"À custa da moradia de uns, o deleite de outros : essa é a conseqüência futura de um raciocínio menos atento à questão social presente.
Em sentença primorosa Juiz de Niteroi - RJ -RECHAÇA a SUMULA 79 do TJ RJe garante a LIBERDADE e oESTADO DEMOCRATICO DE DIREITO.não pode este Magistrado deixar de salientar sua enorme preocupação com a proliferação de ´associações de moradores´ que vem sendo criadas para, ao argumento de haver omissão, substituir o Poder Público nas atividades inerentes a ele, obrigando os moradores a contribuírem com cotas associativas às quais não concordam pagar. A fim de não me aprofundar demais sobre o tema, vale a transcrição do recente e brilhante acórdão da lavra do eminente Des. Rogério de Oliveira Souza que com enorme coragem e contrariando a jurisprudência majoritária desta Corte Estadual e se utilizando de uma visão social e moderna, aquela que se espera do julgador contemporâneo, muito bem elucidou questão semelhante a esta debatida nos presentes autos e com a qual me filio integralmente: ´... Sendo assim, a questão refere-se ao direito de associações de moradores imporem e cobrarem contribuições de todo e qualquer morador que reside na área de sua atuação, fato que vem causando ferrenhas batalhas nas grandes cidades do país e, especialmente, na Cidade do Rio de Janeiro, já tomando as páginas policiais dos jornais. O entrechoque do princípio constitucional da LIVRE ASSOCIAÇÃO e do princípio de direito que veda o enriquecimento sem causa é falso, não servindo para a solução do problema. A Constituição Federal assegura que ´ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei´ (artigo 5o, II), asseverando ainda que ´ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado´ (artigo 5o, XX). Vigora em plenitude absoluta o Princípio da Liberdade, da liberdade perante a lei. As associações privadas não têm nenhum poder e nenhum direito de exigir que o particular se associe aos seus quadros e seja compelido a pagar suas contribuições. Repita-se: não existindo lei que imponha a associação do particular a uma entidade privada, carece esta de qualquer direito em face do particular e, muito menos, de obter qualquer contribuição de sua parte. O Apelado pretende prestar os ´serviços´ arrolados no Inciso III do Estatuto, dentre eles ´coordenar idéias, sugestões e programas que resultem em benefício da comunidade e de seus associados, ligados às áreas de segurança patrimonial, trânsito, iluminação, limpeza, saneamento, urbanização, meio ambiente, cultura e outras afins´ (fls. 16). Verifica-se que tais ´serviços´ são próprios do Poder Público ou de qualquer pessoa, seja natural ou jurídica, não se revelando a necessidade e imprescindibilidade do Apelado em prol dos Apelantes. A obrigação legal dos Apelados seria para com o condomínio local, caso seu imóvel integrasse a estrutura edilícia comum ou para com o Poder Público. Destas obrigações, não podem os Apelantes válida e legalmente se afastarem, sob pena de serem perseguidos judicialmente para o seu cumprimento. Se, por ventura, o proprietário tal ou qual, não associado, vem direta ou indiretamente, a se beneficiar deste ou daquele serviço, tal situação de fato não tem o condão de criar obrigação jurídica, judicialmente exigível, porquanto insuscetível de violação da liberdade individual de contratar. Ao resolverem constituir a associação de moradores, seus fundadores certamente tiveram ciência de que muitos não iriam aderir ao projeto, devendo aqueles entusiastas suportar por si o empreendimento. Sob qualquer enfoque não existe razão fática ou jurídica para impor ao Apelado qualquer obrigação pecuniária em favor do Apelante, sob pena - aí sim - de propiciar enriquecimento indevido deste às custas daquele. Todas as demais obrigações que o Apelante entende o Apelado se encontrar em falta, carece de um simples requisito para sua validação: a necessária e voluntária associação. A se entender diferente, não estaria longe o dia em que nos veríamos sendo cobrados pela ´associação de taxistas do fórum´ porque simplesmente mantém ponto próximo propiciando segurança e rapidez. Ou deveríamos ainda contribuir para a ´associação dos ascensoristas de elevadores da cidade do Rio de Janeiro´ porque prestam serviço de qualidade ao nos transportar de um andar para o outro. Não apenas no caso de associação voluntária a determinada entidade, pode estar exigir o pagamento dos encargos sociais do associado. Uma associação de moradores, por mais digna e atuante que seja, continua sendo uma associação voluntária. Não pode o morador de determinada rua que, por decisão do grupo dominante na associação, passou a integrar sua área de atuação, seja compelido a contribuir para a sua manutenção. Uma vez fechada uma rua, o Poder Público deixa de conferir a devida proteção policial ao local. O espaço público, de uso comum do povo, perde esta qualidade de fato (embora não de Direito) e é apropriado de forma privada por uns poucos, que passam a exigir verdadeiro ´pedágio´ para que o próprio morador possa transitar. Por último, se persistir o entendimento de que, para evitar o enriquecimento sem causa, devem ser estabelecidas cotas idênticas de contribuição entre os moradores, sejam eles associados ou não, corre-se o risco de legitimar a elitização particular de um logradouro público, expulsando-se dali quem não puder por serviços desnecessários, ou ainda que úteis, dispensáveis. À custa da moradia de uns, o deleite de outros: essa é a conseqüência futura de um raciocínio menos atento à questão social presente. A situação é mais ilegal ainda quando a associação pretende prestar serviços que são de responsabilidade do Estado. Processo No 0004207-42.2007.8.19.0212 | |
2007.212.004104-3 | |
TJ/RJ - 06/09/2011 06:43:10 | |
Regional da Região Oceânica | 1ª Vara Cível |
Cartório da 1ª Vara Cível | |
Endereço: | Estrada Caetano Monteiro próx ao nº 1281 |
Bairro: | Pendotiba |
Cidade: | Niterói |
Tipo do Movimento: | Arquivamento |
Data de arquivamento: | 09/07/2010 |
Tipo de arquivamento: | definitivo |
Maço: | 307 |
Maço recebido pelo arquivo em: | 14/07/2010 |
Local de arquivamento: | Arquivo Geral - Rio de Janeiro |
COMARCA DE NITERÓI JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL - REGIÃO OCEÂNICA Processo nº
2007.212.004104-3 Ação: Declaratória c/c Cobrança Autor: Soprecam - Sociedade Pro-Preservação
Urbanística e Ecológica de Camboinhas Réu: Fernanda Gomes Centeio e Jose Luiz Bragança Motta COMARCA DE NITERÓI JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL - REGIÃO OCEÂNICA Processo nº
2007.212.004104-3 Ação: Declaratória c/c Cobrança Autor: Soprecam - Sociedade Pro-Preservação
Urbanística e Ecológica de Camboinhas Réu: Fernanda Gomes Centeio e Jose Luiz Bragança Motta S E
N T E N Ç A I - RELATÓRIO Trata-se de ação declaratória de existência de relação jurídica cumulada
com cobrança, pelo rito sumário, proposta por Soprecam - Sociedade Pró-Preservação Urbanística e
Ecológica de Camboinhas em face de Fernanda Gomes Centeio e Jose Luiz Bragança Motta, alegando,
em apertada síntese, que presta serviços que beneficiam todos os moradores do bairro de Camboinhas
indistintamente, tais como manutenção do aparelhamento de distribuição de água, conservação e
construção de praças e vias públicas, serviços de segurança, instalação de postes de iluminação do
calçadão da praia e das vias, dentre outros. Sustenta que os réus deixaram de efetuar o pagamento
das cotas associativas fixadas em assembléia, mesmo obtendo o desconto de 15% no pagamento de
fatura de consumo de água por força de contrato firmado entre a autora e a concessionária Águas de
Niterói, concluindo pelo dever de contribuição do réu com o fim de evitar o seu enriquecimento sem
causa. Diante de tais argumentos requereu a procedência dos pedidos a fim de que seja declarada a
existência da relação jurídica entre as partes, bem como a condenação dos réus ao pagamento da
quantia de R$5.069,35 correspondente ao valor das cotas associativas em aberto, além dos demais
consectários legais. Inicial e documentos às fls. 02/64. Audiência de conciliação às fls. 83 ocasião em
que a 1ª ré apresentou contestação (fls. 84/89), acompanhada de documentos, argüindo, inicialmente,
a preliminar de ilegitimidade ativa e passiva, e, no mérito, que não pode ser devedora da autora, pois
não pertence ao seu quadro social. Alega que a autora não está constituída como um condomínio, mas
sim como associação civil sem fins lucrativos. Por fim, sustenta que deve prevalecer o direito
fundamental à liberdade de associação preconizada pelo artigo 5º , incisos II e XX da CR/88, pugnando
pela improcedência dos pedidos. Nova audiência de conciliação às fls. 105/106, ocasião em que o 2º
réu apresentou contestação (fls. 107/110), acompanhada de documentos, alegando que não pode ser
obrigado a associar-se e pagar as referidas cotas, nos termos do art. 5º , XX, da Constituição Federal,
além de que não presta os serviços alegados na inicial, razão pela qual a improcedência se impõe.
Decisão saneadora às fls. 424. Audiência de instrução e julgamento realizada às fls. 428/429 quando
foi colhido o depoimento de uma testemunha arrolada pela parte autora, conforme termo de fls. 430/431
e as partes se manifestaram em alegações finais. É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR. II -
FUNDAMENTAÇÃO As partes discutem nestes autos acerca do direito à liberdade de associação, de
sede constitucional, e da obrigação de contribuição financeira para as atividades desempenhadas pela
associação-autora. Duas são, como já se antecipou, as questões de mérito, havendo, de um lado, a
liberdade de associação e, de outro, a obrigação de contribuir com a associação. O direito à liberdade
de associação é direito fundamental, constitucionalmente protegido e, portanto, intangível. Se a parte ré
não pretende se associar ou se manter associada, ninguém pode lhe obrigar a tanto. De outro lado,
porém, o direito brasileiro jamais agasalhou o enriquecimento sem causa de qualquer sujeito de direito.
O que se verifica dos elementos destes autos é que a parte autora vem prestando serviços no bairro
denominado Camboinhas, porém tais serviços não são suficientes para obrigar o réu a efetuar o
pagamento das contribuições associativas. Com efeito, embora se trate de fenômeno moderno que tem
origem de um lado no crescimento da violência urbana e de outro na inteira inoperância das diversas
esferas do Poder Público brasileiro, certo é que a segurança na localidade é mantida pela guarita da
Policia Militar que fica estabelecida na entrada principal do bairro. Nesse aspecto, aliás, cumpre
destacar que a testemunha ouvida às fls. 430/431 foi expressa em esclarecer que os veículos que
fazem o serviço de ronda para a autora atendem apenas os moradores que são associados da
SOPRECAM e em atendimento às residências que possuem um serviço de alarme que é interligado à
sede da associação. Ora, se o serviço de segurança é fornecido apenas àqueles que são associados,
não se pode obrigar o réu a se associar à parte autora se o mesmo não pretende ser beneficiado de tal
serviço. Da mesma forma, a parte autora se vangloria de ter celebrado convênio com a concessionária
Águas de Niterói a fim de possibilitar um desconto de 15% nas faturas de água e esgoto dos
moradores de Camboinhas. Ocorre que tal desconto só é concedido àqueles moradores que são
associados da parte autora. Ora, se o desconto nas faturas de água e esgoto é concedido pela
concessionária apenas àqueles que são associados da SOPRECAM, não se pode obrigar o réu a se
associar à parte autora se o mesmo não pretende ser beneficiado de tal desconto, até porque o
pagamento é efetuado diretamente junto à concessionária. É fato notório, e fato notório não precisa ser
provado (art. 334, I do CPC), que a SOPRECAM vem realizando alguns serviços no bairro de
Camboinhas, mas nenhum de tais serviços substitui a atuação do Poder Público no referido bairro a
ponto de ensejar o enriquecimento sem causa daqueles que se negam a associar à parte autora em
legítimo exercício de um direito constitucionalmente previsto.
O Estado, em sentido lato, quando se omite quanto a seu dever de prestar segurança a seus cidadãos, se omite quanto a preservação das vias
públicas, quanto a limpeza e coleta de lixo na maior parte dos logradouros, notadamente naqueles mais
afastados, isto quando não se omite também quanto aos demais serviços públicos, autoriza a criação
de associações de moradores para suprir a falta da atuação da administração pública no local, mas
não é isso que presenciamos no bairro de Camboinhas.
A manutenção de algumas praças e outros
poucos serviços não pode servir de supedâneo para que alguns cidadãos, associados em razão de
um ou vários interesses comuns, obriguem toda a coletividade do bairro a arcar com um pagamento ao
qual não anuiu, se tais serviços não são destinados a conferir-lhes conforto, tranqüilidade e
segurança, eis que, como já visto, são prestados diretamente pela administração pública. Nem se fale
que há valorização dos imóveis no bairro de Camboinhas por força da atuação da autora, porquanto os
imóveis ali estabelecidos já são valorizados pela sua própria localização.
Não há sequer um arremedo
de prova quanto a existência de eventual benefício econômico que poderia advir a todos os residentes
na região acobertada pelas atividades da associação - autora, pelo que não se pode reconhecer como
razoável a insistência da parte autora em exigir o rateio destas despesas.
Repita-se, por ser
extremamente relevante, que os pouquíssimos serviços relevantes prestados pela autora são
destinados apenas àqueles que a ela se associaram.
Assim, caso algum morador pretenda se
beneficiar de tais serviços, como o desconto na fatura de água e esgoto e o serviço de segurança com
ronda e alarme, poderá se associar livremente.
Vale destacar trecho do depoimento da testemunha
Fernando Vieira arrolada pela própria autora e ouvida às fls. 430/431 que afirmou: ´... que é associado
da ré há 11 anos; que só conhece uma entrada em Camboinhas; que nessa entrada existe um posto
policial; que a autora possui um carro e uma moto que faz o serviço de ronda e atendimento às
residências que possuem alarme ...´.
Dessarte, o que não se pode admitir é a pretensão da autora de
compelir todos os moradores do bairro a custearem seus serviços se grande parcela dos moradores
não concorda com a atuação da SOPRECAM e se recusam a pagar a cota mensal associativa. Somese
a isso o fato de a parte autora não ter logrado provar que a parte ré é beneficiaria dos serviços que
alega prestar, o que também levaria à improcedência do pedido.
Ainda que assim não fosse, não pode
este Magistrado deixar de salientar sua enorme preocupação com a proliferação de ´associações de
moradores´ que vem sendo criadas para, ao argumento de haver omissão, substituir o Poder Público
nas atividades inerentes a ele, obrigando os moradores a contribuírem com cotas associativas às quais
não concordam pagar.
A fim de não me aprofundar demais sobre o tema, vale a transcrição do recente
e brilhante acórdão da lavra do eminente Des. Rogério de Oliveira Souza que com enorme coragem e
contrariando a jurisprudência majoritária desta Corte Estadual e se utilizando de uma visão social e
moderna, aquela que se espera do julgador contemporâneo, muito bem elucidou questão semelhante a
esta debatida nos presentes autos e com a qual me filio integralmente:
´... Sendo assim, a questão
refere-se ao direito de associações de moradores imporem e cobrarem contribuições de todo e
qualquer morador que reside na área de sua atuação, fato que vem causando ferrenhas batalhas nas
grandes cidades do país e, especialmente, na Cidade do Rio de Janeiro, já tomando as páginas policiais
dos jornais. O entrechoque do princípio constitucional da LIVRE ASSOCIAÇÃO e do princípio de direito que veda o enriquecimento sem causa é falso, não servindo para a solução do problema.
A Constituição Federal assegura que ´ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei´ (artigo 5o, II), asseverando ainda que ´ninguém poderá ser compelido a
associar-se ou permanecer associado´ (artigo 5o, XX). Vigora em plenitude absoluta o Princípio da
Liberdade, da liberdade perante a lei. As associações privadas não têm nenhum poder e nenhum direito
de exigir que o particular se associe aos seus quadros e seja compelido a pagar suas contribuições.
Repita-se: não existindo lei que imponha a associação do particular a uma entidade privada, carece
esta de qualquer direito em face do particular e, muito menos, de obter qualquer contribuição de sua
parte.
O Apelado pretende prestar os ´serviços´ arrolados no Inciso III do Estatuto, dentre eles
´coordenar idéias, sugestões e programas que resultem em benefício da comunidade e de seus
associados, ligados às áreas de segurança patrimonial, trânsito, iluminação, limpeza, saneamento,
urbanização, meio ambiente, cultura e outras afins´ (fls. 16).
Verifica-se que tais ´serviços´ são
próprios do Poder Público ou de qualquer pessoa, seja natural ou jurídica, não se revelando a
necessidade e imprescindibilidade do Apelado em prol dos Apelantes.
A obrigação legal dos Apelados
seria para com o condomínio local, caso seu imóvel integrasse a estrutura edilícia comum ou para com o
Poder Público. Destas obrigações, não podem os Apelantes válida e legalmente se afastarem, sob pena
de serem perseguidos judicialmente para o seu cumprimento.
Se, por ventura, o proprietário tal ou qual,
não associado, vem direta ou indiretamente, a se beneficiar deste ou daquele serviço, tal situação de
fato não tem o condão de criar obrigação jurídica, judicialmente exigível, porquanto insuscetível de
violação da liberdade individual de contratar.
Ao resolverem constituir a associação de moradores,
seus fundadores certamente tiveram ciência de que muitos não iriam aderir ao projeto, devendo
aqueles entusiastas suportar por si o empreendimento.
Sob qualquer enfoque não existe razão fática
ou jurídica para impor ao Apelado qualquer obrigação pecuniária em favor do Apelante, sob pena - aí
sim - de propiciar enriquecimento indevido deste às custas daquele.
Todas as demais obrigações que o
Apelante entende o Apelado se encontrar em falta, carece de um simples requisito para sua validação:
a necessária e voluntária associação.
A se entender diferente, não estaria longe o dia em que nos
veríamos sendo cobrados pela ´associação de taxistas do fórum´ porque simplesmente mantém ponto
próximo propiciando segurança e rapidez. Ou deveríamos ainda contribuir para a ´associação dos
ascensoristas de elevadores da cidade do Rio de Janeiro´ porque prestam serviço de qualidade ao nos
transportar de um andar para o outro.
Não apenas no caso de associação voluntária a determinada
entidade, pode estar exigir o pagamento dos encargos sociais do associado. Uma associação de
moradores, por mais digna e atuante que seja, continua sendo uma associação voluntária.
Não pode o morador de determinada rua que, por decisão do grupo dominante na associação, passou a integrar sua área de atuação, seja compelido a contribuir para a sua manutenção.
Uma vez fechada uma rua, o Poder Público deixa de conferir a devida proteção policial ao local. O espaço público, de uso comum do povo, perde esta qualidade de fato (embora não de Direito) e é apropriado de forma privada por uns poucos, que passam a exigir verdadeiro ´pedágio´ para que o próprio morador possa transitar.
Por último, se persistir o entendimento de que, para evitar o enriquecimento sem causa, devem ser
estabelecidas cotas idênticas de contribuição entre os moradores, sejam eles associados ou não,
corre-se o risco de legitimar a elitização particular de um logradouro público, expulsando-se dali quem
não puder por serviços desnecessários, ou ainda que úteis, dispensáveis. À custa da moradia de uns, o deleite de outros: essa é a conseqüência futura de um raciocínio menos atento à questão social presente.
A situação é mais ilegal ainda quando a associação pretende prestar serviços que são de responsabilidade do Estado. O mesmo enfoque foi veiculado na Apelação Cível 1994.08920, do extinto
Tribunal de Alçada Cível, da lavra do Eminente Desembargador JAIR PONTES DE ALMEIDA:
´Associação de moradores. Ninguém será compelido a se associar ou a permanecer associado, nem
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei. Associações de
moradores, de proprietários ou de amigos de determinado logradouro público só se constituem com
aqueles que a elas aderem voluntariamente´. Por último, a legitimação que o Poder Judiciário vem
outorgando a tais associações, está lançando as sementes para um problema futuro que as grandes
metrópoles certamente terão que enfrentar: é a tomada de tais associações por motes de delinqüentes
locais (como já ocorre em diversas associações de favelas), impondo a lei do terror àquele que ousar
discordar ou resistir em ´contribuir´ para os serviços de proteção. É a volta a épocas passadas em que
o particular terá que pagar para não ser atacado no recanto de seu lar, é a ausência do Poder Público
das áreas de asfalto (como já ocorre nos morros circundantes da cidade), é o pagamento legal um, e
criminoso, o outro. O primeiro, por meio dos tributos, ao Estado que não presta o serviço a que está
obrigado constitucionalmente; e o segundo, a ´contribuição´ imposta pelo grupo que se apossou de
umas poucas ruas da vizinhança, colocou duas ou três cancelas nas extremidades e passou a se
servir do medo que ela própria fez nascer no morador. Não se pode afastar o Direito da realidade social
e atual que a Sociedade Brasileira vivencia nos dias de hoje. Ao invés de privatizar as obrigações do
Estado, a Sociedade deve exigir que o Estado cumpra com suas obrigações, para as quais recebe
grande parte da riqueza produzida por esta mesma Sociedade. Relembre-se a lição de San Thiago
Dantas, em sua tese ´Direito de Vizinhança´, quando defendeu o direito do proprietário antigo e anterior
ao novo vizinho de ter respeitada sua situação jurídica já constituída; no caso, sua vontade de se
manter à parte da associação voluntária.
Registre-se, por fim, que se encontra no STF, aguardando
julgamento, o RE 432106-8, sendo relator o Ministro MARCO AURÉLIO, em que é recorrente Franklin
Bertholdo Vieira em face de associação de moradores idêntica àquela deste processo. Neste recurso,
discute-se exatamente a constitucionalidade de se exigir a associação compulsória do particular a
entidades voluntárias.
Diante do exposto, o voto foi no sentido de conhecer e dar provimento ao
recurso no sentido de julgar improcedente o pedido, invertendo-se os ônus da sucumbência´.
(Apelação Cível nº 34047/2008; 18ª Câmara Cível; j. 16.09.2008).
Desta forma, revendo meu posicionamento anterior e ousando respeitosamente divergir da jurisprudência dominante deste egrégio Tribunal de Justiça e entendendo que a Súmula nº 79 não deve prevalecer no caso em tela, até porque o incidente de uniformização de jurisprudência nº 12/2004, apreciado pelo colendo Órgão Especial e que originou a referida Súmula, foi aprovado não por unanimidade, mas por maioria, devendo ser destacado que o voto-vencido sufragou a liberdade associativa declinada em sede constitucional,
notadamente nos incisos II e XX da Carta Magna, entendo que também pelos fundamentos acima
declinados a improcedência do pedido se impõe.
III - DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO
IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, condenando a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$2.000,00 (dois mil reais), nos termos do parágrafo 4º , do artigo
20, do Código de Processo Civil. Acompanho a orientação do egrégio Superior Tribunal de Justiça
(REsp. nº 954.856-RS - Min. Humberto Gomes de Barros - 3ª Turma - j. 16.08.2007; p. 27.08.2007),
razão pela qual fica desde já intimado o réu de que deverá cumprir a obrigação (pagamento das verbas
sucumbenciais) espontaneamente no prazo de 15 dias a contar do trânsito em julgado,
independentemente de nova intimação, sob pena de incidência da multa prevista no artigo 475-J, do
CPC. P.R.I. Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se. Niterói, 16 de outubro de 2008.
ALBERTO REPUBLICANO DE MACEDO JR. Juiz de Direito
2 comentários:
A vergonha é que juizes que não respeitam o STF e muito menos a CONSTITUIÇÃO , sem ao menos ler o processo, aplicam a SÚMULA 79 causando estragos irreparáveis ao cidadão. Esta súmula é uma mácula para o judiciário do RIO DE JANEIRO
Fato semelhante ocorre, em Angra dos Reis.
Lá foi criado um tal de "condominio" geral do bracuhy, em cima de um loteamento, autorizado em conformidade com a lei 6.766 que assim diz no atr 22: Art. 22. Desde a data de registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo.
Interessante é que as autoridades municipais deixam transparecer o conluio com aqueles que se apropriam de bens públicos. E mais, magistrados incompetentes, sentenciam, ao arrepio da lei, ignorando e atirando na latrina normas constitucionais.
Fiquemos atentos!
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