quarta-feira, 24 de setembro de 2014

CONTRATOS IMOBILIÁRIOS NULIDADE DE CLAUSULAS ABUSIVAS, TAIS COMO A IMPOSIÇÃO DE ADESÃO A FALSOS CONDOMINIOS, E OUTRAS

CUIDADOS NA HORA DE COMPRAR LOTES, CASAS OU APARTAMENTOS




CLAUSULAS ABUSIVAS, TAIS COMO ADESÃO COMPULSÓRIA A ASSOCIAÇÃO CIVIL, OU QUALQUER OUTRA CITADA ABAIXO , SÃO NULAS 

Cláusulas abusivas em contratos imobiliários de imóveis na planta

Publicado por Ciro Fonseca Dias 
JUSBRASIL 
Código de Defesa do Consumidor foi formulado com o intuito de consagrar proteção ao consumidor, já que se preocupa com os acidentes advindos do uso de produtos e serviços e com a qualidade destes, bem como com sua proteção no mercado de consumo contra práticas abusivas e no campo contratual.
Segundo preleciona o artigo , do CDC“consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.
No caso de contratos imobiliários, não há dúvidas a despeito da relação de consumo existente, pois, se tem de um lado um fornecedor de produtos - no caso a construtora que promete o imóvel à venda - e, de outro, o adquirente desse produto/serviço – promitente comprador do imóvel.
Além disso, não se pode olvidar que na presente relação de consumo instituída, o Consumidor é sem dúvida alguma a parte mais vulnerável, principalmente diante da postura abusiva perpetrada por determinadas construtoras/incorporadoras que descumprem o que foi pactuado, deixando de entregar o imóvel na data aprazada, e ainda incluem diversas cláusulas abusivas nos contratos firmados.
Deste modo, imprescindível se mostra a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos imobiliários.
Além disso, o Código Civil estabelece que as relações contratuais se realizem com a observância dos princípios da função social, equidade e da boa-fé, consagrados expressamente pela redação dos artigos 421 e 422.
De acordo com os dispositivos legais citados, o instrumento contratual deve ser visualizado e interpretado de acordo com o contexto social, de forma justa e equilibrada, devendo os contratantes sempre agirem de forma honesta e proba, evitando-se prejuízos.
Em regra, os contratos imobiliários de imóveis na planta são entabulados ao arrepio dos princípios da função social, da probidade e da boa-fé social, o que não se pode admitir.
Ademais, referido instrumento contratual refere-se a contrato de adesão, o qual está submetido ao Código de Defesa do Consumidor, nos moldes de seu artigo 52.
Assim, de acordo com o Código Civil e com o Código de Defesa do Consumidor, ocorrendo violação no contrato a quaisquer das normas protetivas, devem ser as cláusulas revistas/anuladas para corrigir as irregularidades, o que se mostra imperioso caso ocorram as seguintes cláusulas:

- Cláusulas que estabelecem diversos prazos de prorrogação para entrega do imóvel

No ato da formalização da proposta de compra e venda o consumidor é informado pela construtora e/ou seus representantes (imobiliárias) da exata data de entrega do imóvel.
Ocorre que ao formalizarem os Contratos Particulares de Promessa de Compra e Venda, as Construtoras/Incorporadoras estabelecem diversos prazos de entrega, tais como:
a) A conclusão da obra poderá ser prorrogada por até 180 (cento e oitenta) dias corridos;
b) A data de entrega das chaves é estimativa e que poderá variar de acordo com o a data de assinatura do contrato de financiamento;
c) A construtora poderá concluir as obras até o último dia do mês da data prevista, salvo se outra data for estabelecida no contrato de financiamento com a instituição financeira.
Alguns instrumentos celebrados entre os Consumidores e Construtoras estabelecem prazos e mais prazos de prorrogação para a entrega do imóvel, chegando ao absurdo de estabelecer termo indeterminado e outros condicionados à assinatura dos contratos de financiamento que, diga-se de passagem, podem atrasar por culpa exclusiva das Construtoras/Incorporadoras como, por exemplo: atraso na entrega da documentação.
Como se vê, determinados instrumentos estabelecem prazos nitidamente arbitrários aos consumidores, mas favoráveis exclusivamente à parte que formulou o contrato.
Referidas cláusulas são totalmente nulas, uma vez que colocam os Consumidores em desvantagem exagerada, incompatível com a boa-fé ou a equidade.
O artigo 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor estabelece que:
“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; (Negritado nosso)”.
No aspecto contratual, a boa-fé é requisito que se exige do fornecedor e do consumidor, gerando, por conseguinte, “transparência e harmonia nas relações de consumo” (CDC, art. 4º, caput).
Bem por isso, estabelece também o artigo  do CDC que o consumidor terá direito à informação adequada e clara (Inciso III); proteção contra métodos comerciais desleais, bem assim contra cláusulas abusivas (Inciso IV), incluindo a publicidade abusiva e enganosa (37, §§ 2º e 3º).
No tocante à cláusula que estabelece a prorrogação da entrega da obra em até 180 (cento e oitenta) dias, sem qualquer ônus, é abusiva e ilegal.
Isso por que admitir uma tolerância imotivada de 180 (cento e oitenta) dias se mostra excessivamente prejudicial ao Consumidor, haja vista que exonera a responsabilidade do fornecedor por vícios no planejamento/execução da obra, fato que não pode ser acobertado pelo Poder Judiciário, sob pena de afronta ao art.51 do Código de Defesa do Consumidor.
Importante ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor prevê no inciso XII do art. 39 que “é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério”.
Necessário observar ainda o disposto no artigo 122, do Código Civil, que também veda a submissão de uma das partes ao arbítrio da outra, o que justamente ocorre em contratos de adesão imobiliários, em que os Consumidores são compelidos a firmar avenças com cláusulas leoninas e abusivas.
A condição a que se subordinará o negócio jurídico, não poderá ser resguardada por aquele que se dispôs a suportar o ônus do negócio, portanto uma vez estabelecido prazo para entrega do imóvel, este deverá ser cumprido.
Destaca-se sobre o tema o entendimento do nobre jurista Eduardo Ribeiro de Oliveira,in litteris:
Não é razoável aceitar-se que alguém queira, simultaneamente, obrigar-se e reservar-se o direito de não se obrigar[1]
Portanto, indiscutível se mostra o intuito transgressor das Construtoras/Incorporadoras ao formularem cláusulas contratuais estipulando vários prazos de prorrogação para a entrega do imóvel, estabelecendo, inclusive, tolerância temporal para o não cumprimento de suas obrigações.
Nesse diapasão, interessante a notícia extraída do sítio do Ministério Público Paulista (MP quer multa para empresa que atrasar a entrega do imóvel. Disponível em Acesso em 22.07.2013), verbis:
“A Promotoria do Consumidor ajuizou duas ações civis públicas (ACP) contra empresas de construção e incorporação imobiliária, para que elas deixem de fixar prazos que desfavorecem os consumidores e sejam punidas se atrasarem a entrega dos imóveis.
De acordo com a ação, proposta no último dia 13 pelo promotor de Justiça Paulo Sergio Cornacchioni, as empresas Civic Engenharia e Construções e Tenda, ao negociar imóveis, preveem em seus contratos multas moratórias para os consumidores, mas não para os fornecedores, que são as próprias empresas.
Os contratos que essas empresas oferecem aos consumidores estabelecem um prazo para a entrega dos imóveis, a chamada “entrega das chaves”, que prevê uma tolerância de 180 dias para o atraso. Nesse período, as empresas não estão sujeitas à multa contratual.
Essa tolerância, entretanto, não é estabelecida para o caso de consumidor deixar de pagar ou atrasar uma das prestações, o que, segundo o promotor, caracteriza a falta de equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.
O equilíbrio do contrato de adesão de compra e venda pressupõe a imposição de prazo para ambas as partes cumprirem suas respectivas obrigações, mediante instrumentos que documentem tais prazos, assim como a previsão de sanções, em desfavor das duas partes igualmente, para o caso de mora, argumenta o promotor na ACP.
O pedido feito na ACP é para que a Justiça considere nula toda cláusula dos contratos que exonere as empresas de cumprir as suas responsabilidades em caso de atraso na “entrega das chaves” e puna os consumidores por atrasos. A Promotoria também pede que as empresas sejam condenadas ao pagamento de multa para cada consumidor a quem tenham efetuado a entrega do imóvel fora do prazo estipulado em contrato.”
Sobre o assunto, este Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás assim já se manifestou:
EMENTA: APELAÇÃO. AÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL C/C RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO. DOMICILIO DA RÉ. CONTRATO DE ADESÃO. NÃO PREVALECE ILEGITIMIDADE DE PARTE. NÃO CONFIGURADA. ADITIVO CONTRATUAL. CLAUSULA ABUSIVA. NULIDADE. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. NAO JUNTADO AOS AUTOS. INAPLICABILIDADE. MORA NA ENTREGA DO BEM. DESCUMPRIMENTO POR PARTE DA CONSTRUTORA. RESCISÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DAS PARCELAS PAGAS. 1 – (...). 3 - são consideradas nulas as cláusulas contratuais que colocam o consumidor em desvantagem exagerada, ou se mostram excessivamente onerosas, evidenciando a incompatibilidade com a boa-fé e a equidade. 4 - não ha como apreciar alegação de aplicabilidade de termo de ajustamento de conduta nao trazido aos autos. 5 - comprovada a mora da construtora na entrega do bem, caracterizado o inadimplemento contratual, cabivel a rescisão do contrato com a restituição integral das parcelas pagas, nos termos da sentenca recorrida. Apelação conhecida e improvida.” (Negritado nosso).
(TJGO, 1ª Câmara Cível, Dra. Doraci Lamar da Silva Andrade, 121034-3/188 – Apelação Cível, DJ 221 de 21/11/2008).
EMENTA: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ATRASO NA ENTREGA DE OBRA. PENA CONVENCIONAL. DANO MATERIAL NÃO CONFIGURADO. EXPECTATIVA DE DIREITO. DANO MORAL CARACTERIZADO. INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. 1. A propaganda veiculada, estipulando prazo para a entrega da obra, gera expectativa legítima nos consumidores, razão pela qual obriga o fornecedor e integra o contrato a ser celebrado, nos termos do art. 30 doCDC. 2. A pena convencional estipulada no contrato é devida pelo período de atraso na entrega da obra, sem a contagem do prazo de tolerância de 120 (cento e vinte) dias úteis, VEZ QUE SE TRATA DE CLÁUSULA ABUSIVA, por ferir o princípio da isonomia, haja vista que o consumidor não goza de semelhante prerrogativa para o caso de atraso no pagamento das parcelas a que se comprometeu. 3. (...) 4. Se a situação de incerteza experimentada pelos apelantes superam os meros dissabores e aborrecimentos do dia a dia, restam caracterizados os danos morais, carecendo, portanto, de reparação. 5. Uma vez reformada a sentença e ficando os apelantes vencidos em parcela mínima do pedido, forçoso inverter os ônus da sucumbência, para recaírem, exclusivamente, sobre a apelada. APELO PARCIALMENTE PROVIDO”. (Grifo e negritado nosso)
(TJGO, 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Carlos Escher – 339149-33.2009.8.09.0051 – Apelação Cível – Processo: 200993391494 – Origem: Goiânia – DJ 1153 de 26/09/2012).
A jurisprudência vem entendendo ser abusiva tal disposição contratual, por ferir o princípio da isonomia, haja vista que o consumidor não goza de semelhante prerrogativa para o caso de atraso no pagamento das parcelas a que se comprometeu.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor preceitua que deve haver equilíbrio contratual para ambos os pólos da relação.
Assim, são consideradas nulas todas as cláusulas abusivas que estabelecem diferentes prazos de prorrogação para a entrega do imóvel, devendo ser considerada a entrega das chaves/obra apenas em uma data, ou seja, sem a prorrogação sequer dos 180 (cento e oitenta) dias, muito menos dias úteis,fazendo incidir a partir daquela data todos os encargos provenientes do atraso.

- Cláusulas estabelecendo que todas as despesas, impostos, taxas, multas de contribuições que recaírem sobre o imóvel a partir da data do "habite-se" serão de responsabilidade dos consumidores

Inicialmente, cumpre esclarecer que o “Habite-se” é um instituto de Direito Administrativo e de Direito Urbanístico e assim deve ser entendido.
No caso de construções edilícias, o art. 44 da Lei 4591/65, dispõe que:
“(...) após a concessão do habite-se pela autoridade administrativa, o incorporador deverá requerer a averbação da construção da edificação, para efeito de individualização e discriminação das unidades, respondendo perante o adquirente pelas perdas e danos que resultem da demora no cumprimento dessa obrigação”.
A Lei 4591/65 é clara: “Habite-se” não é entrega das chaves!
O “Habite-se” é apenas uma certidão da prefeitura atestando que a edificação está regular, sendo necessária para o registro em cartório. Após a concessão do “Habite-se”, o condomínio tem apenas a condição de existir juridicamente, por meio da inscrição no cartório de imóveis.
Isso não significa que, com a referida certidão, as unidades autônomas já estejam individualmente prontas para a entrega aos adquirentes.
Na realidade, entre o “Habite-se” e a última vistoria do imóvel ou entrega das chaves podem se passar muitos meses, como se pode observar pelos inúmeros casos imobiliários em discussão no judiciário.
Dito isso, alguns Contratos Particulares de Promessa de Compra e Venda de imóveis na planta estabelecem cláusula constando que até a data do “Habite-se” ou entrega das chaves, o que ocorrer primeiro, são de responsabilidade dos Promitentes Vendedores (Construtoras/Incorporadoras) todos os impostos, taxas e outras despesas, sendo que a partir da referida data passarão a correr por conta exclusiva dos Promitentes Compradores (Consumidores), ainda que lançados em nome da Construtora/Incorporadora.
Em síntese, referidas cláusulas estipulam que após a data do “habite-se” OU a entrega das chavesO QUE OCORRER PRIMEIRO, todas as obrigações elencadas (juros, impostos etc.) serão de exclusiva responsabilidade dos Consumidores.
No entanto, tais Cláusulas são extremamente prejudiciais aos adquirentes de imóveis na planta, sendo contrária à boa-fé e equidade, porquanto contém obrigações consideradas iníquas, abusivas e que os colocam em desvantagem exagerada.
Isso por que os consumidores não podem ficar simplesmente esperando a boa vontade das Construtoras/Incorporadoras em finalizarem as vistorias finais para concluírem a entrega das chaves, enquanto todas as despesas, como: impostos, taxas, multas e etc. Permanecem incidindo sobre a unidade habitacional, razão pela qual deve prevalecer como parâmetro apenas após a assinatura do termo de vistoria e entrega das chaves a incidência de qualquer pecúnia sobre o imóvel.
Somente quando ficar patente a disponibilidade da posse, do uso e do gozo do imóvel, ou seja, quando o imóvel estiver liberado para que o adquirente possa nele morar ou alugar sua unidade, ISTO É, somente após a última vistoria (com assinatura do termo de vistoria e entrega das chaves) é que se pode concordar com a incidência de todas as quantias monetárias.
De tal modo, não há que se falar em qualquer responsabilidade dos Consumidores antes da entrega das chaves, isto é, caso ocorra primeiro o “habite-se”.
Tanto isso é verdade que apenas após essa entrega é que podem ser cobradas as despesas condominiais e outras referentes à unidade do empreendimento.
Até aquele momento, a construtora ainda pode adentrar ao imóvel, para promover ajustes, finalizações e arremates. Portanto, a posse da unidade é, de fato, muito mais dela do que do novo morador.
Muitas construtoras, inclusive, até proíbem os proprietários de adentrarem ao imóvel sem sua permissão e fiscalização, não podendo nem mesmo iniciar as obras/instalações em sua unidade.
Assim, repise-se, mesmo que conste em contrato: o “Habite-se” não se confunde com a entrega das chaves.
O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo também não confunde a entrega das chaves com o “Habite-se”, verbis:
EMENTA: “COMPRA E VENDA - IMISSÃO NA POSSE – AÇÃO JULGADA PROCEDENTE - PRELIMINARES DE NULIDADE, ILEGITIMIDADE ATIVA E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO AFASTADAS - RÉ QUE NÃO ENTREGOU NO PRAZO PREVISTO O IMÓVEL EM CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE - ENTREGA DAS CHAVES QUE, NO CASO, NÃO SE CONFUNDE COM O "HABITE-SE" - AUTORES QUE CUMPRIRAM A SUA OBRIGAÇÃO CONTRATUAL (...) - RECURSO IMPROVIDO.” (NEGRITADO NOSSO)
(TJ-SP APELAÇÃO CÍVEL 994.05.094177-7, RELATOR (A): FÁBIO QUADROS - JULGAMENTO: 12/08/2010 - ÓRGÃO JULGADOR: 4ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, PUBLICAÇÃO: 25/08/2010).
Para corroborar, segue abaixo a transcrição de parte do acórdão relatado pelo MM. Fábio Quadros, cuja ementa foi citada acima:
“A apelada em correspondência encaminhada aos apelados afirmou que a data da entrega das chaves era a data do "habite-se", ocorrida em 10/05/2004, e que desde essa data o imóvel estava à disposição dos apelados. Por sua vez os apelados em resposta à correspondência anteriormente referida também encaminharam missiva a apelante, na qual informam que a vistoria só foi efetivada em 24/05/2004 conforme agendado pela própria ré e que conforme essa vistoria o imóvel (apartamento 182 do Edifício Memphis) ainda não estava em condições de ser entregue. Nesse ponto, leitura do item 10.04 do contrato dá conta de que a entrega das chaves poderia coincidir com o "habite-se" (...) Não foi o que aconteceu, pois ainda existiam obras de acabamento a serem realizadas no próprio apartamento, situação não contestada pela apelante (...).Ainda que se sustente que esta cláusula permitiria à construtora cobrar valor em pecúnia dos autores, entendo que também a cobrança dessa correção monetária só poderia ser feita após a entrega das chaves do imóvel prometido à venda, na medida em que intrinsecamente relacionada à entrega do apartamento dado como parte do pagamento, em relação ao qual a referida entrega das chaves é pressuposto indispensável. (...) Ante o exposto, rejeitadas as preliminares, nego provimento ao recurso.” (Negritado nosso)
Deste modo, as cláusulas que estabelecem obrigações consideradas iníquas, abusivas e que colocam os consumidores em desvantagem exagerada, devem ser consideradas nulas em atenção ao art. 51IV do CDC, ou modificadas, pois, repita-se, deve ser considerado para todos os fins apenas a data da efetiva entrega das chaves e não a data do “Habite-se”, caso ocorra primeiro, para a incidência dos encargos relacionados, quais sejam: despesas, impostos, taxas, multas e contribuições que recaírem sobre o imóvel.
d) Ausência de previsão de penalidades para o caso de atraso na entrega da obra e das chaves - Necessidade de estipulação de pena convencional
Alguns contratos são tão abusivos que sequer prevêem qualquer penalidade para o atraso na obra (mesmo após os 180 dias excessivos e ilegalmente previstos) e das chaves, antevendo apenas penalidades a serem suportadas exclusivamente pelos Consumidores em caso de mora, como de praxe: multa de 2% sobre o valor corrigido e juros de mora de 1% ao mês.
Vislumbra-se que as construtoras/incorporadoras ao proporem os contratos de adesão sempre dispõem Cláusula estabelecendo multa em caso de atraso no pagamento das parcelas, equivalente a 2% (dois por cento) sobre o valor da obrigação do Adquirente (pagamento das parcelas), acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês.
Qual se vê, unilateralmente, as Construtoras/Incorporadoras estabelecem multa para o descumprimento da obrigação por parte do consumidor, todavia, deixam – propositalmente – de estabelecer pena pecuniária para o descumprimento de sua obrigação (entrega do imóvel), o que não pode ser admitido.
Nesse diapasão, destaca-se sobre o tema novamente o entendimento do nobre jurista Eduardo Ribeiro de Oliveira, in litteris:
Não é razoável aceitar-se que alguém queira, simultaneamente, obrigar-se e reservar-se o direito de não se obrigar.[2]
A jurisprudência também é pacífica em determinar o tratamento isonômico entre as partes do contrato, aplicando estes mesmos parâmetros para o caso de descumprimento da obrigação por parte do fornecedor (construtora/incorporador), vejamos:
EMENTA: “CONSUMIDOR. CONTRATO. MORA PREVISTA APENAS EM DESFAVOR DO CONSUMIDOR. ILEGALIDADE. NECESSIDADE DE TRATAMENTO ISONÔMICO ENTRE AS PARTES CONTRATANTES.Não é aceitável, dentro do sistema de proteção ampla ao consumidor, estipule-se obrigação unilateral em favor do fornecedor ou prestador de serviço no caso de atraso na entrega do bem ou prestação do serviço, onde a mora da incorporadora não acarreta consequência qualquer de caráter penalizador. Multa em favor do consumidor calculada nos mesmos moldes previstos em seu desfavor no instrumento. Recurso provido, no particular.” (Negritado Nosso)
(Recurso Inominado: 0075314620108260016; Relator: Richard Francisco Chequini; Data do Julgamento: 07/12/2011; Data de Publicação: 05/03/2012).
Sendo assim, as Construtoras/Incorporadoras devem ressarcir os Consumidores nos mesmos moldes convencionados no contrato em desfavor dos Promitentes Compradores, qual seja: multa equivalente a 2% (dois por cento) do preço do imóvel objeto do contrato, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mêsdesde a data prevista para a entrega da obra até a sua efetiva entrega, como estipulação de pena convencional.
Conclusão
Como visto, o atraso na entrega do imóvel pode gerar diversos danos financeiros e emocionais aos Consumidores, pois além de deixar de usufruírem o imóvel na data em que haviam planejado, a inadimplência das Construtoras/Incorporadoras são acobertadas por cláusulas abusivas inseridas nas Promessas de Compra e Venda de imóveis na planta com o propósito de eliminar e/ou minimizar qualquer responsabilidade contratual em detrimento dos Consumidores.
As Construtoras aproveitaram-se do boom imobiliário para comercializarem desenfreadamente inúmeras unidades habitacionais, não se atentando que a alta demanda também ocasionariam problemas na programação de entrega dos empreendimentos.
A escassez de mão-de-obra; de matéria prima e de profissionais qualificados são problemas previsíveis nos mais variados ramos da indústria, comércio e construção civil, de modo que os consumidores não podem serem prejudicados em razão disso.
Dessa forma, sentindo-se prejudicados, os Consumidores devem se informar sobre os seus direitos e caso se sintam prejudicados, buscarem o amparo do Poder Judiciário para garantir a isonomia e a boa-fé contratual nos mencionados instrumentos particulares.

[1] OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro – Comentários ao Novo Código Civil, Vol. II, Editora Forense, 2008, Rio de Janeiro, Pg. 310.
[2] OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro – Comentários ao Novo Código Civil, Vol. II, Editora Forense, 2008, Rio de Janeiro, Pg. 310.
Ciro Fonseca Dias
Ciro Fonseca Dias, advogado profissional em Startup (Empresas em Estágio Inicial), contando com Pós-Graduações em Direito e Processo do Trabalho - PUC/GO; Masters of Laws (LL. M.) em Direito Empresarial – FGV/RIO e especializações em Accounting and Finance – IBMEC/RIO e Law and Entrepreneur na North...



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