Fevereiro de 2025
RD 0007048-97.2024.2.00.0000, Relator: Conselheiro Mauro Campbell Marques, julgado na 1ª Sessão Ordinária em 11 de fevereiro de 2025.
Medida Liminar
Indícios de decisão prolatada com desvio de função em favor de advogada, de recebimento
de valores indevidos e de patrimônio incompatível com os rendimentos justificam o
afastamento imediato do magistrado.
O juiz liberou valores indevidos na conta bancária de advogada, mesmo ciente de possível fraude na
documentação que embasou a ação de execução de título extrajudicial.
A advogada havia ajuizado a ação por uma suposta confissão de dívida em desfavor de um idoso aposentado.
O idoso manejou recurso de apelação em embargos à execução, ao qual foi concedido efeito
suspensivo ao bloqueio de valores em suas contas.
Em seguida, a decisão foi reconsiderada e, antes mesmo de ser publicada, a advogada requereu, em
nome do suposto exequente, a imediata liberação dos valores bloqueados com transferência para a conta bancária de sua sociedade individual de advocacia.
Estranhamente, o desembargador que revogou o efeito suspensivo registrou a possibilidade de fraude
na ação de execução de título extrajudicial, porém autorizou o pagamento.
Também é estranha a proximidade do juiz requerido e o esposo da advogada, que também é
magistrado. Os dois juízes mantiveram uma conta bancária conjunta por cerca de 3 anos. E ainda, figuravam
num mesmo grupo de WhatsApp, chamado "Amigos", cujas mensagens foram todas apagadas.
Os elementos de convicção, compartilhados pelo STF, foram obtidos por meio de medidas cautelares de busca e apreensão, quebra de sigilo bancário, fiscal e de dados. Esses elementos apontam para desvio de função e possível envolvimento do juiz em esquema de venda de decisões judiciais.
A análise patrimonial do magistrado apresenta patrimônio subdeclarado ao fisco, de valor
desproporcional com os rendimentos licitamente auferidos.
As informações evidenciam postura habitual e permanente do juiz em proferir decisões em favor de
advogados com os quais mantinha proximidade e dos quais, possivelmente, recebeu vantagens indevidas.
O afastamento cautelar do magistrado é uma exceção. No entanto, o Corregedor Nacional de Justiça
pode determinar medidas que se mostrem necessárias, urgentes ou adequadas para o regular desempenho de
suas funções - art. 8º, IV, do Regimento Interno do CNJ.
Dentro de tais medidas, insere-se a decisão de afastar, de imediato, o magistrado investigado devido
ao risco de continuidade infracional.
O art. 15, parágrafo primeiro, da Resolução CNJ nº 135/2011 também autoriza o exercício do poder
geral de cautela pelo Corregedor Nacional para assegurar o resultado útil das apurações e impedir que o
magistrado interfira na análise dos eventos correicionais ou elimine provas.
As condutas consideradas graves que autorizam o afastamento cautelar são as que comprometem as
atividades jurisdicionais, bem como as que podem desonrar a imagem do Judiciário.
A finalidade não é intimidar ou punir, mas paralisar comportamentos danosos ou impedir que sedesencadeiem, além de garantir a observância dos princípios previstos no art. 37 da Constituição Federal.
Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário do CNJ, por unanimidade, ratificou a liminar
de afastamento imediato do magistrado das funções, concedida pelo Corregedor Nacional.
Ementa |
RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. JUIZ DE DIREITO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. INDÍCIOS ROBUSTOS DE DECISÃO PROLATADA COM DESVIO DE FUNÇÃO EM FAVOR DE ADVOGADA, ESPOSA DE MAGISTRADO, COM A POSSÍVEL INTERVENÇÃO DE ADVOGADO, FILHO DE DESEMBARGADOR. INDÍCIOS DE PROVÁVEL RECEBIMENTO DE VANTAGEM INDEVIDA. PATRIMÔNIO APARENTEMENTE INCOMPATÍVEL COM OS RENDIMENTOS LICITAMENTE AUFERIDOS. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO CAUTELAR. RATIFICAÇÃO DE DECISÃO LIMINAR. 1. Os elementos de convicção compartilhados pelo Supremo Tribunal Federal revelaram que o magistrado reclamado, muito possivelmente, proferiu decisão com desvio de função, em favor de advogada que, por sua vez, era esposa de outro magistrado da mesma corte estadual, com o qual o reclamado manteve conta conjunta em momento pretérito. 2. Ambos os magistrados, inclusive, figuravam em um grupo de mensagens denominado “amigos”, cujas conversas foram sistematicamente apagadas, do qual também fazia parte advogado filho de desembargador do mesmo sodalício. Estranha proximidade entre o reclamado e o aludido advogado, a indicar possível atuação com desvio de função. 3. Indícios relevantes de recebimento de vantagem indevida para a prolação de decisões judiciais. Patrimônio subdeclarado ao fisco, incluindo-se fazenda e aeronave, em aparente dissonância com os rendimentos licitamente auferidos pelo reclamado. 4. Necessidade de afastamento cautelar, ratificada pela recente atuação em processos dos quais participaram advogado filho de desembargador, com o qual o reclamado mantinha notável proximidade. 5. Liminar ratificada. |
Certidão de Julgamento (*) |
O Conselho, por unanimidade, ratificou a liminar, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 11 de fevereiro de 2025. |
Inform. Complement.: | |||
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Referências Legislativas | |
ANO:1988 CF ART:103 LET:B PAR:4° INC:III LCP-35 ANO:1979 ART:27 PAR:3° LEI-9.784 ANO:1999 LEI-13105 ANO:2015 ART:1.021 PAR:2° DEC-LEI-2.848 ANO:1940 ART:109 REGI ART:8° INC:IV ART:82 ORGAO:'CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA' RESOL-135 ANO:2011 ART:24 ORGAO:'CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA' |
Precedentes Citados |
STF Classe: ADI - Processo: 4709/DF - Relator: Min. Rosa Weber |
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