sábado, 5 de maio de 2012

CNJ : Eliana Calmon: bons juízes não podem ser confundidos com 'vagabundos' . É importante valorizar os juízes e magistrados que fazem um bom trabalho, mas acabam ofuscados pelos maus


" Se eu não falasse com a imprensa, eu estaria frita, ..." 


fonte : AGENCIA SENADO - 28/02/2012 - 21h07 Comissões - Constituição e Justiça - Atualizado em 28/02/2012 - 21h07

Eliana Calmon: bons juízes não podem ser confundidos com 'vagabundos'

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[ministra Eliana Calmon]

A ministra Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), disse que é importante valorizar os juízes e magistrados que fazem um bom trabalho, mas acabam ofuscados pelos maus, uma "meia dúzia de vagabundos infiltrados":
- Os magistrados que não honram a toga se misturam com os de boa cepa, os bons magistrados, que são mais numerosos. Precisamos sim fazer o combate a esses poucos para que os bons apareçam, para não serem confundidos pela sociedade.
A ministra fez a afirmação em entrevista após audiência pública na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), durante a qual foram discutidos os poderes do CNJ, nesta terça-feira (28).
Na opinião de Eliana Calmon, as atividades disciplinares do CNJ têm um papel importante, principalmente num momento em que o Poder Judiciário, como toda a sociedade brasileira, enfrenta um esgarçamento ético bastante acentuado e as corregedorias estaduais não estão suficientemente preparadas para fiscalizar os magistrados.
A ministra assinalou que é difícil punir os iguais, principalmente se o juiz for "simpático, malandro, sedutor". Muitas vezes os bons juízes se calam na hora do julgamento porque são incapazes de se indispor, esclareceu.
Durante os debates, Eliana Calmon explicou que jamais mandou quebrar sigilos de desembargadores, como se aventou, mas sim que utilizou dados pedidos ainda pelo ex-presidente do conselho, Gilmar Mendes, ao Conselho de Controle de Atividade Financeira (Coaf) sobre movimentações financeiras atípicas. À época, se pretendia criar um controle de pagamento judicial, com informações dos juízes e até de seus dependentes declarados no Imposto de Renda, o que acabou não sendo feito.
Eliana Calmon acusou governos estaduais de oferecerem pagamentos exorbitantes para juízes "sempre que querem algo", por meio, por exemplo, de gratificações, ou de aulas na escola da magistratura que chegam a R$ 10 mil. Nessas investigações de pagamentos, usando os dados de movimentações atípicas, o CNJ chegou a São Paulo, quando se descobriu que 45% dos juízes nem sequer entregavam a obrigatória declaração de Imposto de Renda ao Tribunal, assim como em Mato Grosso. Então veio a liminar e as investigações pararam, esclareceu.
- E as associações disseram que eu quebrei sigilos bancário e fiscal. Não pedi nada, não quebrei nada - declarou.
Na opinião de Eliana, é necessário retomar a investigação que começou a ser feita no ano passado nos tribunais de Justiça para coibir esses pagamentos elevados. A investigação iniciada pelo CNJ no Tribunal de Justiça de São Paulo, e que seria estendida a outros 21 tribunais, foi interrompida por uma liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski. O processo hoje está sendo relatado pelo ministro Luiz Fux.
Para ver a íntegra do que foi discutido na comissão, clique aqui.


CCJ SENADO FEDERAL
Reunião: 3ª Reunião Extraordinária 
Data: 28/02/2012 
Horário de Início: 14:35 
Notas taquigráficas da reunião na CCJ do Senado sobre PEC do CNJ

Senado Federal
Secretaria-Geral da Mesa
Secretaria de Taquigrafia
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Declaro aberta a 3ª Reunião Extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 54ª Legislatura. 
Antes de iniciarmos os nossos trabalhos, proponho a dispensa da leitura e a aprovação da ata da reunião anterior.
 
Os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras que aprovam queiram permanecer como se encontram. (Pausa.)
A Ata está aprovada e será publicada no Diário do Senado Federal.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para instruir a Proposta de Emenda à Constituição nº 97, de 2011, que dá nova redação ao art. 102 e ao art. 103, “b”, da Constituição Federal, que dispõe sobre a competência do Supremo Tribunal Federal e sobre o Conselho Nacional de Justiça para explicitar as competências do Conselho Nacional de Justiça e da Corregedoria Nacional de Justiça, e dá outras providências, que tramita em conjunto com a Proposta de Emenda à Constituição nº 42, de 2007, que altera a Constituição Federal para possibilitar a perda de cargo do magistrado que receber recursos indevidamente com o fim de influenciar decisões judiciais, e com a Proposta de Emenda à Constituição nº 51, de 2011, que altera o art. 37 para dar novo regulamento à responsabilidade por atos de improbidade administrativa, conforme os Requerimentos nº 19 e nº 94, de 2011, desta CCJ, de iniciativa dos Senadores Vital do Rêgo e Demóstenes Torres.
Os convidados são a Ministra Eliana Calmon, Corregedora Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – CNJ; e o Sr. Paulo Schmidt, Vice-Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra. Também foi convidado o ex-Ministro Nelson Jobim, que é ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal, que justificou a ausência.
 
De acordo com o art. 94, §§2º e 3º, do Regimento Interno do Senado Federal, a Presidência adotará algumas normas ‑ antes, convido a Ministra Eliana Calmon para tomar assento à mesa, assim como o Sr. Paulo Schmidt. (Pausa.)
Os convidados farão as suas exposições e, em seguida, abriremos a fase de interpelação pelas Srªs Senadoras e pelos Srs. Senadores, pela ordem de inscrição. Os interpelantes dispõem, pelo Regimento, de apenas três minutos, mas será assegurado aos Srs. Senadores o tempo de até dez minutos para interpelação, sendo-lhes vedado interpelar os membros da própria Comissão. Aos convidados, fica proibido, pelo Regimento, interpelar os membros da própria Comissão.
 
Eu já convidei para tomarem assento à mesa a Ministra Eliana Calmon e o Dr. Schmidt.
 
A Proposta de Emenda à Constituição nº 97 é de autoria do Senador Demóstenes Torres e outros Senadores.
Ela dá nova redação, como eu disse, ao art. 102 da Constituição Federal, para explicitar, nas alíneas “b” e “r” do inciso I, a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar, nos crimes comuns, os membros do Conselho Nacional de Justiça (Conselho Nacional de Justiça) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), bem como as ações ou causas de qualquer espécie contra o CNJ e seus atos e contra o CNMP e seus atos e de suas corregedorias, ainda que tenham a União no polo passivo.
Altera a redação do art. 103-B da Constituição Federal para determinar que compete ao CNJ: processar e julgar, mediante provocação de qualquer pessoa, faltas disciplinares de juízes, serventuários da Justiça e dos foros extrajudiciais, podendo aplicar, além das penas já constantes do texto constitucional, as de advertência e censura, inclusive a juízes de segunda instância e dos tribunais superiores, bem como outras sanções administrativas, garantida a ampla defesa (inciso III do § 4º), e avocar e rever, de ofício ou mediante provocação de qualquer pessoa, os processos ou procedimentos disciplinares, envolvendo os mesmos sujeitos, julgados ou arquivados há menos de cinco anos (inciso V do § 4º).
Acrescenta §§ 4º-A e 5º-A e altera a redação do § 5º do mesmo artigo 103-B, para tornar clara a competência da Corregedoria Nacional de Justiça, autônoma e concorrente em relação aos órgãos administrativos dos tribunais, podendo instaurar procedimentos e propor ao plenário do CNJ a abertura de processo administrativo disciplinar, requisitar informações, exames, perícias ou documentos, sigilosos ou não, imprescindíveis ao esclarecimento de processos ou procedimentos sob sua apreciação; dispõe que a abertura de processo administrativo disciplinar pelo plenário do CNJ suspende, até deliberação final, a instauração ou o prosseguimento de procedimentos similares nos tribunais. Determina que, enquanto não houver lei específica, o CNJ disciplinará, por resolução, seu funcionamento e as atribuições da Corregedoria Nacional de Justiça, sem prejuízo daquelas constantes do art. 103-B da Constituição Federal, na redação dada pela presente proposta.
 
Essa proposta é do Senador Demóstenes Torres e de outros Senadores que a assinaram.
Para instruir a PEC nº 51, de 2007, também não terminativa, do Senador Almeida Lima e outros Senadores, que altera o art. 37, para dar novo regulamento à responsabilidade por atos de improbidade administrativa: 
“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível, cujas penas, sanções e atos restritivos de direito são aplicáveis a todos os agentes públicos, ordenadores de despesa ou não, que tenham praticado o ato ou contribuído, por ação ou omissão voluntária, para o seu resultado.”
O relator é o Senador Randolfe Rodrigues.
Observação: tramitou em conjunto com várias outras propostas, grande parte delas arquivadas no final da última legislatura. Atualmente, tramitam em conjunto apenas as PECs nº 42, nº 51, de 2007, recebida em 21/12/2011, quando foi recebido o relatório do Senador Randolfe Rodrigues, com voto pela constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 97, de 2011, de autoria do Senador Demóstenes Torres e de outros Senadores, e, no mérito, favorável à Proposta, bem como da Emenda nº 1, na forma de substitutivo que apresenta e pela apresentação de requerimento de desapensamento das Propostas de Emenda à Constituição nº 42 e nº 51, de 2007, para que passem a tramitar autonomamente.
Eu quero, antes de dar a palavra à Ministra Eliana Calmon, Corregedora Nacional de Justiça do CNJ, registrar aqui a lista de presença de autoridades:
Dr. Sílvio Marques, Desembargador e Assessor da Corregedoria Nacional de Justiça, do CNJ;
Dr. Patrício Almeida, aqui representando a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Ceará – seja bem-vindo Dr. Patrício;
Dr. Jairo Schäfer, Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, do CNJ;
Dr. Ricardo Chimenti, Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, do CNJ;
Dr. Marlos Melek, Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, do CNJ;
Dr. Erivaldo Santos, Juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, do CNJ;
Dr. Paulo Regis Machado Botelho, Juiz do Trabalho e Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 7ª Região do meu querido Ceará – seja bem-vindo também;
Dr. Luiz Felipe Vieira de Melo Filho, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, a quem convido para sentar-se na nossa bancada de Senadores.
Dr. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, a quem também convido para tomar assento na bancada dos Senadores.
Para dar início aos nossos trabalhos de audiência pública, convido e concedo a palavra à Ministra Eliana Calmon.
V. Exª terá, obviamente, o tempo regimental de 20 minutos, podendo ser prorrogado pelo tempo que houver necessidade por parte de V. Exª.
A Presidência vai conceder o tempo que V. Exª achar necessário para fazer a sua exposição.
Tem a palavra V. Exª.
A SRª ELIANA CALMON – Senador Presidente Eunício Oliveira, meu colega Dr. Paulo Schmidt e Srs. Senadores, peço licença para distinguir os autores das Emendas nº 42 e 45, os Senadores Demóstenes Torres e Randolfe Rodrigues, minhas senhoras e meus senhores, meus auxiliares diretos na Corregedoria, meus colegas magistrados aqui presentes, é com muita satisfação que compareço aqui, atendendo ao convite da Comissão de Constituição e Justiça para falar um pouco daquilo que tenho vivido nesses últimos 18 meses, que é o Conselho Nacional de Justiça, na parte da Corregedoria Nacional.
Eu quero dizer aos senhores que sou juíza de carreira, estou há 32 anos nas funções judicantes e, há alguns anos, eu me preocupo, consideravelmente, com os aspectos do Poder Judiciário que eu venho, ao longo dos anos, criticando. Mas a crítica é construtiva, de quem quer bem e de quem quer que o Poder assuma o seu papel constitucional que a Constituição de 1988 estabeleceu para o Poder Judiciário.
Essa minha crítica é no sentido de que, lamentavelmente, o Poder Judiciário brasileiro tem sérias dificuldades de assumir o papel constitucional desenhado pelo legislador de 1988, porque nós continuamos com um discurso antigo, com um modelo antigo e com uma estrutura que não está se aguentando para
assumir as responsabilidades impostas pela Carta de 88.
Com esse espírito, cheguei ao Conselho Nacional de Justiça e quero dizer que, embora muitas das atividades do Poder Judiciário se assumam por uma questão de antiguidade, eu escolhi ser Corregedora, eu queria muito ser Corregedora. E por que eu queria ser Corregedora? Eu queria ser para fazer um pouco mais, abrir um pouco mais a visão de que nós precisávamos, em primeiro lugar, fazer um mea-culpa, mas não um mea-culpa interno. Nós precisávamos falar para os nossos jurisdicionados que nós não estamos bem, que temos dificuldades estruturais e, por isso mesmo, estamos no Conselho Nacional de Justiça para que o Poder Judiciário possa desabrochar e atender a suas funções, porque, sem dúvida alguma, a Emenda nº 45 foi de uma felicidade ímpar, na medida em que criou o Conselho Nacional de Justiça para fazer o que no Poder Judiciário? Não interferir no Poder Judiciário, mas para dinamizar, estruturar administrativamente o Poder Judiciário, que estava com gravíssimos problemas de gestão administrativa. E, ao passo que estabeleceu exatamente a função do Conselho de uniformizar as práticas administrativas, estruturar a parte administrativa e, sobretudo, criar o chamado “Planejamento Estratégico para o Poder Judiciário”, a Emenda nº 45 também criou a Escola de Formação de Magistrados porque, dessa maneira, a concepção é a de que o Poder Judiciário, estabelecido no seu status quo, bem administrado, e os novos magistrados que chegavam bem formados, nós nos encontraríamos um dia para fazermos do Poder Judiciário aquilo idealizado pelo legislador de 1988, que é o Poder Judiciário completo, responsável, incumbido de fazer a justiça justa e não apenas a justiça legal. Não ser a boca do legislador, mas ser aquilo que há necessidade de se resolver em relação às políticas públicas, em relação às justiças justas para o povo brasileiro.
Sabia que ia encontrar grandes dificuldades, mas eu entendia que a função precípua da Corregedoria como está na Constituição não é apenas a questão disciplinar: é a questão da execução das políticas traçadas pelo Conselho Nacional de Justiça. O Conselho Nacional de Justiça traça, através do seu plenário, do seu presidente, das suas comissões, a política e o planejamento estratégico a ser seguido pela magistratura de maneira uniforme. E a Corregedoria fiscaliza a realização desse trabalho de execução dessas políticas traçadas pelo CNJ. Daí por que os inúmeros projetos que a Corregedoria estabeleceu, ainda sob a administração do meu antecessor, o Ministro Gilson Dipp, que deu um dinamismo extraordinário à Corregedoria nacional – e eu dei seguimento a todos os projetos, acrescentando alguns outros que estão ligados exatamente a essa atividade de gestão, de administração.
Mas a Corregedoria não é só isso. A Corregedoria é também o órgão onde há o início de toda a atividade disciplinar.
Quero esclarecer que não é a Corregedoria que julga os magistrados. A Corregedoria inicia esse procedimento, a partir do recebimento de reclamações, de providências e de representações. E a partir dessa atividade investigativa é que a Corregedoria apresenta ao Plenário a possibilidade da abertura de uma sindicância para, posteriormente, ser aberto um processo administrativo.
 
Observem os senhores que o caminho é longo e não há a mínima preocupação de dizer que a Corregedoria ou o Conselho Nacional de Justiça é um tribunal de exceção, porque não existe ampla defesa. Não, absolutamente. A Corregedoria investiga, inclusive sigilosamente, sem que haja a manifestação de qualquer das partes, porque, inclusive, as partes ignoram o que está se passando no âmbito da Corregedoria, e se houver pertinência para aquela representação ou para aquela denúncia, aquilo se transforma em sindicância, e a partir daí é que nós comentamos, porque passa a haver o contraditório com a intimação daquele que está sendo sindicado. E somente ao final, levando-se o resultado da sindicância para o Plenário, é que o Plenário vai abrir o processo administrativo.
Essa é a tônica da Corregedoria Nacional, onde as atividades disciplinares têm um papel importante, sim, principalmente num momento em que, no Brasil, nós estamos com o Poder Judiciário, como toda a sociedade brasileira, com um esgarçamento ético bastante acentuado.
 
Daí porque o entendimento que temos é que a Corregedoria Nacional é uma corregedoria pequena. Hoje, eu conto, na Corregedoria, incluindo-me nesse número, com 53 pessoas. É um número bastante limitado, porque nós temos a consciência de que o grande papel de disciplina é feito pelas corregedorias locais. Só que as corregedorias locais estão absolutamente despreparadas para atender à demanda necessária e também pela cultura que se estabeleceu, com ranços, inclusive, de uma civilização bonapartista de que nós temos de nos proteger.
Então, essa cultura das corregedorias locais dificulta grandemente a atividade disciplinar. Daí porque o papel da Corregedoria Nacional é bastante significativo, porque a corregedoria local sabe que, se não houver a interferência e a funcionalidade necessária para o seu mister, ele estará com a Corregedoria Nacional, a quem ele terá de prestar contas.
Tenho de dar diversos depoimentos aos senhores dizendo o seguinte: muitas e muitas vezes, chega à Corregedoria Nacional uma representação ou uma denúncia, e eu, imediatamente, digo à pessoa que procura a Corregedoria Nacional: “Eu irei funcionar juntamente com a corregedoria local”. E às vezes basta um simples telefonema ao Corregedor do Estado para eu solucionar a questão. Outras vezes, por informações, que temos não adianta sequer o telefonema ou o ofício porque sabemos que não haverá resultado naquela interferência. É nesse momento que a Corregedoria Nacional tem a possibilidade de instaurar a sindicância, de instaurar a investigação.
 
Isto é importante frisar porque essa competência concorrente é o que dá toda a força à Corregedoria Nacional. Na medida em que a Corregedoria Nacional se transformasse em um órgão recursal, apenas admitindo a revisão daquilo feito pelas corregedorias locais, nós estaríamos irremediavelmente perdidos nessa grande tarefa que é da reconstrução do Poder Judiciário.
Quero esclarecer aos senhores que foi efetivamente maravilhosa a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal, decisão, inclusive, que não precisava ser tomada se nós olhássemos lá adiante desde a criação do CNJ a posição tomada pelo próprio Supremo Tribunal Federal, que admitiu a autonomia do Conselho Nacional de Justiça.
Mas, ao curso destes seis, sete anos de existência, foi sendo criada uma tese da subsidiariedade, da competência subsidiária, e isso ficou muito arraigado no espírito de diversos segmentos da magistratura nacional.
Portanto, essa decisão veio tirar aquela nuvem que pairava sobre a competência da Corregedoria Nacional.
Mas, então, eu pergunto: será que há necessidade de uma PEC, se o Supremo Tribunal Federal já reconhece a competência concorrente? Eu respondo que sim, à medida que se trata de uma decisão em liminar, se trata de uma decisão por uma maioria bastante reduzida e, mais ainda, à medida que essa competência pode ser questionada em um instrumento que é da iniciativa do próprio Supremo Tribunal Federal, que é a Lei Orgânica da Magistratura.
Então, nesse momento, é necessário que o Senado Federal, o legislador brasileiro, com a consciência que tem do que pensa a sociedade brasileira. Foi efetivamente maravilhosa a participação popular na manutenção do Conselho Nacional de Justiça. O povo brasileiro parece que se apropriou do Conselho Nacional de Justiça como se fosse uma propriedade privada e marchou para as redes sócias, para a imprensa, para os “facebooks” da vida, mostrando o que estava pensado sobre o Conselho Nacional de Justiça. E esse orgãozinho criado em 2004 passou a ser questionado pelo porteiro do prédio, pelo faxineiro do edifício e até pelo “bidoutor”, aquele que foi para os jornais escrevendo artigos e questionando diversos aspectos jurídicos do Conselho Nacional de Justiça. Foi uma das coisas mais lindas que eu, como cidadã brasileira, presenciei. E tive a felicidade de, por ter um apoio extraordinário do Senado Federal, da imprensa brasileira e do povo brasileiro, da magistratura brasileira – por que não dizer, porque diversos e diversos magistrados começaram a correr para, por meio de e-mails, de cartas e cartões, manifestar a sua posição em relação à independência do Conselho Nacional de Justiça...
Daí por que, neste momento, eu acho que é de toda pertinência, sim, o exame dessa PEC e ainda mais estabelecendo algo que é fundamental, quando foi colocada, em dispositivos diversos, a competência concorrente do Conselho Nacional de Justiça para fazer o exame dos processos disciplinares contra os magistrados de primeiro grau, e, em um parágrafo, estabelecendo a competência primária e concorrente também dos magistrados de segundo grau.
E é exatamente aí que está a grande dificuldade: o próprio tribunal julgar os seus é de uma dificuldade sem limites! Ao longo dos anos, ao longo dos tempos e das carreiras todas, temos verificado a existência dessa autodisciplina, a dificuldade que temos de punir os nossos iguais. Principalmente quando esses nossos iguais são pessoas que convivem conosco durante 10, 15, 20 anos.
Eu digo sempre da minha dificuldade quando tive que examinar dois processos disciplinares de colegas meus do Superior Tribunal de Justiça. Magistrados que estavam comigo há muitos anos, dos quais eu conhecia as esposas, fui a todos os batizados e casamentos da família; conviviam na minha casa, e cujos filhos me chamam de tia. De repente, eu viro o julgador desses colegas.
Não é sequer justo para com qualquer magistrado ser o juiz do seu colega, do seu amigo, daquele colega com quem se tem uma convivência tão longa e tão íntima.
 
Daí por que estabelecendo... E como fez a Emenda 51, em que está explicitada, em um artigo, a competência do CNJ para julgar os juízes de primeiro grau e, em um parágrafo, a competência para julgar os magistrados de segundo grau – porque esses são os mais deletérios quando se enveredam para o mal, porque têm a influência direta dos juízes de primeiro grau. E isso precisa ser realmente combatido.
Mas esse combate precisa primeiro nós aceitarmos que isso existe dentro do Judiciário brasileiro; aceitarmos e conversarmos com transparência, sem segredos, sem mistério com o próprio jurisdicionado. Todo mundo sabe de tudo, e por que não vamos falar daqueles males? Daí por que entendo que estamos, sim, num momento rico porque estamos tratando de uma PEC que é de pertinência absoluta.
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – V. Exª concluiu? (Pausa.)
Concedo a palavra ao Dr. Paulo Schmidt, que é vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Anamatra.
V. Exª dispõe de 20 minutos. Se necessário, a Mesa concederá mais tempo a V. Exª.
Tem a palavra.
O SR. PAULO SCHMIDT – Sr. Presidente, Srª Ministra, Sr. Senador, Srªs Senadoras, agradecendo o convite que me foi feito, saudando a presença de vários juízes do Trabalho, presidente da associação nacional, de várias associações regionais. Demonstrando o apreço que temos por esta Casa, por esta comissão, onde somos muito bem recebidos e ouvidos, reitero que provavelmente o convite me tenha sido feito, Senador Pedro Simon, porque fui da primeira composição do CNJ.
 
Preciso necessariamente enfocar alguns aspectos históricos para dizer que nós ombreamos com aqueles que pensaram o CNJ lá atrás, desde antes da sua instalação. A Anamatra, de público, veio trazer uma proposta a favor do que então se dizia controle externo, inclusive com uma participação da sociedade numericamente maior até do que a que acabou sendo consolidada porque entendíamos, à época, que também a academia deveria participar. Mas, enfim, o CNJ nasceu e foi instalado com muitas dificuldades. É preciso fazer o registro do denodo e do empenho do então Ministro Jobim, Presidente da Casa, que foi o grande responsável pela arquitetura física que viabilizou a instalação do Conselho.
A instalação do Conselho veio com a realidade de um Judiciário absolutamente desconhecido, porque era, na expressão que se usava na época, “um conjunto, um arquipélago de 96 ilhas”, que não falavam entre si, que usavam linguagem de informática completamente surda e muda, de uns com os outros, realidade que ainda hoje não está superada e que no plano político sofreu sérias restrições de setores importantes da magistratura.
 
Fui designado para relatar a elaboração do Regimento Interno. Criar um Regimento Interno do nada, a partir de um texto enxuto da Constituição, foi uma tarefa difícil. Ela foi experimentada com a contribuição de todos os então conselheiros daquela primeira composição, baseados exclusivamente na experiência pessoal de cada um.
 
Cada um vinha de um ramo diferente do Judiciário, de um grau diferente, do primeiro, do segundo, dos tribunais superiores, da advocacia, do ministério público, daqui desta Casa e também da Câmara. Lá foram feitas as primeiras discussões sobre a natureza do Conselho e sobre suas competências. Lá já discutimos qual era a natureza do Conselho e qual era sua competência, se estava derrogada ou não a competência disciplinar dos tribunais por conta da Corregedoria Nacional, ou não, se ele se subsumia na administração. Enfim, se ele era um órgão recursal ou se era um órgão originário. A conclusão primeira a que chegamos naquela época foi a de que o CNJ não poderia ser um órgão recursal administrativamente falando, porque ele em pouco tempo seria inviabilizado como hoje estão alguns de nossos tribunais superiores pelo conjunto imenso de processos que lhe são submetidos.
Então, esta foi a primeira definição: a competência do CNJ é originária. Se é originária, ela não é, ordinariamente, recursal e, portanto, a iniciativa lhe cabe tanto na área administrativa quanto na área disciplinar.
Não havia nenhum tipo de discussão se a Constituição, pela Emenda 45, referia se essa competência era concorrente ou era subsidiária, ou seja, após os tribunais. Essa discussão não foi feita. Nós fizemos a discussão sob a ótica da viabilização daquele órgão.
Muito bem, estabelecido isso, as competências específicas de avocação e revisão ficaram claramente dirimidas e, portanto, o CNJ pôde caminhar dali para frente com um busca incessante da sua legitimação. Órgão novo, precisava se legitimar tanto perante a sociedade quanto perante o próprio Poder Judiciário. E as discussões envolveram a elaboração do Regimento, principalmente na estrutura da Corregedoria; por exemplo, se hoje a Corregedoria conta com 53 servidores, o Conselho inteiro temos 30, se tanto, para fazer o órgão começar a funcionar. E o debate foi naquele momento que a Corregedoria era um “órgão” do próprio Conselho subordinado ao Plenário, como todos os órgãos do próprio Conselho, que é a sua instância máxima.
Bom, feito isso, adotamos as políticas públicas republicanas que a sociedade reclamava. Primeiro, no que diz respeito às sessões públicas, que deveriam deixar de ser secretas. Na questão do nepotismo. No enfrentamento da questão remuneratória. Na questão de se levantarem dados confiáveis. Não se conheciam dados do Poder Judiciário. Se bem que o Ministro Jobim, no Gabinete extraordinário, há um ano antes, já havia providenciado a primeira edição do Justiça em Números, e que foi sendo depois aperfeiçoado.
Essas medidas, vamos dizer assim, republicanas é que legitimaram inicialmente o CNJ perante a sociedade e também perante a grande maioria dos juízes – E aí juízes no sentido lato, de todas as instâncias –, que enxergaram no Conselho exatamente aquele órgão que poderia vir a resolver o sério problema de interlocução entre os diversos ramos e as diversas instâncias, que até aquele momento não existiam. Lembro-me de uma informação que nos chegou num certo momento onde se discutia a informatização: após a fusão, após a incorporação dos três Alçadas ao TJ de São Paulo, o Tribunal de Justiça de São Paulo funcionava com quatro sistemas de informática diferentes e que não conversavam entre si. Isso era absolutamente comum em vários tribunais, onde os dados do primeiro grau não se cruzavam com os do segundo. Os dados da Corregedoria não se comunicavam com a Presidência.
Esse é hoje, penso eu, um dos grandes desafios que ainda se colocam para o CNJ. É o planejamento estratégico, é a uniformização de procedimentos e a informática, de modo que um advogado do Acre possa peticionar um processo do Rio Grande do Sul, e vice-versa, e a linguagem ser compatível entre os dois tribunais.
Essa é uma demanda que ainda o CNJ não respondeu e é compreensível, porque não é fácil fazer isso, tendo-se em conta que a tecnologia da informação envelhece a cada seis meses. Isso é uma demanda pendente que precisa ser solucionada.
Mas, voltando à questão da PEC, da forma como está apresentada, repito que a Anamatra, os juízes do Trabalho e em boa parte os juízes federais, até onde sei, tínhamos uma posição e sempre tivemos uma posição absolutamente favorável à ampla competência do CNJ. E nos sentimos muito à vontade quando o Senador Demóstenes apresentou a PEC. Nós viemos dizer que, em linhas gerais, nós concordamos com isso. Portanto, nós nos sentimos muito à vontade. Embora, penso eu, sobre alguns aspectos da proposta que inclusive foi viabilizada pelo substitutivo, há três questões que eu gostaria de enfocar.
Primeiro: a questão do fórum privilegiado. Penso que fórum privilegiado é até um nome impróprio; deveria ser “prerrogativa de fórum”. A proposta é alcançar os conselheiros na questão do fórum privilegiado para crimes comuns. O Ministro Celso de Melo agora, na semana passada, publicou um artigo em que ele entende que, politicamente, deveria ser eliminado, a não ser para situações excepcionais, o fórum privilegiado para crimes comuns. O que eu acho, na verdade, é que, para atender a demanda que os conselheiros precisam... Aqui falo de experiência pessoal: o que precisa o conselheiro ter é garantia de fórum em razão do cargo que ele ocupou, das demandas que decorram das decisões que proferiu; e aí pouco importa se durante o mandato ou após. Esse conselheiro poderá ser demandado por ações, digamos assim, de dano moral em qualquer parte do Brasil, em mais de uma vez. Então, talvez a alternativa melhor para o fim pretendido – que, repito, é para dar autonomia e independência para os conselheiros – fosse prever a prerrogativa de função, o foro no Supremo, para as ações que decorram do exercício da função.
A outra questão que gostaria de enfocar é que acho que a intenção na PEC não é nem essa, mas pode vir a sugerir isso – e falo de experiências e de discussões na época. A PEC prevê que a Corregedoria é um órgão do CNJ, é um órgão do Conselho Nacional de Justiça. O órgão é o próprio CNJ. A Corregedoria é, vamos dizer assim, um setor de competência específica para determinada atribuição e competência do Conselho. Mas ela não é um órgão propriamente dito. Penso que isso... Não agora, porque a Ministra, com certeza, não tem esse entendimento. Mas me lembro da época da feitura do primeiro Regimento, em que nós tivemos alguma dificuldade de discussão nesse sentido, e substituir essa redação, excluindo essa expressão “é órgão do Conselho”, talvez fosse mais apropriado.
A terceira questão diz respeito à requisição de documentos de informações sigilosas ou não. Eu li a justificativa do Relator, são razões fortes, mas penso que há uma distinção clara entre a natureza do provimento judicial do Conselho, que é administrativo, de provimento judicial que a Constituição prevê e que estão lá no art. 5º, incisos X e XII.
Então, provavelmente, essa proposição, dessa forma, encontre óbice na possibilidade material de emenda da Constituição, vedada no art. 60, inciso IV, § 4º da própria Constituição, que seria...Eu entendo que essa é uma cláusula pétrea e, portanto, há dificuldade, há impedimento de modificação nesse sentido.
Feitas essas considerações, Sr. Presidente, eu teria alguns outros pontos a enfocar que não estão diretamente relacionados à matéria em discussão, à PEC em discussão. Não há proposta nesse sentido, mas me sinto no dever de aproveitar esta fala para lembrar que a forma de composição do Conselho Nacional de Justiça, se não traz problemas, tem, potencialmente, algum risco de afetar a independência do conselheiro. Penso que, no modelo europeu, encontraram uma forma democrática que melhor atende à independência do Conselho – é isso que estamos discutindo –, que, se ele fosse eleito diretamente pelos seus pares, estaria mais bem assegurada. Aliás, uma proposta de emenda, uma ideia já apresentamos em algum momento para alguns dos Srs. Senadores, mas ainda não conseguimos estabelecer essa discussão. Por isso que a refaço neste momento.
E outra questão que acho deveria ser resolvida – e aí é quase um apelo, Srs. Senadores: hoje, a magistratura da União está numa situação de clara dependência do Poder Executivo, da Chefe do Poder Executivo, num tema chamado “negociações”. Agora, lamento que isso não seja uma das preocupações do CNJ.
O que está acontecendo? Há dezenas de listas de magistrados para serem providos cargos nos tribunais que quase fazem aniversário de ano e nós não temos uma solução para isso. Não há, efetivamente, ao que nos aprece, tempo na agenda da Senhora Presidente para despachar com os Ministros envolvidos na questão a fim de saber quem é o juiz que deve ser promovido.
Na verdade, penso que, primeiro, isso deveria ser resolvido sob a ótica da simetria com os TJs. Nos tribunais de justiça, os desembargadores oriundos da carreira são nomeados pelo próprio Presidente e não pelo Governador do Estado. Por que nos TRTs e nos TRFs tem que ser o Presidente da República, que não sabe nada do juiz? Não sabe!
E, aí, nós temos um comando constitucional que determina que o CNJ propugne – e que os tribunais também o façam – por promoções baseadas em critérios objetivos. Vamos reconhecer: essa é uma das questões mais tormentosas que o CNJ enfrenta ao longo desses seus quase sete anos, qual seja, o estabelecimento de critérios objetivos para promover o mais merecedor. E, aí, dezenas, centenas de processos são julgados; há uma normatização que o CNJ fez; levou aos tribunais que implementassem isso, e o que acontece na verdade? Quando os três supostamente mais meritórios entram na lista, e o primeiro, em tese, é o que tem mais mérito, a Presidente da República não está vinculada, não se vincula ao topo da lista, que é o mais merecedor.
Então, esse trabalho imenso, esse esforço que o CNJ faz, que os tribunais fazem – e vêm fazendo há muito tempo – de tentar efetivamente eliminar as possibilidades do compadrio, do tráfico de influência, criando critérios objetivos, nós chegamos a que... Quando os processos chegam aqui para se efetivar a promoção, nós nos deparamos com uma situação dessa.
Então, é quase que um apelo para que essa situação tenha tratamento similar aos TJs. Nos TJs, o Governador apenas nomeia os integrantes do quinto. Os de carreira são nomeados pelo próprio Presidente do Tribunal, assim como também na aposentação.
Presidente, tendo feito essas considerações – e teria ainda muitos aspectos a observar, como também a Srª Ministra –, mas, por enquanto, fico por aqui e faço exatamente uma chamada no sentido de que os juízes esperam muito do CNJ. Esperam muito! E não só na questão disciplinar, no cumprimento de metas, na busca de eficiência, mas esperam também do CNJ a defesa da sua independência, porque, embora esteja na Constituição apenas a atribuição do CNJ de defender a autonomia dos tribunais, friso que não existe autonomia dos tribunais sem defesa da independência do juiz.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Obrigado, Dr. Paulo Schmidt; muito obrigado, Ministra Eliana Calmon.
Vamos à fase de interpelação pelas Srªs e pelos Srs. Senadores.
A Senadora Marta Suplicy está na ordem de inscrição; em seguida, Senadores Ricardo Ferraço, Randolfe Rodrigues, Demóstenes Torres, Pedro Taques...

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – V. Exª pode falar como autor do requerimento.
Como dizia, estão inscritos ainda os Senadores Pedro Taques e Eduardo Suplicy.
Então, como V. Exª é autor do requerimento, pediria que me possibilitasse dar a palavra à Senadora Marta Suplicy, de vez que S. Exª tem, inclusive, daqui a pouco, de presidir a sessão do Senado Federal. (Pausa.)
Assim, tem a palavra V. Exª, Senadora Marta Suplicy.
A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Muito obrigada pela gentileza, Senador Demóstenes, Senador Eunício.
Quero cumprimentar o Dr. Paulo Schmidt pelo aporte de reflexões que nos trouxe e, muito brevemente, parabenizar o Senador Demóstenes pela iniciativa da PEC. Muito oportuna, Senador, e acho que vai tramitar como um bólido neste Senado. E parabenizar, de todo o coração e com toda a alegria a Ministra Eliana Calmon, porque são a determinação e a coragem de V. Exª que vão trazer e possibilitar uma mudança radical no nosso Judiciário. E, como sei também da militância histórica feminista de V. Exª, quero também, como mulher, dizer do nosso orgulho e da nossa admiração pela figura que a senhora trouxe, brilhante, e com todos esses atributos e qualidades que a gente admira. E hoje temos em V. Exª um modelo cívico para todas nós, e também político. Muito obrigada pela contribuição que está dando à sociedade brasileira.
Era tudo o que tinha a dizer.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Obrigada, Senadora Marta Suplicy.
Vou conceder, então, a palavra...Pela ordem de inscrição, seria o Senador Ricardo Ferraço, mas, como autor da PEC, concedo a palavra ao Senador Demóstenes Torres.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Sr. Presidente, Srª Ministra Eliana Calmon, Sr. Vice-Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Paulo Schmidt, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, na realidade, esta é uma discussão muito antiga para quem participa, tanto da carreira do Judiciário quanto das carreiras que compõem as funções essenciais à Justiça.
Tive a oportunidade – lembrei isso inclusive num debate com a Ministra Eliana Calmon no jornal Folha de S. Paulo – de dizer que temos essa aspiração mesmo antes da Constituição de 1988. E que, na Constituição de 1988, tentamos criar o que se chamava de Controle Externo da Atividade Judiciária, o controle externo do Judiciário que, como lembrou o Dr. Paulo Schmidt, era algo muito mais ambicioso que foi criado, porque pensávamos realmente num controle externo com a participação mínima do Poder Judiciário.
Mas acontece que a evolução do tema, a maturação da Constituição possibilitou que fizéssemos o Conselho Nacional da Magistratura como um órgão do controle interno, um conselho do controle interno, para que o Judiciário tivesse a oportunidade de se autodepurar, e fizemos isso dando a oportunidade para que os próprios magistrados compusessem majoritariamente esse Conselho. E haveria quatro representantes da sociedade civil, dois indicados pela Câmara dos Deputados e dois indicados pelo Senado Federal, além dos representantes da Magistratura e da Ordem dos Advogados do Brasil.
Isso feito, houve uma engenharia própria que foi colocar o Conselho Nacional de Justiça logo abaixo do Supremo Tribunal Federal, para que o Supremo pudesse corrigir as ações do Conselho que estivessem desequilibradas ou afrontosas à Constituição Federal.
E, no debate que travamos aqui – eu já era Senador, muitos aqui já eram Senadores –, lembro-me perfeitamente do Senador Pedro Simon. Nesse debate, dizíamos que era importante que assim fosse, por quê? Porque se evitariam os questionamentos quanto à competência do Conselho Nacional de Justiça para processar e julgar originariamente os seus pares.
E por que colocamos dessa forma na Constituição? Por que, sabidamente, as corregedorias locais não funcionavam. Lembro-me de um exemplo claríssimo dado aqui pelo Ministro Nelson Jobim: quando alguém tinha que ser punido, os desembargadores mais velhos chamavam aquele desembargador, o faltoso, e diziam: “Está na hora de você se aposentar”. Essa era a punição. E, muitas vezes, até me lembro que o representante da Magistratura se indignou naquele momento, dizendo que no Estado dele nunca foi assim, mas era um consenso que fosse dessa forma, um consenso reconhecido pelo então Presidente do Supremo Tribunal Nelson Jobim.
 
Nós podemos dizer o seguinte: o Relator, naquele momento, era o hoje Ministro do Tribunal de Contas da União José Jorge, e o Ministro Nelson Jobim encontrou uma redação que satisfazia o pleito do Congresso, da sociedade e dos próprios magistrados, para que o Conselho tivesse efetividade.
E dizia o seguinte:
 

“Art.130.......................................................................................................................B ...........................................................................................................
§4º. Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:
I. .........................................................................................................................
II. ........................................................................................................................
III. receber e conhecer (...)”

Todo mundo sabe o que é conhecer, no jargão jurídico: quem conhece em seguida julga; julga procedente ou julga improcedente. Então, não se pode dizer que, com isso, o Conselho estaria afastado daquela função de julgar originariamente os juízes faltosos.
Muito bem. Mas houve, a partir da edição, por parte daqueles que nunca se conformaram com a existência do Conselho – é bom dizer isto: uma parte da magistratura substancial nunca se conformou com a existência do Conselho Nacional de Justiça. Tanto é que, logo no ano de 2005, houve uma ação direta de inconstitucionalidade e, nessa ação direta de inconstitucionalidade, o Supremo, por maioria esmagadora, disse: o Conselho Nacional de Justiça é constitucional. Mas vem a revanche sempre. Vem a revanche!
E quem sofre com essa revanche não é só a Ministra Eliana Calmon; quem sofre são todos os brasileiros que esperam um Poder Judiciário cada dia melhor. O Dr. Paulo Schmidt esteve lá, fez parte da primeira composição e contribuiu brilhantemente para que esse Conselho pudesse atuar.
Mas, então, o que é que nós imaginamos? Para evitar a dificuldade que, repito, neste momento é da Ministra Eliana Calmon, mas amanhã será de outro corregedor; portanto, é da própria sociedade brasileira, é que nós concebemos essa proposta de emenda à Constituição. E deixamos claro que, em vez de receber e conhecer das reclamações, fica “processar e julgar, de ofício ou mediante provocação de qualquer pessoa, faltas disciplinares praticadas por membros ou órgãos do Poder Judiciário”. Processar e julgar: não tem mais claro, não é? Se estava ali obscuro, não o era em minha opinião, e quem lida com o Direito sabe muito bem que não é obscuro. Mas, para evitar problemas, colocamos então: “processar e julgar, aplicar advertência e censura” etc.
Colocamos também avocar e rever, de ofício ou mediante provocação de qualquer pessoa, processos ou procedimentos disciplinares em relação a faltas praticadas por membros ou órgãos do Poder Judiciário e auxiliares da Justiça, ou de serventias de foro extrajudicial, e ampliamos o prazo de os processos serem julgados ou arquivados para menos de cinco anos, em vez de ser um ano, como é hoje.
Eu gostaria até de perguntar a V. Exª se V. Exª concorda com esse prazo ou se um ano é o prazo suficiente para fazer isso.
 
E também deixamos claro que não era só atuação decorrente ou conferida pelo Estatuto da Magistratura, mas das próprias leis que serão editadas e que são editadas da Constituição Federal.
 
Também perguntaria a V. Exª se concorda com essa modificação.
E deixamos claro também que essa função é autônoma e concorrente com os outros órgãos administrativos dos tribunais. Por quê? Porque, senão, o corregedor e o próprio Conselho se sentirão impedidos de poder trabalhar de forma efetiva.
E fizemos algumas modificações, para deixar absolutamente claro que, por exemplo, o conselheiro deve ser processado, uma vez que ele está acima do Superior Tribunal de Justiça, naquela escala oferecida por nós mesmos: Supremo Tribunal Federal, Conselho nacional de Justiça e, depois, os Tribunais Superiores e assim por diante.
Então, nós colocamos que os membros do Conselho Nacional de Justiça e os membros do Conselho Nacional do Ministério Público devem ser processados pelo Supremo Tribunal Federal. Por que não fizemos nos moldes que sugeriu o Dr. Paulo Schmidt? Porque a Súmula nº 394 foi cancelada, que dizia isso há muito tempo, muito antes da própria reforma. Quer dizer, então não há possibilidade de se fazer essa sugestão que V. Exª dá em decorrência do cancelamento dessa própria Súmula. Então, também indago a V. Exª se acha pertinente essa alteração.
Colocamos, inclusive, uma outra regra, porque deixamos claro que cabe recurso das decisões para o Supremo, cabe mandado de segurança, cabem outras espécies já admitidas pelo próprio Supremo, mas as ações ou causas de qualquer espécie contra o Conselho Nacional de Justiça, e seus atos, e contra Conselho Nacional do Ministério Público, e seus atos, e de suas corregedorias hoje podem ser desconstituídas por ação de órgão, inclusive, de primeiro grau, o que é um verdadeiro absurdo. A decisão, não, mas qualquer outro ato administrativo pode ser passível de ataque ainda no primeiro grau de jurisdição. Agora, vejam, um órgão corregedor que aplica sanções, inclusive para os Ministros do Superior Tribunal de Justiça está passível, seus atos, não as decisões, de um órgão de primeiro grau, ou de segundo grau, ou assim por diante, ou de um órgão de grau inferior.
Então, estamos colocando claramente que essa competência é do Supremo Tribunal Federal. Se V. Exª também concorda com essa alteração.
E, em relação aos documentos sigilosos, é bom, Dr. Paulo Schmidt, que atentemos para a redação. O que estamos propondo? Até poderíamos, se o Conselho Nacional de Justiça fosse entendido, como chegou a defender aqui o Ministro Gilmar Mendes, que as decisões eram decisões judicialiformes, poderíamos até entender que CNJ poderia quebrar os sigilos, mas não é isso que nós estamos propondo não. Nós estamos propondo o seguinte: requisitar das autoridades fiscais, monetárias e de outras autoridades competentes informações, exames, perícias ou documentos, sigilosos ou não, imprescindíveis ao esclarecimento de processo ou de procedimento submetidos à sua apreciação.
Estava aqui o nosso querido Senador Edison Lobão, na legislatura passada, e nós aprovamos isso aqui para o Ministério Público e para as Polícias, por quê? Porque não se trata de quebra de sigilo. Aqui não está pedindo para grampear ninguém, aqui não está pedindo nenhuma informação referente a paraíso fiscal não. São documentos sigilosos ou não já existentes, por exemplo, como contas telefônicas; como os dados fiscais, a declaração de Imposto de Renda, a cópia já dada no Tribunal, como é obrigação de todo servidor público, como nós fazemos aqui, todos os anos, enviamos uma cópia para o Tribunal de Contas da União.l
Então, nós não estamos falando aqui em quebra de sigilo; nós estamos falando em busca de documentos sigilosos ou não, que podem embasar as investigações.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – V. Exª me permite um aparte depois?
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Com o maior prazer, Senador Pedro Taques.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Apenas para lembrar, e V. Exª fez referência, que é a Lei de Improbidade Administrativa, 8.429, de 92, já determina que o servidor público deve apresentar essas declarações.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Perfeito.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – E um outro dado importante é que esses dados cadastrais aí não estão acobertados por sigilo bancário ou fiscal, porque nós não vivemos na Suíça, onde os nomes também estão acobertados. Apenas isso, se me permite, e peço desculpas se interrompi seu raciocínio.
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – Permite, Senador?
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Permito com maior prazer, Senador Lobão.
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – Esse item engloba também a quebra do sigilo bancário?
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Não.
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – E por que não, se é um importante instrumento de investigação e julgamento? Por que não se aproveitou?
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Olha, eu até concordaria, e V. Exª estava aqui quando o Ministro Gilmar veio e também a Ministra Ellen Gracie. E ambos, em oportunidades distintas, defenderam que o CNJ deveria ter essa oportunidade porque as decisões não eram meras decisões administrativas, mas eram decisões judicializadas; tanto é que o CNJ está abaixo. Mas, para evitar polêmica, não colocamos aqui a quebra do sigilo. Colocamos o acesso aos dados. Veja só que o Ministro Gilmar está na ativa no Supremo Tribunal Federal, e é um Ministro respeitabilíssimo, que tem a opinião de que isso não feriria, de forma alguma, a privacidade de quem quer que seja, uma vez que as decisões do Conselho Nacional são judicializadas. Então, acho que, se V. Exª apresentar a emenda – não sou relator – o Senador Randolfe analisaria isso com carinho.
 
Então, também aqui não se fala em quebra de sigilo, mas nos dados cadastrais...Como lembrou o Senador Pedro Taques, nós deixamos claro que o Ministério Público e a polícia podem pedir isso porque esses dados não estão acobertados pelos chamados sigilos constitucionais.
 
Eu também perguntaria se V. Exª concorda com a alteração feita nesse projeto para fortalecer o Conselho.
V. Exª aborda alguns temas interessantes. Acho que, quando aparecer a nova Lei Orgânica da Magistratura, nós podemos tratar. Sou plenamente favorável a que a escolha dos dirigentes dos tribunais regionais federais se dê pelo próprio órgão colegiado, pelo presidente do tribunal pertinente. Acho que, em relação a tribunais superiores e Supremo Tribunal, é pertinente a escolha. E discordo frontalmente de V. Exª – só para tratar desse tema – acerca da escolha por associados. Por quê? Eu fui candidato três vezes no Ministério Público, entrei na lista três vezes. Depois, fui eleito também Presidente do Conselho dos Procuradores Gerais por votação direta, mas, sinceramente, acho que isso politiza demais a classe e cria facções indesejáveis dentro de instituições e poderes que tenham funcionamento próprio. Então, não é matéria para discussão aqui, mas eu diria que não é a maneira como se escolhe. Veja, por exemplo, que V. Exª foi eleito dentro da sistemática atual e foi um brilhante conselheiro. Não temos reclamações contra os conselheiros; temos reclamações contra tentativas de cerceamento das atividades do Conselho Nacional de Justiça. Esse é o motivo pelo qual entramos nisso.
E uma última observação é que também esses dois magistrados do Supremo que aqui vieram defenderam, inclusive, que o Conselho Nacional de Justiça.poderia exonerar, demitir, impor a perda de cargo através do Conselho Nacional de Justiça. Tanto é que aprovamos uma proposta de emenda à Constituição, cuja primeira signatária é a Senadora Ideli Salvatti, hoje Ministra, que se encontra guardada em um gavetão da Câmara dos Deputados, como sempre. Mas já aprovamos isso aqui. Não coloquei isso aqui sob pena de ser bis in idem. Mas, se quiserem colocar...
Exatamente, aprovar mais uma vez pode reforçar a tese.
Então, com essas brevíssimas considerações, Sr. Presidente, agradeço a V. Exª pela tolerância, e deixo de fazer essas indagações, porque já fiz alguns comentários acerca do que V. Exª disse. E, em razão da discordância em alguns pontos apenas, peço que a Ministra Eliana Calmon possa se manifestar acerca disso.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Antes de passar a palavra ao Relator, Senador Randolfe Rodrigues, e, em seguida, ao Senador Ricardo Ferraço, eu quero registrar com prazer também aqui a presença do Dr. Jerônimo Siqueira, da Anamatra do meu querido Estado do Ceará.
Eu quero pedir desculpas à Ministra Eliana e ao Dr. Paulo porque eu tenho que me retirar para fazer uma representação desta Comissão em outro ambiente, mas convido o Senador Demóstenes Torres, como ex-Presidente desta Comissão e como autor da PEC, da proposta de emenda à Constituição, a presidir os trabalhos em substituição aos nossos trabalhos.
Em seguida, o Senador Demóstenes, ao tomar assento, concederá obviamente a palavra, se assim o desejar, diretamente à Ministra Eliana ou, então, ouviremos mais o Relator e dois Senadores, os nossos convidados e, em seguida, poderemos ouvir os outros dois Senadores, para, se não houver mais ordem de inscrição, darmos a palavra final.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) – Presidente, permite-me?
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Pois não.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) – Os nossos questionamentos, aliás, o autor do requerimento e o autor da proposta de emenda à Constituição esgotou o Relator, inclusive, em boa parte dos questionamentos, e o fez com muito brilho.
Parte dos meus questionamentos, em especial à Ministra Eliana e ao Dr. Paulo Schmidt, vai no mesmo sentido. Se V. Exª assim permitir, antes de passar para a resposta da Ministra Eliana e do Dr. Paulo Schmidt...
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – Ouviremos os Senadores. O.k.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) –...eu gostaria de completar os questionamentos do Senador Demóstenes, que eu acredito serão na mesma linha de raciocínio iniciada pelo Senador Demóstenes.
O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. Bloco/PMDB – CE) – O Presidente, a partir de agora, vai ser o Senador Demóstenes, mas eu quero deixar aqui proposto que escutemos V. Exª, Senador Ricardo Ferraço; depois, se for o caso, ouviremos os nossos interpelados. Depois, estão inscritos o Senador Pedro Taques, o Senador Suplicy – não sei se o Senador Simon quer inscrever-se também? –, também o Senador Simon.
Senador Demóstenes, por gentileza, tome assento à Mesa para assumir os nossos trabalhos.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Obrigado.
V. Exªs viram o quanto eu fiquei feliz de sentar de novo nesta cadeira! (Risos.)
Eu quero, então, conceder a palavra...
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) – Isso é um risco para o Presidente Eunício!
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Foi eleito!
Com a palavra, então, V. Exª, Senador Randolfe Rodrigues.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) – Senador Demóstenes, como eu havia dito, V. Exª explicitou a proposta de emenda à Constituição em que V. Exª é o primeiro signatário, e eu acho que é importante, para termos um esclarecimento dessa emenda à Constituição, este debate.
Eu fico satisfeito, mais uma vez, fico extremamente satisfeito com a preliminar apresentada pela Ministra Eliana Calmon. Digo, mais uma vez, que a senhora, Ministra Eliana, encheu todos os brasileiros, enche todos os brasileiros de orgulho com as posições que sustenta. E V. Exª abriu aqui a preliminar desta audiência pública, dizendo que, a contrario sensu do que alguns pensam, de fato a questão do Conselho Nacional de Justiça não se encerrou e não se encerra com o julgamento do Supremo Tribunal Federal. Portanto, há a necessidade dessa proposta de emenda à Constituição tão bem idealizada pelo Senador Demóstenes, que, em primeiro lugar, explicita as atribuições do Conselho Nacional de Justiça.
Mas o fundamental – e eu acho que é disto que se trata – o que está claro na exposição agora feita pelo Senador Demóstenes é que se ampliam essas prerrogativas para atuação do CNJ.
Então, sem mais, e só completando a linha de raciocínio iniciada pelo Senador Demóstenes, eu queria perguntar o seguinte: primeiramente, quais informações V. Exª tem sobre o montante de procedimentos disciplinares em andamento no Conselho Nacional de Justiça? Eu não percebi V. Exª tratar desse tema na sua exposição inicial. Parece-me que não tratou. Considero uma informação importante.
Na sua opinião, quais seriam as principais medidas, necessárias de serem tomadas, para que tenhamos claramente maior transparência no Poder Judiciário?
Aqui se debateu... Senador Lobão, fiquei muito feliz por V. Exª trazer uma proposta, uma sugestão que, se me permite, teria de ser encaminhada como emenda a ser incorporada a esse relatório. E também o Senador Demóstenes... Ainda ontem telefonei para o Senador Demóstenes e o consultei, trocamos ideias sobre o que mais colocar nessa proposta de emenda à Constituição – a questão da demissão de juízes. E o Senador Demóstenes nos esclareceu, nos lembrou da proposta de emenda à Constituição que já havia sido aprovada aqui no Senado de autoria, inicialmente, da então Senadora Ideli Salvatti. Então, acharia importante nós criarmos um entendimento nesta CCJ sobre esse tema.
É nesse sentido a terceira pergunta: V. Exª entende que as punições, hoje previstas na legislação, a serem aplicadas aos membros do Poder Judiciário que eventualmente comentam infrações disciplinares são suficientes para coibir a prática de tais atos?
Qual seria a posição de V. Exª sobre a possibilidade da aplicação das penas, por parte da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, de demissão, cassação e aposentadoria?
Nesse sentido ainda, quais os principais problemas que V. Exª enumera enfrentados hoje pelas Corregedorias dos tribunais de justiça, que acabam não esgotando as apurações, levando aos procedimentos disciplinares no Conselho Nacional de Justiça?
Tenho uma pergunta que queria ver dialogada entre a Ministra Eliana Calmon e o Dr. Paulo Schmidt, que é sobre a composição do Conselho Nacional de Justiça. Há posições na doutrina que argumentam que o Conselho Nacional de Justiça deveria, já na sua origem, ter a sua composição mais ampla do que é hoje. Deveriam ali ter assento a Defensoria Pública e a Advocacia da União. Pergunto a V. Exª sua opinião nesse sentido da ampliação do CNJ e como avaliaria a possibilidade de maior participação da sociedade, ampliando a representação do Senado da República e da Câmara dos Deputados, de indicação de cidadãos ao CNJ.
E, por último, Dr. Paulo Schmidt, dirijo-me a V. Exª. Desde o início dos questionamentos sobre as competências do CNJ, a Anamatra tem se posicionado favoravelmente à manutenção dos poderes conferidos pela Constituição – e me permita saudar essa posição da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho –, ou seja, essa posição favorável às competências do CNJ me parece que rompe com a concepção de que isso seria um debate contra a corporação dos magistrados. Não é! Claramente existem muitos magistrados e associações de magistrados, como a Anamatra, que reconhecem a necessidade de uma instância de funcionamento com o papel claro que tem o Conselho Nacional de Justiça.
Por fim, só para concordar com V. Exª, Ministra Eliana Calmon, devo dizer que esse tema deixou de ser somente um tema, digamos, de militantes do direito, de juristas; esse tema passou a ser da sociedade brasileira. O recente debate, as mobilizações da Ordem dos Advogados do Brasil, a expectativa nacional que foi criada no julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre as expectativas do CNJ deixaram claro que o CNJ é hoje uma instituição que pertence à sociedade brasileira.
Por isso, no meu entender, é feliz a iniciativa dessa proposta de emenda constitucional e central o papel do Parlamento em deixar claro e incontroverso as atribuições e a função de controle que tem que cumprir o Conselho Nacional de Justiça.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Vou adotar a seguinte sistemática, uma vez que vai começar a Ordem do Dia. Vou passar a palavra a todos os Srs. Senadores inscritos. Depois, o Dr. Paulo Schmidt e, em seguida, a Ministra Eliana Calmon dão a respostas e encerramos. Podemos fazer dessa forma? (Pausa.)
Com a palavra o Senador Ricardo Ferraço.
 
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB – ES) – V. Exª manda.
 
Eu já tinha tido a oportunidade de me manifestar absolutamente favorável à proposta de emenda constitucional em bom tempo, tempestivamente apresentada a esta Comissão pelo eminente Senador Demóstenes Torres. No parecer do Senador Randolfe, ele incorpora alguns outros avanços importantes, e, com a manifestação aqui do Senador Lobão, estamos tendo a alegria de incorporar, até a possibilidade de votação, essa emenda de quebra de sigilo bancário e telefônico, que me parece ter uma acolhida por parte do Senador Randolfe, Senador relator, com o qual concordamos plenamente, o que fortalece ainda mais o papel do Conselho Nacional de Justiça.
Se já tinha uma convicção favorável, agora, com a manifestação da Ministra Eliana e do Dr. Paulo Schmidt, essa convicção se torna um pouco mais clara.
Ministro, um pouco na linha do que indagou o Senador Randolfe Rodrigues, faço a seguinte indagação a V. Exª. Pergunto com relação aos limites, com relação aos obstáculos ainda enfrentados pelo CNJ para levar adiante investigações sobre juízes que não honram a toga, envolvidos ou suspeitos de envolvimento em irregularidades inerentes ao cargo que exercem.
 
Cito aqui matéria recente, do fim de semana, do jornal O Estado de S.Paulo com o título “CNJ engavetou solução para superpagamentos”. A matéria trata de uma minuta de resolução que estaria engavetada há quase dois anos e que poderia evitar descontrole da concessão de crédito atrasados, milionários a magistrados das cortes estaduais. É o que relata a matéria de O Estado de S.Paulo.
A reportagem destaca ainda o fato de o Conselho de Justiça Federal e do Conselho Superior de Justiça do Trabalho já terem padronizado os critérios para o reconhecimento de atrasado, a apuração e a correção dos valores devidos, resolvendo a questão dos pagamentos privilegiados dos tribunais federais e da Justiça Trabalhista.
 
A resolução engavetada no CNJ, segundo a Folha de S. Paulo, teria evitado os pagamentos antecipados para um pequeno grupo de desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo, pagamentos milionários que escandalizaram o País inteiro. O jornal ainda afirma que tal resolução poderia ajudar a impedir a concessão de benefícios eticamente duvidosos a desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e juízes do Estado. Vencimentos mensais de R$40 mil, de R$150 mil, um abuso e um privilégio inaceitável. Segundo o mesmo jornal, um dos desembargadores chegou a receber mais de R$500 mil por mês em dezembro de 2010.
Seria interessante ouvir uma explicação, uma manifestação da nossa ilustre Corregedora e admirada Corregedora, Ministra Eliana Calmon, sobre os motivos que teriam levado ao suposto engavetamento da resolução do CNJ e sobre as perspectivas de que o assunto seria levado à votação, segundo relata o jornal Folha de S. Paulo.
A segunda indagação que faço – e faço-a não apenas à Ministra Eliana Calmon, mas ao Dr. Paulo Schmidt – é: apertar a fiscalização, se não for acompanhada de uma punição adequada, parece-nos que não estamos ao fim e ao cabo tentando uma solução por definitivo. Cito um caso recente em que a Ministra Eliana teve um papel relevante, segundo relato da imprensa, com relação ao Desembargador Roberto Wilder, ex-corregedor do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Ele foi condenado por ter nomeado dois advogados sem concurso público para comandar cartórios do Rio de Janeiro. Esses advogados trabalhavam no escritório de um lobista acusado de vender sentenças judiciais para que candidatos a eleições municipais pudessem escapar de uma eventual cassação. A ligação entre o lobista e o desembargador, então Presidente do Tribunal Regional Eleitoral foi apurada e comprovada, segundo o jornal, por uma comissão parlamentar de inquérito na Assembleia Legislativa. Mesmo assim, o Conselho Nacional de Justiça teve que se ater à penalidade máxima, ou seja, o desembargador foi condenado à “aposentadoria compulsória”.
 
O argumento de que a Constituição garante a vitaliciedade não se sustenta, a meu juízo, até porque a própria Constituição já abre brechas para a perda do cargo em caso de sentença judicial condenatória transitada em julgado. Só que essa é uma hipótese absolutamente remota, ainda mais diante de tantas instâncias recursais que acabam empurrando por décadas o anuncio de uma sentença definitiva.
 
A vitaliciedade foi pensada pelos Constituintes para assegurar a independência dos juízes, e não para ser um salvo-conduto ou monumento à impunidade para a prática de irregularidades que desonram o Poder Judiciário. A pergunta que faço é a seguinte: o que lhes parece uma proposta de emenda constitucional que possa prever a perda do cargo do magistrado vitalício não apenas por força de sentença transitada em julgado, mas também por decisão de dois terços dos membros do Conselho Nacional de Justiça ou do tribunal ao qual o magistrado está vinculado. A proposta também poderia retirar do Texto Constitucional a previsão de aposentadoria compulsória e da disponibilidade remunerada como sanções disciplinares e atribuir ao Conselho Nacional de Justiça a iniciativa da lei complementar do Estatuto da Magistratura, competência que cabe hoje ao Supremo Tribunal Federal.
 
Feitas essas considerações, eu gostaria de ouvir dos nossos convidados suas impressões a respeito das considerações que fiz. Agradeço ao Presidente, Senador Demóstenes Torres, e aos nossos ilustríssimos convidados.
 
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Agradeço a V. Exª.
Com a palavra o Senador Pedro Taques.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Sr. Presidente, Srs. Convidados, Srªs e Srs. Senadores, quero inicialmente cumprimentar a Ministra Eliana Calmon pela batalha republicana. V. Exª tem demonstrado o espírito da chamada honestidade cívica do republicanismo, não interessando quem esteja do outro lado. Parabéns pela atuação de V. Exª.
A respeito da PEC, seria interessante que pudéssemos – e aqui já foram agitados alguns temas sobre isso – discutir o dogma do foro por prerrogativa de função. Se é foro por prerrogativa ou se é privilégio, para o cidadão comum é uma impunidade, porque o Supremo Tribunal Federal e os tribunais têm demonstrado que não julgam a tempo autoridades dotadas de foro por prerrogativa de função.
Se, desde a Constituição de 1988 até hoje, analisarmos as decisões do Supremo, salvo engano, ele condenou duas autoridades com foro por prerrogativa de função. O restante foram todos prescritos. Se formos ao Superior Tribunal de Justiça, veremos ali condenações baixíssimas, em número de condenações, de autoridades com foro por prerrogativa de função.
Se analisarmos constituições de outros países, chegaremos à conclusão de que o foro por prerrogativa de função. é, mais ou menos, uma jabuticaba, ou seja, só existe no Brasil, com essa construção do art. 53, § 2º, no tocante aos Senadores e Deputados Federais. Com essa construção, só existe no Brasil. Imagine, o cidadão é julgado pelo Supremo Tribunal Federal pela prática de qualquer crime, sem fazer qualquer pertinência temática com o exercício da sua função, sem qualquer relação com a sua função de senador da República, deputado federal, deputado estadual.
E veja, Srª Ministra, Sr. Desembargador – ou Sr. Juiz? Juiz. Veja que, no Brasil, temos que dar vários nomes para à mesma função, e, nos Estados Unidos, todos são juízes. Veja que a nossa Constituição permite que até vereadores – nada contra vereadores – que exercem trabalhos nobres no Brasil – e temos que ressaltar isso – a Constituição permite que as constituições estaduais ofertem foro por prerrogativa de função também para vereadores. E duas constituições estaduais, a do Piauí e a do Rio de Janeiro, ofertem foro por prerrogativa de função para vereadores.
Estamos transformando o que deveria ser exceção em regra. Portanto, essa é a possibilidade de alargamos o foro por prerrogativa de função, agora para membros dos dois conselhos, com todo o respeito, isso está na PEC, mas vamos debater aqui na Comissão de Constituição e Justiça, para, me parece, transformarmos aqui o que é exceção em regra. Aí, vamos ofertar foro por prerrogativa de função também para os membros dos conselhos, quando deveríamos ir em sentido contrário, para acabar com o famigerado foro por prerrogativa de função, que é instrumento de impunidade no Brasil. Este é um ponto.
O Dr. Paulo Schmidt trouxe uma ideia, que a respeito, mas, com todo respeito ao Senhor, não concordo com ela, de que possamos ainda mais alargar para aqueles ex-conselheiros o que já foi objeto de decisão do Supremo Tribunal Federal, conforme bem disse o Senador Demóstenes, no cancelamento da Súmula nº 394, por um voto cujo relator foi o Ministro Sidney Sanches, em outubro de 2001.
Portanto, isso já está pacífico no Supremo. Não podemos mais trazer outra discussão para essa Proposta de Emenda à Constituição. Primeiro, acabarmos com o foro por prerrogativa de função, quem sabe deixarmos só para crimes praticados em razão do exercício da função. Esse é um primeiro ponto.
O segundo ponto é: vamos levar, para o Supremo Tribunal Federal, outras ações. O Supremo Tribunal Federal é uma Corte Constitucional, assim ele foi pensado na Constituição de 1988. Mas sabemos que, por questões corporativas, em 1988, com medo de perder poder – isso é fato – o Supremo se manteve com competências que não são competências de uma Corte Constitucional.
O Supremo julga briga de vizinho para decidir quem vai ficar com o papagaio. E, se alargarmos ainda a competência do Supremo aqui para debater outros temas, estamos, mais uma vez, enfraquecendo essa posição de Supremo Tribunal Federal como uma Corte Constitucional.
Esta PEC, capitaneada pelo Senador Demóstenes Torres, a quem cumprimento, traz mais um dado que mereceria a nossa reflexão a respeito do chamado sigilo bancário, sigilo fiscal, o que foi aqui trazido pelos Senadores Lobão Filho e Ricardo Ferraço: sigilo bancário e sigilo fiscal.
Servidor público, como é o caso dos juízes da espécie e agente político, servidor público como senador da República, falar em sigilo bancário e sigilo fiscal é, me parece, respeitando posições contrárias, um absurdo. Se somos servidores públicos, temos que prestar contas das nossas atividades. Quanto ganhamos? Eu exerço outra atividade? Muito bem, então entra o dinheiro dessa outra atividade na minha conta. Eu recebi como, e só fui servidor público federal e estadual, recebi, durante minha vida toda, “x”. Não posso ter um patrimônio maior que “x”. Isso é da essência do servidor público.
Então, essa possibilidade do conselho afastar o sigilo bancário e o sigilo fiscal, que não é isso que está aqui na PEC, mas, foi sugerido, foi aqui ao menos trazido como instrumento de debate pelo Senador Lobão Filho. E me associo a este debate, precisamos fazer este debate. Dizer que sigilo bancário e sigilo fiscal estariam protegidos pela intimidade, conforme o art. 5º, inciso XI, ou pelos dados, conforme art. 5º, inciso XII, é mais uma jabuticaba que existe no Brasil, notadamente de servidores públicos.
O Conselho Nacional de Justiça deve exercer atribuições fortes – isso eu defendo –, porque não há maior injustiça do que você ser julgado por um juiz que é corrupto, não há maior injustiça do que isso, e a esmagadora maioria dos juízes brasileiros são pessoas sérias, descentes, honestas, que trabalham e acordam cedo, ganham um salário, o teto, ganham este teto. Se nós compararmos com o salário mínimo, é muito; agora, se compararmos com a iniciativa privada, é pouco. Nós vamos discutir aqui assuntos corporativos, salário, nós vamos discutir aqui a função do magistrado.
 
Muito bem. Também gostaria de trazer um outro tema para este debate, o outro tema é: a demora do Supremo Tribunal Federal em apresentar o projeto para Lei Orgânica da Magistratura Nacional. O Supremo Tribunal Federal é useiro e vezeiro em dizer que o Congresso Nacional é omisso em regulamentar a Constituição.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Permita-me, Senador Pedro Taques?
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Por gentileza.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Logo no início da gestão do atual Ministro Cezar Peluso, havia um debate aqui acerca das férias, Senador Pedro Simon se lembra bem, e o Ministro Peluso disse o seguinte – isso foi no início do primeiro ano: “No mês de setembro, outubro, estarei remetendo a Lei Orgânica da Magistratura, a nova lei”. Está encerrando o mandato, e não veio. Então, ele pedia para que nós não aprovássemos por PEC o fim das duas férias, que ele mandaria em seguida. Nós atendemos, e até hoje a PEC não veio.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Sim.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Então, V. Exª tem inteira razão.
 
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Há 23 anos, a sociedade brasileira espera o Supremo Tribunal Federal apresentar esse projeto, e nunca chega esse projeto, e nós, todas as quartas-feiras, ouvimos o Supremo Tribunal Federal dizer que somos omissos, somos omissos. E temos sido, não vamos fugir à nossa responsabilidade.
Segundo o grande constitucionalista Pinto Ferreira, a Constituição de 1988 precisaria de 133 leis ordinárias e 33 leis complementares para que ela tivesse efetividade. Nós não fizemos essas leis ainda, então nós somos omissos. Agora, o fato de sermos omissos não me retira a prerrogativa de criticar aquele que é omisso também. O Supremo é omisso, não remeteu para cá.
Aí temos dois pontos que poderiam ser debatidos nesta PEC: a extinção daquela previsão da Lei Complementar nº 35, de 79, que é a Loman; da possibilidade de aposentadoria de magistrados que cometem ilícitos como um prêmio. No Estado de Mato Grosso existem exemplos fantásticos disso, fantásticos. O cidadão comete o ilícito, é aposentado – isso é prêmio.
 
Então, nós poderíamos, sim, porque o Supremo é omisso nesse sentido, tratar dessa PEC. E eu gostaria também de concordar com o Dr. Paulo que a participação do chefe do Executivo Federal na escolha dos juízos dos Tribunais Regionais do Trabalho e dos juízes dos Tribunais Regionais Federais também se afigura como algo debatido na Constituinte de 88 não muito republicano. Concordo inteiramente que essa modificação poderia ser feita por nós aqui.
No mais, cumprimentando a Ministra Eliana Calmon, eu gostaria de ouvi-los a respeito desta possibilidade do afastamento do sigilo bancário e fiscal, da questão do foro por prerrogativa de função, e, com isso, nós vamos assoberbar mais ainda o Supremo Tribunal Federal.
Por fim, eu recebi uma contribuição para o debate do Desembargador Márcio Vidal, que é Corregedor-Geral da Justiça do Estado de Mato Grosso. Eu gostaria de trazer a contribuição dele no sentido de que, se fosse a opinião de V. Exª e do Dr. Paulo, criássemos no Conselho Nacional de Justiça a competência originária para julgamento de desembargadores. Só o Conselho Nacional de Justiça poderia julgar desembargadores. Aqui a competência não seria concorrente, seria originária.
Pela proposta de emenda à Constituição aqui, capitaneada pelo Senador Demóstenes, no instante em que houver a coincidência das fiscalizações dos procedimentos, o Conselho Nacional de Justiça determina a suspensão daquela do Estado até que o Conselho Nacional de Justiça assim determinasse.
 
São essas as contribuições... (Pausa.)
Está previsto, não é? (Pausa.)
Sim. (Pausa.)
Paralisa lá.
 
São essas as contribuições, Senador Demóstenes, mais uma vez parabenizando V. Exª pela proposta de emenda à Constituição.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Agradeço a V. Exª, Senador Pedro Taques.
Com a palavra o Senador Suplicy.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Sr. Presidente, Senador Demóstenes Torres, quero também cumprimentá-lo pela iniciativa de ter apresentado esta emenda que aperfeiçoa as funções e os deveres do Conselho Nacional de Justiça. Cumprimento o Desembargador Dr. Paulo Schmidt e a Ministra Eliana Calmon, o Vice-Presidente da Anamatra e a nossa Corregedora.
 
A Constituição brasileira, no art. 103-B, §4º, ao definir as competências do Conselho Nacional de Justiça, menciona:

Art. 103-B.
§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhes, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: [...]

Eu gostaria de aproveitar essa oportunidade para indagar a V. Exª a respeito de um caso concreto que aconteceu em janeiro último. Vou, aqui, fazer um breve relato.
 
No dia 18 de janeiro, acompanhado dos Deputados Ivan Valente, Adriano Diogo, Carlos Gianazzi, fiz uma visita ao Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivan Sartori, ponderando que estava prestes a acontecer um entendimento entre os governos federal, estadual e municipal sobre a destinação da área do Pinheirinho.
 
O Presidente Ivan Sartori me disse: “Olha, eu não posso aqui tomar uma decisão de sustar a reintegração de posse sem que haja um documento formal das partes”. Mas ele recomendou que...E me deu o telefone e o nome do sindico da massa falida, o Sr. Jorge Uwada. Eu, de pronto, liguei para ele que me falou: “sim, eu posso encontrá-lo, mas gostaria de encontrá-lo perante o juiz da 18ª Vara que cuida das falências”. E, aí, fomos diretamente ao fórum, no 9º andar, dialogar com o juiz Luiz Beethoven Giffoni Ferreira e, ali, diante das observações que nós fizemos, esse perguntou ao síndico da massa falida: “O senhor concordaria que fosse dado um prazo, digamos, não de trinta ou sessenta dias, proposto pelos Deputados, mas quinze dias apenas para que se chegue a um entendimento?”
O síndico respondeu: “Sim, eu concordo”.
“Então, o senhor queira fazer o favor de escrever uma petição, um requerimento dizendo exatamente isso”.
 
Ele o fez. O juiz Beethoven Ferreira despachou no mesmo papel e, ao mesmo tempo, ligou para a juíza Márcia Loureiro, de São José dos Campos, que tinha determinado a reintegração e recomendou a ela que respeitasse. E, eu, por indicação do juiz Beethoven Ferreira, levei o documento ao juiz Sartori e entreguei nas mãos do seu principal assessor jurídico, o juiz Rodrigo Capez.
Eis que, por razões que não conheço totalmente, quando chegou o sábado, depois de eu ter dialogado com o Governador Geraldo Alckmin que disse que, se houvesse um entendimento entre as duas partes, o governo estadual faria as obras de investimento em infraestrutura na área do Pinheirinho, e eu ter dialogado e recebido, por hora e meia, o Prefeito de São José dos Campos, Sr. Eduardo Cury, na sexta-feira, dia 20, disse a ele dos entendimentos que estariam sendo possíveis. Mas eis que, no sábado – e ainda não consegui falar com o Juiz Beethoven –, ele revogou aquela decisão, mas só a publicou no dia 26.
Às seis e pouco da manhã, dois mil policiais, com helicópteros, tropa de choque, peruas da ROTA, adentraram na área do Pinheirinho e causaram um estrago simplesmente fantástico do ponto de vista da dignidade daquela população, cerca de mil e seiscentas famílias, mais de sete mil pessoas, algumas das quais foram feridas, alguns com balas verdadeiras, outras com balas de borracha, num espaço muito pequeno de tempo. Foi feita a reintegração e, em seguida, foi ordenada, com o uso de tratores, com pouco tempo para as famílias retirarem seus pertences, a destruídas das casas. As emissoras de televisão mostraram a destruição dos móveis, das geladeiras, das tevês, de pertences de estimação, de fotografias e gravuras que as pessoas tinham em suas casas, bem como a morte a tiros de animais de estimação das crianças diante delas, além de outras situações também muito graves que ocorreram no Campo dos Alemães, onde três viaturas da ROTA, por exemplo, adentraram, às onze e meia da noite daquele mesmo dia 22, numa residência, como que para tentar criminalizar todo aquele movimento, tentando encontrar drogas, e ali, naquela residência, onde estavam sete pessoas, elas todas, os seus habitantes, foram molestados, abusados sexualmente de uma forma que não vou aqui descrever, ou seja, de uma forma inteiramente inadequada.
Ora, o que me vem à reflexão? Que o direito à propriedade da massa falida de 1,3 milhão de metros quadrados foi considerado como algo muito prioritário, que teria que ser feito, com tudo destruído em questão de quarenta e oito horas, e o direito à propriedade daquelas famílias carentes aos seus pertences, móveis, simples que fossem, colchões, camas, televisores etc. e a maneira como foram expulsos.... Será que esse é um procedimento adequado? A pergunta que faço é: seria o caso de os Senadores, como eu próprio e outros, que aqui ouvimos os depoimentos dos moradores do Pinheirinho, bem como as imagens e os depoimentos gravados em vídeo...

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – É porque estou pensando em fazer isso. Seria o caso de encaminhar... E após, porque ainda quero dar a oportunidade de as autoridades convidadas a comparecer, na última semana, a uma reunião presidida pelo Senador Pedro Simon – os Secretários do Governo Estadual, os quatro juízes que mencionei, os magistrados que participaram dessa decisão... Não seria o caso de, tendo eles aqui a oportunidade de, mais uma vez, virem, porque serão convidados à Comissão de Direitos Humanos – e depois dessa reflexão, ouvidas as suas palavras, espero que eles compareçam –, isso ser objeto de uma apreciação do Conselho Nacional de Justiça, ou seja, o comportamento desses juízes?
E fiquei pensando, Srª Ministra Eliana Calmon...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Vou concluir, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – É só porque o Presidente Sarney avisa que terá início a Ordem do Dia; do contrário, não conseguiremos ouvir a Ministra.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Estou terminando.
Penso se não seria o caso de apresentarmos, então, um projeto de lei para que fique impedida, explicitamente, qualquer ação de reintegração de posse de área onde haja coletividade de famílias residentes, sem que, antes, esteja prevista uma solução habitacional adequada para aquelas famílias.
Mas eu agradeço muito se puderem transmitir-nos a sua avaliação.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Vai criar o mutirão da invasão no Brasil. Vai criar o mutirão da invasão no Brasil!
Vamos deixar isso para outra oportunidade.
Agradeço a V. Exª, Eduardo Suplicy...
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Mas eu fiz a pergunta para que os nossos convidados possam responder, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Sem dúvida. Fez muito bem!
Senador Pedro Simon, com a palavra V. Exª.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Sr. Presidente, eu sou inteiramente favorável ao projeto de V. Exª.
 
Apesar da decisão do Supremo – aliás, quero felicitar a senhora e o senhor pela honra de tê-los conosco –, eu acho que, e se não me equivoquei, foi o que a ilustre Ministra disse: ela também é favorável à aprovação do projeto, porque ele traz uma decisão definitiva sobre algo que não importa. Em nossa opinião, não deveria haver aquela decisão, que levantasse as dúvidas que foram levantadas. Mas ficou: se houve aquela, amanhã pode haver outra. Por isso, eu acho que ao projeto de V. Exª eu sou inteiramente favorável.
Em segundo lugar, eu quero dizer, com todo o respeito ao Dr. Paulo e a todos os vices e magistrados do Brasil, que eu sou daqueles que veem com muito respeito a situação do Conselho Nacional de Justiça.
Eu não sei, mas eu era um dos Senadores que estavam aqui quando nós fizemos uma longa discussão sobre essa matéria. Era Presidente o Ministro Jobim, que tinha, digamos assim, uma tarimba muito grande, porque ele tinha sido Senador, Relator na Constituinte, Ministro da Justiça e Presidente do Supremo; então, passou, praticamente, por todos os cargos de todos os Poderes da vida pública.
Quando ele veio discutir essa matéria aqui, vários parlamentares – eu, inclusive – achávamos que o Conselho Nacional de Justiça devia ser mais aberto, que ele não devia ser um órgão tão fechado, mas devia comportar representações da sociedade. E eu diria até que esse era o pensamento dominante.
O Ministro Jobim, com muita competência, explicou-nos que nem sempre o que a gente acha que é perfeito é possível, e nós tínhamos que conseguir o viável, o possível. E o que ele estava trazendo era, na opinião dele, o máximo que nós poderíamos colher por parte da magistratura. Ele achava que era importante e que era suficiente. E ele disse uma coisa de que eu nunca me esqueço: “Há de se entender o seguinte: a magistratura, na sua imensa maioria, é de gente de bem, de gente absolutamente responsável, absolutamente competente.” E eu não tenho nenhuma dúvida de que, seja quem for, seja de que maneira ele vá para o Conselho Nacional de Justiça, quando estiver lá, ele irá se compenetrar da responsabilidade dele. Ele irá se compenetrar, porque uma coisa é o espírito de classe, quando a gente está em um determinado tribunal, e outra coisa é a gente estar em um Conselho, que tem a responsabilidade de apurar.
Eu me lembro quando... Sou muito amigo do Ministro Jobim: fui eu que o tirei da vice-presidência da OAB para colocá-lo na política; então, nós temos uma amizade que vem de muito longe. E ele me contava quando Presidente do Supremo: “Tu acreditas que nós não temos decisão nenhuma, nós não mandamos nada? O Presidente do Tribunal do Acre faz o que quer; o fulano, o beltrano e o sicrano... Nós não temos nenhuma orientação. Nenhuma orientação!” Outro dia, em um determinado tribunal, ele disse para os caras: “Olha, não façam esse aumento. Vocês não podem fazê-lo!” E eles fizeram. Não sei qual era a decisão: “E eles fizeram! E sabe o que eu tive de fazer? Eu telefonei para ele dizendo que não vou mandar mais a verba.” E o cara disse: “Não, não vou fazer isso.”; “Faça o que tu quiseres! Vamos ver o que vai acontecer comigo, mas vocês não vão receber a verba!” Porque não tinha o que fazer. Quer dizer, não havia uma coordenação, não havia nada que determinasse, uma orientação, um sentimento nacional em torno dessa matéria.
Talvez seja essa uma das razões que o Presidente do Supremo, Nelson Jobim, mais insistiu conosco nesta matéria; era necessário ter um entrosamento de união, de entendimento, que fosse realmente respeitado.
Disse ele mais, que se nós quiséssemos fazer, criar um conselho com essa heterogeneidade, ele acha que não passava. E disse mais – uma coisa que é até chato eu dizer, mas eu vou dizer, eu vou dizer. Ele disse o seguinte: “Se nós fizéssemos que nem a gente queria, não ia passar, porque a Magistratura ia mandar contra”. E aí disse ele uma coisa que eu também não deveria dizer, mas eu vou dizer: “E tem muito Parlamentar que tem coisas aí que não vai votar”. Chegava e dizia: “É o fulano, é o beltrano, não sei o quê, e, na hora, com essa mania que vocês pensam, não vai acontecer, porque muita gente vai recuar”.
Vou ser sincero, esse foi o argumento definitivo, que fez com que nós votássemos da maneira que votamos. E falo com toda sinceridade: achei tão bom conselho... Tão bom conselho! Acho que foi muito bom o primeiro Corregedor, gaúcho, claro, belo Corregedor, uma diferença... Todo mundo tem um defeito
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – Agora vem um nordestino.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Todo mundo tem defeito, um dos mais graves é a inveja. (Risos.)
O Dipp teve seriedade, teve capacidade, iniciou, coordenou, deu um sentido para fazer a coisa, era diferente da senhora. Ele é meu patrício gaúcho, descendente de libanês, ele fala pouco, era mais fechado, fazia as coisas, às vezes a gente ia ficar sabendo depois, porque nem divulgava para a imprensa, não sei o quê... E a coisa foi indo. Depois veio a senhora. A senhora, mais extrovertida, dizia as coisas e saía no jornal.
 
Então, aquilo que, de certa forma, com o Dipp havia sido feito, mais calado, silencioso...
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Bloco/DEM – GO) – Mais Pedro Simon. É mais Pedro Simon, mais extrovertida. (Risos.)
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Ela melhor do que eu, porque eu não me dou bem. Ela se dá bem, e eu sempre saio perdendo, e ela ganhou bem.
 
Mas, talvez, o motivo é que a senhora foi o finalmente, ele estava no início, começando a coisa. Ninguém imaginava até onde ia. Por isso, talvez, tenha havido o choque. Eu até creio, com toda sinceridade, que se o Dipp estivesse no seu lugar, o senhor agiria do mesmo jeito quando chegasse esse determinado momento, em que a coisa chegasse onde chegou.
Eu acho que o Supremo Tribunal Federal teve uma dessas decisões mais importantes: votar essa matéria. Teve coragem, foi uma sessão bonita, inclusive os que votaram da outra maneira votaram com grandeza, com respeito recíproco – fica o orgulho da minha gaúcha, que foi, embora alguns, inclusive Senadores, achavam que por ela ser do trabalho não havia grandeza, não sei o quê, e fizeram, coitadinha, fizeram um troço duro aqui na sabatina, os dois fizeram duro. Foi duro, mas acho que foi o momento, talvez, dos mais bonitos do Supremo Tribunal Federal. Sinceramente, quem ganhou ganhou bem e quem perdeu perdeu com grandeza, isso é que é importante.
 
Acho que ali foi um dia histórico para nós. O outro foi o Ficha Limpa, em que também o Supremo decidiu, com uma maioria tranquila, e acho que a senhora... Eu tenho o maior carinho, o maior respeito pela senhora. Achei muito bacana, a senhora inclusive, quando ganhou, não falou mais nada, quer dizer era a hora em que poderia ter dito isso, ter dito aquilo, fez um silêncio magnífico. A sua atuação foi, realmente, altamente positiva, e olha que a imprensa a provocou, cobrou-a, querendo entrevista, querendo isso, querendo aquilo. A senhora saiu com muita dignidade.
Eu acho hoje e volto aqui... A palavra está com a Presidente da República, porque nós vivemos um momento muito importante. Claro que nós temos um projeto igual a esse, no mesmo sentido, do Senador Pedro Taques. E acho que ele deve ser votado. Sou totalmente favorável. Só não sei quanto tempo vai levar, porque lá na Câmara, cá entre nós... Não sei quanto tempo vai levar. Por isso que acho que essa decisão, que não nasceu... Quem começou foi o Ministro da Corregedoria Geral. Ele iniciou o estudo, junto com o Ministro da Justiça e a Ministra-Chefe da Casa Civil, de criar o Ficha Limpa lá no Executivo, no sentido de que o Governo baixe o decreto. Quer dizer, só será nomeado o cidadão que tenha ficha limpa e capacidade comprovada para o cargo que vai exercer.
Aí diz a Chefe da Casa Civil: “A Presidente já está fazendo isso”. Eu acredito até que sim, mas uma coisa ela é hoje e, amanhã, pode mudar; e outra coisa é ela ter... Até para garanti-la contra... Outro dia, o Ministro da Agricultura indicou um rapaz excepcional, de primeiríssima grandeza, e não foi aceito porque o Líder do PMDB lá na Câmara quer indicar um cidadão não sei o quê, cuja ficha não conheço, e trocou a indicação desse cidadão para o PTB votar nele para Presidente da Câmara.
Então, a Presidente tem que ter argumentos que deem força para ela. E eu fico meio assim. Ela não fala. Quer dizer, acho que às vezes ela deveria responder que é favorável.
 
Agora, nesta reunião, eu digo que vim aqui e faço questão de estar aqui. O Senador Demóstenes é um homem excepcional, não tenho dúvida nenhuma. Ele estava praticamente sozinho. Agora veio o outro Pedro.
 
E vocês, Procuradores, eu estava dizendo aqui, acho que vocês já nascem para ser procurador. Não é que o cara se forma... Não! Ele já veio, ele foi gerado para ser o que vocês são.
 
Nunca me esqueço, nunca me esqueço: estávamos numa sessão dura no plenário do Senado – lotadíssimo –, onde estávamos “cassa, não cassa” um Senador. E, na hora de falar, esse Senador ficou na frente, no primeiro lugar, e olhava para quem estava falando. Eu, quando falei, morri de vergonha. Ele olhava para mim e eu ficava com pena, ficava assim... Era esquisito. O Demóstenes se levantou, saiu da tribuna, veio para a frente da mesa, ali, e ficou olhando para ele. Ele é que passou (Inaudível): “Ele deve ser cassado por causa disso, por causa disso, por causa disso”.
 
E o pior é que eu senti que o Procurador sente aquilo, faz bem, sabe? (Risos.)
Machuca a gente, mas eles fazem bem.
 
Mas acho que estamos vivendo o grande momento. Se a Presidente da República fizer o que estamos apelando para que faça, marcar uma reunião – e acho que essa reunião deveria ser uma grande reunião –, convidar o Presidente do Supremo, o Presidente do Senado, o Presidente da Câmara e assinar, para coroar, a decisão entregando para o Conselho Geral da Magistratura essas questões.
 
Vamos fazer justiça, o Supremo disse, abriu mão: “No Judiciário, nós não queremos corporação (Inaudível) decide com relação ao Judiciário”.
Nós, no momento em que uma lei do povão veio para cá e nós votamos a Lei da Ficha Limpa, nós, parlamentares, dissemos: “A nossa vida está à disposição”.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Me permite um aparte?
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Só terminando. Se a Presidente da República disser: “E no Executivo também”, fechou a questão...
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Exatamente.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – ...e nós podemos dizer que vamos iniciar um novo período, um novo período.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Sim, só para concordar inteiramente com o argumento de V. Exª, precisamos desse decreto. Imagine: se o titular do poder, que é o povo, não pode eleger um ficha-suja, será que aquele que é eleito pelo titular do poder pode escolher um ficha-suja? O cidadão não pode ser Deputado, não pode ser Senador, não pode ser Vereador, não pode ser Prefeito, mas pode ser Presidente da Petrobras, Ministro, Presidente da Casa da Moeda; vai cuidar de uma diretoria que fure poço, por exemplo, na Petrobras...
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Pode ser Ministro do Supremo.
Era isso, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Agradeço a V. Exª. Como já começamos a Ordem do Dia, vou pedir, não querendo, de forma alguma, tolher a palavra do nosso querido Lobão... Tem o tempo que quiser V. Exª.
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – Não, não. Serei muito breve.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Tem a palavra o Senador Lobão Filho.
O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – Já começo dizendo que V. Exª fica muito bem nessa cadeira. Deveria ser vitalício aí.
Ministra Eliana Calmon, Dr. Paulo Schmidt, faço parte de um poder, o Poder Legislativo, extremamente devassado, fiscalizado e pouco corporativo. Nosso Senador Pedro Simon acabou de citar o exemplo que nós cassamos nossos pares. Isso é um hábito comum aqui no Congresso: a Câmara cassa Deputados, o Senado cassa Senadores. No Poder Executivo não é diferente: toda hora vemos Ministros sendo demitidos, presidentes de autarquias sendo demitidos, presidentes de empresas públicas sendo demitidos. Então, isso é comum também no Poder Executivo. Mas no Poder Judiciário é bem diferente. Os dois Pedros, Pedro Simon e Pedro Taques, falaram em ficha limpa para o Legislativo, em ficha limpa para o Executivo, mas ninguém falou em ficha limpa para o Judiciário.

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. LOBÃO FILHO (Bloco/PMDB – MA) – É medo, não é?
Então, perceba que é um poder diferente.
Mas eu pedi a palavra só para fazer um registro: eu conheço a história de V. Exª há muitos anos. V. Exª não é do CNJ; está no CNJ. V. Exª é magistrada e, como magistrada – e isso enaltece ainda mais o que vou falar –, V. Exª quebrou um paradigma, o paradigma do poder estanque, fechado, endógeno, que a sociedade brasileira inteira sempre viu como uma coisa onde não se podia ver o que acontecia dentro dessa caixa. E V. Exª, como membro da caixa, quebrou isso e abriu para a sociedade brasileira. Essa é uma atitude corajosa e histórica.
As minhas palavras são muito breves, apenas para manifestar o que a minha família inteira fala todos os dias dentro da minha casa e que eu vejo no meu Estado, na minha cidade, em conversas com meus amigos: a admiração pelas atitudes corajosas de V. Exª durante esse processo todo. V. Exª. como parte desse corpo, resolveu abri-lo para a sociedade brasileira, de forma corajosa, volto a dizer, porque contrária à posição de muitos outros magistrados, mas como magistrada.
Então, parabéns! O reconhecimento da sociedade brasileira a essa atitude e que, se Deus quiser, mostra um tempo novo para o Judiciário no Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Senador Vital do Rêgo.
O SR. VITAL DO RÊGO (Bloco/PMDB – PB) – Sr. Presidente, Senador Demóstenes Torres, Ministra Eliana Calmon, Dr. Paulo Schmidt, serei muito breve, até porque a campainha da ordem do dia nos convoca e nós estamos sedentos para ouvir novamente a Ministra Eliana sobre as arguições que foram feitas pelos nossos colegas Senadores.
Gostaria de saudar a Ministra Eliana, que há mais de oito meses, não por ela, mas pela nossa própria agenda, por meio de requerimento de nossa autoria, está convidada para falar sobre o CNJ. Esse requerimento foi apensado ao de realização desta audiência pública promovida pelo autor da PEC, que, rapidamente, com a inteligência que os dois Pedros colocaram agora há pouco, foi corajoso e recebeu uma aclamação, Ministra, quando da apresentação dessa PEC, rica em propósitos, em objetivos, mas necessária, como se fosse a palavra do Senado dizendo: “Vá em frente, Ministra! A senhora não está sozinha”.
Essa PEC vem, muitas vezes, municiada desse sentido de que o Senador falou há pouco, de brisa, de suspiro, de oxigenação dentro de uma estrutura muito hermética.
Eu quero dizer que a senhora pode, nesta audiência pública, em muito contribuir para essa PEC, que já é muito rica, repito, em propósitos, em eficácia, à luz do que queremos para a República.
E faço diretamente as três perguntas – havia marcado aqui outras tantas, mas soube já das indagações que me antecederam: que propostas a senhora pode nos sugerir para ampliar e fortalecer a autoridade fiscalizatória do CNJ?
Devolvo a minha indagação à fala muito mais eloquente, muito mais jurídica, muito mais competente de Pedro Taques, quando versou a respeito de quebra de sigilo de magistrados em processos administrativos de competência do CNJ e – ele foi mais além – de servidor público. Quero tomar e fazer minha essa questão que foi levantada do sigilo.
Também saber da senhora os procedimentos administrativos realizados ano passado quando teriam sido quebrados sigilos de centenas de pessoas ligadas ao Poder Judiciário, como estão prontos, como está esse julgamento.
As demais perguntas, esses questionamentos, foram todas já saciadas pelos nossos colegas Senadores.
Quero dizer que sinto-me muito feliz pessoalmente, como um advogado admirador dessa nova magistratura que surge, como outras tantas. Bem disseram os meus colegas: nós temos a esmagadora maioria de juízes e juízas de bem e do bem, esmagadora maioria. Mas assim como a laranja, que sozinha apodrece o saco, nós que somos muitas vezes vítima da generalidade e da injustiça sobre este Parlamento, sobre o Executivo, acho que o Judiciário deve deixar a laje e ir para o mesmo telhado que nos abriga.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Agradeço a V. Exª.
Concedo a palavra ao Dr. Paulo Schmidt, Vice-Presidente da Anamatra, para responder às indagações e fazer as suas considerações finais.
O SR. PAULO SCHMIDT – Sr. Presidente, as indagações feitas, na maioria, são dirigidas à Ministra, várias dela a mim.
Com relação ao questionamento que o Relator faz, com relação à composição do CNJ, de incluir tanto a defensoria e advogados públicos, isto é, da AGU, me parece que não seria uma medida que contribuiria para o CNJ no sentido de que são advogados, e a advocacia já está lá representada.
Na mesma linha, gostaria de responder ao Senador Simon que, em 2003, quando fizemos, juízes do trabalho, uma proposta ao CNJ mais ampla que essa que veio a ser aprovada, então era Ministro o Dr. Márcio Thomaz Bastos. E ele foi à imprensa e disse literalmente: a proposta da Anamatra tecnicamente e politicamente é melhor que a proposta que está em discussão no Senado. Mas uma questão pragmática nos move: se nós mudarmos no Senado, terá que voltar à Câmara; portanto, pragmaticamente, nós vamos aprovar a proposta.
Então, me sinto muito à vontade para encaminhar a resposta nesse sentido, porque a minha experiência lá... Até dizem que a talvez a academia devesse estar lá representada, porque a academia oxigena também as ideias. Portanto, eu acho que seria interessante.
Em relação ao Senador Ferraço, efetivamente em 2010, houve uma articulação lá no CNJ, e foi produzida uma resolução para criar padrões transparentes, claros e isonômicos para todos os tribunais que viessem a reconhecer eventuais diferenças salariais por qualquer razão retroativas. Então, a proposta era um regramento único: índice de correção, período, juros e tudo o mais.
Muito bem. O detalhe era que nós, inclusive, concordávamos que, no âmbito da União, a AGU deveria participar dos processos de definição dessas diferenças, porque, afinal de contas, era interesse da União. Mas houve uma resistência no CNJ, e não seguiu adiante. Mas as associações – e aí o trabalho sempre próximo no CNJ – levaram essa mesma proposta tanto para o Conselho Superior da Justiça do Trabalho como para o Conselho da Justiça Federal, e os Presidentes desses dois conselhos editaram as normas. Então, no âmbito da Justiça da União, especialmente trabalhista e federal, essa questão da uniformidade de critérios está amplamente equacionada. Não há divergência quanto a isso.
A questão da penalidade máxima de aposentadoria. Eu tenho insistido em que há uma informação que não é devidamente completa em relação a essa questão. Entender-se que a penalidade máxima é a aposentadoria compulsória em razão de delito funcional, vamos dizer assim, é apenas uma parte da verdade, porque há a segunda parte – e eu conheço várias situações –, em que a perda dessa condição é feita mediante o processo judicial.
 
Eu não estou aqui defendendo absolutamente que essa seja a melhor solução, mas estou dizendo que, efetivamente, isso ocorre. Então, parece que o juiz, ou o servidor, aposentado compulsoriamente passa a gozar plenamente dessa condição para o resto da vida, o que na maioria das vezes não é verdade, porque há representação do tribunal – e isso é um dever funcional – para o Ministério Público para prover a devida ação penal para a entidade, que é, efetivamente, titular da ação penal.
Sugestões para reforçar os poderes do CNJ. Eu penso que os poderes que hoje o CNJ encerra são poderes importantes, mas penso que o CNJ ainda não conseguiu exercê-los todos na medida em que estão previstos, porque embora a competência penal – ou disciplinar, melhor dizendo –, a competência disciplinar pareça a princípio a mais vistosa aos olhos da imprensa, penso eu que a principal competência que o CNJ tem é efetivamente o de transformar o Judiciário, dar-lhe melhor configuração, fazer o seu planejamento estratégico com vistas ao futuro e para resolver a principal queixa da sociedade brasileira, que é o Judiciário lento e ineficiente. É nesse sentido que acho que o aprofundamento do exercício das competências que o CNJ tem hoje, com melhor estrutura, estrutura bastante mais ágil, eu penso que efetivamente pode ser resolvido.
Sr. Presidente, sei do adiantado da hora, então peço desculpas se não consegui responder todas as questões. Agradeço imensamente a oportunidade. E sempre à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Agradeço a V. Exª, Dr. Paulo Schmidt.
 
Concedo a palavra à Ministra Eliana Calmon para responder às indagações e também para fazer suas considerações finais.
A SRª ELIANA CALMON – Começo respondendo os questionamentos feitos por V. Exª e digo o seguinte: acho que a colocação do CNJ, logo abaixo do Supremo Tribunal Federal, foi estrategicamente corretíssima. Está correta a posição do CNJ, para que seja possível ao Supremo Tribunal Federal fazer as correções quanto aos excessos e aos possíveis desmandos, se houver, do Conselho Nacional de Justiça.
E a ampliação do prazo que está estabelecido na PEC, de que os processos que estão julgados pelas Corregedorias, após um ano, podem ser resgatados pela Corregedoria Nacional, é de importância fundamental, porque um ano é muito pouco. Muitas e muitas vezes, quando nós chegamos nas Corregedorias para fazer as inspeções e as correições, nós encontramos os processos dentro das gavetas ou nos armários, estão lá dormindo por uma série de circunstâncias. Por exemplo, chega-se à conclusão de que não há quórum para julgamento. Então, esse processo vai para o armário e fica lá esperando para quando houver quórum. Nunca haverá quórum. E nós chegamos e resgatamos isso. Um ano é muito pouco. Nós chegamos e encontramos já tudo prescrito.
De forma que a proposta de aumentar para cinco anos é fundamental. E por que cinco anos? Porque, em relação a tudo que diz respeito à atividade administrativa, o prazo de cinco anos é o prazo normal para prescrição.
Acho fundamental a função de autonomia e a função concorrente. Disso já falamos bastante, já dissemos que é necessário, mas eu achei espetacular o adendo que V. Exª fez colocando um parágrafo para dizer o seguinte: os desembargadores são julgados pelo Conselho Nacional de Justiça. É fundamental! É dificílimo um tribunal julgar desembargador. Se o desembargador, inclusive, é aquele que tem liderança, que tem a simpatia do colegiado – e aqui quero dizer que os malandros são extremamente simpáticos –, o Tribunal não tem condições sequer de julgar, e os homens de bem, os magistrados de bem são extremamente tímidos por formação. O magistrado é um tímido e muitas e muitas vezes cala. Eu digo sempre – sempre estou dizendo isso quando me reúno com os desembargadores: eu não tenho medo dos maus juízes, mas eu tenho medo do silêncio dos bons juízes, que concordam com uma série de coisas. Concordam, não; calam na hora do julgamento. Só fazem fazer isto com a cabeça, mas, no entanto, são incapazes ,porque querem se indispor, porque o coração não está bem, porque já estão no fim da vida, porque já estão no fim da carreira. Por isso, eles não tomam atitude.
É interessante observar – eu, que tenho percorrido esses Estados, fazendo várias inspeções, chego a vários tribunais – que toda sociedade sabe quem é o bom juiz e o mau juiz, todos sabem. Cheguei a um determinado Estado onde, já à frente do hotel onde fiquei, já encontrei as faixas dizendo os absurdos que se passavam no Tribunal de Justiça. Parti para uma reunião com os advogados da localidade, e eles me disseram: “Vou dizer para a senhora: tais e tais desembargadores não prestam; tais e tais desembargadores são homens de bem.” Então, todo mundo sabe; é o segredo de polichinelo. E quando a gente fala alguma coisa de que há desonestidade, dizem que a gente está falando demais. Então, é importante, sim, essa função de competência primária para julgar os desembargadores.
 
Em relação ao foro especial, eu concordo que é um absurdo e, se é um absurdo, não vamos aumentar isso mais. Todos nós temos a preocupação dos Conselheiros. Já temos, inclusive, precedentes: o Conselheiro Maurik, que era juiz, está respondendo a uma ação no Tribunal Regional Federal da 4ª Região por causa de atos praticados como Conselheiro do CNJ. Nós temos essa preocupação, mas não vamos tirar uma preocupação com uma solução que nós não aceitamos, que é o foro especial. Esse foro especial é uma excrescência.
Sou juíza de colegiado, sou juíza de Tribunal Superior e posso dizer aos senhores: o processo não anda, mas não anda não é porque o relator não quer; não anda porque é feito para não andar. A legislação é feita para não andar. Primeiro, uma denúncia que é recebida monocraticamente pelo juiz primeiro grau, no STJ, é recebida por quinze. Quando chega à ponta da mesa, os fatos já estão todos deturpados. Cada um dá uma interpretação diferente; nós levamos a tarde inteira para julgar.
Mais uma coisa que foi trágica: ao se revogar a súmula do Supremo Tribunal Federal, a Súmula nº 394, foi uma tragédia. O que nós temos hoje? Estamos julgando foro especial na hora. Recebe a denúncia, vem toda a defesa. No mínimo, o relator que for diligente, no mínimo, são dois anos do recebimento da denúncia até a finalização da instrução, fora o tempo que ficou até o recebimento da denúncia, que são outros dois anos.
Quando chega perto e a prova está contrária ao réu, ele pede aposentadoria – como um dos conselheiros do Tribunal de Contas que eu estava processando – no dia do julgamento. No dia do julgamento! De manhã, eu estava em casa, estudando já o voto para ir de tarde para a sessão, quando eu recebi um telefonema do chefe de gabinete, que me disse o seguinte: “O conselheiro fulano de tal acaba de pedir exoneração.” O que significava que tudo estava perdido porque o processo ia começar na primeira instância, já que ele perdia o foro especial.
 
Graças a Deus, consegui salvar porque eu disse: “Foi publicado o ato!” E ele disse: “Não; então, eu vou julgar.” Mas levei para o colegiado e ainda houve dois votos contrários, porque entendiam que, mesmo sem publicação, ele tinha perdido o foro especial e nós não podíamos julgar. Então, não tem cabimento esse foro especial.
 
E, além de tudo, a legislação que se segue, a legislação penal de rito para o foro especial é trágica. Em relação à pertinência da alteração para requisitar informações, documentos, perícias eu entendo que está na medida, porque fazer prova, quebrar sigilo fiscal e bancário seria importante. Mas isso pode ser questionado porque temos uma cultura de manter sigilosamente essas finanças, que naturalmente são mantidas em sigilo já que não são muito puras, são espúrias.
Então, nós não podemos avançar demasiadamente. E aqui eu me lembro muito bem – desculpem-me pelo avançar da hora, mas eu tenho de falar – de Bertha Lutz, quando lhe perguntaram: “Por que a senhora só defendeu direitos políticos e não defendeu direitos civis?” E ela respondeu: “Não posso defender tudo. Vamos por partes: no momento em que eu conseguir os direitos políticos para a mulher, os direitos civis virão por via de consequência.”
 
No momento em que ficar delineado a competência do CNJ e da sua corregedoria para manusear, com as provas produzidas por outrem, através da requisição de informações, documentos e perícias produzidas no juízo criminal, no juízo tributário, nas investigações policiais, naturalmente a quebra, o poder de quebrar o sigilo fiscal e bancário virá por via de consequência.
Portanto, a manutenção da PEC do jeito que está me parece mais salutar para não causar o estresse que esta sociedade ainda tem no que toca à quebra de sigilo fiscal e bancário, porque eu costumo dizer: é aí que está o ovo da serpente.
 
Pode o CNJ exonerar e demitir? Acho importante que essas penas sejam mexidas. Por que temos de mexer nessas penas? Porque a sociedade não se conforma. Como é que uma aposentadoria pode ser uma pena para uma pessoa que comete absurdos?
Então, realmente nós precisávamos de uma pena mais drástica, aplicada, sim, pelo órgão incumbido de fazer a fiscalização e a disciplina. Pode-se dizer o seguinte: mas isso vem porque o juízo penal aplica a pena 20 anos depois. Vinte anos depois! Porque sentença transitada em julgado neste País é substantivo abstrato. Não vamos querer nos enganar! E, se a gente pensa que a ação penal vai andar, não anda! Daí por que é importante, é instrumento moralizador, sim, esta questão.
Quero também dizer aqui, misturando um pouco, mas dizer o seguinte: aquilo que o meu colega o Dr. Paulo Schmidt falou, sobre o aspecto da magistratura, da nomeação pelo Executivo, é um absurdo. A fila cresce e cresce, e não é isso que faz com que as escolhas sejam melhores ou piores. Apenas eles remetem a uma situação que eu acho que é até pior, com mais “lobismos” para as nomeações. Resolver com simetria parece-me bem mais correto, no que toca, vamos dizer assim, à independência da magistratura.
A autonomia dos tribunais e a independência dos juízes é, sem dúvida alguma, um grande filão e uma grande necessidade, e esse é um dos objetivos do Conselho Nacional de Justiça.
Mas agora eu passo a responder às perguntas do Senador Randolfe, citando as informações quanto ao número do andamento dos processos. Eu tenho aqui o seguinte: eu encontrei na Corregedoria, quando assumi em setembro de 2010, um remanescente de 2.847 processos. Recebi, durante um ano e meio, de setembro até fevereiro, 6.322 processos. E, durante esse mesmo período de um ano e meio, julguei 6.488 processos. Estão em tramitação atualmente 2.758 processos. Não é muito. Tenho detalhado, mas me parece que essa não é a importância para V. Exª, se não esses número abstratos, mas eu passarei a V. Exª inclusive esses números.
Quanto às principais medidas para a transparência, o primeiro passo foi dado, porque houve um momento em que a transparência, que foi um dos pontos marcantes na criação do CNJ, passou a ser questionada dentro do Conselho Nacional de Justiça. Mas o Supremo Tribunal Federal colocou nos lugares quando discutiu largamente que os processos que tramitam pelo CNJ são ostensivos, sim, são públicos, sim, e que isso é a tônica da Constituição de 1988. De forma que me parece que isso é suficiente.
Quanto à quebra de sigilo bancário, eu já me expliquei. As punições também. Eu acho que realmente devemos mexer para colocar cassações e aposentadoria. E os principais problemas das corregedorias estaduais.
Quais os principais problemas das corregedorias atuais? Em primeiro lugar, as corregedorias têm uma estrutura tão antiquada que muitas e muitas estão subordinadas à Presidência. Se o corregedor não se der bem com o presidente, nada anda na corregedoria, porque o presidente estrangula a corregedoria, não oferecendo os recursos necessários para a corregedoria andar. Então, isso é um problema. Hoje eu estou tentando ver se eu deixo as corregedorias com uma estrutura administrativa e financeira de absoluta independência, mas, naturalmente, a cultura das justiças, principalmente as justiças estaduais, é de uma perversidade ímpar.
Quero dizer aos senhores que, no final do ano passado, num grande Estado, um Estado importante da Federação, o tribunal de Justiça elegeu um desembargador que acabava de ter um AVC e ficou absolutamente abilolado. E foi esse homem o escolhido para ser o corregedor. E ainda a Presidente do Tribunal veio me dizer: “É, escolheram, não é?” Eu disse: “É, para não fazer nada, está ótimo”.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Muito antes de ser escolhido... (Fora do microfone.)
A SRª ELIANA CALMON – Teve o AVC, ficou de licença, mas voltou para ser o bonequinho de presépio, e, achando pouco o papel que ele ia fazer, ainda foi eleito Corregedor. É o Corregedor.
Eu, inclusive, pedi ao Colégio dos Corregedores para haver uma interferência nisso, porque eu entendia que eu que já estava num clichê aberto no Supremo Tribunal Federal, se fosse questionar a eleição de um Corregedor pelo Tribunal, eu iria abrir mais um flanco de guerra. E eu, então, nada fiz, esperei que o Colégio de Corregedores fizesse. Não fez, lógico que não fez.
Esse é um exemplo que eu conto para dizer que, realmente, é uma tradição não fazer nada. O corregedor que vai fazer fica numa situação difícil, por quê? Porque, geralmente, é um dos mais antigos. Ele sai da corregedoria e se candidata à presidência. Se ele começar a mexer em muita coisa, ninguém o elege presidente. Como ele quer ser presidente, porque presidente é a função mais importante, então ele não faz nada e fica esperando.
Sabe quais são os melhores corregedores? Aqueles que não têm idade de chegar à presidência. Então, como eles estão lá, é o fim de carreira, eles fazem alguma coisinha. E isso eu estou falando por experiência própria, porque é o que eu estou encontrando nos Estados.
De forma que, realmente, nós temos que fortalecer as corregedorias. Quem é que pode fortalecer as corregedorias? E é nisto que eu estou trabalhando: o Colégio de Corregedores. Mas o Colégio de Corregedores tem uma tradição, qual é? Fazer as reuniões, e as reuniões viram o quê? Um grande piquenique. É ótimo ir, jantar, festa, as mulheres vão, passeiam, é um espetáculo! Agora, o que é que temos de fazer? Temos de fazer como agora esta composição do Colégio está fazendo, e avisou logo: não é festa, nós vamos trabalhar os três dias. Eu quero ver. Eu estou indo e estou querendo trabalho. Já pedi dois dias para falar, dois dias, para ver se realmente nós vamos... É uma forma de fortalecer as corregedorias, deixando que estes colégios – e eles existem para isso – façam todo o dever de casa.
Quanto à composição mais ampla, eu sou contra. Por que eu sou contra? Colegiado muito abrangente é uma guerra, não resolve nada. Quinze já dá problema, se colocar mais, vai ficar preocupante. E não é isso que dá legitimidade à sociedade, não é isso. O que dá legitimidade ao conselho para participação da sociedade são as escolhas que os senhores fazem nesta Casa, as escolhas que fazem na Câmara dos Deputados. É isso que dá legitimidade.
 
E qual é a minha preocupação? O CNJ está adquirindo uma visibilidade grande na sociedade e está se politizando. E é a minha preocupação. As escolhas que se fazem neste momento. Não é só escolha das Casas legislativas, a escolha que se faz da Magistratura, em que se começa a fazer uma escolha direcionada para servir ao senhor maior dos seus componentes – e isso é o que me preocupa. Mas isso esta Casa pode fazer pouco, porque isso é uma questão de cultura, é uma questão de civilidade, é amadurecimento político da Nação, que pode, sim, fazer uma escolha que não seja escolhas insensatas para servir as elites ou servir individualmente cada uma das pessoas, troca de favores.
Então, isso é difícil, mas isso virá com o tempo, mas cada um tem de ter a consciência que escolheu bem os seus representantes.
Em relação ao tema da sociedade brasileira, realmente ela apropriou-se do CNJ. Hoje se questiona a posição do CNJ e isso é de uma importância fundamental.
Passo a responder as perguntas do Senador Ricardo Ferraço, dizendo quais os limites e obstáculos das investigações. As investigações feitas pela Corregedoria do CNJ são investigações fracas, frágeis. Por quê? Eu praticamente tenho a prova documental.
É muito difícil, e principalmente nesse momento em que temos uma evolução na informática, corrupto deixar documento. Muito difícil. Então, o que eu tenho para investigar? Eu vou me valendo das provas que estão num inquérito, ou que estão no STJ, contra os desembargadores, eu fico pedindo compartilhamento, para que eu possa fazer alguma coisa.
 
Então, essas investigações patrimoniais – que chamo de patrimoniais – são importantes, porque, através do Imposto de Renda e também desse compartilhamento de quebra de sigilo, etc., eu posso fazer alguma coisa. É de importância fundamental.
Mas há também uma coisa que me incomoda muito, e isso precisamos resolver realmente, porque o que se diz é o seguinte: todas as vezes que estou questionando algum ato de improbidade ou algum ato de corrupção de magistrado, dizem o seguinte: mas, você não pode se meter porque isso é decisão judicial. Eu disse: sim. Mas, o juiz comete improbidade onde? Não é no ato judicial? Por que juiz praticar ato administrativo só os presidentes, porque, juiz mesmo não tem ato administrativo. Então, a improbidade é na sentença, é na decisão, é na condução do processo. Agora, eu não posso, como tribunal administrativo, imiscuir-me na motivação do ato judicial. Mas, o ato judicial deformado, o ato judicial escancaradamente deformado, é óbvio que o CNJ pode se questionar, mas, muitas cabeças pensantes ainda acham que não é possível.
Desculpe, mas não posso perder a oportunidade de dizer isso. Eu estava no meu gabinete, há quinze dias, quando os advogados de uma grande empresa me procuraram. E esta empresa dizia o seguinte: “Estamos aqui porque não sabemos mais o que vamos fazer”. O que houve? Uma ação de indenização que foi proposta contra... Uma pessoa humilde, um perueiro, que comprou uma van, e a van estragou. Ele entrou e pediu uma indenização de R$20 mil reais. O juiz, na condução do processo – e já estava acostumado a fazer isso porque já o conhecíamos – começou a questionar, intimou errado e tal, e aí começou a aplicar multa diária porque não fez o depósito de R$20 mil reais. Moral da história: o pedido inicial, que era de R$20mil reais, transformou-se em R$2,9 milhões. E o que ele fez? Ele foi lá, entrou com a penhora on-line e pegou R$900 mil da conta da empresa. E a empresa correu para o tribunal, porque o processo estava nas mãos da empresa, e ele disse: “Não vão tirar, está lá com penhora on-line, mas não vão tirar porque o processo está na minha mão”. Ele fez autos suplementares, tirou o dinheiro, e o dinheiro sumiu. A empresa foi atrás do perueiro, e o perueiro nunca viu esse dinheiro.
Bem, para encerrar o caso, ele entrou com uma ação rescisória porque isso transitou em julgado. Entrou com uma ação rescisória porque, a essa altura, o CNJ já tinha afastado esse juiz por outros casos que tinham acontecido. Esse juiz está afastado. Do CNJ. Aliás, ia ser julgado hoje, ia ser julgado hoje. Bem, o caso, a decisão do tribunal. Eles entraram com a ação rescisória dizendo: “Olha, a decisão é de um juiz corrupto que está afastado”. O tribunal confirma a sentença e diz o seguinte: “A sentença do juiz não é de corrupção, porque o juiz foi afastado, mas o juiz não foi exonerado, então a sentença dele é válida”. Os advogados me procuraram e disseram o seguinte: “Um juiz corrupto, que está afastado, mas as decisões dele estão transitando em julgado e cumprindo os seus efeitos, como uma sentença normal de um bom juiz? O que a gente faz? Correr atrás?” Chamo o corregedor e digo: “Pelo amor de Deus, esse recurso é especial, tem de ser admitido para a gente corrigir esses erros, porque a empresa diz o seguinte: para tal estado assim, assim, não se vende mais nada”.
 
Mas o importante é a falta de credibilidade que isso causa ao Poder Judiciário. E, para esse juiz, eu tenho cem juízes que são magníficos, que são maravilhosos.
 
Pagamentos duvidosos, Justiça do Trabalho, Justiça Federal. Quero responder aqui uma pergunta, que achei fantástica, do Senador Ricardo Ferraço, para dizer o seguinte, o que é que aconteceu, e os senhores vão me dar espaço para eu contar a história disso, que dizem que eu quebrei o sigilo de duzentas e tantas mil pessoas. O problema: Gilmar Mendes, o Ministro Gilmar Mendes era Presidente do CNJ; o Ministro Gilson Dipp era o Corregedor. O Ministro Gilmar Mendes, então, quis fazer dentro do CNJ aquilo que já tinha sido pensado lá atrás e que foi tocado pelo Dr. Paulo Schmidt. Ele quis criar um sistema de controle de todos os pagamentos da Justiça Estadual, porque, meus senhores, é um descalabro. Todas as vezes que um governador corrupto quer um favor do tribunal, ele se junta com o Presidente do tribunal e diz: “Eu lhe dou aumento”. E tudo passa. E tudo passa.
Já tive a oportunidade de afastar presidente de tribunal por causa disso, mancomunado. Presidente do tribunal, presidente da assembleia legislativa, presidente do tribunal de contas, as três pessoas da santíssima trindade. Andam juntinhas e fazem o que querem. Com quê? Aumento de salário. E dizem o seguinte: “Estou cuidando da categoria, estou cuidando da categoria”.
Bem, feito isso, os salários começam a subir assustadoramente. Mas tem o teto, tem o teto constitucional. O que nós estamos encontrando? Nós estamos encontrando o seguinte: os desembargadores ganham o teto, R$26 mil; mas, três vezes no ano, vem um penduricalho em que se dá uma gratificação monstruosa. Se nós tomarmos tudo e dividirmos por doze, eles não ganham R$26 mil; eles ganham R$50 mil, R$40 mil, R$60 mil, R$70 mil, porque, na soma... Uma aula que se dá na Escola da Magistratura, R$10 mil por aula. Pronto! Agora, se isso fosse contabilizado e chegasse ao CNJ, nós tínhamos condição de fazer a correção. E era por isso que nós queríamos que fizessem exatamente isso.
Para formar esse cadastro, o Ministro Gilson Dipp oficiou a todos os tribunais, pedindo que os tribunais mandassem os nomes de todos os juízes, de todos os desembargadores e de todos os servidores. E, mais ainda, dos dependentes que constavam do Imposto de Renda, formando-se, assim, o cadastro da família judiciária. De posse desse cadastro, para formar justamente essa base de dados, o Ministro Gilson Dipp mandou ao COAF todo esse universo – aí é que vem a história – de 237 mil pessoas. Esse é o universo da família do judiciário. Ele mandou ao COAF, dizendo o seguinte: “COAF, quando você foi criado, não existia a CNJ. O COAF foi criado em 1998, mas agora eu sou fiscal desse universo aqui. Então, você, que pela lei tem que mandar todas as operações atípicas para o TCU e TCE, agora mande para mim, que sou o órgão fiscalizador.”
Isso foi em 2010, e o COAF só respondeu em fevereiro de 2011, quando eu já era corregedora. Mas peguei aquilo ali e não entendi nada, porque o relatório do COAF não dá nome, não dá CPF, não dá nada. O nome, o CPF e tal ele só dá para a polícia e para a justiça, quando há investigação. Para mim, disseram que existe concentração de operações atípicas em tal, tal, tal tribunal. Só isso que ele deu. Não me aproveitei disso para nada, mas quando chegou em dezembro cheguei à conclusão de que eu não tinha pernas para fazer inspeção em todos os Estados grandes, porque o Ministro Gilson Dipp fez nos Estados menores. Os maiores, ele disse: “Vou consumir meu tempo todo e não chego lá.” Então, a estratégia foi chegar aos Estados grandes para fazer só uma espécie de inspeção, e me fixei exatamente nessa inspeção patrimonial, porque essa base de dados que foi pensada lá atrás não deu certo. Por quê? Porque a base de dados foi iniciada, a resolução foi feita, mas não houve interesse da nova administração em fazer essa base de dados, que então ficou esquecida, não se tem base de dados, não sabemos quanto é que pagou. Só sei porque alguém diz que estão pagando demais aos desembargadores – e eu sei, porque já tive operações policiais como magistrada lá no STJ, como as coisas funcionam em termos de salários. Os Estados mais pobres são aqueles que pagam mais. Pagam e ganham muito bem, tanto que muita gente não quer ser Ministro do STJ porque vai ganhar muito menos. E há, ainda, uma prática que tentamos coibir de algumas situações em que se ganha duas vezes: aposenta-se no Estado e assume outro cargo. Isso já houve, foi combatido dentro do STJ, mas dizem que continua. Não sei, não tenho informações sobre isso.
Resolvi ir àqueles redutos onde eu iria ter dificuldades, mas eu tinha de me basear em alguma coisa para dizer que ia a São Paulo, porque São Paulo realmente é um Estado fechado, que nunca abriu para o CNJ, etc. E como a concentração maior indicada pelo COAF estava no Tribunal de São Paulo, fui até lá para fazer uma investigação patrimonial. Em que se resume a investigação patrimonial? Olhar a declaração de bens que os juízes entregam e olhar a folha de pagamento, para ver se estava pagando muito. Só isso que ia olhar, e as coisas normais que sempre faço em todos os Estados. Quando cheguei lá, deparei-me com a seguinte situação. Primeiro, uma dificuldade: não queriam. Só no segundo dia é que foi possível essa investigação e descobrimos que 45% dos magistrados paulistas não entregam declaração de imposto de renda. Isso não é novidade, porque outros Estados também não entregam. Mato Grosso, por exemplo, não estava entregando.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Mato Grosso?
A SRª ELIANA CALMON – Mato Grosso. Não entrega. Eu já estava combatendo nos outros Estados, mas encontrei isso em São Paulo. Veio a liminar e proibiu que eu desse continuidade a isso.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB – ES) – Permita-me, Ministra. Esses desembargadores não declaram imposto de renda à Receita?
A SRª ELIANA CALMON – Não sei. Não entregam a declaração ao tribunal, que é a obrigação.
O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT – MT) – Quantos por cento em Mato Grosso?
A SRª ELIANA CALMON – Em Mato Grosso há um percentual maior que em São Paulo. Está corrigido. O corregedor hoje corrigiu isso. O Márcio Vidal está corrigindo muita coisa.
O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL – AP) – Quais Estados mais, Ministra?
A SRª ELIANA CALMON – Não me lembro. Tem um ou outro Estado que não entrega um pouco, mas nessa proporção grande foi em Mato Grosso – que corrigimos – e em São Paulo, 45%, que encontramos. Não encontramos mais nada porque os dados não puderam ser trabalhados. Foi isso o que as associações disseram, que quebrei o sigilo bancário e o sigilo fiscal. Não quebrei nada, não pedi nada.
O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB – RS) – Foi o corregedor primeiro que pediu.
A SRª ELIANA CALMON – Foi quem pediu, mas pediu para fornecer, ele não quebrou. Ele disse: “O meu universo é esse.” Tanto que ele sabe, foi lá e viu que o ofício era dele e tal. Eu assinaria perfeitamente o ofício.
O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB – ES) – Ministra, Mato Grosso está corrigindo. E São Paulo, está corrigindo também?
A SRª ELIANA CALMON – Olha, o novo Presidente de São Paulo está tomando umas atitudes que estão me agradando muito. Primeiro, ele está falando, porque São Paulo nunca falou. Ele está falando, está querendo corrigir. Ele sabe dessa deficiência, porque eu lhe disse. E ele está pedindo, pela primeira vez, o auxílio do CNJ, que, inclusive, está indo lá para ajudar nos precatórios. Ou seja, pela primeira vez o tribunal se abre para dizer que tem problemas, porque, no passado, ainda na gestão do Ministro Gilson Dipp, quando o CNJ chegava o Presidente mandava buscar a bandeira de São Paulo, fincava e recebia o CNJ com a bandeira de São Paulo. Comigo nunca aconteceu isso, sempre fui muito bem recebida, mas nada de intimidade. Vou devagar, mas intimidade com a corregedora, nenhuma. Convidar para jantar e tal... Tanto que eu disse aquela célebre frase que terminou irritando muito: “Só entro em São Paulo no dia em que o Sargento Garcia prender o Zorro.” Aí um conselheiro chegou a me dizer que assistiu a um seriado em que o Sargento Garcia prendeu o Zorro. Eu fiquei assim... E ele disse: “Por algumas horas.” E eu entrei em São Paulo por algumas horas. Estava lendo a liminar e vai valer ainda por muito tempo, porque a AGU entrou com recurso e o relator respondeu que vai ouvir todas as associações de juízes, todas as associações de servidores, inclusive extrajudiciais, e depois ele vai decidir. Então, essa liminar está realmente valendo.
Continuando, já falei sobre o aspecto da vitaliciedade, da perda por sentença judicial também, vem então o CNJ com a competência de elaborar a Loman. Isso precisa de uma emenda constitucional. Acho que é o leito verdadeiro da Loman. Quem conhece as entranhas do Poder Judiciário é o CNJ. Ministro do Supremo Tribunal Federal não conhece o Poder Judiciário. Nem pode conhecer. Eu, magistrada de carreira, que faço instrução, que tenho um tribunal muito mais aberto, não conhecia. O Ministro Gilson Dipp me dizia: “Você vai perder a sua inocência no dia em que for corregedora.” Eu dizia: “Mas eu não sou uma mulher inocente.” Eu era uma mulher inocente.
Senador Pedro Taques, foro por prerrogativa de função, perfeito, já respondi sobre isso, não vamos cometer o mesmo erro. Refletir sobre o sigilo bancário e fiscal, também já respondi. Demora do Supremo Tribunal em apresentar a Loman, podíamos fazer uma tentativa de mudar um pouco. Eles têm tantas coisas a resolver, tão assoberbados que estão, que podem corrigir as demasias até que o Poder Legislativo, o CNJ possa apresentar esse projeto da Loman. Sobre a nomeação de juízes federais, já vimos isso. O Márcio Vidal falando sobre a competência originária, que já está na emenda.
O Senador Suplicy fala sobre uma questão do caso concreto de Pinheirinhos – e eu até já estive pelo meio daquela situação, porque tudo é corregedoria, e, na ocasião, fui procurada pelo presidente da OAB, fiz a sua ponte com o Ministro Ari Pargendler, liguei também para o Presidente Sartori e verifiquei que a situação estava muito complicada, mas, na realidade, tenho que dizer a V. Exª que todo o processo correu na justiça estadual e, como último grito, correram para a justiça federal para dizer que a questão era federal e tirar das mãos da juíza, o que não deu certo. Então, sobre o caso concreto judicializado, V. Exª me desculpe por não tecer maiores considerações, e quero dizer que o CNJ não tem condições de resolver isso porque já está judicializado. O CNJ não entra em questão de judicialização.
Senador Pedro Simon, também acho, como V. Exª, que a composição do CNJ é muito boa. O Ministro Dipp falava pouco porque não precisava falar. Eu falei muito porque eu precisava falar. Se eu não falasse com a imprensa, eu estaria frita, daí porque quero só lhe dar essa satisfação. Tanto que o senhor verificou que, quando eu não precisei, não falei mais. Sou magistrada e só sou magistrada, tendo o DNA de magistratura, de forma que falo pouco, mas falo. E por que falo? Porque entendo que há uma necessidade imperiosa de mudarmos um pouco isso que o Senador Lobão disse que era uma caixa, a tal “Caixa de Pandora”, onde efetivamente precisamos abrir em diversos flancos, para falar e dizer aquilo que está errado dentro da nossa Casa. Faço isso porque quero bem à magistratura, faço isso em prol da magistratura séria, correta, decente e que não pode ser misturada com meia dúzia de vagabundos que estão infiltrados nela. Para defender a magistratura é preciso, sim, que os magistrados estejam fortalecidos com a corregedoria, com o CNJ, é preciso ampararmos. E quantos e quantos casos eu tenho defendido o magistrado de primeiro grau, pegando o telefone e dizendo o seguinte: “Os senhores vão fazer a promoção agora, mas cuidado, porque estou de olho nos critérios que os senhores estão fazendo.” Em um determinado Estado, por exemplo, já se ia fazer a eleição do terceiro filho de um desembargador, passando à frente de todo mundo. O senhor sabe a quem me refiro. Quem foi que interferiu? A Corregedoria. E não aconteceu. E tantas e tantas vezes que o magistrado chega lá e diz: “Pelo amor de Deus, só tem uma corregedoria!” E tem mesmo! Vamos lá! E conseguimos barrar muitas coisas. Muitas vezes não está nem na lei, mas barramos só com a força moral, que é a maior força que se tem. Muitas vezes se barra com a força moral e muitas vezes sou temida porque o pessoal sabe que eu falo. E tantas e tantas vezes que eu disse, até dentro do CNJ: “Tudo bem, isso vai ser resolvido. Agora, tem troco. E quem vai dar o troco é a imprensa.” E, no outro dia, estava resolvido o problema. Por isso que falo.
Acho que respondi a todos e agradeço a oportunidade de ter feito aqui um desabafo, porque aqui é uma Casa onde posso falar o que eu quiser e ninguém pode dizer que me excedi, por que quem me perguntou foram os Senadores.
Muito obrigada pela oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Demóstenes Torres. Bloco/DEM – GO) – Lamentavelmente, não pode haver manifestação, ainda que mereça a nossa convidada Eliana Calmon, a quem agradeço pela presença, concordo, mas não posso autorizar.
Parabéns à nossa Ministra Eliana Calmon, parabéns ao Dr. Paulo Schmidt, muito obrigado por essa oportunidade.
Está encerrada a reunião.

(Iniciada às 14 horas e 35 minutos, a reunião é encerrada às 17 horas e 44 minutos.)
Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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