RECURSO ESPECIAL Nº 1.351.571 - SP (2012/0226735-9)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MARCO BUZZI
transitado em julgado
"A lei não prevê qualquer restrição à garantia do imóvel como bem de família relativamente ao seu valor, tampouco estabelece regime jurídico distinto no que tange à impenhorabilidade, ou seja, os imóveis residenciais de alto padrão ou de luxo não estão excluídos, em razão do seu valor econômico, da proteção conferida aos bens de família consoante os ditames da Lei 8009/90. "
RECORRENTE : ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS DOS LOTEAMENTOS RECANTO DOS PÁSSAROS I E II
ADVOGADOS : JOSÉ ROBERTO PIRAJÁ RAMOS NOVAES - SP146429
ANDREA FELICI VIOTTO E OUTRO(S) - SP183027
RECORRIDO : MONICA DE ALMEIDA ROCHA
ADVOGADO : MAGDA APARECIDA PIEDADE E OUTRO(S) - SP092976
INTERES. : ANTHONY WONG
ADVOGADO : CÉSAR CRUZ GARCIA - SP146364
EMENTA RECURSO ESPECIAL -
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM
AÇÃO DE COBRANÇA POR DESPESAS DE MANUTENÇÃO E
MELHORIAS DE LOTEAMENTO - PRETENSÃO DE PENHORA
DO ÚNICO BEM DE PROPRIEDADE DA EXECUTADA SOB A
ALEGAÇÃO DE TRATAR-SE DE IMÓVEL DE LUXO (ALTO
VALOR) - TRIBUNAL A QUO QUE MANTEVE O
INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE PENHORA DA UNIDADE
HABITACIONAL INDIVIDUAL ANTE O NÃO ENQUADRAMENTO
NAS HIPÓTESES DE EXCEÇÃO À ALUDIDA GARANTIA
(IMPENHORABILIDADE).
IRRESIGNAÇÃO DO EXEQUENTE.
Hipótese: Controvérsia envolvendo a possibilidade de
reinterpretação do instituto da impenhorabilidade do bem de
família com vistas a alargar as hipóteses limitadas, restritas e
específicas de penhorabilidade descritas na legislação própria,
ante a arguição de que o imóvel é considerado de alto valor.
1. O bem de família obrigatório está disciplinado na Lei nº
8.009/90 e surgiu com o objetivo de proteger a habitação da
família, considerada, pela Constituição Brasileira, elemento
nuclear da sociedade.
2. Em virtude do princípio da especificidade "lex specialis
derogat legi generali", prevalece a norma especial sobre a geral,
motivo pelo qual, em virtude do instituto do bem de família ter sido
especificamente tratado pelo referido ordenamento normativo, é
imprescindível, tal como determinado no próprio diploma regedor,
interpretar o trecho constante do caput do artigo 1º "salvo nas
hipóteses previstas nesta lei", de forma limitada.
Por essa razão,
o entendimento do STJ é pacífico no sentido de que às ressalvas
à impenhorabilidade ao bem de família obrigatório, é sempre
conferida interpretação literal e restritiva. Precedentes.
3. A lei não prevê qualquer restrição à garantia do imóvel como
bem de família relativamente ao seu valor, tampouco estabelece
regime jurídico distinto no que tange à impenhorabilidade, ou seja,
os imóveis residenciais de alto padrão ou de luxo não estão excluídos, em razão do seu valor econômico, da proteção
conferida aos bens de família consoante os ditames da Lei
8009/90.
4. O momento evolutivo da sociedade brasileira tem sido
delineado de longa data no intuito de salvaguardar e elastecer o
direito à impenhorabilidade ao bem de família, de forma a ampliar
o conceito e não de restringi-lo, tomando como base a
hermenêutica jurídica que procura extrair a real pretensão do
legislador e, em última análise, a própria intenção da sociedade
relativamente às regras e exceções aos direitos garantidos, tendo
sempre em mente que a execução de crédito se realiza de modo
menos gravoso ao devedor consoante estabelece o artigo 620 do
CPC/73, atual 805 no NCPC.
5. A variável concernente ao valor do bem, seja perante o
mercado imobiliário, o Fisco, ou ainda, com amparo na
subjetividade do julgador, não afasta a razão preponderante
justificadora da garantia de impenhorabilidade concebida pelo
legislador pelo regime da Lei nº 8.009/90, qual seja, proteger a
família, garantindo-lhe o patrimônio mínimo para sua residência.
6. Na hipótese, não se afigura viável que, para a satisfação do
crédito, o exequente promova a penhora, total, parcial ou de
percentual sobre o preço do único imóvel residencial no qual
comprovadamente reside a executada e sua família, pois
além da lei 8009/90 não ter previsto ressalva ou regime jurídico
distinto em razão do valor econômico do bem, questões afetas ao
que é considerado luxo, grandiosidade, alto valor estão no campo
nebuloso da subjetividade e da ausência de parâmetro legal ou
margem de valoração.
7. Recurso especial desprovido.
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, após
o voto-vista do Sr. Ministro Marco Buzzi negando provimento ao recurso especial,
divergindo do relator, e o voto do Sr. Ministro Raul Araújo acompanhando a divergência,
e o voto da Sr. Ministra Maria Isabel Gallotti acompanhando o relator, e o voto do Sr.
Ministro Antonio Carlos Ferreira acompanhando a divergência, por maioria, negar
provimento ao recurso especial, nos termos do voto divergente do Ministro Marco Buzzi.
Vencidos o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão (relator) e a Ministra Maria Isabel
Gallotti.
Votaram com o Sr. Ministro Marco Buzzi os Srs. Ministros Raul Araújo e Antonio
Carlos Ferreira.
Brasília (DF),
27 de setembro de 2016 (Data do Julgamento)
MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
Presidente
MINISTRO MARCO BUZZI
Relator
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