Descrição: |
Trata-se
de ação de cobrança movida por SOCIEDADE CIVIL ORLA 500 em face de
HELOÍSA MARIA MARTINS GOMES, alegando, em síntese, que a Ré é
proprietária do imóvel constituído pelo lote de terreno nº 06, da quadra
19, atual Rua 15, onde foi edificada a casa nº 06, dentro dos limites
do loteamento Orla 500. Aduz que não obstante a sua obrigação de
contribuir, por beneficiar-se direta ou indiretamente, dos serviços
prestados pela sociedade autora, a Ré vem se recusando a pagar a sua
cota de contribuição mensal, sob fundamento de que não é obrigada a
associar-se e de que não está obrigada a pagar por não se tratar de
condomínio. Ao entendimento de que a recusa configura enriquecimento sem
causa, requer a condenação da Ré ao pagamento das cotas relativas ao
período de maio/99 a janeiro/2007, que totalizam R$24.910,00 (vinte e
quatro mil, novecentos e dez reais), além das que se vencerem no curso
da lide. Com a inicial, emendada a fls. 154, vieram os documentos de
fls. 09/150. A fls. 156 foi recebida a emenda da inicial de fls. 154 e
ordenada a citação. A Ré apresentou a reconvenção de fls. 165/169,
acompanhada dos documentos de fls. 170/171, onde aduziu, em resumo, que a
Reconvinda não possui legitimidade para ajuizar ação de cobrança contra
um morador do loteamento que não faz parte da associação e tampouco
usufrui dos serviços por ela prestados, caracterizando assim uma conduta
de má-fé. Ressalta que suportou prejuízos pela necessária contratação
de escritório de advocacia, pagando R$3.500,00 e também danos de ordem
moral, razão pela qual requer a condenação da Reconvinda na obrigação de
reparar os referidos danos. Além disso, apresentou a Ré a contestação
de fls. 173/185, acompanhada dos documentos de fls. 186/282, suscitando,
preliminarmente, incompetência absoluta do juízo, ilegitimidade
passiva, ilegitimidade ativa e ausência de interesse processual e
possibilidade jurídica do pedido. No mérito, sustentou, em síntese, que
existem no loteamento diversas associações de moradores, cada qual com a
produção de seus próprios serviços básicos, havendo provas que a Ré não
se aproveita dos serviços prestados pela Autora, mas tão somente da
Associação Bengala, da qual é associada. Réplica à contestação a fls.
291/307. Manifestação sobre a reconvenção a fls. 308/318. Instadas as
partes a especificarem provas, apenas a Ré se manifestou, na forma de
fls. 323. A fls. 336 foram indeferidas as provas requeridas pela Ré. O
feito foi sentenciado conforme fls. 358/359. Recurso de apelação da Ré a
fls. 361/382, recebido a fls. 388. Ao recurso foi dado provimento para
anular a sentença proferida, conforme decisão monocrática de fls.
424/425-verso, confirmada com o julgamento do Agravo Interno de fls.
426/427-verso. A fls. 429 foi determinado o cumprimento do V. acórdão,
sendo indeferida a produção de prova pericial, por desnecessária e
deferida a produção de provas testemunhal e documental superveniente.
Após certificada a inércia da Ré a fls. 430, foi decretada a perda das
provas a fls. 431. Vieram-me os autos conclusos. É O RELATÓRIO. PASSO A
DECIDIR. Diante da decretação da perda das provas a fls. 431, impõe-se o
julgamento antecipado da lide. Inicialmente, não há que se cogitar de
incompetência absoluta do juízo, tendo em vista que a parte autora
comprovou a fls. 31/40, que pelo novo estatuto, a associação passou a
ter sede no próprio loteamento, situado em Cabo Frio, na forma do art.
2º (fls. 35). As preliminares de ilegitimidade, seja ativa ou passiva,
são levadas a questão de mérito, sendo certo que aplicável a Teoria da
Asserção. Quanto à suposta ausência de interesse processual e
impossibilidade jurídica do pedido, tais questões se confundem com o
mérito e com ele devem ser julgadas. Sem outras preliminares, passemos à
análise do mérito. Através da presente ação a associação autora
pretende compelir a Ré a pagar mensalidades para manutenção e
conservação do loteamento ´Orla 500´. Não se pode negar que a Autora
realiza vários serviços em prol do loteamento a partir das contribuições
de seus associados. Porém, o que se discute neste autos não é a
prestação do serviço pela sociedade autora mas a obrigatoriedade
daqueles que não se associaram ao pagamento das contribuições. Os
documentos anexados aos autos pelas partes dão conta de inúmeras
decisões judiciais sobre a matéria já foram proferidas. É incontroverso
nos autos que não existe condomínio no loteamento e que existem outras
associações no empreendimento que visam o mesmo fim colimado pela
demandante. Com efeito, a não existência de condomínio dificulta a
uniformização de procedimentos visando a conservação do loteamento
justamente pela não obrigatoriedade ao pagamento das contribuições por
aqueles que não se associaram à Autora. Ressalte-se que no processo
movido pela Ré em face da Autora, citado por ambas as partes, apenas
ficou consagrada a inexistência da relação jurídica entre as demandantes
pelo reconhecimento da desfiliação da ora Ré, mas não se repeliu o
direito da associação autora de buscar a contraprestação em face de
efetivos beneficiários dos serviços prestados, mesmo que não associados.
Portanto, a questão passa a ser de fato, cabendo a análise dos autos no
intuito de se verificar se a Ré, efetivamente, usufrui dos serviços
prestados pela Autora. Nesse passo, torna-se oportuno observar que a Ré
informa sua filiação a outra associação, o que prova com o documento de
fls. 212. Alega que não usufrui dos serviços da Autora em razão do
suprimento por parte da associação a que atualmente é filiada. A
comprovar os serviços prestados pela referida associação, foram
acostados os documentos de fls. 256/258, que dão conta do pagamento de
salário a um funcionário e pagamento de serviços autônomos de coleta de
lixo e de manutenção, sem especificação. Em contrapartida, a parte
autora demonstrou pelos documentos trazidos com a inicial que possui
diversos funcionários empregados e, efetivamente, são promovidos
serviços de segurança, portaria, limpeza, capinação, manutenção, dentre
outros a permitir a organização do loteamento. No entanto, deve ser
ressaltado que, em princípio, deve prevalecer a liberdade de associação,
em observância ao comando constitucional do art. 50, II e XX, sendo
certo que para que se verifique o direito de exigir a contraprestação do
não associado, deverá ser demonstrada a efetiva fruição do serviço
prestado. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO DE
COBRANÇA DE COTA DE MANUTENÇÃO E CONSERVAÇÃO DE LOTEAMENTO IMOBILIÁRIO
URBANO. CO-PROPRIETÁRIO NÃO ASSOCIADO. COTAS ´CONDOMINIAIS´ OU
´ASSOCIATIVAS´. CONDOMÍNIO ATÍPICO OU DE FATO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL
DA RESERVA LEGAL E DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO (CF, 5O, II E XX).
PRIVATIZAÇÃO INDEVIDA DO ESPAÇO PÚBLICO. OBRIGAÇÃO PESSOAL E NÃO REAL.
PRESCRIÇÃO. Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude da lei, não podendo ser compelido a se associar a
entidade privada. Associação de moradores não tem nenhum direito de
crédito em face de morador que não se associou. Serviços de segurança,
limpeza e conservação que cabem ao Poder Público prestar como obrigação
constitucional de sua razão de ser. Privatização dos espaços públicos
por entidade privada. Imposição de obrigação ao particular de pagar
duplamente pelos mesmos serviços, para os quais já contribui através de
impostos e taxas. Relação jurídica que não se confunde com a obrigação
condominial, na qual as áreas comuns integram a fração ideal do imóvel
do condômino e, muito menos, com a obrigação tributária, cujo fundamento
é o dever de constitucional de contribuir para a manutenção do Estado e
dos serviços públicos. Livre associação e livre desvinculação
associativa. Conhecimento e provimento do recurso. DES. ROGERIO DE
OLIVEIRA SOUZA - Julgamento: 03/03/2015 - VIGESIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL.
0008079-03.2013.8.19.0003 - APELACAO. Data de Julgamento: 03/03/2015.
Observe-se que instadas as partes a especificarem provas, deixou a
Autora de apresentar qualquer requerimento, conforme certificado a fls.
332, mesmo após ter conhecimento sobre a impugnação da Ré em sua peça
contestatória quanto à diferenciação de tratamento entre associados e
não associados. Com efeito, diante da negativa da Ré quanto à efetiva
prestação do serviço de coleta de lixo, de conservação da via em que se
localiza o seu imóvel, de manutenção, entre outros, caberia à Autora
demonstrar cabalmente o fato constitutivo de seu direito, conforme
preceitua o art. 333, I do CPC. Nesse ponto, entendo que os documentos
trazidos pela Autora, apesar de demonstrar a existência da administração
da portaria, prestação de serviços de coleta de lixo, preservação dos
logradouros com pintura, capinação, dentre outros, não evidenciaram a
prestação de serviços diretamente à Autora, sendo certo que não se deve
olvidar que a Ré faz parte de outra entidade existente no local. De tal
modo, não há que se impor à Ré o pagamento de cotas de manutenção à
Autora. No que tange à reconvenção, não se pode penalizar a Reconvinda
por exercer seu direito de ação, que tem proteção constitucional, na
forma do art. 5º, XXXV, não havendo abuso a ser reconhecido no caso.
Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na inicial,
condenando a Autora ao pagamento das despesas processuais e dos
honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (mil reais), na forma do
parágrafo 4º do artigo 20 do CPC. Outrossim, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO
formulado pela Ré-Reconvinte na ação reconvencional, condenando-a ao
pagamento das respectivas despesas processuais e dos honorários
advocatícios que fixo em R$400,00 (quatrocentos reais), na forma do
parágrafo 4º do artigo 20 do CPC. Transitada em julgado, dê-se baixa e
arquivem-se os autos. Publique-se e Intimem-se.
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