Pesquisar este blog

domingo, 18 de maio de 2025

STF RE 1445171-SP PROVIDO ROMPENDO BARREIRAS

 👏👏👏👏👏👏👏👏

Ao I. Advogado

 Dr. DAVI TELES MARÇAL 

OAB/SP 272.852

Leia adiante a íntegra do primoroso RECURSO EXTRAORDINÁRIO provido pelo STF


RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.445.171 SÃO PAULO


RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

RECTE.(S) : JAIRO GOMES PICCINALLI

ADV.(A/S) : DAVI TELES MARCAL

RECDO.(A/S) : ASSOCIACAO RESIDENCIAL JARDIM SAO LUIS

ADV.(A/S) : DANIEL BRAGA FERREIRA VAZ


DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário interposto em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ementado nos seguintes termos:


“Cobrança — Despesas de manutenção — Ação procedente — Decisão mantida — Associado que anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes — Questão apreciada à luz do Tema 492 do Supremo Tribunal Federal, não aplicada ao caso, porque o associado anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes — Recurso improvido” (eDOC 15 – ID: 9c6d3ddf, p. 2)


No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, aponta-se violação aos arts. 5, II e XX, e 93, IX, do texto constitucional, assim como ao que decidido no julgamento do Tema 492 da repercussão geral.

Nas razões recursais, alega-se, em suma, não ser associado e que não estaria abrangido por qualquer das hipóteses delineadas no Tema 492 que autorizam a cobrança da taxa de associação (eDOC 17 – ID: b68fc80b, p. 14).

Aduz-se, nesse sentido, que a cobrança da taxa “não encontra qualquer justa causa, na medida em que todas as áreas que não são propriedades privadas (lotes), na verdade, são áreas públicas, tais como as ruas e praças. Portanto, verifica-se que os tais ‘benefícios’ na verdade é um dever do Estado, o que torna a cobrança de qualquer taxa sem qualquer embasamento fático e jurídico” (eDOC 17 – ID: b68fc80b, p. 33).

Argumenta-se, ainda, que o “acórdão deu predominância ao enriquecimento sem causa, em detrimento ao princípio da liberdade de associação, na medida que manteve o encargo mesmo o recorrente não sendo associado e, como dito acima, tendo a associação tendo sido criada antes da Lei 13.465/2017” (eDOC 17 – ID: b68fc80b, p. 16).

Por fim, sustenta-se que “não há qualquer cláusula convencional constante em escritura pública e averbada no cartório imobiliário, inserida especificamente na matrícula do imóvel do recorrente, o que, efetivamente tornaria obrigatória o pagamento da referida dívida” (eDOC 17 – ID: b68fc80b, p. 34).


É o relatório.


 Decido.


A irresignação merece prosperar.

Inicialmente, registro que este Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 492 da repercussão geral, cujo paradigma é o RE 695.911, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 19.04.2021, assentou a inconstitucionalidade da cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis. Nesse sentido, confira-se a ementa do julgado:


“Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Liberdade associativa. Cobrança de taxas de manutenção e conservação de áreas de loteamento. Ausência de lei ou vontade das partes. Inconstitucionalidade. Lei nº 13.467/17. Marco temporal. Recurso extraordinário provido. Fatos e provas. Remessa dos autos ao tribunal de origem para a continuidade do julgamento, com observância da tese. 1. Considerando-se os princípios da legalidade, da autonomia de

vontade e da liberdade de associação, não cabe a associação, a pretexto de evitar vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a proprietário de imóvel que não tenha a ela se associado (RE nº 432.106/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 3/11/11). 2. Na ausência de lei, as associações de moradores de loteamentos surgiam apenas da vontade de titulares de direitos sobre lotes e, nesse passo, obrigações decorrentes do vínculo associativo só podiam ser impostas àqueles que fossem associados e enquanto perdurasse tal vínculo. 3. A edição da Lei nº 13.465/17 representa um marco temporal para o tratamento da controvérsia em questão por dentre outras modificações a que submeteu a Lei nº 6.766/79, ter alterado a redação do art. 36-A, parágrafo único, desse diploma legal, o qual passou a prever que os atos constitutivos da associação de imóveis em loteamentos e as obrigações deles decorrentes vinculam tanto os já titulares de direitos sobre lotes que anuíram com sua constituição quanto os novos adquirentes de imóveis se a tais atos e obrigações for conferida publicidade por meio de averbação no competente registro do imóvel. 4. É admitido ao município editar lei que disponha sobre forma diferenciada de ocupação e parcelamento do solo urbano em loteamentos fechados, bem como que trate da disciplina interna desses espaços e dos requisitos urbanísticos mínimos a serem neles observados (RE nº 607.940/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe de 26/2/16). 5. Recurso extraordinário provido, permitindo-se o prosseguimento do julgamento pelo tribunal de origem, observada a tese fixada nos autos: ‘É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir do qual se torna possível a cotização de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, desde que, i) já possuidores de lotes, tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a

administradoras de imóveis ou, (ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis’.” (RE 695.911, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, DJe 19.04.2021; grifo nosso)


Na espécie, o Tribunal de origem reconheceu que o recorrente anuiu com a cobrança da taxa objeto de cobrança e que este teria usufruído dos serviços prestados pela associação de moradores, de maneira a concluir que afastar a cobrança dos valores devidos implicaria no enriquecimento ilícito do recorrente. 

Nesse sentido, extrai-se o seguinte trecho do acórdão impugnado:


“(...)

2. A associação cobra do réu, proprietário dos lotes nº 01, 02, 03, 04, 10, 11, 12 e 13 da quadra 07 do Jardim São Luis, despesas de manutenção no período de junho de 2013 até março de 2016, mais as parcelas subsequentes.

Já decidiu o Supremo Tribunal Federal, Tema 492, que: ‘É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis’.

Embora mereça respeito o entendimento de que os proprietários de imóveis que não integram ou não aderem à associação de moradores não estariam obrigados ao pagamento compulsório de despesas ou de outras contribuições, referidas nos recursos especiais 1280871/SP e 1439163/SP, não existem elementos que comprovem estar a cobrança desvinculada dos serviços prestados pela autora e, além disso, o réu anuiu expressamente com a cobrança (conferir in fine fls. 42, 46, 50, 55,

60, 65, 69, e 73:

Cláusula 11ª A administração geral do loteamento JARDIM SÃO LUIS é feita pela Associação Residencial Jardim São Luis, à qual neste ato, o CESSIONÁRIO se compromete a contribuir com as despesas estipuladas pelo Conselho Deliberativo ou Assembléia Geral da Associação”.

(...)

Deve prevalecer a tese que reconhece a legitimidade da cobrança mesmo aos proprietários não filiados à associação que administra o loteamento.

(...)

Não está em jogo a liberdade de associação e sim o princípio que veda o enriquecimento sem causa, sendo possível o ajuizamento da ação quando o morador se beneficia dos serviços prestados, como: ronda, monitoramento por câmeras, limpeza, manutenção de ruas, valas, correspondências, controle de portaria, pagamento de empregados (fls. 290).

A associação foi constituída em 20.03.1999 e os lotes adquiridos posteriormente, de forma que o autor já estava ciente da forma de gestão do loteamento na ocasião da aquisição.

(...)

Como não é possível que o proprietário de lotes se beneficie de serviços de seu interesse, que inclusive valorizam o seu imóvel, sem contraprestação, porque onera os demais proprietários do loteamento, a hipótese é de reconhecimento da legalidade da cobrança” (eDOC 15 – ID: 9c6d3ddf)


Observa-se que nos contratos de Promessa de Cessão e Transferência de Direitos e Obrigações de Compromisso Particular de Venda e Compra constante nos autos (eDOC 4 – ID: 407416ea, p. 28-62), referentes a todos os imóveis objeto de negociação pelo recorrente, consta a sua adesão expressa à associação litigante, com os instrumentos devidamente assinadas e datados em período compreendido entre os anos de 2004 e 2009, e nos quais consta a concordância com o pagamento das taxas ora objeto de cobrança.

No entanto, o recorrente solicitou o seu desligamento da associação, por motivos particulares, conforme consta no eDOC 6 (ID: 1dbcc923, p. 2), que foi devidamente aceito pela entidade associativa, conforme consta em documento localizado no eDOC 6 (ID: 1dbcc923, p. 7-8), datado do dia 6.6.2013.

Conclui-se, assim, que, quando do início da vigência da Lei nº 13.465/2017, o recorrente não era vinculado à associação recorrida, motivo pelo qual deve ser reconhecida a impossibilidade da cobrança compulsória da taxa de manutenção e conservação pleiteada.

Isso porque, conforme orientação firmada no Tema 492, é inconstitucional a cobrança, por parte de associação, de tal taxa de proprietários não associados até o advento da Lei nº 13.465/2017. Dessa forma, para período anterior à mencionada norma, não se pode depreender a compulsoriedade na cobrança do valor, sendo imprescindível a concordância do interessado na manutenção do vínculo associativo.

Nesse sentido, confira-se trecho do voto proferido no RE-RG 695.911, paradigma do Tema 492, que bem explana a questão:


“(...) não há como impor qualquer obrigação a quem não queira se associar ou permanecer associado ante a ausência de manifestação expressa de vontade nesse sentido e de previsão legal da qual decorra uma relação obrigacional.

(...) o Superior Tribunal de Justiça, como intérprete da Legislação infraconstitucional, já teve a oportunidade de consignar que as alterações promovidas pela Lei nº 13.465/2017 não se aplicam às relações jurídicas existentes antes de sua edição, em razão do princípio da irretroatividade das leis. Em decorrência disso, entendeu aquela Corte que a mencionada lei não pode retroagir para conferir às associações (como espécie de ‘administradora[s] de imóveis’) o direito de cobrar de proprietário não associado taxas ou encargos relativos ao rateio de serviços prestados em loteamentos de acesso controlado, nos termos da novel legislação” (grifos nossos)


No caso, deve prevalecer, pois, a liberdade associativa, no que se inclui a preservação da vontade do interessado em se associar, como também de se desligar livremente da entidade.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso extraordinário, para considerar indevidas as parcelas deduzidas na inicial desta ação. Invertidos os ônus da sucumbência.


Publique-se.

Brasília, 27 de agosto de 2023.


Ministro GILMAR MENDES Relator

Documento assinado digitalmente



EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DA SESSÃO CÍVEL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


Processo nº 1001094-45.2016.8.26.0441


JAIRO GOMES PICINALLI, já qualificado nos autos em epígrafe, vem à presença de Vossa Excelência, por seu advogado que esta subscreve, interpor o presente RECURSO EXTRAORDINÁRIO, com fulcro no artigo 1029 do CPC, combinado com artigo 321 do RISTF e artigo 102, III, alíneas “a” da CF/88, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.


Outrossim, requere o recebimento do presente recurso, juntamente com as razões, apresentando-se o recolhimento do preparo, pugnando pela remessa ao Colendo STF.


Pede deferimento


Peruíbe, 23 de março de 2022


DAVI TELES MARÇAL OAB/SP 272.852

 

RAZÕES DO RECURSO ESPECIAL


Processo nº: 1001094-45.2016.8.26.0441


Origem: TRIBUNAL DE JUSTIÇA OD ESTADO DE SÃO PAULO 

Recorrente: JAIRO GOMES PISCINALLI

Recorrido: ASSOCIAÇÃO RESIDENCIAL JARDIM SÃO LUIZ


Egrégio Supremo Tribunal Federal Colenda Turma,

Eméritos Ministros


1. BREVE RESUMO DA DEMANDA


Trata-se de ação ordinária de cobrança, movida pela Recorrida, denominada “ASSOCIAÇÃO RESIDENCIAL JARDIM SÃO LUIZ, objetivado, em síntese, a cobrança de R$ 64.036,62 (sessenta e quatro mil, trezentos e trinta e seis Reais e sessenta e dois centavos), decorrente de sua “contribuição no rateio das despesas” (SIC), à partir de junho de 2013 à março de 2016.

 

Em síntese, alega a recorrida que a cobrança de tais valores se justifica na medida em que o local é desprovido de diversos serviços essenciais, tais como “segurança, conservação das ruas e valas do loteamento, manutenção da rede elétrica, administração contábil da Associação, bem como a disposição de máquinas para a manutenção e conservação do leito carroçável das ruas do loteamento” (SIC).


Com efeito, por se intitular como sendo uma “ Sociedade Civil, desprovida de fins lucrativos” (SIC), busca a cobrança do numerário acima descrito, correspondente, em tese, do rateio dos serviços ora prestados.


Ao final da instrução, superada a fase dos debates oras, o Douto Magistrado de Primeira Instância, julgou procedente os pedidos formulados pela recorrida na exordial, aduzindo, em síntese, que muito embora o Egrégio Supremo Tribunal Federal tenha consagrado o entendimento em sede de recursos repetitivos ( artigo 543 – C do CPC) de desobrigação dos moradores de anuírem à associação de moradores e (Tema 882 do STJ), com isso, pagarem taxas associativas, deveria prevalecer o entendimento da possibilidade de cobrar pelos gastos efetuados em benefício do proprietário, como forma de se evitar o enriquecimento ilícito. (fls.245/252)


Aduziu, ainda, que com a vigência da Lei 13.465/17, portanto, posterior ao julgamento do Recurso Repetitivo (Tema 882 do STJ), restou amparado legalmente a possibilidade de tais associações de obrigarem os moradores a aderirem aos quadros associativos, sendo eles associados ou não, consoante a leitura do artigo 36 – A do referido diploma legal (fls. 245/252)

 

Em face da r. Sentença, o recorrente interpôs o recurso de apelação, pugnando pelo provimento, com os fundamentos a seguir:


1) Ao contrário do exposto pelo Magistrado de Primeira Instância, a vigência da Lei 13.465/17 por si só não supera o entendimento de recursos repetitivos, conforme preleciona o artigo 543 – C do CPC/73, correspondente ao artigo 1036 do CPC/15, eis que o precedente consolidado no Tema 882 do STJ não havia sido substituído por outro “overruling”, tampouco teve seu âmbito de eficácia restringido “overrriding” por mesmo precedente do Superior Tribunal de Justiça, de sorte que os demais órgãos do Poder Judiciário não tem legitimidade para tal desiderato;

2) Por se tratar de uma associação de moradores, a recorrida não é equiparada a um condomínio edilício, nos moldes da Lei 4.591/64 e, por tal motivo, as mensalidades não revestiam de caráter cogente, de modo que não poderiam ser equiparadas a taxas condominiais;

3) Aduziu que antes mesmo do início do período de cobrança descrito na petição inicial, no dia 28/05/2013 o recorrente formalmente manifestou seu interesse expresso em não se manter mais na condição de associado (fls. 118/122 ), fato que foi reconhecido e aceito pela recorrida, tendo o recorrente tomado a cautela para que eventual serviços externos (diga-se, que não existem) da sua residência seriam realizados por ele próprio, tais como segurança ou limpeza da área frontal da sua casa, com o propósito de evitar-se o reconhecimento do enriquecimento sem causa;

4) Conforme exaustivamente exposto nos documentos expostos na contestação (fls. 151/184), outro relevante motivo para ilegalidade das cobranças é o fato de que as ruas que cercam seu imóvel não são asfaltadas; a iluminação é precária; não há área de entretenimento com piscinas, quadras de futebol, salão de festas, parques de diversões ou outro atrativo que, em tese, poderia valorizar direta ou indiretamente o imóvel do recorrente. Ademais, que a recorrente não produziu qualquer prova no sentido de eventual valorização do imóvel, ônus que lhe competia nos termos do artigo 373, I, do CPC;


Sobreveio o Venerando Acórdão, desprovendo o recurso de apelação, sob argumento de que embora mereça respeito o entendimento de que os proprietários não associados estariam desobrigados ao pagamento compulsório das despesas, nos termos dos Recursos Especiais n 1280871/20 e 143963/SP, não existe elementos nos autos no sentido demonstrar que tais cobranças estariam desvinculadas aos serviços prestados pela associação e, ademais, o recorrente anuiu a tais cobranças no ato da compra dos lotes. (fls. 396).


Sendo assim, fazendo referência Resp. nº 490.419-SP, Rel. Min. Nancy Andrigui, j. 10/06/2003, considerando a existência de serviços prestados pela recorrida, as cobranças eram devidas, a fim de evitar-se o enriquecimento sem causa, mencionando diversos serviços supostamente prestados pela recorrida “ronda, monitoramento por câmeras, limpeza, manutenção de ruas, valas, correspondências, controle de portaria, pagamento de empregados” (sic) mencionando o teor da fls. 290, que na verdade não é prova alguma, se trata de trecho das contrarrazões de apelação da recorrida.


Ressaltou, por fim, que a associação foi instituída em 20.03.1999 e os lotes foram adquiridos posteriormente, de modo que as cobranças seriam legítimas tendo vista que o recorrente já estava ciente da forma de gestão dos lotes, fazendo menção ao voto vencido proferido pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas no Recurso Repetitivo REsp. 1439163-SP.


Em síntese, os fatos.



2. TEMPESTIVIDADE



De acordo com o que se depreende dos autos, o Venerando Acórdão foi disponibilizado no Dje no dia 16/11/2021, sendo publicado no primeiro dia subsequente.


Em face do Venerando Acórdão, no dia 24/11/2021 o recorrente opôs embargos de declaração, com visas a sanar contradição, bem como, para fins de prequestionamento, nos termos do artigo 1025 e seguintes do CPC. (fls. 01 do incidente de embargos de declaração).


No dia 25/02/2022 foi disponibilizado no DJE o Venerando Acórdão que apreciou o referido embargo declaratórios, sendo publicado no primeiro dia útil subsequente. (fls. 14 do incidente de embargos de declaração).


Ocorre que, nos termos do Provimento CSM 2641/2021 TJSP (em anexo), os dias 28/02/2022 e dia 01/03/2022 não entraram para o cômputo dos prazos, eis que se tratava de véspera e feriado de carnaval respectivamente, de modo que a publicação do Venerando Acórdão passou a ser no dia 02/03/2022. Portanto, o termo final para interposição do presente Recurso Especial o dia 23/03/2022.

 

Deste modo, o presente recurso reveste-se do requisito da tempestividade.


3. DO PREQUESTIONAMENTO


De igual sorte, o presente recurso reveste-se do prequestionamento específico, conforme se depreende do artigo 1025 do Código de Processo Civil, eis que da leitura da apelação e dos embargos de declaração, o recorrente aventou especificamente todas as matérias constitucionais que ensejam o conhecimento do presente recurso. (fls. 01/06 do incidente de embargos de declaração).


Com efeito, nas razões de apelação e nos embargos de declaração houve o prequestionamento dos artigos e matérias constitucionais e lei federal (vide fls. 04/05 do incidente de embargos de declaração):


a) Artigo 5ª, inciso XX, da CF/88 – Haja vista que, data venia, a exigibilidade de tais cobranças constitui flagrante ofensa à liberdade associativa, tal como também consagrado no Tema 492 do STJ;


b) Princípio 5º, inciso II, da CF/88 - Haja vista que, data venia, a exigibilidade de tais cobranças constitui flagrante ofensa ao princípio da legalidade, eis que obrigações são originadas apenas por lei ou pela vontade das parres;

c) Artigo 93, inc. IX, da CF/88 – Haja vista que, data venia, se não for sanada a contradição acima vergastada, este Venerando Acórdão estará acoimado de fundamentação deficiente, eis que como já dito o “enriquecimento sem causa” não está amparada em nenhuma modalidade probatória;


d) Tema 492 - Eis que a recorrida não constitui entidade de moradores regulamentada pela Lei 13465/17 ( o que, em tese, legitimaria tais cobranças), e nem tampouco respeitou o marco temporal para aplicação da lei.


Portanto, resta igualmente presente o requisito do prequestionamento, na moldura acima exposta.


4. DA REPERCUSSÃO GERAL DAS QUESTÕES CONSITUCIONAIS DISCUTIDAS


O recorrente ingressa com o presente Recurso Extraordinário para demonstrar repercussão geral das questões constitucionais que pretende discutir, nos termos do parágrafo 3º do artigo 102 da CF, que dispõe, verbis:


“ Art. 102. Compete

ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

(...)

§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.   (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)”


Desta feita, conforme demonstrado alhures, o Egrégio Tribunal a quo entendeu que a previsão para a cobrança das taxas é decorrente de singela relação decorrente de contrato de gaveta no ato da compra do imóvel, mesmo o contrato não estando alicerçado dos requisitos da Lei 6766/79, com as alterações da Lei 13465/17, assim como também ante a inegável ofensa a normatização consagrada no Tema 492 do Supremo Tribunal Federal, dentro os quais, o marco temporal para aplicação da referida lei.


Portanto, nota-se a expressa violação ao princípio da legalidade e da autonomia, bem como, o da liberdade de associação, nos termos do artigo 5ª, II, XX e XII da CF, de tal sorte que resta evidente o preenchimento do requisito de admissibilidade da repercussão geral no caso em apreço.


Neste diapasão, como bem pontuou o Ministro Dias Toffoli na relatoria do AI 745831, verbis:


EMENTA DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE COBRANÇA DE TAXAS DE MANUTENÇAO E CONSERVAÇÃO DE ÁREA DE LOTEAMENTO. DISCUSSÃO ACERCA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO. MATÉRIA PASSÍVEL DE REPETIÇÃO EM INÚMEROS PROCESSOS, A REPERCUTIR NA ESFERA DE INTERESSE DE MILHARES DE PESSOAS. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.


(AI 745831 RG, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 20/10/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-226 DIVULG 28-11-2011 PUBLIC 29-11-2011 )

 

Desta feita, acompanha o mesmo entendimento o Ministro Marco Aurélio, no julgamento do RE 432106/RJ de sua relatoria, verbis:


DECISÃO REPERCUSSÃO GERAL ADMITIDA – MATÉRIA IDÊNTICA – CONDOMÍNIOS – COBRANÇA DE TAXAS DE MANUTENÇÃO E CONSERVAÇÃO DE ÁREA DE LOTEAMENTO  –  LIBERDADE  DE  ASSOCIAÇÃO  –

SOBRESTAMENTO. 1. O Tribunal, no Agravo de Instrumento nº 745.831/SP, da relatoria do Ministro Dias Toffoli, concluiu pela repercussão geral do tema atinente à liberdade de associação quando está em jogo a cobrança de taxas de manutenção e conservação de área de loteamentos imobiliários. 2. Ante o quadro, ressalvando a óptica pessoal quanto à inadequação de lançar-se agravo no chamado Plenário Virtual, considerado o fato de o recurso veicular a mesma matéria, tendo a intimação do acórdão de origem ocorrido anteriormente à vigência do sistema da repercussão geral, determino o sobrestamento deste processo. 3. À Assessoria, para o acompanhamento devido. 4. Publiquem. Brasília, 27 de março de 2012. Ministro

MARCO AURÉLIO Relator

(RE  432106  ED,  Relator(a):  Min.  MARCO  AURÉLIO,

julgado em 27/03/2012, publicado em DJe-069 DIVULG 09/04/2012 PUBLIC 10/04/2012)


Destarte, resta

inequívoco o preenchimento do requisito de admissibilidade da repercussão geral no caso em apreço.

 

5. DA VIOLAÇÃO AO TEMA 492 DO STF E AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA AUTONOMIA DA MANIFESTAÇÃO DA VONTADE E DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO –


Primeiramente, vale a transcrição da ementa do acordão recorrido, para fins de confrontação analítica, verbis:


Cobrança – Despesas de manutenção – Ação procedente – Decisão mantida – Associado que anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes – Questão apreciada à luz do Tema 492 do Supremo Tribunal Federal, não aplicada ao caso, porque o associado anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes–Recurso improvido.

(TJSP; Apelação Cível 1001094-45.2016.8.26.0441; Relator (a): Luis Mario Galbetti; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Peruíbe - 1ª Vara; Data do Julgamento: 03/11/2021; Data de Registro: 04/11/2021)


Destaque-se que um dos motivos pelo qual o Tribunal ad quo se posicionou sobre a validade das cobranças das aos moradores não associados, foi pelo fato de que serem beneficiados pelos serviços prestados, conforme se verifica na transcrição do trecho do Venerando Acórdão, verbis:


“Embora mereça respeito o entendimento de que os proprietários de imóveis que não integram ou não aderem à associação de moradores não estariam obrigados ao pagamento compulsório de despesas ou de outras contribuições, referidas nos recursos especiais 1280871/SP e 1439163/SP, não existem elementos que comprovem estar a cobrança desvinculada dos serviços prestados pela autora e, além disso, o réu anuiu expressamente com a cobrança (conferir in fine fls. 42, 46, 50, 55, 60, 65, 69, e 73:


Cláusula 11ª A administração geral do loteamento JARDIM SÃO LUIS é feita pela Associação Residencial Jardim São Luis, à qual neste ato, o CESSIONÁRIO se compromete a contribuir com as despesas estipuladas pelo Conselho Deliberativo ou Assembléia Geral da Associação”.


Deve prevalecer a tese que reconhece a legitimidade da cobrança mesmo aos proprietários não filiados à associação que administra o loteamento.”


Pois bem, Preclaros Ministros, a despeito do posicionamento acima esposado, verifica-se, que o Tribunal ad quo nitidamente relativizou o princípio constitucional da não associação (artigo 5ª, XII, da CF), dando maior preponderância a vedação ao enriquecimento sem causa. Ainda, consignou que a existência do contrato que o recorrente anuiu (requisitos da Lei 6766/79, com as alterações da Lei 13465/17 – objeto do Tema 492), seria o suficiente para se perpetuar tais cobranças.


Antes esgotarmos o tema a temática da violação dos preceitos constitucionais, imperioso a transcrição do TEMA 492 do STF :

 

"É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis".


Sendo assim, este Colendo Supremo Tribunal Federal fixou algumas balizas para a cobrança de moradores nos chamados “condomínios de acesso controlado”


1) É impossível a cobrança daqueles que não se associaram livremente antes do advento da Lei 13.465/2017 ou de lei municipal anterior que disciplinasse a questão;

2) Para os loteamentos constituídos depois de referida Lei ou para os casos já existentes, também posteriormente a legislação, desde que haja comprovação da associação do proprietário do imóvel;

3) Em se tratando de novos adquirentes de lotes, desde que o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no respectivo Cartório de Registro de Imóveis para que se dê publicidade.

 

Oras, pela leitura ictu oculi do Venerando Acórdão é possível constatar que o recorrente não é associado (...“Embora mereça respeito o entendimento de que os proprietários de imóveis que não integram ou não aderem à associação de moradores não estariam obrigados ao pagamento compulsório de despesas..), e nem, tampouco, houve expressa anuência do recorrente em data posterior a vigência da lei pare se tornar um novo associado.


Ou seja, pelo status de não associado, partindo da premissa do Tema 492 – do STF, a cobrança passa a ser inconstitucional, tornando-a, obviamente, indevida.


Mais ainda, a tese esposada na ementa do acórdão guerreado, no sentido de que a anuência da cobrança na época da compra (sem que tal obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis , tornando-a de natureza propter rem), também não prospera em face do entendimento deste Colendo STF.



Vale novamente a transcrição da ementa do acórdão

guerreado:


Cobrança – Despesas de manutenção – Ação procedente – Decisão mantida – Associado que anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes – Questão apreciada à luz do Tema 492 do Supremo Tribunal Federal, não aplicada ao caso, porque o associado anuiu com a cobrança na ocasião da aquisição dos lotes Recurso improvido.

 

(TJSP;  Apelação  Cível  1001094-45.2016.8.26.0441;

Relator (a): Luis Mario Galbetti; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Peruíbe - 1ª Vara; Data do Julgamento: 03/11/2021; Data de Registro: 04/11/2021)


logo de início percebe-se que o Tribunal a quo validou a existência do contrato escrito assinado pelo recorrente, o que validaria tais cobranças e, portanto, o Tema 492 não seria aplicado ao caso em concreto.


Entretanto, percebe-se flagrante oposição ao enunciado do Tema 492, pois o que tornara a cobrança de natureza real, ou seja , propter rem, seria o fato de que tais cobranças fossem averbadas junto a matrícula imobiliária, pois uma das hipóteses previstas para a existência do encargo era de que “i) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis .“


Todavia, repita-se, tais contratos não estão registrados na matrícula imobiliária, como deveria ser nos termos da Lei 6766/79, artigo 18, VI c.c. artigo 26, VII, do mesmo diploma, respeitando as adaptações marco temporal de vigência da Lei nº 13.465/17.


Portanto, é evidente o flagrante desacatamento ao entendimento consolidado no Tema 492 do STF.

 

De outra forma, percebe-se que o venerando acórdão deu predominância ao enriquecimento sem causa, em detrimento ao princípio da liberdade de associação, na medida que manteve o encargo mesmo o recorrente não sendo associado e, como dito acima, tendo a associação tendo sido criada antes da Lei 13.465/2017 .


Pois bem, como é sabido, as relações obrigacionais são originadas da Lei (Artigo 5, II, da CF/88) ou da vontade das partes, que no caso, somente se expressamente o recorrente tivesse manifestado o interesse em se associar, nos termos do artigo 5º, XX, da CF “XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”.


No caso em concreto, a imposição de tais encargos ao recorrente ensejaria flagrante ao princípio da legalidade e às liberdades individuais, notadamente à garantia fundamental da liberdade associativa, pois criou-se um encargo partindo do Poder Judiciário, algo flagrantemente ilegal.


Neste diapasão, a jurisprudência deste Egrégio Supremo Tribunal Federal é uníssona nesse sentido, verbis:


RE 1341189 / DF - DISTRITO FEDERAL RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES

Julgamento: 25/11/2021 Publicação: 30/11/2021 Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-236 DIVULG 29/11/2021 PUBLIC 30/11/2021

Partes

RECTE.(S) : MARCOS DE SOUZA RAMOS ADV.(A/S) : FILLIPE GUIMARAES DE ARAUJO RECDO.(A/S) : ASSOCIACAO EULER PARANHOS ADV.(A/S) : ADRIANA DE OLIVEIRA SANTOS

 

Decisão

Trata-se de Recurso Extraordinário interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, assim ementado (Vol. 40, fl. 1):

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. TAXAS DE MANUTENÇÃO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. PRELIMINARES DE NULIDADE DA SENTENÇA E ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADAS. RATEIO DE DESPESAS. TITULAR DOS DIREITOS SOBRE LOTE. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. FEITO SUFICIENTEMENTE INSTRUÍDO. CUMPRIMENTO DO ART. 333, I, DO CPC. INCLUSÃO DOS HONORÁRIOS NA PLANILHA DO DÉBITO. MATÉRIA NÃO SUBMETIDA AO JUÍZO SINGULAR. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. NÃO COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.

1 - É válida a decisão proferida com fundamentação sucinta, se contém os requisitos essenciais e indica as razões de decidir.

2 - Não é imprescindível, para a cobrança de contribuições referentes ao rateio das despesas, que o morador tenha se associado formalmente à Associação de Moradores, nem que dela usufrua, bastando que sua unidade imobiliária seja contemplada com os serviços disponibilizados pelo ente associativo. Legitimidade passiva reconhecida.

3 - O fato de tratar-se de Associação, popularmente conhecida como "condomínio irregular", não configura óbice à cobrança dos moradores acerca do pagamento das contribuições referentes ao rateio das despesas ordinárias e extraordinárias. Precedentes.

4 - Peculiaridades do Distrito Federal, onde ocorreu ocupação irregular de solo público, com a formação de centenas de imensos núcleos habitacionais.

5 - Encontrando-se o Feito suficientemente instruído com o Estatuto da Associação, as Atas das Assembleias Ordinárias, bem como com a planilha de débito, não há que se falar em ausência de prova.

6 - Não tendo a questão relativa à impossibilidade de inclusão da cobrança de honorários na planilha de cálculo sido arguida no Juízo a quo, nem sido sequer apreciada na sentença recorrida, não pode ser apreciada no presente recurso, sob pena de supressão de instância e violação do princípio do duplo grau de jurisdição.

7 - Para a aplicação da penalidade por litigância de má- fé, necessária a comprovação da conduta maliciosa da parte, bem como o propósito meramente protelatório do recurso. Não tendo, contudo, sido demonstrados tais fatos, inviável se afigura a condenação pretendida.

Apelação Cível desprovida.”.

Opostos Embargos de Declaração (Vol. 43, fl. 1), não foram conhecidos (Vol. 45, fl. 1).

No RE (Vol. 50, fl. 1), interposto com amparo no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, a parte recorrente sustenta que houve violação aos artigos 5º, II, XVII e XX; e 93, IX, da CF/1988.

Alega, inicialmente, que o acórdão incorreu em negativa de prestação jurisdicional, pois, apesar da oposição dos Embargos de Declaração, não foram sanadas as omissões apontadas.

Ainda, afirma que o acórdão recorrido violou “os princípios da legalidade e da liberdade de associação, ao exigir que o recorrente, a despeito de se recusar a fazer parte da associação, por discordar de seus objetivos, se submeta aos seus mandos e cobranças” (Vol. 50, fl. 4,).

Aduz que, “em que pese tenha sido filiado a partir de 2002, pediu a desfiliação em setembro de 2011” (Vol. 50, fl. 6).

O Juízo a quo inadmitiu o apelo extremo, aos fundamentos de incidirem, no caso, os óbices das Súmulas 282 e 356, ambas do STF, e de que a fundamentação do acórdão recorrido atende as diretrizes desta CORTE (Vol. 53, fl. 4).

 

No Agravo, a parte recorrente refutou os empecilhos acima citados à inadmissão do recurso (Vol. 56).

Recebidos os autos nesta CORTE, a Presidência determinou a devolução do processo à instância de origem para que observasse a orientação fixada no RE 695.911, Tema 492 da repercussão geral (Vol. 61, fl.

2).

Em face dessa decisão, o Presidente do TJDFT determinou o retorno dos autos ao Órgão Julgador para eventual juízo de retratação ao decidido no Tema 492 (Vol. 62). Todavia, o acórdão recorrido foi mantido nos termos da seguinte ementa (Vol. 64, fls. 1-2):


“DIREITO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. TAXAS CONDOMINIAIS. ASSOCIAÇÃO IRREGULAR DE MORADORES. CONDOMÍNIO DE FATO. DESPESAS COMUNS. COBRANÇA DEVIDA. REJULGAMENTO DETERMINADO EM FACE DO JULGAMENTO DO RE Nº 695.911/SP (TEMA Nº 492 DA REPERCUSSÃO GERAL). RAZÕES DE DECIDIR COMPATÍVEIS COM A TESE FIRMADA NO PARADIGMA. ACÓRDÃO MANTIDO.

1 – Em face do que assentado pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário nº 695.911/SP (Tema de Repercussão Geral nº 492), "É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis" (RE 695911, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-073 DIVULG 16- 04-2021 PUBLIC 19-04-2021).

2 – A partir do reexame dos fundamentos do acórdão objeto de rejulgamento (Acórdão nº 871764), é possível constatar que as peculiaridades do caso concreto, elucidadas a partir da revisão dos fatos e provas constantes dos autos, demonstram de forma inequívoca que o Réu se filiou à associação Autora, inexistindo prova hábil a demonstrar a desfiliação por ele alegada. Diante disso, já que a discussão subjacente ao Tema nº

492 é sobre a legitimidade de cobrança por parte de associação de taxa de manutenção de proprietário não associado, a situação dos autos é diversa, pois o desligamento do associado não restou comprovado, razão pela qual inexiste fato impeditivo, modificativo ou extintivo apto a afastar a legitimidade das cobranças perseguidas neste Feito.

3 - Não obstante a valoração da prova produzida nestes autos, por si só, seja suficiente para a manutenção do acórdão, certo é que esta Corte de Justiça, de forma reiterada, defende a inaplicabilidade para a situação peculiar do Distrito Federal das teses firmadas nos Recursos  Especiais  repetitivos  nº  1.280.871  e  nº

1.439.163 (“As taxas de manutenção criadas por associação de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram”) e, como não poderia ser diferente, no Tema nº 492 da sistemática da repercussão geral. Isso porque é distinta, do ponto de vista fático, a situação considerada nos precedentes indicados, de associação voluntária de moradores que instituem condomínio de fato para congregar interesses comuns da mesma rua, bairro ou região por meio da delimitação de área comum, da situação configurada no Distrito Federal, em que os condomínios de fato são instituídos em área comum que foi objeto de parcelamento/loteamento irregular do solo, buscando o recebimento das taxas de contribuição destinadas à manutenção das áreas comuns.

Apelação Cível desprovida.”

Em novo juízo de admissibilidade, o Recurso Extraordinário foi admitido e determinada a remessa dos autos ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (Vol. 66).

Novamente, o Presidente do STF determinou a devolução do processo ao Tribunal de origem para que observasse o Tema 492 da repercussão geral (Vol. 68).

 

Desta feita, o Presidente do TJDFT, consignou que “em que pese a determinação da Corte Suprema, constata-se que este Tribunal de Justiça, como dito, já se desincumbiu do cumprimento da sistemática dos repetitivos, e diante da manutenção do acórdão dissonante, um novo envio dos autos ao STF, conforme disposição do citado artigo 1.041 do CPC, se revela medida pertinente. Assim, remetam-se os autos ao Supremo Tribunal Federal” (Vol. 72, fl. 232).

É o relatório. Decido.

Inicialmente, não merecem ser acolhidas as razões da parte recorrente. Em relação à suscitada ofensa ao art. 93, IX, da Carta Magna, o Juízo de origem não destoou do entendimento firmado por esta CORTE no julgamento do AI 791.292-QO-RG/PE (Rel. Min. GILMAR MENDES,

Tema 339).

Nessa oportunidade, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL assentou que o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal de 1988 “exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão”.

No caso em apreço, a fundamentação do acórdão recorrido alinha-se às diretrizes desse precedente.

No que remanesce, o Plenário do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do RE 695.911, de relatoria do Min. DIAS TOFFOLI, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 492), DJe de 19/4/2021, fixou tese no sentido de que:

“É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras  de  imóveis  ou  (ii)  sendo  novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação

esteja registrado no competente Registro de Imóveis.”

O acórdão encontra-se assim ementado:

“EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Liberdade associativa. Cobrança de taxas de manutenção e conservação de áreas de loteamento. Ausência de lei ou vontade das partes. Inconstitucionalidade. Lei nº 13.467/17. Marco temporal. Recurso extraordinário provido. Fatos e provas. Remessa dos autos ao tribunal de origem para a continuidade do julgamento, com observância da tese.

1. Considerando-se os princípios da legalidade, da autonomia de vontade e da liberdade de associação, não cabe a associação, a pretexto de evitar vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a proprietário de imóvel que não tenha a ela se associado (RE nº 432.106/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 3/11/11).

2. Na ausência de lei, as associações de moradores de loteamentos surgiam apenas da vontade de titulares de direitos sobre lotes e, nesse passo, obrigações decorrentes do vínculo associativo só podiam ser impostas àqueles que fossem associados e enquanto perdurasse tal vínculo.

3. A edição da Lei nº 13.465/17 representa um marco temporal para o tratamento da controvérsia em questão por, dentre outras modificações a que submeteu a Lei nº 6.766/79, ter alterado a redação do art. 36-A, parágrafo único, desse diploma legal, o qual passou a prever que os atos constitutivos da associação de imóveis em loteamentos e as obrigações deles decorrentes vinculam tanto os já titulares de direitos sobre lotes que anuíram com sua constituição quanto os novos adquirentes de imóveis se a tais atos e obrigações for conferida publicidade por meio de averbação no competente registro do imóvel.

4. É admitido ao município editar lei que disponha sobre forma diferenciada de ocupação e parcelamento do solo urbano em loteamentos fechados, bem como que trate da disciplina interna desses espaços e dos requisitos urbanísticos mínimos a serem neles observados (RE nº 607.940/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe de 26/2/16).

5. Recurso extraordinário provido, permitindo-se o prosseguimento do julgamento pelo tribunal de origem, observada a tese fixada nos autos: “É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir do qual se torna possível a cotização de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, desde que, i) já possuidores de lotes, tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou, (ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis”.

No caso concreto, o Tribunal de origem, com base na prova produzida nos autos, confirmou a sentença que condenara o ora recorrente a efetuar o pagamento das taxas condominiais indicadas pela Associação Euler Paranhos administradora do condomínio denominado Chácaras Rurais Euler Paranhos, pois concluiu ser inequívoca a filiação do réu a dita associação, além do que não foi comprovada a sua desfiliação da entidade.

Nesse ponto específico, vejam-se os fundamentos do voto que, em juízo de retratação, confirmou o acórdão recorrido (Vol. 64 , fls. 8-9):

“Segundo o acervo fático-probatório dos autos, o Réu, ora Apelante, ingressou de forma voluntaria nos quadros da Autora, em 17/08/2002 (Doc. Num. 11853596 – Pág. 02), não havendo, contudo, comprovação da alegada circunstância de que ele tivesse se desfiliado dela.

Aliás, o Réu até alega que não está mais filiado à associação desde 17/03/2010, nos termos do documento colacionado ao ID Num. 11853636 – Pág. 52. Entretanto, a partir da valoração da prova produzida, esta Quinta Turma Cível expressamente salientou que o referido  documento,  a  despeito  de  prever  o cancelamento das associações previstas anteriormente ao recadastramento efetivado, não demonstra que a circunstância do Réu se insere nessa situação.

Ademais, também em valoração da prova produzida nestes autos, a Turma entendeu que o documento de ID Num. 11853636 – Pág. 56 também não tem o condão de comprovar o desligamento associativo do Réu a partir de 2011, pois, além de mera cópia, tratou-se de prova unilateralmente produzida por ele, sem qualquer demonstração que houvesse sido feito a sua entrega à associação Autora, corroborando, aliás, a circunstância de que ao menos até setembro de 2011 o Réu estava sim filiado à Autora.

Em suma, portanto, da prova produzida nos autos, é inequívoca a filiação do Réu à associação, bem assim não restou comprovada, por outro lado, a sua desfiliação.

Tais peculiaridades fáticas, por si só, já são suficientes para afastar a tese formulada no Tema nº 492, porque nela a discussão é sobre a legitimidade de cobrança por parte de associação de taxa de manutenção de proprietário não associado, o que, contudo, não é o caso dos autos.

Além disso, conforme se tratou no acórdão ora sujeito a rejulgamento, diversamente do Réu, que não comprovou a sua desfiliação dos quadros da associação Autora, esta última demonstrou, por meio de seu estatuto (Doc. Num. 11853596 – Págs. 12/23) e das atas das assembleias gerais em que instituídos os valores cobrados (Doc. Num. 11853596 – Págs. 03/10 e 11853641), aliado à demonstração clara e detalhado débito e de sua evolução (Doc. Num. 11853596).

Dessa maneira, tendo sido comprovada a condição de associado do Réu, e não tendo ele se desincumbido do ônus de demostrar de forma suficiente a sua desfiliação, em nada contraria o paradigma da repercussão geral o que foi decidido no Acórdão nº 871.764, por mais que possa parecer que a premissa adotada (associação formal ou não ao condomínio de fato) tenha sido formulada em sentido contrário à tese.

Apenas essas conclusões são suficientes para manter o

acórdão ”.


Ao assim decidir, o Tribunal a quo respeitou o entendimento sedimentado no Tema 492, no qual se considerou inconstitucional a cobrança por parte de Associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano unicamente de proprietário não associado anterior à promulgação da Lei 13.465/2017 ou, a partir daí, daqueles que, já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis.


Cumpre esclarecer a razão pela qual, efetivamente, o

Tema 492 aplica-se ao caso dos autos.


O TJDF, em juízo negativo de retratação, consignou que não incide o Tema 492 da sistemática da repercussão geral, bem como as teses firmadas nos Recursos Especiais repetitivos 1.280.871 e 1.439.163 (“As taxas de manutenção criadas por associação de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram”), porque a questão no presente processo “é distinta, do ponto de vista fático, da situação considerada nos precedentes indicados, de associação voluntária de moradores que instituem condomínio de fato para congregar interesses comuns da mesma rua, bairro ou região por meio da delimitação de área comum, da situação configurada no Distrito Federal, em que os condomínios de fato são instituídos em área comum que foi objeto de parcelamento/loteamento irregular do solo, buscando o recebimento das taxas de contribuição destinadas à manutenção das áreas comuns” (Vol. 64, fl. 2)


No acórdão anterior, que foi mantido em juízo negativo de retratação, o Tribunal de origem já havia assentado que (Vol. 41, fl. 14):


“Deve ser destacado ainda que, em face das peculiaridades do Distrito Federal, onde a ocupação irregular do solo é a regra e também que a Ré/Apelante quando adquiriu seu imóvel, por cessão de direitos, estava ciente de que se tratava de imóvel irregular e que, porquanto no ordenamento jurídico pátrio somente existe a previsão de formação de condomínio vertical, não existindo regulação legal para a formação de condomínio horizontal, não pode ela alegar desconhecimento da lei.

Assim, vê-se que o pagamento da quota relativa ao rateio das despesas condominiais decorre da relação com a coisa e não de obrigação pessoal.

Ressalte-se, por fim, que não se poder falar em liberdade de associação quando a desfiliação de condômino representa a perspectiva de locupletamento ilícito.

Conclui-se, assim, por ser desinfluente a efetiva adesão de determinado condômino/associado ao ente condominial ou associação, assim como a real utilização dos benefícios disponibilizados, para que tenha de participar do rateio das despesas de manutenção do ente coletivo.“


Ocorre que as peculiaridades acerca do caso concreto indicadas pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não foram consideradas no julgamento do precedente paradigma julgado sob o Tema 492.


A propósito, confiram-se os seguinte trechos do voto do Relator daquele leading case, o Eminente Min. DIAS TOFFOLI:

“Dessa perspectiva, a conclusão proposta nestes autos não se dirige à inconstitucionalidade da figura da associação de moradores de loteamento urbano para gerência das áreas de uso comum. Afinal:

(i) o fim é, em princípio, lícito: gestão de interesses comuns, inclusive por meio da prestação de serviços de utilidade pública (alguns em complementação aos serviços estatais, como recolhimento de lixo, segurança, dentre outros);

(ii) a constituição é voluntária (já que formada por assentimento dos detentores de direitos sobre os imóveis); e

(iii) a direção é unificante (congregam-se os interessados em torno da proposta de melhor qualidade de vida a todos), constituída com perspectiva de prolongamento no tempo (ou seja, não é direcionada a uma atuação pontual e temporária).

Apreciando, portanto, o aspecto inicial da celeuma, é possível vislumbrar a existência de associação lícita de pessoas na reunião que se perfaz e que se perfazia mesmo na ausência de lei expressa para a organização dos loteamentos.

Não obstante, toda forma jurídica encontra limitações no complexo normativo e, do ponto de vista constitucional, há comandos muito claros às associações que se perfectibilizam como limites a sua atuação. São os comandos constitucionais pertinentes, extraídos do art. 5º da Constituição Federal:

(...)

O que emana, portanto, diretamente dos dispositivos da Constituição Federal é que, se de um lado: (i) se assegura a plenitude da liberdade de associação (art. 5º, XVII), (ii) se mantêm as entidades associativas distantes da interferência estatal (art. 5º, XVIII) e (iii) se lhes garante legitimidade judicial e extrajudicial (5º, XXI); de outro lado, se preserva a liberdade do indivíduo de não se associar ou dela se desassociar a qualquer tempo (art. 5º, XX).


Esse é, segundo minha compreensão, o desenho jurídico que decorre diretamente do texto constitucional. Isso porque, ao mesmo tempo em que a Constituição Federal garante proteção a essa forma de congregação de interesses, ela também assegura a liberdade na integração a ela e, no mesmo passo, à desintegração. Como salientado por José Afonso da Silva:

(…)


Assim, embora, a princípio, estejam identificadas a licitude e a relevância dessa forma de organização (inegavelmente congregante de interesses de uma coletividade, com suprimento, não raro, de diversas lacunas dos serviços públicos), o fato é que essas associações, antes do advento da Lei nº 13.465/2017, surgiam  tão  somente  da  vontade  de  suas  partes integrantes e, nesse passo, obrigações dela decorrentes só poderiam vincular aqueles que a ela aderissem, e enquanto a ela estivessem vinculados.


Não vislumbro, desse modo, como se possa impor a integrante de loteamento obrigação da qual ele se desincumbiu quando da manifestação negativa de sua vontade, seja para sua retirada da associação (se já a tenha integrado), seja para seu não ingresso (se dela nunca participou).

 Seria, entendo, direta afronta a direito constitucional de liberdade.

Ressalte-se que a liberdade de associação consolida direito que, como a própria titulação indica, se situa na seara dos direitos de liberdade ou dos direitos de primeira geração/dimensão.

 Nesse campo, os meios de restrição são significativamente mais estreitos, como já reconheceu esta Corte em diversas oportunidades. Vide:

(…)

Evidentemente, não desconsidero que princípio algum é dotado de caráter absoluto, sendo, em verdade, sempre inspirado pelo pressuposto da máxima extensão, sem me olvidar da coerência que o sistema impõe.

Assim é que, mesmo os direito fundamentais, tais como o que ora se analisa liberdade de associação são passíveis de limitação em seu alcance. A própria Constituição Federal, seja por normas explícitas, seja por seu arcabouço principiológico, estabelece como e quando pode haver alguma limitação ao exercício dos direitos fundamentais.

Atente-se que toda restrição a um direito de liberdade configura, em essência, a imposição de uma obrigação (fazer, não fazer ou dar). E obrigações em razão do princípio da legalidade (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, art. 5º, II, da CF/88) só possuem validade quando expressamente consignadas em normas jurídicas: lei ou ajuste entre as partes.


Nesse passo, restrições ao direito de liberdade, além de exigirem restrição mínima, requerem necessariamente previsão em lei.

 

A esse respeito, colho trecho do voto do Ministro Ricardo Lewandowski proferido no julgamento da ADI nº 1.969/DF, de sua relatoria, em que Sua Excelência clarifica, a partir das preciosas lições de J. J. Gomes Canotilho, a maneira como os direitos fundamentais podem encontrar alguma restrição:

(…)

Dessa forma, é possível que se restrinja o alcance de um direito fundamental em três situações: a) em razão de seu desenho constitucional, quando a própria Constituição prevê limitação para seu exercício; b) em razão da existência de expressa autorização na Constituição da República para que o legislador ordinário, ao expedir ato legal regulamentando seu exercício, o limite; c) ou, ainda, em decorrência de uma ponderação com valores outros que ostentem igual proteção constitucional.


Relativamente à liberdade de associação, a expressa previsão constitucional restritiva diz respeito às associações de caráter paramilitar. 

No mais, a Constituição assegurou amplo exercício de liberdade, dado que ela protegeu as associações da interferência estatal indevida, exigiu manifestação judicial para sua dissolução compulsória e garantiu ao indivíduo o direito de se associar e de se desassociar.

Por outra perspectiva, não há no texto constitucional indicação do direito associativo como dependente de regulamentação legal. Nesse aspecto, foi peremptória a Constituição ao estabelecer que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado (art. 5º, XX, da CF).

Haveria, então, ponderação principiológica apta a minimizar, na situação sob análise, o alcance da liberdade de associação?

Nesse ponto, é imperioso recorrer aos ensinamentos de Robert Alexy, precisamente sintetizados por Rodrigo Capez, no sentido de que as colisões entre princípios, que ocorrem na dimensão do peso, exigem tratamento diverso das antinomias entre regras, que ocorrem na dimensão da validade (Capez, Rodrigo. Prisão e Medidas Cautelares Diversas: A individualização da Medida Cautelar no Processo Penal. São Paulo, Quartier Latin, 2017. p. 51) .


Essa é uma distinção relevante, dado que, no caso dos autos, suscitam-se princípios, e também regras, que seriam aptos a impor obrigação de pagamento, mesmo na ausência de legislação expressa, a detentor de imóvel que seja fração de loteamento com associação constituída.

De fato, aponta a parte recorrida, Associação de Proprietários Amigos da Porta do Sol (APAPS), como princípio antagônico à liberdade de associação a vedação ao enriquecimento ilícito , posição que é também defendida pelos amici curiae que se manifestaram contrariamente à pretensão autoral. Complementa a PGR situando o aclamado princípio como decorrência da eticidade (dever de probidade) que deve pautar as relações sociais e, como consequência, também da previsão constitucional da solidariedade (art. 3º, I, da CF) . Cito trecho do opinativo ministerial nesse sentido:

(…)

Também nas decisões proferidas pelas instâncias de origem embasadas em alegada valorização do imóvel promovida pela atuação da associação autora, se encontra menção ao princípio da vedação ao enriquecimento ilícito, assim como também se observa, nas mesmas decisões, explícita equiparação dos loteamentos aos condomínios para fins de remissão à obrigação propter rem. Transcrevo trechos das referidas decisões:

(...)

Em que pese o esforço argumentativo, nenhum dos princípios ou regras citados guarda expressa e direta previsão constitucional. Trata-se de regras jurídicas ou princípios de ordem infraconstitucional. Suas aplicações em face do princípio da liberdade associativa só faria sentido em um sopesamento entre esse princípio e eventual princípio constitucional no qual a regra se baseia. Isso porque, como ensina Rodrigo Capez, a colisão entre princípios e regras jurídicas.

 

(…)

No caso dos autos, todavia, não vislumbro de que modo se poderia identificar princípio constitucional que fosse substrato das regras apontadas. 

Vedação ao enriquecimento ilícito, obrigações propter rem e dever de eticidade são todos instrumentos civilistas de enorme importância, mas não deitam suas bases em princípios constitucionais aptos a serem sopesados em face da liberdade de associação.

Em verdade, é o princípio da legalidade o instrumento de sopesamento constitucional ao princípio da liberdade de associação. 

De um lado, assegurando que obrigação só é imposta por lei; de outro e por consequência garantindo que, na ausência de lei, não há para os particulares impositividade obrigacional, regendo-se a associação somente pela livre disposição de vontades.

Dito de outro modo, ante a ausência de obrigação legal, somente o elemento volitivo manifestado, consistente na anuência expressa da vontade de se associar, pode vincular as partes pactuantes e gerar para as mesmas direitos e obrigações decorrentes da associação.


Assim, eventual reconhecimento da possibilidade de se exigir daquele que não deseja se associar o pagamento de taxas ou encargos cobrados em função dos serviços prestados por uma associação a determinada coletividade significaria, na prática, obrigar o indivíduo a se associar, por imposição da vontade coletiva daqueles que, expressamente, anuíram com a associação e seus encargos.


 Equivaleria, também, a fabricar e legitimar fonte obrigacional que não seja a lei nem a vontade o que, evidentemente, implica ofensa ao princípio da legalidade e às liberdades individuais, notadamente à garantia fundamental da liberdade associativa.


Sob tais considerações, portanto, não há como impor qualquer obrigação a quem não queira se associar ou permanecer associado ante a ausência de manifestação expressa de vontade nesse sentido e de previsão legal da qual decorra uma relação obrigacional.”

Assim, verifica-se que a circunstância de o condomínio de fato ser instituído em área comum que foi objeto de parcelamento/loteamento irregular do solo não tem o condão de afastar a tese fixada no Tema 492.


Por fim, a argumentação recursal traz versão dos fatos diversa da exposta no acórdão, de modo que o acolhimento do recurso passa necessariamente pela revisão das provas. 


Incide, portanto, o óbice da Súmula 279 desta CORTE: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.

Diante do exposto, com base no art. 21, §1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.


Não se aplica o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015, tendo em vista que o julgado recorrido foi publicado antes da vigência da nova codificação processual.

Publique-se.

Brasília, 25 de novembro de 2021. Ministro Alexandre de Moraes Relator

Documento assinado digitalmente

Observação

13/12/2021 Legislação feita por: (MCH).

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 INC-00002 INC- 00017 INC-00020 ART-00093 INC-00009 ART-00102 INC-00003 LET-A CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED LEI-013105 ANO-2015 ART-00085 PAR-00011 ART-00333 INC-00001 ART-01041 CPC-2015 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL LEG-FED LEI-013465 ANO-2017 LEI ORDINÁRIA LEG-FED RGI ANO-1980 ART-00021 PAR-00001 RISTF-1980 REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUMSTF-000279 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF LEG- FED SUMSTF-000282 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF LEG-FED SUMSTF-000356 SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF

fim do documento


Por outro lado, Excelência, sem o embargo da ilegalidade da cobrança da dívida ora vergastada, verifica-se que a cobrança por eventuais “benefícios” não encontra qualquer justa causa, na medida em que todas as áreas que não são propriedades privadas (lotes), na verdade, são áreas públicas, tais como as ruas e praças.


Portanto, verifica-se que os tais “benefícios” na verdade é um dever do Estado, o que torna a cobrança de qualquer taxa sem qualquer embasamento fático e jurídico.


Em outras palavras, nas áreas públicas, “a segurança, asfalto, limpeza, esgoto e demais serviços disponíveis e comuns a todos os associados” (SIC) são provenientes da atuação do próprio Estado e não da associação, seja ela qual for.


Por tais motivos, a preservação do direito do recorrente em não se associar e não pagar qualquer numerário para continuar desfrutando do direito de utilizar seu imóvel não implica em qualquer enriquecimento sem causa, visto que a recorrida não demonstrou cabalmente quais seriam os serviços passíveis de serem reembolsados.


No mesmo sentido, vale novamente frisar o entendimento deste Egrégio Supremo Tribunal Federal, verbis:


“ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. MENSALIDADE. AUSÊNCIA DE ADESÃO.

Por não se confundir com a associação de moradores com condomínio disciplinado pela Lei 4.591/64, descabe, a pretexto de evitar vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a proprietário do imóvel que ela não tenha aderido. Considerações sobre o princípio da legalidade e da autonomia da manifestação da vontade artigo 5º, inciso II, e XX, Min. MARCO AURÉLIO, j. 20.09.11, v.u)


Sem prejuízo de todas as razões acima, verifica-se que não há qualquer cláusula convencional constante em escritura pública e averbada no cartório imobiliário, inserida especificamente na matricula do imóvel do recorrente, o que, efetivamente tornaria obrigatória o pagamento da referida dívida.


Portanto, ante a violação ao principio da livre associação (artigo 5, XX, CF), legalidade ( 5, II, CF), da propriedade privada ( XXII), e, por fim, da gritante violação do Tema 492 este Egrégio Tribunal, requer-se o provimento deste recurso.


6. DOS PEDIDOS


Face o exposto, consoante as razões de fato e direito acima aduzidas, requer-se provido o presente recurso, a fim de que seja considerada inexigível a pretensão aduzida na exoridal, por ofensa ao fundamental da liberdade de associação, legalidade, propriedade privada e Tema 492 STF.


Termos em que, Pede deferimento,


Peruibe, 23 de março de 2022.


DAVI TELES MARÇAL

 

OAB/SP 272.852



Nenhum comentário: