domingo, 25 de novembro de 2012

" Não pode haver liberdade para violar a lei" leia OS LIMITES DA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL NO MINISTÉRIO PÚBLICO

"não pode legitimamente o órgão do Ministério Público invocar a independência funcional para violar a seu bel-prazer a ordem jurídica ou para obter fim incompatível com a defesa do regime democrático, ou ainda para preterir a defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis."  Dr. HUGO NIGRO MAZZILLI
"Não pode haver liberdade para violar a lei"- HUGO NIGRO MAZZILLI

Um dos maiores obstáculos encontrados pelas pessoas que se veem, de uma hora para outra, compulsória e ilegalmente vitimadas por cerceamento de sua liberdade de ir e vir, cobranças ilegais, e  outros ilicitos praticados por falsos condomínios, ocorre quando promotores de justiça põem suas "opiniões" pessoais ACIMA da LEI e da jurisprudencia pacificada pelas Cortes Superiores da Nação - STF e STJ , alegando que "gozam de independência funcional ". 
Constata-se que, enquanto membros dos mais altos escalões do Ministério Publico ( e do Poder Judiciario ) condenam veementemente os abusos praticados por falsos condomínios, alguns membros do Ministerio Publico, atuando a nível municipal, alegam "independencia funcional" para recusarem-se a agir em defesa da ORDEM PUBLICA, e indeferem representações das vitimas dos falsos condominios, apesar destas conterem robustas provas dos gravissimos delitos praticados por "representantes" de falsos condomínios, de fato, "empresas" altamente lucrativas, que criam zonas de exclusão jurídica e social no território nacional, para se locupletarem dos bens e direitos alheios, e do patrimonio publico e privado.
Porem , existem limites para a "independencia funcional " no Ministério Publico, conforme leciona o o jurista HUGO NIGRO MAZZILLI, Procurador de Justiça e membro do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo,  no artigo abaixo reproduzido.
Por este motivo, o Conselho Superior do Ministério Publico do Estado de São Paulo, tem reformado varias "promoções de arquivamento" de representações feitas contra falsos condomínios, designando promotores substitutos para a instauração das ações civis publicas imprescindíveis para o restabelecimento da ORDEM PUBLICA nas cidades assoladas por "falsos condomínios" .
Conselho Superior do MP SP , por unanimidade ,
rejeita promoção de arquivamento e designa substituto automatico
para promover ação civil publica contra a ARPPO - OSASCO
"OS LIMITES DA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL  NO MINISTÉRIO PÚBLICO" 

(...)

Temos dito que a independência funcional faz parte da nobreza da instituição do Ministério Público, e sem ela os órgãos do Ministério Público nada mais seriam que meros funcionários subordinados ou hierarquizados; não o são, porém, precisamente porque se vêem apenas sob a égide da lei e de suas consciências.
Certo, porém, que há e deve mesmo haver limites para a independência funcional. 
A primeira a impô-los é a Constituição, que prevê a independência funcional como princípio institucional do Ministério Público (art. 128, § 1º), mas ao mesmo tempo comete-lhe deveres ligados à defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127 caput).
Assim, por exemplo, não pode legitimamente o órgão do Ministério Público invocar a independência funcional para violar a seu bel-prazer a ordem jurídica ou para obter fim incompatível com a defesa do regime democrático, ou ainda para preterir a defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis. 
Também a legislação infraconstitucional impõe limites: a LC federal n. 40/81, cuja subsistência em nosso ordenamento jurídico temos sustentado (Regime jurídico cit., p. 182-193), enquanto assegura a independência funcional aos membros do Ministério Público (art. 16), ao mesmo tempo lhes impõe deveres que não podem ser obstados sob a mera alegação de independência ou liberdade funcional, e, em
caso de descumprimento, sujeita seus infratores às sanções nela previstas (arts. 22 e s. e
32).
Por sua vez, a Lei federal n. 8.625/93 (a atual Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) prevê que os membros do Ministério Público gozem de  inviolabilidade por suas opiniões ou manifestações expedidas em processos ou procedimentos, nos limites de sua independência funcional (art. 41, V) — preceito que é repetido pela Lei Orgânica Estadual (arts. 1º, § 2º, e 169 e s. da LC n. 734/93). Também o Código de Processo Civil se refere à responsabilidade dos membros do Ministério Público quando procedam com dolo ou fraude (art. 85).
Admitir limites à independência funcional não significa negá-la, e sim assegurar seu efetivo exercício dentro de padrões legais, fundados em supostos éticos e lógicos, sob pena de, não o fazendo, subvertermos as premissas e a destinação institucional do Ministério Público. Por isso que o inc. V do art. 41 da Lei n. 8.625/93, referindo-se às prerrogativas dos membros da instituição, sublinha sua inviolabilidade
pelas opiniões que externar ou pelo teor de suas manifestações processuais ou procedimentais, nos limites de sua independência funcional.

Se fosse absolutamente ilimitada a independência funcional, também seria ilimitada a possibilidade de abuso. Em si mesma a liberdade, um dos postulados básicos da democracia, sujeita-se também a limites previstos em lei. Não fosse assim, sob o manto da liberdade e da independência funcional, o Promotor ou o Juiz poderiam arbitrariamente negar cumprimento à própria Constituição Federal, que é o fundamento não só da ordem jurídica como até mesmo de suas investiduras; ou então poderiam sustentar, sem a menor razoabilidade, apenas fundados em abstrações ou especulações genéricas, qualquer quebra da ordem jurídica. 
Se nos afastássemos dos postulados da lógica do razoável, chegaríamos à possibilidade de admitir que o Juiz pudesse invocar sua independência funcional para rejeitar uma denúncia por crime de ação pública, apenas porque o Ministério Público, a despeito de norma constitucional expressa de legitimação, a seu ver idiossincrático e isolado, não estaria legitimado a exercitá-la, ou então o Promotor poderia deixar de propô-la, por qualquer outra razão igualmente absurda.
3. Assim, para alcançar legitimamente o conceito de independência funcional, o sistema jurídico vale-se de outros princípios complementares, que dão a medida da liberdade funcional.

O primeiro limite da independência funcional do membro do Ministério Público consiste, naturalmente, em não violar os princípios da legalidade e da obrigatoriedade da ação penal pública.
Parafraseando Calamandrei (Istituzioni di diritto processuale civile, § 126), caberia dizer que, se o Ministério Público adverte que a lei foi violada, não lhe pode ser consentido abstenha-se de acionar ou de intervir para fazer com que a lei se restabeleça, a não ser que — o acréscimo é nosso — a própria lei lhe permita agir sob critérios de oportunidade e conveniência (como o faz, v.g., em relação ao Juiz, na área da jurisdição voluntária, cf. art. 1.109 do CPC, ou poderá fazê-lo na transação penal, ainda não implantada em nosso Direito, mas já prevista no art. 98, I, da CF).
Em outras palavras, identificando o órgão do Ministério Público uma hipótese em que a lei lhe imponha agir, não tem como não o fazer. Embora tenha liberdade para apreciar se ocorre a hipótese de agir, identificada esta, não se pode recusar a fazê-lo, seja para propor a ação, seja para recorrer, seja apenas para produzir uma prova.

A quebra do dever de agir (violação do princípio da obrigatoriedade) ocorre não apenas quando o Promotor diz que é caso de agir, mas não vai agir, como também quando, por negligência ou dolo, diz  não ser caso de agir embora o exame do caso concreto evidencie, acima de dúvida, que a ação do Ministério Público era exigível. 
Esta segunda hipótese não pode ser descartada, sob pena de, não a prevendo, estarmos dando pretexto para que o dever de agir sempre seja violado impunemente, apenas mudando-se a fundamentação da inércia (bastaria que o Promotor se recusasse a agir dizendo que não identifica a hipótese de agir...). Assim, tanto viola o dever de agir o Promotor que diz: aqui há crime na sua materialidade, são claros os indícios de autoria, não está extinta a punibilidade, não ocorre causa de isenção de pena nem excludente do crime, o agente não é inimputável, a lei exige que eu aja, mas, ainda assim não vou agir, como aqueloutro que, por negligência ou dolo, não vê ou não quer ver o crime que está acima de dúvida evidenciado nos autos e contudo diz: não vou agir. Seria o  mesmo que, na primeira hipótese, ele dissesse: reconheço ser caso em que a lei exige que eu aja, mas assim mesmo, fundado em minha liberdade funcional, não vou agir; no segundo caso, poderia ele assim formular sua proposição: não identifico hipótese de agir e por isso não vou agir.
Ora, se em princípio é lícito que o membro do Ministério Público não aja quando não identifique hipótese em que a lei torna obrigatória sua atuação, não menos verdade é que, nesse último caso, para se admitir a licitude de sua recusa, é mister que esteja ela fundada em elementos fáticos e jurídicos.

A liberdade e a independência funcionais existem. Mas não se pode invocar levianamente uma ou outra apenas para justificar posições estritamente arbitrárias e meramente pessoais. Assim, não pode haver liberdade para violar a lei, sob pena de cairmos numa petição de princípios: se em nome de um conceito absoluto de liberdade eu não pudesse cercear pessoa alguma, então eu também não poderia cercear nem mesmo quem violasse a liberdade... Ora, essa interpretação, ainda que pudesse ser sustentada em nome da liberdade irrestrita, importaria em negá-la ao final.
(...)





Artigo publicado na Revista  dos  Tribunais, RT 715/571, maio, 1995, disponível em http://www.mazzilli.com.br/pages/artigos/limitesindep.pdf.

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