PARABÉNS DES. ROGÉRIO DE OLIVEIRA SOUZA
BOSQUE DOS ESQUILOS NÃO É CONDOMÍNIO
NÃO PODE IMPOR COBRANÇAS COERCITIVAS
NÃO BASTA FIXAR UM OUTDOOR PARA "CRIAR CONDOMÍNIO" O Bosque dos Esquilos (gleba B) foi criado pela empresa RSP em 1984, em pleno vigor da lei 4591/64 |
Sob qualquer enfoque que se examine a matéria, não
existe razão - fática ou jurídica - para a Apelada impor qualquer obrigação pecuniária em desfavor do Apelante, sob pena – aí sim – de propiciar enriquecimento indevido daquela, em detrimento deste.
Tais contribuições, mister que se esclareça, carecem de
um simples requisito para sua validação: a necessária e voluntária
associação. A se entender diferente, não estaria longe o dia em que nos veríamos sendo cobrados pela “associação de taxistas do fórum” porque simplesmente mantém ponto próximo propiciando segurança e rapidez. Ou deveríamos ainda contribuir para a “associação dos ascensoristas de elevadores da cidade do Rio de Janeiro” porque prestam serviço de qualidade ao nos transportar de um andar para o outro.
Não.
Apenas no caso de associação voluntária à determinada
entidade, pode se estar exigir o pagamento
dos encargos sociais do associado.DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA -
Julgamento: 14/01/2014 - VIGESIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL
APELAÇÃO CÍVEL 0032463-46.2012.8.19.0203
Apelantes: VALERIA THIRÉ e MARCELO DE VASCONCELOS
CRUZ
Apelado: ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS E MORADORES
DO BOSQUE DOS ESQUILOS – GLEBA C
RELATOR: DESEMBARGADOR ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE COTA DE MANUTENÇÃO E CONSERVAÇÃO DE LOTEAMENTO IMOBILIÁRIO URBANO. PROPRIETÁRIO NÃO ASSOCIADO. COTAS "CONDOMINIAIS" OU "ASSOCIATIVAS". CONDOMÍNIO ATÍPICO OU DE FATO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA LEGAL E DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO (CF, 5O, II E XX). PRIVATIZAÇÃO INDEVIDA DO ESPAÇO PÚBLICO. OBRIGAÇÃO PESSOAL E NÃO REAL. PRESCRIÇÃO.
Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei, não podendo ser compelido a se associar a entidade privada. Associação de moradores não tem nenhum direito de crédito em face de morador que não se associou.
Serviços de segurança, limpeza e conservação que cabem ao Poder Público prestar como obrigação constitucional de sua razão de ser.
Privatização dos espaços públicos por entidade privada.
Imposição de obrigação ao particular de pagar duplamente pelos mesmos serviços, para os quais já contribui através de impostos e taxas.
Relação jurídica que não se confunde com a obrigação condominial, na qual as áreas comuns integram a fração ideal do imóvel do condômino e, muito menos, com a obrigação tributária, cujo fundamento é o dever de constitucional de contribuir para a manutenção do Estado e dos serviços públicos.
Livre associação e livre desvinculação associativa.
Diante do reconhecimento da impossibilidade de associação compulsória, que afasta a pretensão de cobrança, encontra-se prejudicada a análise da ocorrência de prescrição. Conhecimento e provimento do recurso.
INTEIRO TEOR Íntegra do Acórdão clique aqui - Data de Julgamento: 14/01/2014 (*) Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro TRIBUNAL DE JUSTIÇA 22ª CÂMARA CÍVEL ============================================== APELAÇÃO CÍVEL 0032463-46.2012.8.19.0203 Apelantes: VALERIA THIRÉ e MARCELO DE VASCONCELOS CRUZ Apelado: ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS E MORADORES DO BOSQUE DOS ESQUILOS – GLEBA C RELATOR: DESEMBARGADOR ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA
A C Ó R D Ã O
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO
DE COBRANÇA DE COTA DE MANUTENÇÃO E
CONSERVAÇÃO DE LOTEAMENTO IMOBILIÁRIO
URBANO. PROPRIETÁRIO NÃO ASSOCIADO. COTAS
“CONDOMINIAIS” OU “ASSOCIATIVAS”. CONDOMÍNIO
ATÍPICO OU DE FATO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
RESERVA LEGAL E DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO
(CF, 5, II E XX). PRIVATIZAÇÃO INDEVIDA DO ESPAÇO
PÚBLICO. OBRIGAÇÃO PESSOAL E NÃO REAL.
PRESCRIÇÃO. Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa senão em virtude da lei, não podendo ser
compelido a se associar a entidade privada. Associação de
moradores não tem nenhum direito de crédito em face de
morador que não se associou. Serviços de segurança,
limpeza e conservação que cabem ao Poder Público prestar
como obrigação constitucional de sua razão de ser.
Privatização dos espaços públicos por entidade privada.
Imposição de obrigação ao particular de pagar duplamente
pelos mesmos serviços, para os quais já contribui através de
impostos e taxas. Relação jurídica que não se confunde com
a obrigação condominial, na qual as áreas comuns integram a
fração ideal do imóvel do condômino e, muito menos, com a
obrigação tributária, cujo fundamento é o dever de
constitucional de contribuir para a manutenção do Estado e
dos serviços públicos. Livre associação e livre desvinculação
associativa. Diante do reconhecimento da impossibilidade de
associação compulsória, que afasta a pretensão de cobrança,
encontra-se prejudicada a análise da ocorrência de
prescrição. Conhecimento e provimento do recurso.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 0032463-46.2012.8.19.0203 em que são apelantes
VALERIA THIRÉ e MARCELO DE VASCONCELOS CRUZ e apelado ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS E MORADORES DO BOSQUE DOS ESQUILOS – GLEBA C.
ACORDAM os Desembargadores da 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por
maioria, em CONHECER O RECURSO e DAR-LHE PROVIMENTO, na forma do voto do Desembargador Relator.
Trata-se de ação proposta pela ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS E MORADORES DO BOSQUE DOS ESQUILOS – GLEBA C em face de VALERIA THIRÉ e MARCELO DE VASCONCELOS CRUZ objetivando a cobrança de despesas e contribuições associativas sob o fundamento de que os réus são
proprietários de imóvel localizado em sua área de atuação, encontrando-se inadimplente no que se refere aos meses vencidos a partir de agosto de 2003, que somavam ao tempo da propositura da ação o valor de R$25.465,80, buscando, desta forma, o recebimento das prestações devidamente corrigidas e acrescidas de juros de mora.
O pedido foi julgado, consoante o seguinte dispositivo:
“...JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, condenando os réus a pagarem à
autora o valor de R$ 25.465,80 (vinte e cinco mil quatrocentos e sessenta e
cinco reais e oitenta centavos), referente às cotas associativas vencidas
entre agosto/2003 a julho/2012, bem como as cotas vencidas no curso do
processo e as que se vencerem até o efetivo pagamento, na forma do art.
290 do Código de Processo Civil, devidamente corrigidas e com juros de
mora de 1%( um por cento) a contar do vencimento de cada cota...”
Inconformado, recorreram os autores, postulando a
reforma da sentença, defendendo a liberdade de associação, não
podendo, pois, exigir-se de proprietário não associado, o pagamento
de cotas condominiais e a ocorrência de prescrição. (peça digitalizada
00683)
Contrarrazões digitalizada na peça 00723.
O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes
seus requisitos de admissibilidade.
De início, não se conhece do agravo retido oposto pelo
réu, ora Apelante (peça digitalizada 00638), da decisão que indeferiu a
produção de prova oral (peça digitalizada 00634) em razão do mesmo
não ter sido reiterado nesta sede.
A controvérsia recursal cinge-se a perquirir sobre a
possibilidade de associações de moradores imporem e cobrarem
contribuições de todo e qualquer morador que reside na área de sua
atuação, ainda quando não tenham a ela se associado
voluntariamente.
Cumpre afirmar que o conflito entre o princípio
constitucional da LIVRE ASSOCIAÇÃO e do princípio de direito que
veda o enriquecimento sem causa é apenas aparente, não servindo
para a solução do problema.
A Constituição Federal assegura que “ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
lei” (artigo 5o
, II), asseverando ainda que “ninguém poderá ser
compelido a associar-se ou permanecer associado” (artigo 5o
, XX).
Vigora em plenitude absoluta o Princípio da Liberdade,
da liberdade perante a lei.
As associações privadas não têm nenhum poder e
nenhum direito de exigir que o particular se associe aos seus quadros
e seja compelido a pagar suas contribuições.
Repita-se: não existindo lei que imponha a associação
do particular a uma entidade privada, carece esta de qualquer direito
em face do daquele e, muito menos, de obter qualquer contribuição.
O estatuto da associação particular não tem o poder
jurídico de criar a adesão tão somente pelo fator objetivo de imóvel do
particular se situar dentro da área territorial escolhida aleatoriamente
como sendo de sua própria atuação associativa.
Esta obrigação pecuniária não pode decorrer da
condição de proprietário, mas apenas de associado, se neste sentido
manifestou sua vontade.
Normalmente tais associações buscam prestar
“serviços”, de natureza essencialmente pública, a determinada
localidade residencial, especialmente aqueles destinados a segurança
pública.
Contudo, verifica-se que tais “serviços” são próprios do
Poder Público ou de qualquer pessoa, seja natural ou jurídica, não se
revelando a necessidade e imprescindibilidade de sua prestação.
A conservação e reparação das áreas públicas, mas
indevidamente delimitadas com de sendo de uso comum, devem
caber ao Poder Público e à sociedade como um todo e não a um
determinado número de residentes da localidade.
Assim, a obrigação legal do Apelante é para com o
condomínio legal (porque as áreas lhe são comuns, integrando a
fração ideal de seu imóvel particular) ou para com o Poder Público
(em razão da relação tributária).
Quanto a estas obrigações, o proprietário não pode,
válida e legalmente, se afastar, sob pena de ser-lhe exigido
judicialmente o seu cumprimento.
Se, por ventura, o proprietário não associado, vem direta
ou indiretamente, a se beneficiar deste ou daquele serviço, tal
situação de fato não tem o condão de criar obrigação jurídica,
judicialmente exigível.
Ao resolverem constituir a associação de moradores,
seus fundadores certamente tiveram ciência de que muitos não iriam
aderir ao projeto, devendo aqueles entusiastas suportar por si o
empreendimento.
Sob qualquer enfoque que se examine a matéria, não
existe razão - fática ou jurídica - para a Apelada impor qualquer
obrigação pecuniária em desfavor do Apelante, sob pena – aí sim – de
propiciar enriquecimento indevido daquela, em detrimento deste.
Tais contribuições, mister que se esclareça, carecem de
um simples requisito para sua validação: a necessária e voluntária
associação.
A se entender diferente, não estaria longe o dia em que
nos veríamos sendo cobrados pela “associação de taxistas do fórum”
porque simplesmente mantém ponto próximo propiciando segurança e
rapidez. Ou deveríamos ainda contribuir para a “associação dos
ascensoristas de elevadores da cidade do Rio de Janeiro” porque
prestam serviço de qualidade ao nos transportar de um andar para o
outro.
Não.
Apenas no caso de associação voluntária à determinada
entidade, pode se estar exigir o pagamento dos encargos sociais do
associado.
E, no caso, não há qualquer prova no sentido do
Apelado ter aderido voluntariamente à associação, de forma a ser
compelido a pagar as referidas contribuições.
Por certo, não pode o morador de determinada rua, pelo
simples fato de residir no local, ser obrigado a associar-se a
determinado grupo que, sem legitimidade, dispõe-se a representar os
moradores da região.
A situação é mais ilegal ainda quando a associação
pretende prestar serviços que são de responsabilidade do Estado.
O mesmo enfoque já havia sido veiculado na Apelação
Cível 1994.08920, do extinto Tribunal de Alçada Cível, da lavra do
Eminente Desembargador JAIR PONTES DE ALMEIDA:
“Associação de moradores. Ninguém será compelido a se associar ou
a permanecer associado, nem será obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa, senão em virtude de lei. Associações de
moradores, de proprietários ou de amigos de determinado logradouro
público só se constituem com aqueles que a elas aderem
voluntariamente”.
Por último, a legitimação que o Poder Judiciário vem
outorgando a tais associações, está lançando as sementes para um
problema futuro que as grandes metrópoles certamente terão que
enfrentar: é a tomada de tais associações por motes de delinqüentes
locais (como já ocorre em diversas associações de favelas), impondo
a lei do terror àquele que ousar discordar ou resistir em “contribuir”
para os serviços de proteção.
É a volta a épocas passadas em que o particular tinha
que pagar para não ser atacado no recanto de seu lar, diante da
ausência do Poder Público e do arbítrio do Poder Paralelo.
Tal situação absurda fomenta a conduta ilícita do Estado,
que não presta o serviço a que está obrigado constitucionalmente,
mas recebe o excessivo tributo, bem como autoriza a cobrança de
eventual “contribuição” imposta pelo grupo que se apossou de umas
poucas ruas da vizinhança, colocou duas ou três cancelas ilegais nas
extremidades e passou a se servir do medo que ela própria fez nascer
no morador.
Não se pode afastar o Direito da realidade social,
porquanto é o primeiro que serve à última, e não o contrário.
Ao invés de privatizar as obrigações do Estado, a
Sociedade deve exigir que o Estado cumpra com suas obrigações,
para as quais recebe grande parte da riqueza produzida por esta
mesma Sociedade.
Comungando deste mesmo posicionamento, decidiu o
Supremo Tribunal Federal, reconhecendo, inclusive, a repercussão
geral da matéria:
Comungando deste mesmo posicionamento, decidiu o
Supremo Tribunal Federal, reconhecendo, inclusive, a repercussão
geral da matéria:
DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE COBRANÇA
DE TAXAS DE MANUTENÇAO E CONSERVAÇÃO DE
ÁREA DE LOTEAMENTO. DISCUSSÃO ACERCA DO
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE
ASSOCIAÇÃO. MATÉRIA PASSÍVEL DE REPETIÇÃO EM
INÚMEROS PROCESSOS, A REPERCUTIR NA ESFERA
DE INTERESSE DE MILHARES DE PESSOAS.
PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL. (AI 745831
RG, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em
20/10/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe- 226
DIVULG 28-11-2011 PUBLIC 29-11-2011)
RE 432106 / RJ - RIO DE JANEIRO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES – MENSALIDADE –
AUSÊNCIA DE ADESÃO. Por não se confundir a
associação de moradores com o condomínio disciplinado
pela Lei nº 4.591/64, descabe, a pretexto de evitar
vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a
proprietário de imóvel que a ela não tenha aderido.
Considerações sobre o princípio da legalidade e da
autonomia da manifestação de vontade – artigo 5º, incisos
II e XX, da Constituição Federal. Relator: Min. MARCO
AURÉLIO Julgamento: 20/09/2011 Órgão Julgador:
Primeira Turma Publicação DJe-210 DIVULG
03-11-2011 PUBLIC 04-11-2011).
Ainda que a questão constitucional tenha enfrentado
soluções diversas nos Tribunais de todo o País, não mais se admite,
segundo o regime jurídico processual atual (CPC, 543-B) que trata
dos recursos repetitivos, conclusão diversa daquela a que chegou a
Suprema Corte quanto à inconstitucionalidade de se exigir o
pagamento de quem não se associou voluntariamente.
Por fim, diante da impossibilidade de associação
compulsória reconhecida nos termos da fundamentação supra, que
afasta a pretensão de cobrança, encontra-se prejudicada a análise da
ocorrência de prescrição.
Do exposto, conheço o recurso e dou-lhe provimento
para reformar a sentença, no sentido de julgar improcedente o
pedido deduzido na petição inicial da ação de cobrança,
suportando o Apelado (Autor) as despesas do processo e a verba
honorária de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído a causa.
Rio de Janeiro, 14 de janeiro de 2014.
Rogerio de Oliveira Souza
Desembargador Redator
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