segunda-feira, 2 de maio de 2011

Juiz da 6ª vara Federal Campina Grande/PB afirma que não se pode admitir que um advogado receba honorários contratuais e sucumbenciais

Honorários

Semana passada, Migalhas divulgou a decisão do juiz Federal Francisco Eduardo Guimarães Farias, da 6ª vara de Campina Grande/PB, segundo a qual um advogado não poderia receber "honorários contratuais e sucumbenciais, em prejuízo do direito da parte que representa" (Migalhas 2.616 - clique aqui). A referida decisão repercutiu entre os leitores(clique aqui). Hoje, o magistrado migalheiro assina artigo com o objetivo de fomentar o debate sobre tema que, segundo ele, precisa ser melhor analisado e regulado. (Clique aqui)

Honorários
Juiz da 6ª vara Federal Campina Grande/PB afirma que não se pode admitir que um advogado receba honorários contratuais e sucumbenciais
O juiz Federal Francisco Eduardo Guimarães Farias, da 6ª vara Federal de Campina Grande/PB, diz em decisão que considera inadmissível que um advogado receba "honorários contratuais e sucumbenciais, em prejuízo do direito da parte que representa", pois o fato "representaria frontal violação aos direitos constitucionais do jurisdicionado".
O magistradao afirma que as regras do Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94 - clique aquiforam introduzidas, "por força do lobby dos advogados" junto ao Congresso Nacional. Ele comenta ainda que algumas regras são "surpreendentes, senão intrigantes, no que concerne ao destino a ser dado aos honorários sucumbenciais."

  • Processo : 00359616619004058201
Clique aqui para conferir a decisão na íntegra.
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O entendimento do nobre MM Juiz Federal prolator da decisão de fl. 254 acerca do percentual de honorários contratuais no percentual de 20% não coaduna com o deste Juízo, conforme adiante passo a explanar. 
Com a edição do novo Estatuto da Advocacia e da OAB, Lei nº 8.906, de 4 de abril de 1994, foram introduzidas, por força do lobby dos advogados junto ao Congresso Nacional, algumas regras surpreendentes, senão intrigantes, no que concerne ao destino a ser dado aos honorários sucumbenciais.
Até então, era matéria pacífica e fora de qualquer dúvida ou discussão, seja nos textos das leis, na doutrina ou na jurisprudência, que os honorários sucumbenciais pertenciam à parte vencedora da demanda judicial a título de indenização por haver tido que contratar serviços de um profissional que tivesse habilitação para intermediar seu pleito em juízo. 
Com aquelas alterações introduzidas com o novo Estatuto dos Advogados, os advogados fizeram constar em texto de lei que os honorários sucumbenciais também lhes seriam devidos, a título pessoal e direto, como direito seu, mesmo que tivessem já recebido os honorários contratuais. 
As novas regras, com essa interpretação, carregam gritante inconstitucionalidade, pois importam em minimizar, amesquinhar o direito do cidadão que, por lei, precisa valer-se o Poder Judiciário para fazer valer os seus direitos e, para tanto, precisa fazer uso dos serviços profissionais de quem detém a chamada capacidade postulatória, o advogado. 
É inadmissível que o jurisdicionado somente possa, mesmo tendo absoluto sucesso em uma demanda judicial, ver reconstituído o seu direito (diga-se, o seu patrimônio) até o limite de 80% do valor originário, porque 20% dele passa a ser apropriado pelo advogado pelo só fato de haver intermediado judicialmente a realização material desse direito. Caso esse fosse o entendimento aceite para a compreensão das novas regras, estaríamos diante de uma lei que reduz o direito do cidadão, ao qual o ordenamento jurídico impõe a necessidade inafastável de demandar judicialmente através de advogados. 
É bem verdade que é no próprio texto constitucional que se encontra, também por lobby de advogados, inserida esta imposição ao jurisdicionado de demandar por intermédio de causídicos, posto que lá se fez constar que "o advogado é indispensável à administração da justiça" (art. 133, da CF/88).
Contudo não se pode perder de vista que é essa mesma Constituição que reuniu a mais ampla tábua de direitos fundamentais de que se tem notícia no direito constitucional brasileiro, na tentativa de promover o resgate da cidadania, ao mesmo tempo em que prometia o resgate da democracia. 

As idéias de cidadania e democracia não podem conviver com a idéia de direitos truncados, pela metade, de meio-cidadãos, que jamais poderiam ver seu direito integralmente satisfeito por meio dos instrumentos que a própria lei lhe oferece e impõe.
Uma situação como essa não pode ser compatível com a idéia de cidadania plena (art. 5º, caput, da CF/88), não pode ser compatível com a proteção constitucional ao direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII, da CF/88), não pode ser compatível com o direito ao devido processo legal (art. 5º, inciso XXXV, da CF/88), não pode ser compatível com o direito adquirido (art. 5º, inciso XXXVI, da CF/88).

Deveras, se o caput do art. 5º da Carta de 1988 estabelece a "inviolabilidade do direito ... à propriedade", não pode a lei violar tal direito de forma tão flagrante, amesquinhando a própria cidadania e fazendo tábua rasa dos direitos constitucionalmente assegurados.
As inovações introduzidas pelo novo Estatuto dos Advogados foram já questionadas perante a Suprema Corte, quanto a sua constitucionalidade, mediante a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.194-4/DF, promovida pela Confederação Nacional da Indústria.
No julgamento dessa ADI, os Ministros MARCO AURÉLIO, CESAR PELUSO e GILMAR MENDES proferiram voto no sentido de que os honorários de sucumbência, a teor do disposto no art. 20 do CPC, são devidos à parte vencedora, e de que o direcionamento, ao advogado, da verba honorária destinada, por natureza, a compensar o dano causado àquele que teve o ônus próprio de ir ao Judiciário para ter sua razão reconhecida, implica indevido desfalque do patrimônio deste, violando o art. 5º, XXXV, da CF. 
Nesse mesmo sentido doutrinaram os Juízes Federais ERIVALDO RIBEIRO DOS SANTOS e JOSÉ JÁCOMO GIMENES, em artigo publicado no jornal O Estado do Paraná no mês de maio de 2005, donde se extrai o seguinte trecho:
"Ora, se o honorário de sucumbência pertencer ao advogado, de plano, sem ciência e concordância do cliente, por força dos artigos 22 e 23 do Estatuto da Advocacia, a parte vencedora no processo fica automaticamente sem compensação pelo valor que pagou a seu advogado, a título de honorário contratual. Apesar de vencedor no processo judicial, não será reparado integralmente. Não haverá justa reparação. O Estatuto da Advocacia encurta o direito da parte vencedora do processo judicial".
Embora a interpretação que comumente se tem dado aos arts. 21, 22 e 23 do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994) seja assim gritantemente inconstitucional, entendo, todavia, ser possível compatibilizá-los com as exigências superiores da Constituição. Entendo, pois, ser possível a interpretação desses dispositivos legais em conformidade com a Constituição. Para que tais dispositivos não sejam entendidos como uma invasão ao direito ou ao patrimônio do cidadão é preciso entendê-los como uma faculdade que se dá ao profissional do Direito de escolher ser remunerado diretamente pela parte que o contrata ou, alternativamente, só pelos honorários sucumbenciais. É dizer: o advogado pode escolher ser remunerado por honorários contratuais, logo ao início ou até o término do processo, caso em que a verba sucumbencial seria recebida pela parte como reparação pelas despesas feitas com o pagamento dos honorários contratuais a seu patrono; ou pode o advogado optar por ser remunerado somente pela verba sucumbencial, sem firmar contrato de honorários com seu cliente, que não estaria perdendo qualquer parte de seu direito para efetuar pagamentos ao profissional; uma terceira possibilidade, também compatível com a Constituição, seria entender como devida ao advogado a parte dos honorários sucumbenciais que supere o valor do dispêndio efetuado pela parte com o pagamento dos honorários contratuais.
Também entendo que não seria inconstitucional a contratação de honorários até o limite de 20% do valor devido à parte, ainda que esses 20% possam representar valor superior ao valor da verba sucumbencial devida à parte. 
O que não se pode admitir é o advogado receber honorários contratuais e sucumbenciais, em prejuízo do direito da parte que representa. Isso representaria frontal violação aos direitos constitucionais do jurisdicionado.
Com estas considerações, determino que os honorários pretendidos pelo patrono da causa (contratuais e sucumbenciais) fiquem limitados a 20% (vinte por cento) do valor que cabe ao exeqüente, devendo ser descontado dos honorários contratuais, contudo, o valor correspondente à verba sucumbencial (10%), para que essa quantia seja paga ao exequente.
A Secretaria refaça os requisitórios nos termos daqueles expedidos às fls. 239/250.
Após o trânsito em julgado desta decisão, certifique-se e requisitem-se os pagamentos, observando a presente decisão. 

Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.
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Esta matéria foi colocada no ar originalmente em 26 de abril de 2011.
ISSN 1983-392X
 

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