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sábado, 4 de janeiro de 2014

STJ - MIN SERGIO KUKINA MINISTERIO PUBLICO PODE DEFENDER DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGENEOS

DEFENDA-SE contra os GOLPES de IMOBILIÁRIAS  e de ASSOCIAÇÕES que VENDEM LOTEAMENTOS ILEGAIS E/ OU FALSOS "CONDOMÍNIOS RESIDENCIAIS DE LOTES "
RECORRA AO MINISTÉRIO PUBLICO ESTADUAL 

O MINISTÉRIO PUBLICO É PARTE LEGITIMA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PUBLICA 
EM DEFESA DA ORDEM URBANÍSTICA E DOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DOS MORADORES LESADOS POR 
FRAUDADORES DAS LEIS DE PARCELAMENTO DE SOLO URBANO 

"O direito à moradia digna é considerado fundamental pelo artigo 7º. da Constituição Federal.  Disso decorre que ainda que não houvesse outros interesses urbanísticos e ambientais em jogo, os interesses homogêneos dos adquirentes dos lotes são de ordem pública e podem ser defendidos em ação civil pública patrocinada pelo Ministério Púbico." 

STJ - "... No campo de loteamentos clandestinos ou irregulares, o Ministério Público é duplamente legitimado, tanto pela presença de interesse difuso (= tutela da ordem urbanística e/ou do meio ambiente), como de interesses individuais homogêneos (= compradores prejudicados pelo negócio jurídico ilícito e impossibilidade do objeto)...." (REsp 897.141/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/10/2008, DJe 13/11/2009)

TJ SP - LOTEAMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Procedência - Legitimidade do Ministério Público inquestionável, porquanto a ele incumbe zelar pelo efetivo respeito aos poderes públicos, aos serviços de relevância pública e aos direitos assegurados na Constituição Federal (...) Loteamento que também carece de infra-estrutura (conforme se extrai do mesmo laudo) - Condenação solidária do Município - Cabimento - Responsabilidade pela fiscalização do loteamento (art. 40 do referido diploma legal) - Precedentes (inclusive desta Câmara, envolvendo loteamentos vizinhos) - Sentença mantida - Recurso improvido. (Apelação 994030586505 (2833164200)  - Relator(a): Salles Rossi  - Comarca: São José do Rio Preto  - Órgão julgador: Oitava Turma Cível  - Data do julgamento: 25/08/2010  - Data de registro: 01/09/2010).

DEFENDA SEUS DIREITOS : RECORRA AO PROMOTOR DE JUSTIÇA 

UM DOS MAIORES OBSTÁCULOS ENCONTRADOS POR CIDADÃOS LESADOS POR LOTEADORES, ASSOCIAÇÕES DE MORADORES, E FALSOS CONDOMÍNIOS É A "ALEGAÇÃO" DE ALGUMAS PESSOAS QUE "O MINISTÉRIO PUBLICO NÃO TERIA LEGITIMIDADE PARA PROPOR A AÇÃO CIVIL PUBLICA PORQUE  "SE TRATA DE DIREITO INDIVIDUAL DISPONÍVEL", A SER DEFENDIDO INDIVIDUALMENTE PELO MORADOR COM SEU PROPRIO ADVOGADO PESSOAL  " ( sic )

CASO VOCE ESTEJA ENCONTRANDO ESTE TIPO DE DIFICULDADE EM SUA CIDADE, VOCE DEVE RECORRER À CORREGEDORIA DO MP , PREFERENCIALMENTE, COM AJUDA DE UM BOM ADVOGADO, DE CONFIANÇA E DE COMPETÊNCIA COMPROVADA 

UM DOS FUNDAMENTOS, É A DECISÃO DO TJ SP NO CASO ABAIXO, QUE FOI RATIFICADA PELO MINISTRO SERGIO KUKINA DO STJ, E QUE AFASTA DEFINITIVAMENTE  A ALEGAÇÃO DE "FALTA DE LEGITIMIDADE ATIVA DO MP" PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PUBLICA EM DEFESA DOS DIREITOS DOS MORADORES LESADOS 

MINISTRO DO STJ  CONFIRMA ACORDÃO DO TJ SP  E LEGITIMIDADE DO MP 

PROCESSO
AREsp 336905 UF: SPREGISTRO: 2013/0133743-9
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
AUTUAÇÃO23/05/2013
AGRAVANTER F IMÓVEIS ADMINISTRAÇÃO DE BENS E CONDOMÍNIOS S/C LTDA
AGRAVADOMINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
RELATOR(A)Min. SÉRGIO KUKINA - PRIMEIRA TURMA
ASSUNTODIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Ordem Urbanística - Parcelamento do Solo

"De acordo com a jurisprudência desta Corte, "o Ministério Público possui legitimidade para, no âmbito de ação civil pública em que se discute a execução de parcelamento de solo urbano com alienação de lotes sem aprovação de órgãos públicos competentes, formular pedido de indenização em prol daqueles que adquiriram os lotes irregulares. " (REsp 743.678/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/9/2009, DJe 28/9/2009)." 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO RECONHECIDA.
1. O Ministério Público possui legitimidade ativa para propor Ação Civil Pública para pleitear nulidade de contratos imobiliários relativos a loteamento irregular.
2. No campo de loteamentos clandestinos ou irregulares, o Ministério Público é duplamente legitimado, tanto pela presença de interesse difuso (= tutela da ordem urbanística e/ou do meio ambiente), como de interesses individuais homogêneos (= compradores prejudicados pelo negócio jurídico ilícito e impossibilidade do objeto). Assim sendo, em nada prejudica ou afasta a legitimação do Parquet o fato de que alguns consumidores, mesmo lesados, prefiram manter-se na posse do lote irregular.
3. Recurso Especial provido. 
(...) 
Ante o exposto, nego provimento ao agravo.
Publique-se.
Brasília (DF), 16 de dezembro de 2013.
MINISTRO SÉRGIO KUKINA 

Relator
LEIA A INTEGRA desta decisão clicando AQUI 

ENTENDA O CASO NO TJ SP 

Processo:
0518989-91.2000.8.26.0100 (990.10.544512-8) Retornou dos Sup. Tribunais
Classe:
Apelação
Área: Cível
Assunto:
DIREITO CIVIL-Coisas-Promessa de Compra e Venda
Origem:
Comarca de São Paulo / Foro Central Cível / 28ª Vara Cível
Números de origem:
583.00.2000.518989-8/000000-000
Distribuição:
4ª Câmara de Direito Privado
Relator:
FRANCISCO LOUREIRO
Revisor:
ENIO ZULIANI

ACORDÃO DO TJ SP  - 

Apelação Cível no  0518989-91.2000.8.26.0100
Comarca: SÃO PAULO
Juiz:  ROGÉRIO MURILLO PEREIRA CIMINO
Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO E OUTROS
VOTO No  13.170
AÇÃO CIVIL PÚBLICA Regularização de 
loteamento Legitimidade ativa do Ministério Público 
para ajuizamento da ação, que envolve interesses 
urbanísticos, ambientais e direito fundamental à 
moradia digna Reconhecimento da ilegitimidade ad 
causam passiva do réu sócio de uma das pessoas 
jurídicas requeridas e dos membros da associação de 
moradores que figuraram individualmente no pólo 
passivo do feito Condenação da ré proprietária formal 
do imóvel que deve ser limitada ao consentimento para 
os atos necessários à devida transferência do domínio Responsabilidade dos loteadores e da pessoa jurídica 
que administrou a carteira do loteamento pelas 
irregularidades verificadas Ausência de aprovação do 
loteamento pelos órgãos municipais competentes e do 
registro imobiliário, exigidos pelos arts. 12 e 18 da Lei 
n. 6.766/79 Obras básicas de infra-estrutura ainda não 
implantadas Ação procedente, para condenar os réus 
a promover a regularização do empreendimento e a 
implementação das obras necessárias, bem como 
indenizar os adquirentes lesados, nos termos postulados 
na inicial Recurso do réu Gustavo de Souza provido, 
da ré Wanda Gonçalves Dias parcialmente provido e da 
ré R. F. Imóveis Administração de Bens e Condomínios 
S/C LTDA. não provido, com observação.
São recursos de apelação interpostos contra a sentença de fls. 1342/1346 dos autos, que julgou procedente a ação civil pública para regularização de loteamento ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra R. F. IMÓVEIS ADMINISTRAÇÃO DE BENS E CONDOMÍNIOS S/C LTDA. E OUTROS, para o fim de determinar aos réus que regularizem o Loteamento Pedra Azul, indenizem os compradores dos lotes excluídos, reparem os prejuízos causados ao poder público e paguem ao Município as despesas relativas à desapropriação das áreas necessárias.
Fê-lo a sentença recorrida, sob o argumento de que os documentos constantes dos autos demonstram que os réus promoveram o parcelamento do solo e venda dos lotes do Loteamento Pedra Azul, sem providenciar a aprovação nos órgãos competentes, em afronta às exigências legais impostas pela Lei n. 6.766/79, prejudicando, assim, a coletividade em geral, relativamente ao aproveitamento adequado e seguro do espaço urbano. Reconheceu a sentença a obrigação dos réus de promoverem a regularização 
requerida pelo Ministério Público, em defesa do interesse público.
(....)
Os recursos fora contrariados (fls. 1433/1440).
O parecer da D. Procuradoria Geral de Justiça foi no sentido do improvimento dos recursos (fls. 1453/1466).
É o relatório.
1. A preliminar de ilegitimidade ad causam ativa do Ministério Público deve ser rejeitada.
Em relação ao tema, cumpre de pronto observar que a questão da regularização de loteamentos envolve interesses que transcendem, em muito, o simples prejuízo patrimonial dos adquirentes dos lotes. 
O direito à moradia digna é considerado fundamental pelo artigo 7º. da Constituição Federal. 
Disso decorre que ainda que não houvesse outros interesses urbanísticos e ambientais em jogo, os interesses homogêneos dos adquirentes dos lotes são de ordem pública e podem ser defendidos em ação civil pública patrocinada pelo Ministério Púbico. 
Parece claro que o loteamento irregular, sem a aprovação da Municipalidade e sem Registro Imobiliário, exigidos 
pelos arts. 12 e 18 da Lei n. 6.766/79, além de carecer de obras de 
infra-estrutura, afeta vários outros interesses de ordem pública. 
A ausência de guias e sarjetas provoca o 
escoamento errôneo das águas pluviais, com conseqüente 
assoreamento de rios e áreas de erosão. As vias públicas, que 
integram a malha viária do município, serão de difícil trânsito não 
somente dos moradores, mas de quantos as utilizem como acesso. A falta de iluminação pública afeta diretamente a questão da segurança. 
A incorreta implantação do loteamento fere sobretudo interesses 
urbanísticos, além de prejudicar o direito fundamental à moradia, 
impedindo que os compradores adquiram validamente a propriedade dos lotes.
A matéria não é nova e já se encontra surrada 

por dezenas de julgados dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. (...)
Em caso idêntico ao ora em exame, foi fixado 
que o “Ministério Público é parte legítima para a defesa dos interesses 
dos compradores de imóveis loteados, em razão de projetos de 
parcelamento de solo urbano, face a inadimplência do parcelador na 
execução de obras de infra-estrutura ou na formalização e 
regularização dos loteamentos” (RESP 137.889/SP, Ministro 
Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, julgado em 
06.04.2000, DJ 29.05.2000, pág. 136)
Isso porque, na esteira do acima se afirmou, “o 
Ministério Público é parte legítima para propor Ação Civil Pública para discutir a regularização de loteamento relacionada ao 
desenvolvimento urbano, pois neste caso trata-se de interesses 
difusos e coletivos não referentes a pessoas determinadas e sobre 
bens não disponíveis. É dever constitucional do Ministério Público a defesa do patrimônio público e social, dos interesses difusos e 
coletivos e de outras funções compatíveis com a sua natureza” (art. 

129, III e IX C.F.)” (REsp 436166/SP, Ministro JOSÉ DELGADO).

Diga-se que a legitimidade do Ministério Público deve ser admitida com largueza, em razão de um segundo papel, qual seja, “em verdade a ação coletiva, ao tempo em que propicia solução uniforme para todos os envolvidos no problema, livra o Poder Judiciário da maior praga que o aflige: a repetição de 
processos idênticos” (RESP 404.759/SP, Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, julgado em 17.12.2002, DJ 17.02.2003, pág. 226).
(...)
7. Fixadas estas premissas, no mérito, o decreto de procedência da ação deve ser mantido.

A clandestinidade e irregularidade do parcelamento do solo são patentes. 

Houve abertura de vias públicas e  a alienação de glebas com posse localizada, sob a fraude à lei de vendas de partes ideais. 

 


INTEGRA DO PARECER DA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO 

Apelação Cível nº 990.10.544512-8 – São Paulo
Apelantes: Gustavo de Souza e Outros
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo
Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos

                   Egrégio Tribunal

                            Colenda Câmara


 Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra R.F. Imóveis Administração de Bens e Condomínios S/C Ltda. e Outros visando obter a regularização de loteamento clandestino executado pelos apelantes ou, na impossibilidade, a reparação dos danos causados aos adquirentes, com indenização integral, permuta de lotes e restituição dos valores e despesas advindos das aquisições.

A r. sentença recorrida acolheu integralmente o  pleito inicial para condenar solidariamente os réus a: a) regularizarem o loteamento clandestino denominado “Pedra Azul”, no prazo de dois anos; b) indenizarem os compradores dos lotes, na impossibilidade da regularização, no valor que pagaram, com correção monetária e juros de mora, sem prejuízo das despesas realizadas nos lotes; c) providenciarem, no mesmo prazo, a reparação dos danos provocados junto ao poder público, reurbanizando a área indevidamente devastada; d) pagarem ao Município o valor referente às despesas com desapropriação das áreas necessárias, nos termos da Lei Municipal nº 9.413/81.

Inconformados, apelam os requeridos, pleiteando a reforma da decisão monocrática.

Sustentam preliminares de ilegitimidade ativa do Ministério Público e ilegitimidade passiva deles, apelantes. No mérito, pugnam pela reforma da r. decisão por entenderem que não restou comprovado qualquer dano, quer ao meio ambiente, quer aos adquirentes dos lotes.

Contra-razões a fls. 1439/1440.

É o breve relato.

Os recursos de apelação interpostos não merecem ser providos.

O Ministério Público afirmou – e comprovou – que os apelantes realizaram parcelamento do solo urbano em desacordo com as disposições da Lei nº 6.766/79, criando o loteamento clandestino denominado “Pedra Azul”, procedendo à venda de lotes a terceiros de boa fé.

De tais condutas resultaram os danos de ordem ambiental e urbanística relatados na inicial, a ensejar a responsabilização dos empreendedores pelos prejuízos causados tanto ao meio ambiente, como aos consumidores adquirentes dos “lotes”.

As questões suscitadas pelos apelantes vêm sendo exaustivamente tratadas por esta Egrégia Corte de Justiça, em inúmeros recursos interpostos contra decisões favoráveis proferidas em ações civis públicas semelhantes, ajuizadas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo.

Nenhuma das teses abordadas pelos apelantes é nova e repetem-se costumeiramente, consoante se pode apreender dos recentes julgamentos abaixo colacionados, a título de amostra:

LOTEAMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Procedência - Legitimidade do Ministério Público inquestionável, porquanto a ele incumbe zelar pelo efetivo respeito aos poderes públicos, aos serviços de relevância pública e aos direitos assegurados na Constituição Federal - Municipalidade que é parte legítima para figurar no pólo passivo - Inexistência de litisconsórcio passivo com os adquirentes do loteamento - Ação que busca impedir a venda de lotes irregulares e determinar a regularização do loteamento - Descabida a inclusão, no pólo passivo, daqueles que, na verdade, foram vítimas do parcelamento irregular do solo - Precedentes - Inocorrência de prescrição - Conduta omissiva permanente do Município - Prazo que começa a fluir do último ato omissivo (artigo 23 da Lei 7.347/85) - Prova pericial conclusiva acerca do efetivo parcelamento do solo - Destinação urbana a imóvel rural - Afronta à Lei 6.766/79 - Loteamento que também carece de infra-estrutura (conforme se extrai do mesmo laudo) - Condenação solidária do Município - Cabimento - Responsabilidade pela fiscalização do loteamento (art. 40 do referido diploma legal) - Precedentes (inclusive desta Câmara, envolvendo loteamentos vizinhos) - Sentença mantida - Recurso improvido. (Apelação 994030586505 (2833164200)  - Relator(a): Salles Rossi  - Comarca: São José do Rio Preto  - Órgão julgador: Oitava Turma Cível  - Data do julgamento: 25/08/2010  - Data de registro: 01/09/2010).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - LOTEAMENTO IRREGULAR. I. Insurgência da Municipalidade contra decisão que concedeu a antecipação de tutela para regularização do parcelamento, além de execução de obras de infra-estrutura - Incompetência do juízo ausência de peças essências à comprovação da alegada prevenção - Exame prejudicado. II. Ilegitimidade passiva ad causam - Não ocorrência - Município de Várzea Paulista é parte legítima para figurar no pólo passivo da demanda, cujo objeto é a regularização do loteamento clandestino, conforme entendimento pacifico do STJ - Precedentes desta Corte. III. Litisconsórcio necessário - Não configuração - O Ministério Público é parte legítima na defesa dos interesses individuais homogêneos Desnecessidade da citação dos adquirentes dos lotes irregulares - Preliminares afastadas. IV - Imperioso a manutenção da tutela antecipada concedida em primeira instância, ante a presença de seus requisitos legais - Recurso improvido. (Agravo de Instrumento 994092362071 (9914105200) - Relator(a): Cristina Cotrofe  - Comarca: Várzea Paulista  - Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Público  - Data do julgamento: 28/07/2010  - Data de registro: 03/08/2010).

NULIDADE DA SENTENÇA - Alegação de ausência de fundamentação - Inexistência - Decisão concisa que não se confunde com omissão - Preliminar repelida. CERCEAMENTO DE DEFESA - Inocorrência - Desnecessidade de maior dilação probatória - Preliminar rejeitada. ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO - Descabimento - Reconhecida a legitimidade do "Parquet" para a defesa de interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, nos termos dos arts. 127 e 129, II, da CF/88 - Preliminar rejeitada. ILEGITIMIDADE PASSIVA DOS RÉUS - Inadmissibilidade - Caracterizada a responsabilidade dos requeridos pela irregularidade no loteamento - Descabida, ainda, a tese de impossibilidade jurídica do pedido - Ausência de ingerência indevida do Judiciário sobre a Administração - Preliminares afastadas. PRESCRIÇÃO - Inocorrência - Danos urbanísticos e ambientais cujos efeitos se protraem no tempo - Preliminar rechaçada. AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Loteamento irregular - Pedido de condenação dos réus à execução das obras de infra-estrutura faltantes - Admissibilidade - A discricionariedade da Administração não é absoluta, podendo o Judiciário intervir diante da ilegalidade da omissão administrativa - Configurado, outrossim, o dever dos réus de regularizar o empreendimento - Indenização corretamente arbitrada - Ação julgada procedente - Sentença mantida - Reexame necessário, considerado interposto, e recursos voluntários improvidos. (Apelação 994090113484 (8973475900)   - Relator(a): Leme de Campos  - Comarca: Itatiba  - Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Público  - Data do julgamento: 03/05/2010  - Data de registro: 14/05/2010).

Vê-se, pois, que a irresignação dos apelantes, externada nos recursos ora interpostos, está predestinada ao fracasso.

Com efeito. Não há que se falar em ilegitimidade ativa “ad causam” do Ministério Público, nem de ilegitimidade passiva dos co-requeridos.

No tocante a atuação do Ministério Público na esfera de tutela de interesses difusos ou coletivos potencialmente violados, cumpre observar que nos exatos termos do disposto no artigo 127 da Constituição Federal, o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo sua função institucional, consoante previsto no artigo 129, III, promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

A Lei da Ação Civil Pública, por sua vez, em seu artigo 5º, prevê a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de ação de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico, bem como a atuação como “custos legis” nas ações civis públicas em que não intervir como parte.
De tal entendimento não destoa a orientação do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LOTEAMENTO CLANDESTINO. AQUISIÇÃO DE LOTES IRREGULARES. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO EM PROL DOS ADQUIRENTES FEITO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO NO ÂMBITO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA.
1.O Ministério Público possui legitimidade para, no âmbito de ação civil pública em que se discute a execução de parcelamento de solo urbano com alienação de lotes sem aprovação de órgãos públicos competentes, formular pedido de indenização em prol daqueles que adquiriram os lotes irregulares. E isso por três motivos principais. 2. Em primeiro lugar, porque os arts. 1º, inc. VI, e 5º, inc. I, da Lei n. 7.347/85 lhe conferem tal prerrogativa. 3. Em segundo lugar porque, ainda que os direitos em discussão, no que tange ao pedido de indenização, sejam individuais homogêneos, a verdade é que tais direitos, no caso, transbordam o caráter puramente patrimonial, na medida que estão em jogo a moradia, a saúde e o saneamento básico dos adquirentes e, além disso, valores estéticos, ambientais e paisagísticos - para dizer o mínimo – do Município (art. 1º, inc. IV, da Lei n. 7.347/85). Aplicação, com adaptações, do decido por esta Corte Superior na IF 92/MT, Rel. Min. Fernando Gonçalves, Corte Especial, j. 5.8.2009. 4. Em terceiro e último lugar, porque os adquirentes, na espécie, revestem-se da qualidade de consumidor - arts. 81, p. ún., inc. III, e 82, inc. I, do CDC. 5. Recurso especial provido. (REsp 743678 / SP - RECURSO ESPECIAL 2005/0064840-7 Relator(a): Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141) - Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA - Data do Julgamento:15/09/2009 - Data da Publicação/Fonte - DJe 28/09/2009). 
Também esta Egrégia Corte de Justiça, apreciando questão semelhante, reconheceu não só a legitimidade ativa do MP para a propositura da ação como a legitimidade passiva e responsabilidade solidária e objetiva dos proprietários e loteadores:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS - INÉPCIA DA PEÇA INICIAL AFASTADA. Contendo a peça inicial todos os requisitos legais hábeis a delinear a lide, indicando as partes, os atos e as omissões de cada qual, descrevendo o local, bem assim a forma dos danos urbanísticos e ambientais, não pode ser qualificada de inepta, até porque permitiu ampla defesa. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E INTERESSE DE AGIR. O pedido formulado é amparado pelo ordenamento jurídico e mostra-se possível. O interesse de agir, seguindo linha lógica de raciocínio, é evidente, porquanto outra alternativa não restava ao autor da ação para obter a regularização do loteamento e indenização pelos danos urbanísticos e ambientais causados pelos co-réus. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM" DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Parquet compete defender os interesses da população e da comunidade relativamente à preservação do meio ambiente, seja ele natural ou urbano. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE PASSIVA DOS CO-RÉUS - LOTEADORES / PROPRIETÁRIOS DA GLEBA QUE AUFERIRAM LUCROS COM O FATO. Respondem objetivamente pelo loteamento clandestino os proprietários da gleba, que a receberam e continuam na prática ilegal, vendendo lotes e auferindo lucros. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS LEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM" DA MUNICIPALIDADE. O Município pode ser responsabilizado objetivamente, na seara ambiental, tanto se for causador direto do dano, quanto na hipótese em que a Administração Pública tem o dever de fiscalizar as atividades desenvolvidas pelos particulares, não somente quanto às atividades existentes, mas como no caso dos autos, previamente à instalação e implantação de unidades e atividades cujo funcionamento e local em que situadas causarão degradação ambiental. "In casu", a omissão das autoridades públicas municipais contribuiu para o estabelecimento de fato do loteamento irregular, permitindo os danos ambientais, urbanísticos e ao consumidor, cujas proporções são objeto da vertente ação civil pública. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - PARCELAMENTO IRREGULAR DO SOLO E LOTEAMENTO CLANDESTINO - DANOS URBANÍSTICOS E AMBIENTAIS COMPROVADOS. A implantação de parcelamento irregular, sem os aparelhamentos públicos necessários previamente à venda dos lotes (falta de pavimentação de ruas, inexistência de rede coletora de esgoto, lançamento de dejetos "in natura" diretamente em curso d'água) causa inquestionável dano ambiental e urbanístico, que deve ser reparado na forma possível, concretamente ou mediante indenização. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - VERBA HONORÁRIA INCABÍVEL EM SENDO O AUTOR DA AÇÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO. Descabe a condenação em verba honorária quando o autor da ação é o Ministério Público. RECURSO DOS CO-RÉUS AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO; RECURSO DA MUNICIPALIDADE AO QUAL SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO (Apelação Com Revisão 7296265000 - Relator(a): Regina Capistrano - Comarca: São Paulo - Órgão julgador: Câmara Especial de Meio-Ambiente - Data do julgamento: 10/04/2008 - Data de registro: 14/04/2008).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Regularização de loteamento - Legitimidade ativa do Ministério Público para ajuizamento da ação, que envolve interesses urbanísticos, ambientais e direito fundamental a moradia digna - Interesse de agir pela adequação do instrumento da ação civil pública para a defesa de interesses individuais homogêneos e indisponíveis, como no caso concreto - Ausência de aprovação do loteamento pelos órgãos municipais competentes e do registro imobiliário, exigidos pelos arts. 12 e 18 da Lei n. 6.766/79 - Obras básicas de infra- estrutura ainda não implantadas - Prescrição inocorrente, enquanto não cessada a situação de irregularidade - Responsabilidade das pessoas jurídicas que comercializaram indevidamente os lotes - Ação procedente, para condenar os réus a promover a regularização do empreendimento, no prazo hábil de um ano a contar do trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa diária de R$ 500,00 - Recurso não provido, com observação (Apelação Cível 4344374900 - Relator(a): Francisco Loureiro - Comarca: Itu - Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado - Data do julgamento: 09/10/2008 - Data de registro: 22/10/2008). 

No mérito, cumpre primeiramente ressaltar que ficou sobejamente demonstrada a irregularidade do loteamento clandestinamente implantado, sem registro nem aprovação dos órgãos públicos competentes, sem infra estrutura, sem rede de esgoto, sem abastecimento de água, sem sistema para adequada captação de águas pluviais, consoante se pode conferir dos inúmeros documentos acostados no vultoso inquérito civil entranhado nos autos desta ação civil pública, instruído com fotos e vários autos de infração lavrados pela Prefeitura Municipal.
Também restou abundantemente demonstrada nos autos a venda dos lotes.
O loteamento, pois, foi implantado e comercializado em afronta à legislação pertinente.
Com efeito, dispõe o art. 37 da Lei 6.766/79:
"Art 37 - E vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado."
No tocante ao dano ambiental, aplicável o principio da responsabilidade objetiva, previsto na Constituição Federal e legislação de regência.
Neste sentido já se manifestou esta colenda Corte de Justiça:
AGRAVO DE INSTRUMENTO ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA, INÉPCIA DA INICIAL E FALTA DE INTERESSE DE AGIR - INADMISSÍVEL A DISCUSSÃO DA MATÉRIA NA PRESENTE FASE PROCESSUAL - A IRRESIGNAÇÃO DEVE ESTAR ADSTRITA AO CONTEÚDO ESPECÍFICO E IMEDIATO DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA COMBATIDA. INCIDÊNCIA NA ESPÉCIE DA RESPONSABILIDADE AMBIENTAL OBJETIVA - INTELIGÊNCIA DO ART. 225, § 3o, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO ART. 14, § Io, DA LEI N° 6.938/81- AGRAVO DESPROVIDO INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. - MICROSSISTEMA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR QUE IMPREGNOU TODO O DIREITO CIVIL - HIPOSSUFICIENTE COM DEMANDA PLAUSÍVEL TEM DIREITO À PERÍCIA, CUSTEADA PELA RÉ - AGRAVO DA RÉ DESPROVIDO

Naquela oportunidade, assim restou decidido:

“A responsabilidade objetiva ambiental tem previsão na Constituição Federal de 1.988, que em seu art. 225, § 3o, assim determinou:

"Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
§ 3o - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."

Ademais, tem-se o comando do art. 14. § 1º, da Lei n° 6.938/81, que preceitua:

"Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:
(...)
§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente."

De tal sorte que deve ser mantida a r. sentença, de vez que deve ser reconhecida a responsabilização solidária de todos os réus, pois, além do esteio normativo que ampara a decisão, é impossível determinar qual a proporção da contribuição de cada um dos requeridos para a formação do loteamento.
Neste sentido:

AÇÃO CIVIL PUBLICA - Loteamento irregular em área de proteção ambiental - Condenação do proprietário do terreno e da empresa responsável por sua implantação, além dos sócios desta na obrigação de reparar os prejuízos urbanísticos - Eventual ausência de fiscalização do Poder Público que não exime o infrator de reparar, posto configurada violação voluntária à lei - Responsabilidade solidária dos sócios da empresa empreendedora que decorre do disposto no art 47 da Lei 6.766/79 - Cerceamento de defesa – Inocorrência - Extensão e valor dos danos que é objeto da fase de cumprimento do julgado - Apelos desprovidos (Apelação Cível 1907154000 - Relator(a): Galdino Toledo Júnior - Comarca: São Paulo - Órgão julgador: 10ª Câmara de Direito Privado - Data do julgamento: 05/05/2009 - Data de registro: 25/05/2009).

Diante do exposto o parecer desta Procuradoria de Justiça é pelo não provimento dos recursos de apelação dos requeridos.

            São Paulo, 07 de fevereiro de 2011.

Natália Fernandes Aliende da Matta

         Procuradora de Justiça

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

DIA MUNDIAL DA PAZ : "FRATERNIDADE, FUNDAMENTO E CAMINHO PARA A PAZ" PAPA FRANCISCO

Neste DIA MUNDIAL DA PAZ, rogamos a Nossa Senhora de Todos os Povos, Rainha da Paz, que passe à nossa frente, intercedendo por nós junto a JESUS,
abrindo estradas e caminhos, abrindo portas e portões, abrindo casas e corações, para que haja PAZ !
Vinde Nossa Senhora de Todos os POVOS!

"FRATERNIDADE, FUNDAMENTO E CAMINHO PARA A PAZ"

" há uma forma de promover a fraternidade – e, assim, vencer a pobreza – que deve estar na base de todas as outras. É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim experimentar a comunhão fraterna com os outros. Isto é fundamental, para seguir Jesus Cristo e ser verdadeiramente cristão. É o caso não só das pessoas consagradas que professam voto de pobreza, mas também de muitas famílias e tantos cidadãos responsáveis que acreditam firmemente que a relação fraterna com o próximo constitua o bem mais precioso." PAPA FRANCISCO 

Hoje, 1º de janeiro, celebra-se o Dia Mundial da Paz. Segue, na íntegra, a primeira mensagem do papa Francisco para este dia e que aborda o tema "Fraternidade, fundamento e caminho para a paz".

MENSAGEM DO SANTO PADRE FRANCISCO
PARA A CELEBRAÇÃO DO XLVII DIA MUNDIAL DA PAZ
1º DE JANEIRO DE 2014
FRATERNIDADE, FUNDAMENTO E CAMINHO PARA A PAZ
1. Nesta minha primeira Mensagem para o Dia Mundial da Paz, desejo formular a todos, indivíduos e povos, votos duma vida repleta de alegria e esperança. Com efeito, no coração de cada homem e mulher, habita o anseio duma vida plena que contém uma aspiração irreprimível de fraternidade, impelindo à comunhão com os outros, em quem não encontramos inimigos ou concorrentes, mas irmãos que devemos acolher e abraçar.

Na realidade, a fraternidade é uma dimensão essencial do homem, sendo ele um ser relacional. A consciência viva desta dimensão relacional leva-nos a ver e tratar cada pessoa como uma verdadeira irmã e um verdadeiro irmão; sem tal consciência, torna-se impossível a construção duma sociedade justa, duma paz firme e duradoura. E convém desde já lembrar que a fraternidade se começa a aprender habitualmente no seio da família, graças sobretudo às funções responsáveis e complementares de todos os seus membros, mormente do pai e da mãe. A família é a fonte de toda a fraternidade, sendo por isso mesmo também o fundamento e o caminho primário para a paz, já que, por vocação, deveria contagiar o mundo com o seu amor.

O número sempre crescente de ligações e comunicações que envolvem o nosso planeta torna mais palpável a consciência da unidade e partilha dum destino comum entre as nações da terra. Assim, nos dinamismos da história – independentemente da diversidade das etnias, das sociedades e das culturas –, vemos semeada a vocação a formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros. Contudo, ainda hoje, esta vocação é muitas vezes contrastada e negada nos fatos, num mundo caracterizado pela «globalização da indiferença» que lentamente nos faz «habituar» ao sofrimento alheio, fechando-nos em nós mesmos.

A globalização, como afirmou Bento XVI, torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos.[1] As inúmeras situações de desigualdade, pobreza e injustiça indicam não só uma profunda carência de fraternidade, mas também a ausência duma cultura de solidariedade. As novas ideologias, caracterizadas por generalizado individualismo, egocentrismo e consumismo materialista, debilitam os laços sociais, alimentando aquela mentalidade do «descartável» que induz ao desprezo e abandono dos mais fracos, daqueles que são considerados «inúteis». Assim, a convivência humana assemelha-se sempre mais a um mero do ut des pragmático e egoísta.

Ao mesmo tempo, resulta claramente que as próprias éticas contemporâneas se mostram incapazes de produzir autênticos vínculos de fraternidade, porque uma fraternidade privada da referência a um Pai comum como seu fundamento último não consegue subsistir.[2] Uma verdadeira fraternidade entre os homens supõe e exige uma paternidade transcendente. A partir do reconhecimento desta paternidade, consolida-se a fraternidade entre os homens, ou seja, aquele fazer-se «próximo» para cuidar do outro.

«Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9)

2. Para compreender melhor esta vocação do homem à fraternidade e para reconhecer de forma mais adequada os obstáculos que se interpõem à sua realização e identificar as vias para a superação dos mesmos, é fundamental deixar-se guiar pelo conhecimento do desígnio de Deus, tal como se apresenta de forma egrégia na Sagrada Escritura.

Segundo a narração das origens, todos os homens provêm dos mesmos pais, de Adão e Eva, casal criado por Deus à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 26), do qual nascem Caim e Abel. Na história desta família primigênia, lemos a origem da sociedade, a evolução das relações entre as pessoas e os povos.

Abel é pastor, Caim agricultor. A sua identidade profunda e, conjuntamente, a sua vocação é ser irmãos, embora na diversidade da sua atividade e cultura, da sua maneira de se relacionarem com Deus e com a criação. Mas o assassinato de Abel por Caim atesta, tragicamente, a rejeição radical da vocação a ser irmãos. A sua história (cf. Gn 4, 1-16) põe em evidência o difícil dever, a que todos os homens são chamados, de viver juntos, cuidando uns dos outros. Caim, não aceitando a predileção de Deus por Abel, que Lhe oferecia o melhor do seu rebanho – «o Senhor olhou com agrado para Abel e para a sua oferta, mas não olhou com agrado para Caim nem para a sua oferta» (Gn 4, 4-5) –, mata Abel por inveja. Desta forma, recusa reconhecer-se irmão, relacionar-se positivamente com ele, viver diante de Deus, assumindo as suas responsabilidades de cuidar e proteger o outro. À pergunta com que Deus interpela Caim – «onde está o teu irmão?» –, pedindo-lhe contas da sua ação, responde: «Não sei dele. Sou, porventura, guarda do meu irmão?» (Gn 4, 9). Depois – diz-nos o livro do Gênesis –, «Caim afastou-se da presença do Senhor» (4, 16).

É preciso interrogar-se sobre os motivos profundos que induziram Caim a ignorar o vínculo de fraternidade e, simultaneamente, o vínculo de reciprocidade e comunhão que o ligavam ao seu irmão Abel. O próprio Deus denuncia e censura a Caim a sua contiguidade com o mal: «o pecado deitar-se-á à tua porta» (Gn 4, 7). Mas Caim recusa opor-se ao mal, e decide igualmente «lançar-se sobre o irmão» (Gn 4, 8), desprezando o projeto de Deus. Deste modo, frustra a sua vocação original para ser filho de Deus e viver a fraternidade.

A narração de Caim e Abel ensina que a humanidade traz inscrita em si mesma uma vocação à fraternidade, mas também a possibilidade dramática da sua traição. Disso mesmo dá testemunho o egoísmo diário, que está na base de muitas guerras e injustiças: na realidade, muitos homens e mulheres morrem pela mão de irmãos e irmãs que não sabem reconhecer-se como tais, isto é, como seres feitos para a reciprocidade, a comunhão e a doação.

«E vós sois todos irmãos» (Mt 23, 8)

3. Surge espontaneamente a pergunta: poderão um dia os homens e as mulheres deste mundo corresponder plenamente ao anseio de fraternidade, gravado neles por Deus Pai? Conseguirão, meramente com as suas forças, vencer a indiferença, o egoísmo e o ódio, aceitar as legítimas diferenças que caracterizam os irmãos e as irmãs?

Parafraseando as palavras do Senhor Jesus, poderemos sintetizar assim a resposta que Ele nos dá: dado que há um só Pai, que é Deus, vós sois todos irmãos (cf. Mt 23, 8-9). A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Não se trata de uma paternidade genérica, indistinta e historicamente ineficaz, mas do amor pessoal, solícito e extraordinariamente concreto de Deus por cada um dos homens (cf. Mt 6, 25-30). Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido, torna-se no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha ativa.

Em particular, a fraternidade humana foi regenerada em e por Jesus Cristo, com a sua morte e ressurreição. A cruz é o «lugar» definitivo de fundação da fraternidade que os homens, por si sós, não são capazes de gerar. Jesus Cristo, que assumiu a natureza humana para a redimir, amando o Pai até à morte e morte de cruz (cf. Fl 2, 8), por meio da sua ressurreição constitui-nos como humanidade nova, em plena comunhão com a vontade de Deus, com o seu projeto, que inclui a realização plena da vocação à fraternidade.

Jesus retoma o projeto inicial do Pai, reconhecendo-Lhe a primazia sobre todas as coisas. Mas Cristo, com o seu abandono até à morte por amor do Pai, torna-Se princípio novo e definitivo de todos nós, chamados a reconhecer-nos n’Ele como irmãos, porque filhos do mesmo Pai. Ele é a própria Aliança, o espaço pessoal da reconciliação do homem com Deus e dos irmãos entre si. Na morte de Jesus na cruz, ficou superada também a separação entre os povos, entre o povo da Aliança e o povo dos Gentios, privado de esperança porque permanecera até então alheio aos pactos da Promessa. Como se lê na Carta aos Efésios, Jesus Cristo é Aquele que reconcilia em Si todos os homens. Ele é a paz, porque, dos dois povos, fez um só, derrubando o muro de separação que os dividia, ou seja, a inimizade. Criou em Si mesmo um só povo, um só homem novo, uma só humanidade nova (cf. 2,14-16).

Quem aceita a vida de Cristo e vive n’Ele, reconhece Deus como Pai e a Ele Se entrega totalmente, amando-O acima de todas as coisas. O homem reconciliado vê, em Deus, o Pai de todos e, consequentemente, é solicitado a viver uma fraternidade aberta a todos. Em Cristo, o outro é acolhido e amado como filho ou filha de Deus, como irmão ou irmã, e não como um estranho, menos ainda como um antagonista ou até um inimigo. Na família de Deus, onde todos são filhos dum mesmo Pai e, porque enxertados em Cristo, filhos no Filho, não há «vidas descartáveis». Todos gozam de igual e inviolável dignidade; todos são amados por Deus, todos foram resgatados pelo sangue de Cristo, que morreu na cruz e ressuscitou por cada um. Esta é a razão pela qual não se pode ficar indiferente perante a sorte dos irmãos.

A fraternidade, fundamento e caminho para a paz

4. Suposto isto, é fácil compreender que a fraternidade é fundamento e caminho para a paz. As Encíclicas sociais dos meus Predecessores oferecem uma ajuda valiosa neste sentido. Basta ver as definições de paz da Populorum progressio, de Paulo VI, ou da Sollicitudo rei socialis, de João Paulo II. Da primeira, apreendemos que o desenvolvimento integral dos povos é o novo nome da paz[3] e, da segunda, que a paz é opus solidaritatis, fruto da solidariedade.[4]

Paulo VI afirma que tanto as pessoas como as nações se devem encontrar num espírito de fraternidade. E explica: «Nesta compreensão e amizade mútuas, nesta comunhão sagrada, devemos (...) trabalhar juntos para construir o futuro comum da humanidade».[5] Este dever recai primariamente sobre os mais favorecidos. As suas obrigações radicam-se na fraternidade humana e sobrenatural, apresentando-se sob um tríplice aspecto: o dever de solidariedade, que exige que as nações ricas ajudem as menos avançadas; o dever de justiça social, que requer a reformulação em termos mais corretos das relações defeituosas entre povos fortes e povos fracos; o dever de caridade universal, que implica a promoção de um mundo mais humano para todos, um mundo onde todos tenham qualquer coisa a dar e a receber, sem que o progresso de uns seja obstáculo ao desenvolvimento dos outros.[6]

Ora, da mesma forma que se considera a paz como opus solidarietatis, é impossível não pensar que o seu fundamento principal seja a fraternidade. A paz, afirma João Paulo II, é um bem indivisível: ou é bem de todos, ou não o é de ninguém. Na realidade, a paz só pode ser conquistada e usufruída como melhor qualidade de vida e como desenvolvimento mais humano e sustentável, se estiver viva, em todos, «a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum».[7] Isto implica não deixar-se guiar pela «avidez do lucro» e pela «sede do poder». É preciso estar pronto a «“perder-se” em benefício do próximo em vez de o explorar, e a “servi-lo” em vez de o oprimir para proveito próprio (...). O “outro” – pessoa, povo ou nação – [não deve ser visto] como um instrumento qualquer, de que se explora, a baixo preço, a capacidade de trabalhar e a resistência física, para o abandonar quando já não serve; mas sim como um nosso “semelhante”, um “auxílio”».[8]

A solidariedade cristã pressupõe que o próximo seja amado não só como «um ser humano com os seus direitos e a sua igualdade fundamental em relação a todos os demais, mas [como] a imagem viva de Deus Pai, resgatada pelo sangue de Jesus Cristo e tornada objecto da ação permanente do Espírito Santo»,[9] como um irmão. «Então a consciência da paternidade comum de Deus, da fraternidade de todos os homens em Cristo, “filhos no Filho”, e da presença e da ação vivificante do Espírito Santo conferirá – lembra João Paulo II – ao nosso olhar sobre o mundo como que um novo critério para o interpretar»,[10] para o transformar.

A fraternidade, premissa para vencer a pobreza

5. Na Caritas in veritate, o meu Predecessor lembrava ao mundo que uma causa importante da pobreza é a falta de fraternidade entre os povos e entre os homens.[11] Em muitas sociedades, sentimos uma profunda pobreza relacional, devido à carência de sólidas relações familiares e comunitárias; assistimos, preocupados, ao crescimento de diferentes tipos de carências, marginalização, solidão e de várias formas de dependência patológica. Uma tal pobreza só pode ser superada através da redescoberta e valorização de relações fraternas no seio das famílias e das comunidades, através da partilha das alegrias e tristezas, das dificuldades e sucessos presentes na vida das pessoas.

Além disso, se por um lado se verifica uma redução da pobreza absoluta, por outro não podemos deixar de reconhecer um grave aumento da pobreza relativa, isto é, de desigualdades entre pessoas e grupos que convivem numa região específica ou num determinado contexto histórico-cultural. Neste sentido, servem políticas eficazes que promovam o princípio da fraternidade, garantindo às pessoas – iguais na sua dignidade e nos seus direitos fundamentais – acesso aos «capitais», aos serviços, aos recursos educativos, sanitários e tecnológicos, para que cada uma delas tenha oportunidade de exprimir e realizar o seu projeto de vida e possa desenvolver-se plenamente como pessoa.

Reconhece-se haver necessidade também de políticas que sirvam para atenuar a excessiva desigualdade de rendimento. Não devemos esquecer o ensinamento da Igreja sobre a chamada hipoteca social, segundo a qual, se é lícito – como diz São Tomás de Aquino – e mesmo necessário que «o homem tenha a propriedade dos bens»,[12] quanto ao uso, porém, «não deve considerar as coisas exteriores que legitimamente possui só como próprias, mas também como comuns, no sentido de que possam beneficiar não só a si mas também aos outros».[13]


Por último, há uma forma de promover a fraternidade – e, assim, vencer a pobreza – que deve estar na base de todas as outras. É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim experimentar a comunhão fraterna com os outros. Isto é fundamental, para seguir Jesus Cristo e ser verdadeiramente cristão. É o caso não só das pessoas consagradas que professam voto de pobreza, mas também de muitas famílias e tantos cidadãos responsáveis que acreditam firmemente que a relação fraterna com o próximo constitua o bem mais precioso.
A redescoberta da fraternidade na economia

6. As graves crises financeiras e económicas dos nossos dias – que têm a sua origem no progressivo afastamento do homem de Deus e do próximo, com a ambição desmedida de bens materiais, por um lado, e o empobrecimento das relações interpessoais e comunitárias, por outro – impeliram muitas pessoas a buscar o bem-estar, a felicidade e a segurança no consumo e no lucro fora de toda a lógica duma economia saudável. Já, em 1979, o Papa João Paulo II alertava para a existência de «um real e perceptível perigo de que, enquanto progride enormemente o domínio do homem sobre o mundo das coisas, ele perca os fios essenciais deste seu domínio e, de diversas maneiras, submeta a elas a sua humanidade, e ele próprio se torne objecto de multiforme manipulação, se bem que muitas vezes não diretamente perceptível; manipulação através de toda a organização da vida comunitária, mediante o sistema de produção e por meio de pressões dos meios de comunicação social».[14]

As sucessivas crises económicas devem levar a repensar adequadamente os modelos de desenvolvimento econômico e a mudar os estilos de vida. A crise atual, com pesadas consequências na vida das pessoas, pode ser também uma ocasião propícia para recuperar as virtudes da prudência, temperança, justiça e fortaleza. Elas podem ajudar-nos a superar os momentos difíceis e a redescobrir os laços fraternos que nos unem uns aos outros, com a confiança profunda de que o homem tem necessidade e é capaz de algo mais do que a maximização do próprio lucro individual. As referidas virtudes são necessárias sobretudo para construir e manter uma sociedade à medida da dignidade humana.

A fraternidade extingue a guerra

7. Ao longo do ano que termina, muitos irmãos e irmãs nossos continuaram a viver a experiência dilacerante da guerra, que constitui uma grave e profunda ferida infligida à fraternidade.

Há muitos conflitos que se consumam na indiferença geral. A todos aqueles que vivem em terras onde as armas impõem terror e destruição, asseguro a minha solidariedade pessoal e a de toda a Igreja. Esta última tem por missão levar o amor de Cristo também às vítimas indefesas das guerras esquecidas, através da oração pela paz, do serviço aos feridos, aos famintos, aos refugiados, aos deslocados e a quantos vivem no terror. De igual modo a Igreja levanta a sua voz para fazer chegar aos responsáveis o grito de dor desta humanidade atribulada e fazer cessar, juntamente com as hostilidades, todo o abuso e violação dos direitos fundamentais do homem.[15]

Por este motivo, desejo dirigir um forte apelo a quantos semeiam violência e morte, com as armas: naquele que hoje considerais apenas um inimigo a abater, redescobri o vosso irmão e detende a vossa mão! Renunciai à via das armas e ide ao encontro do outro com o diálogo, o perdão e a reconciliação para reconstruir a justiça, a confiança e esperança ao vosso redor! «Nesta óptica, torna-se claro que, na vida dos povos, os conflitos armados constituem sempre a deliberada negação de qualquer concórdia internacional possível, originando divisões profundas e dilacerantes feridas que necessitam de muitos anos para se curarem. As guerras constituem a rejeição prática de se comprometer para alcançar aquelas grandes metas econômicas e sociais que a comunidade internacional estabeleceu».[16]

Mas, enquanto houver em circulação uma quantidade tão grande como a atual de armamentos, poder-se-á sempre encontrar novos pretextos para iniciar as hostilidades. Por isso, faço meu o apelo lançado pelos meus Predecessores a favor da não-proliferação das armas e do desarmamento por parte de todos, a começar pelo desarmamento nuclear e químico.

Não podemos, porém, deixar de constatar que os acordos internacionais e as leis nacionais, embora sendo necessários e altamente desejáveis, por si sós não bastam para preservar a humanidade do risco de conflitos armados. É precisa uma conversão do coração que permita a cada um reconhecer no outro um irmão do qual cuidar e com o qual trabalhar para, juntos, construírem uma vida em plenitude para todos. Este é o espírito que anima muitas das iniciativas da sociedade civil, incluindo as organizações religiosas, a favor da paz. Espero que o compromisso diário de todos continue a dar fruto e que se possa chegar também à efetiva aplicação, no direito internacional, do direito à paz como direito humano fundamental, pressuposto necessário para o exercício de todos os outros direitos.

A corrupção e o crime organizado contrastam a fraternidade

8. O horizonte da fraternidade apela ao crescimento em plenitude de todo o homem e mulher. As justas ambições duma pessoa, sobretudo se jovem, não devem ser frustradas nem lesadas; não se lhe deve roubar a esperança de podê-las realizar. A ambição, porém, não deve ser confundida com prevaricação; pelo contrário, é necessário competir na mútua estima (cf. Rm 12, 10). Mesmo nas disputas, que constituem um aspecto inevitável da vida, é preciso recordar-se sempre de que somos irmãos; por isso, é necessário educar e educar-se para não considerar o próximo como um inimigo nem um adversário a eliminar.
A fraternidade gera paz social, porque cria um equilíbrio entre liberdade e justiça, entre responsabilidade pessoal e solidariedade, entre bem dos indivíduos e bem comum. Uma comunidade política deve, portanto, agir de forma transparente e responsável para favorecer tudo isto. Os cidadãos devem sentir-se representados pelos poderes públicos, no respeito da sua liberdade. Em vez disso, muitas vezes, entre cidadão e instituições, interpõem-se interesses partidários que deformam essa relação, favorecendo a criação dum clima perene de conflito.
Um autêntico espírito de fraternidade vence o egoísmo individual, que contrasta a possibilidade das pessoas viverem em liberdade e harmonia entre si. Tal egoísmo desenvolve-se, socialmente, quer nas muitas formas de corrupção que hoje se difunde de maneira capilar, quer na formação de organizações criminosas – desde os pequenos grupos até àqueles organizados à escala global – que, minando profundamente a legalidade e a justiça, ferem no coração a dignidade da pessoa. Estas organizações ofendem gravemente a Deus, prejudicam os irmãos e lesam a criação, revestindo-se duma gravidade ainda maior se têm conotações religiosas.
Penso no drama dilacerante da droga com a qual se lucra desafiando leis morais e civis, na devastação dos recursos naturais e na poluição em curso, na tragédia da exploração do trabalho; penso nos tráficos ilícitos de dinheiro como também na especulação financeira que, muitas vezes, assume caracteres predadores e nocivos para inteiros sistemas económicos e sociais, lançando na pobreza milhões de homens e mulheres; penso na prostituição que diariamente ceifa vítimas inocentes, sobretudo entre os mais jovens, roubando-lhes o futuro; penso no abomínio do tráfico de seres humanos, nos crimes e abusos contra menores, na escravidão que ainda espalha o seu horror em muitas partes do mundo, na tragédia frequentemente ignorada dos emigrantes sobre quem se especula indignamente na ilegalidade. A este respeito escreveu João XXIII: «Uma convivência baseada unicamente em relações de força nada tem de humano: nela vêem as pessoas coarctada a própria liberdade, quando, pelo contrário, deveriam ser postas em condição tal que se sentissem estimuladas a procurar o próprio desenvolvimento e aperfeiçoamento».[17] Mas o homem pode converter-se, e não se deve jamais desesperar da possibilidade de mudar de vida. Gostaria que isto fosse uma mensagem de confiança para todos, mesmo para aqueles que cometeram crimes hediondos, porque Deus não quer a morte do pecador, mas que se converta e viva (cf. Ez 18, 23).
No contexto alargado da sociabilidade humana, considerando o delito e a pena, penso também nas condições desumanas de muitos estabelecimentos prisionais, onde frequentemente o preso acaba reduzido a um estado sub-humano, violado na sua dignidade de homem e sufocado também em toda a vontade e expressão de resgate. A Igreja faz muito em todas estas áreas, a maior parte das vezes sem rumor. Exorto e encorajo a fazer ainda mais, na esperança de que tais ações desencadeadas por tantos homens e mulheres corajosos possam cada vez mais ser sustentadas, leal e honestamente, também pelos poderes civis.
A fraternidade ajuda a guardar e cultivar a natureza
9. A família humana recebeu, do Criador, um dom em comum: a natureza. A visão cristã da criação apresenta um juízo positivo sobre a licitude das intervenções na natureza para dela tirar benefício, contanto que se atue responsavelmente, isto é, reconhecendo aquela «gramática» que está inscrita nela e utilizando, com sabedoria, os recursos para proveito de todos, respeitando a beleza, a finalidade e a utilidade dos diferentes seres vivos e a sua função no ecossistema. Em suma, a natureza está à nossa disposição, mas somos chamados a administrá-la responsavelmente. Em vez disso, muitas vezes deixamo-nos guiar pela ganância, pela soberba de dominar, possuir, manipular, desfrutar; não guardamos a natureza, não a respeitamos, nem a consideramos como um dom gratuito de que devemos cuidar e colocar ao serviço dos irmãos, incluindo as gerações futuras.
De modo particular o sector produtivo primário, o sector agrícola, tem a vocação vital de cultivar e guardar os recursos naturais para alimentar a humanidade. A propósito, a persistente vergonha da fome no mundo leva-me a partilhar convosco esta pergunta: De que modo usamos os recursos da terra? As sociedades atuais devem refletir sobre a hierarquia das prioridades no destino da produção. De facto, é um dever impelente que se utilizem de tal modo os recursos da terra, que todos se vejam livres da fome. As iniciativas e as soluções possíveis são muitas, e não se limitam ao aumento da produção. É mais que sabido que a produção atual é suficiente, e todavia há milhões de pessoas que sofrem e morrem de fome, o que constitui um verdadeiro escândalo. Por isso, é necessário encontrar o modo para que todos possam beneficiar dos frutos da terra, não só para evitar que se alargue o fosso entre aqueles que têm mais e os que devem contentar-se com as migalhas, mas também e sobretudo por uma exigência de justiça e equidade e de respeito por cada ser humano. Neste sentido, gostaria de lembrar a todos o necessário destino universal dos bens, que é um dos princípios fulcrais da doutrina social da Igreja. O respeito deste princípio é a condição essencial para permitir um acesso real e equitativo aos bens essenciais e primários de que todo o homem precisa e tem direito.
Conclusão
10. Há necessidade que a fraternidade seja descoberta, amada, experimentada, anunciada e testemunhada; mas só o amor dado por Deus é que nos permite acolher e viver plenamente a fraternidade.
O necessário realismo da política e da economia não pode reduzir-se a um tecnicismo sem ideal, que ignora a dimensão transcendente do homem. Quando falta esta abertura a Deus, toda a actividade humana se torna mais pobre, e as pessoas são reduzidas a objecto passível de exploração. Somente se a política e a economia aceitarem mover-se no amplo espaço assegurado por esta abertura Àquele que ama todo o homem e mulher, é que conseguirão estruturar-se com base num verdadeiro espírito de caridade fraterna e poderão ser instrumento eficaz de desenvolvimento humano integral e de paz.
Nós, cristãos, acreditamos que, na Igreja, somos membros uns dos outros e todos mutuamente necessários, porque a cada um de nós foi dada uma graça, segundo a medida do dom de Cristo, para utilidade comum (cf. Ef 4, 7.25; 1 Cor 12, 7). Cristo veio ao mundo para nos trazer a graça divina, isto é, a possibilidade de participar na sua vida. Isto implica tecer um relacionamento fraterno, caracterizado pela reciprocidade, o perdão, o dom total de si mesmo, segundo a grandeza e a profundidade do amor de Deus, oferecido à humanidade por Aquele que, crucificado e ressuscitado, atrai todos a Si: «Dou-vos um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim como Eu vos amei. Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 34-35). Esta é a boa nova que requer, de cada um, um passo mais, um exercício perene de empatia, de escuta do sofrimento e da esperança do outro, mesmo do que está mais distante de mim, encaminhando-se pela estrada exigente daquele amor que sabe doar-se e gastar-se gratuitamente pelo bem de cada irmão e irmã.
Cristo abraça todo o ser humano e deseja que ninguém se perca. «Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele» (Jo 3, 17). Fá-lo sem oprimir, sem forçar ninguém a abrir-Lhe as portas do coração e da mente. «O que for maior entre vós seja como o menor, e aquele que mandar, como aquele que serve – diz Jesus Cristo –. Eu estou no meio de vós como aquele que serve» (Lc 22, 26-27). Deste modo, cada actividade deve ser caracterizada por uma atitude de serviço às pessoas, incluindo as mais distantes e desconhecidas. O serviço é a alma da fraternidade que edifica a paz.
Que Maria, a Mãe de Jesus, nos ajude a compreender e a viver todos os dias a fraternidade que jorra do coração do seu Filho, para levar a paz a todo o homem que vive nesta nossa amada terra.

Vaticano, 8 de dezembro de 2013.

FRANCISCUS
[1]Cf. Carta enc. Caritas in veritate (29 de Junho de 2009), 19: AAS 101 (2009), 654-655.

[2]Cf. Francisco, Carta enc. Lumen fidei (29 de Junho de 2013), 54: AAS 105 (2013), 591-592.

[3]Cf. Paulo VI, Carta enc. Populorum progressio (26 de Março de 1967), 87: AAS 59 (1967), 299.

[4]Cf. João Paulo II, Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 39: AAS 80 (1988), 566-568.

[5]Carta enc. Populorum progressio (26 de Março de 1967), 43: AAS 59 (1967), 278-279.

[6]Cf. ibid., 44: o. c., 279.

[7]Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 38: AAS 80 (1988), 566.

[8] Ibid., 38-39: o. c., 566-567.

[9] Ibid., 40: o. c., 569.

[10] Ibid., 40: o. c., 569.

[11]Cf. Carta enc. Caritas in veritate (29 de Junho de 2009), 19: AAS 101 (2009), 654-655.

[12] Summa theologiae, II-II, q. 66, a. 2.

[13] Conc. Ecum. Vat. II, Const. past. sobre a Igreja no mundo contemporâneo Gaudium et spes, 69; cf. Leão XIII, Carta enc. Rerum novarum (15 de Maio de 1891), 19: ASS 23 (1890-1891), 651; João Paulo II, Carta enc. Sollicitudo rei socialis (30 de Dezembro de 1987), 42: AAS 80 (1988), 573-574; Pont. Conselho «Justiça e Paz», Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 178.

[14] Carta enc. Redemptor hominis (4 de Março de 1979), 16: AAS 61 (1979), 290.

[15]Cf. Pont. Conselho «Justiça e Paz», Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 159.

[16] Francisco, Carta ao Presidente Vladimir Putin (4 de Setembro de 2013): L’Osservatore Romano (ed. portuguesa de 8/IX/2013), 5.

[17] Carta enc. Pacem in terris (11 de Abril de 1963), 17: AAS 55 (1963), 265.