sábado, 31 de agosto de 2024

STF RE 1418365 AGR / SP ASSOCIACAO DE MORADORES DO RESIDENCIAL PRIMAVERA NÃO PODE COBRAR LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO E DE ASSOCIAÇÃO É DIREITO HUMANO

ASSOCIACAO DE MORADORES

NÃO PODE COBRAR DE NÃO ASSOCIADO 


TEMA 492 REPERCUSSÃO GERAL 


19/06/2023 SEGUNDA TURMA

AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.418.365 SÃO PAULO RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

AGTE.(S) : ASSOCIACAO DE MORADORES DO RESIDENCIAL PRIMAVERA

ADV.(A/S) : NATALIA ZAMARO DA SILVA

ADV.(A/S) : ALESSANDRO BIEM CUNHA CARVALHO

ADV.(A/S) : CRISTIANO BIEM CUNHA CARVALHO

ADV.(A/S) : MAXIMILIANO BIEM CUNHA CARVALHO

AGDO.(A/S) : EMPREENDIMENTOS GLOBAL VR LTDA

ADV.(A/S) : MAURICIO RIZOLI


Agravo Regimental em Recurso Extraordinário. 2. Direito Civil. 3. Loteamento imobiliário urbano. Taxas ou encargos cobrados em função dos serviços prestados por associação. Tema 492 da repercussão geral. 4. Requisitos para a cobrança. 5. Hipótese em que divergir do acórdão recorrido demandaria o revolvimento do acervo probatório, providência vedada pela Súmula 279 do STF. Precedentes. 6. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental não provido.


A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do Senhor Ministro André Mendonça, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.

Brasília, Sessão Virtual de 9 a 16 de junho de 2023.

Ministro GILMAR MENDES

Relator

Documento assinado digitalmente

 

19/06/2023 SEGUNDA TURMA

AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.418.365 SÃO PAULO RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

AGTE.(S) : ASSOCIACAO DE MORADORES DO RESIDENCIAL PRIMAVERA

ADV.(A/S) : NATALIA ZAMARO DA SILVA

ADV.(A/S) : ALESSANDRO BIEM CUNHA CARVALHO

ADV.(A/S) : CRISTIANO BIEM CUNHA CARVALHO

ADV.(A/S) : MAXIMILIANO BIEM CUNHA CARVALHO

AGDO.(A/S) : EMPREENDIMENTOS GLOBAL VR LTDA

ADV.(A/S) : MAURICIO RIZOLI


R E L A T Ó R I O



O  SENHOR  MINISTRO  GILMAR  MENDES  (RELATOR):  Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou seguimento ao recurso extraordinário. Consta da decisão recorrida:


“(...)

No caso, o Tribunal de origem, ao examinar o conjunto probatório constante dos autos, deu provimento ao recurso inadmitindo a cobrança pleiteada pois ausentes os requisitos autorizadores previstos no tema 492 da repercussão geral.

(...)

Pois bem.

No julgamento do RE 695.911/SP, recurso paradigma do tema 492 da Repercussão Geral, o Plenário desta Corte fixou a tese da impossibilidade de cobrança, por parte de associação, de taxas de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não-associado, em período anterior a Lei 13.465/17, ou de lei municipal anterior que discipline a questão.

No voto condutor do acórdão desse precedente de repercussão geral, o Relator, Ministro Dias Toffoli, anotou,

 ademais, a necessidade da manifestação expressa da vontade de associar-se pelo detentor de direitos sobre o imóvel urbano integrante do loteamento (...)

Desta forma, não se verifica divergência entre o acórdão recorrido e a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no paradigma da repercussão geral.” (eDOC 52 – ID: 0e6752e2)


No agravo regimental, a recorrente sustenta que não incide, no caso, o tema 492 da repercussão geral, ao fundamento de que o STF “editou tese quando a relação estabelecida é de um mero associado e não daquele que, na condição de empreendedor criou a associação, presidiu a ata de constituição, enfim sua anuência é plena porque foi ele o criador” (eDOC 53 – ID: f01009bf, p. 6).


Argumenta, nesses termos, que não se estaria diante de “um mero associado, como ocorre na tese fixada, mas sim do próprio empreendedor/fundador e ele tinha plena ciência do loteamento Residencial Primavera, do estatuto social, registro e ata de fundação” (eDOC 53 – ID: f01009bf, p. 13).


Com base nisso, afirma ser possível a cobrança da taxa na situação narrada, dado que o empreendedor possuía plena consciência da existência da associação.

Intimada, a parte recorrida não apresentou contrarrazões, conforme certidão constante do eDOC 56 – ID: c404ea63.

É o relatório

19/06/2023 SEGUNDA TURMA


AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.418.365 SÃO PAULO


V O T O


O  SENHOR  MINISTRO  GILMAR  MENDES  (RELATOR):  No agravo

regimental, não ficou demonstrado o desacerto da decisão agravada.

Verifico que as alegações da parte são impertinentes e decorrem de mero inconformismo com a decisão adotada por este Tribunal, uma vez que o agravante não trouxe argumentos suficientes a infirmá-la, visando apenas à rediscussão da matéria já decidida de acordo com a jurisprudência desta Corte.

Como já demonstrado na decisão ora agravada, não se verifica divergência entre o acórdão recorrido e a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema 492 da repercussão geral.

Isso porque, na espécie, o Tribunal de origem entendeu que o caso analisado não se amolda às hipóteses previstas no precedente mencionado. Nesse sentido, extrai-se o seguinte trecho do acórdão proferido pelo Tribunal de origem:


“(...)

O entendimento de que se valeu a i. sentenciante, data venia, não corresponde ao teor do Tema 492 do STF, o qual prevê que: ‘É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, que i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis’ (g.n.).

São claras as hipóteses de inadmissibilidade da cobrança a partir do estabelecimento do precedente vinculante:

 


1) Proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17 e que à associação não aderiu expressamente; a anuência tácita não constitui a obrigação;


2) Proprietário não associado até o advento de lei municipal anterior à Lei nº 13.465/17 que discipline a questão e que à associação não aderiu expressamente;


3) Proprietários não associados e sem vínculo contratual admitindo o rateio;


Ou seja: Até o início da vigência da Lei 13.465/2017 ou de lei municipal que discipline a questão, considera-se inconstitucional a cobrança de taxa de manutenção dirigida a quem não se associou ou a ela não anuiu expressamente.


 Posteriormente à sua vigência, é possível a cobrança da taxa de manutenção, desde que: a) O proprietário faça adesão ao ‘ato constitutivo das entidades equiparadas a administradora de imóveis’; b). O ‘ato constitutivo da obrigação’ esteja registrado no competente Registro de Imóveis.


Para deixar ainda mais clara a questão, a admissibilidade da cobrança pressupõe a existência de obrigação por imposição legal ou voluntariedade; somente será possível a cobrança do proprietário não associado quando o dever obrigacional estiver disposto em ato constitutivo da associação (ou outra entidade civil organizada), firmado após o advento da Lei nº 13.465/2017 e que este esteja registrado na matrícula atinente ao loteamento no registro de imóveis; ou que o proprietário do lote permaneça associado à associação de moradores e se encontre inadimplente; ou exista cláusula expressa no contrato de promessa de compra e venda prevendo o rateio de despesas do loteamento de acesso restrito; ou, finalmente, exista contrato padrão registrado no Oficial de Registro de Imóveis, ou anotação na matrícula do loteamento, admitindo a cobrança.

Observa-se, ainda, que a anuência tem que ser expressa, por adesão inequívoca ao ato que instituiu tal encargo. A tese da anuência tácita, pelo pagamento de várias mensalidades bem como a do enriquecimento ilícito - não prevaleceram, como deixa claro o RECURSO EXTRAORDINÁRIO 695.911 que

firmou o Tema 492 do STF, em referência expressa ao Precedente firmado no Tema 882 do STJ, ambos de natureza vinculante.


Nenhum dos referidos requisitos se encontra no caso em análise, não servindo ao propósito da exceção ao tema, a previsão no contrato de cessão - de que o cessionário passa ser responsável pelo pagamento de todos os impostos e taxas que venham a incidir no terreno desde a assinatura do contrato, razão pela qual o pedido de cobrança dever ser julgado improcedente, arcando integralmente a autora com os ônus da sucumbência, fixado em 10% sobre o valor da causa.” (eDOC 20, p. 4-5; grifo nosso)


No julgamento do RE-RG 695.911/SP, paradigma do tema 492 da repercussão geral, o Plenário desta Corte fixou tese no sentido da impossibilidade de cobrança, por parte de associação, de taxas de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado, em período anterior a Lei 13.465/17, ou de lei municipal anterior que discipline a questão.


No voto condutor do acórdão desse precedente de repercussão geral, o Relator, Ministro Dias Toffoli, anotou, ainda, a necessidade da manifestação expressa da vontade de associar-se pelo detentor de direitos sobre o imóvel urbano integrante do loteamento. Nesse sentido, cito o seguinte trecho do voto proferido pelo relator do tema 492:


“(...)

Em verdade, é o princípio da legalidade o instrumento de sopesamento constitucional ao princípio da liberdade de associação. De um lado, assegurando que obrigação só é imposta por lei; de outro – e por consequência – garantindo que, na ausência de lei, não há para os particulares impositividade obrigacional, regendo-se a associação somente pela livre disposição de vontades.

Dito de outro modo, ante a ausência de obrigação legal, somente  o  elemento  volitivo  manifestado,  consistente  na anuência expressa da vontade de se associar, pode vincular as partes pactuantes e gerar para as mesmas direitos e obrigações decorrentes da associação.

Assim, eventual reconhecimento da possibilidade de se exigir daquele que não deseja se associar o pagamento de taxas ou encargos cobrados em função dos serviços prestados por uma associação a determinada coletividade significaria, na prática, obrigar o indivíduo a se associar, por imposição da vontade coletiva daqueles que, expressamente, anuíram com a associação e seus encargos. Equivaleria, também, a fabricar e legitimar fonte obrigacional que não seja a lei nem a vontade – o que, evidentemente, implica ofensa ao princípio da legalidade e às liberdades individuais, notadamente à garantia fundamental da liberdade associativa.

Sob tais considerações, portanto, não há como impor qualquer obrigação a quem não queira se associar ou permanecer associado ante a ausência de manifestação expressa de vontade nesse sentido e de previsão legal da qual decorra uma relação obrigacional.” (DJe 19.4.2021; grifo nosso)


Permanece hígida, portanto, a conclusão de que — mesmo diante das alegações do recorrente no sentido de ser o recorrido o empreendedor que viabilizou o loteamento — deve prevalecer a garantia constitucional da liberdade de associação, de modo que imprescindível a expressa manifestação de vontade do recorrido em aderir à associação.


Observa-se, ademais, que divergir do entendimento adotado pelo Tribunal de origem, acerca da ausência dos requisitos delineados no tema 492 da repercussão geral, demandaria o revolvimento do acervo fático- probatório, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF. Confiram-se, em sentido semelhante, os seguintes precedentes:


“Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo.

2. Direito Civil. 3. Associação. Legitimidade de cobrança de taxas de manutenção, conservação e melhoramento. Vínculo associativo. Tema 492 da repercussão geral. 4. Tribunal de origem assentou a existência de associação expressa dos adquirentes. 5. Divergir do acórdão recorrido demandaria o revolvimento do acervo probatório, providência vedada pela Súmula 279 do STF. Precedentes. 6. Violação ao art. 93, IX, da CF. Inocorrência. Tema 339 da repercussão geral. 7. Inexistência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 8. Negado provimento ao agravo regimental.” (RE 1.273.762 AgR, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe 19.05.2023; grifo nosso)


“DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APLICAÇÃO DO TEMA 492. NECESSIDADE   DE   REEXAME   DE   MATERIAL

PROBATÓRIO. SÚMULA 279/STF. 1. Para dissentir da conclusão do Tribunal de origem, seria necessário o reexame de material fático-probatório. Incidência no caso, da Súmula 279/STF. 2. Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, fica majorado em 25% o valor da verba honorária fixada anteriormente, observados os limites legais do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015. 3. Agravo a que se nega provimento.” (RE

1.372.357 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 1º.6.2022; grifo nosso)


Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.


SEGUNDA TURMA

EXTRATO DE ATA


AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.418.365

PROCED. : SÃO PAULO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES

AGTE.(S) : ASSOCIACAO DE MORADORES DO RESIDENCIAL PRIMAVERA ADV.(A/S) : NATALIA ZAMARO DA SILVA (253402/SP)

ADV.(A/S) : ALESSANDRO BIEM CUNHA CARVALHO (132023/SP) ADV.(A/S) : CRISTIANO BIEM CUNHA CARVALHO (145786/SP) ADV.(A/S) : MAXIMILIANO BIEM CUNHA CARVALHO (254939/SP) AGDO.(A/S) : EMPREENDIMENTOS GLOBAL VR LTDA

ADV.(A/S) : MAURICIO RIZOLI (146790/SP)


Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Segunda Turma, Sessão Virtual de 9.6.2023 a 16.6.2023.


Composição: Ministros André Mendonça (Presidente), Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Edson Fachin e Nunes Marques.



Hannah Gevartosky Secretária





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