MINISTÉRIO PUBLICO DÁ UM BASTA
NA PRIVATIZAÇÃO DAS RUAS PUBLICAS
ESTAMOS DIVULGANDO MAIS UMA AÇÃO CIVIL PUBLICA
PARA SER USADA COMO MODELO PARA AÇÃO POPULAR E AÇÃO CIVIL PUBLICA
CONTRA FECHAMENTO DE RUAS PARA CRIAÇÃO DE FALSOS CONDOMÍNIOS
EXCELENTÍSSIMO(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA
PRIMEIRA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE BAURU-SP
"O
‘Direito Urbanístico’ é produto das transformações sociais que vêm ocorrendo
nos últimos tempos. Sua formação, ainda em processo de afirmação, decorre da
nova função do Direito, consistente em oferecer instrumentos normativos ao
poder público, a fim de que possa, com respeito ao princípio da legalidade,
atuar no meio social e no domínio privado, para ordenar a realidade no
interesse da coletividade." (José Afonso da Silva[1]).
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo Promotor de Justiça de
Habitação e Urbanismo de Bauru, infra-assinado, no uso de suas atribuições
legais, com fundamento no artigo 129, incisos II e III, da Constituição
Federal, nas Leis Federais nº 7.347/85 e nº 8.625/93, e nos artigos 103, inc.
III e 295, inc. X, da Lei Estadual nº 743/93, atuando na defesa dos interesses
difusos e coletivos afetos às relações jurídicas envolvendo o parcelamento e
uso do solo para fins urbanos no Município de Bauru, vem perante Vossa
Excelência propor a presente ACÃO CIVIL PUBLICA de obrigação de fazer e não
fazer, de rito ordinário e com PEDIDO DE LIMINAR, em face ao Município de
Bauru, pessoa jurídica de direito público interno, com sede na Praça das
Cerejeiras, nesta cidade, pelos fatos e fundamentos jurídicos abaixo
relacionados.
I.
SINOPSE
Por esta ação civil pública, com base nas peças anexas, que
compõem o Inquérito Civil Público nº 112/06, pretende o Ministério Público
compelir o Município de Bauru, a partir da data da propositura desta ação, a:
1)- abster-se de autorizar, por meio de permissão, concessão de direito real de
uso ou qualquer outro tipo de contrato ou convênio, o fechamento de novos
loteamentos urbanos mediante a construção de muros e instalação de portaria com
cancela, para acesso privativo dos moradores do bairro, privando a população em
geral de acesso às vias públicas e às áreas verdes e institucionais; 2)-
exigir, para aprovação de novos projetos de empreendimentos imobiliários
(loteamentos, desmembramentos ou condomínios), a elaboração do necessário
estudo prévio de impacto de vizinhança – EIV, bem como o cumprimento das
exigências nele estabelecidas, conforme determina o Estatuto da Cidade (Lei nº
10.267/2001)[2].
II.
OS FATOS
Como é de conhecimento público, para atender a uma demanda da
população que busca maior segurança em termos de moradia, nos últimos anos
proliferaram-se no Município de Bauru os chamados “loteamentos fechados”,
implantados com base na Lei Municipal nº 4.053/1996, que autoriza o Poder
Executivo a celebrar convênios com loteadores ou com associações de bairros,
permitindo o fechamento de vias públicas e de áreas verdes e institucionais.
Com a construção de muros ao redor de todo o perímetro do
loteamento, o acesso às áreas públicas passa a ser privativo dos moradores,
pois o convênio autoriza a instalação de portarias, que são monitoradas por
seguranças particulares, que não permitem ao cidadão comum o acesso às partes
internas do loteamento, salvo com a autorização do morador ou do presidente da
associação.
Além disso, o Município não possui diretrizes eficazes e
definidas que possam, ao mesmo tempo, atender tanto os interesses dos
adquirentes de lotes quanto os da população de um modo geral, pois a lei que
estabelece o convênio, além de autorizar o controle do acesso de pessoas e
veículos pela portaria do loteamento[3],
não impede que as áreas verdes e institucionais fiquem localizadas na parte
interna do empreendimento, sem que a população possa ter acesso a essas áreas.
Para agravar ainda mais essa situação, na zona sul da cidade,
região mais cobiçada pelos empreendedores e onde está localizada a maioria dos
loteamentos fechados de Bauru, conforme demonstra o mapa da cidade em anexo, já
estão surgindo os primeiros problemas relativos ao fluxo de veículos, haja
vista a insuficiência de vias de acesso entre esses loteamentos fechados,
notadamente em se considerando que aquela região da cidade é seccionada pela
Estrada de Ferro conhecida como Sorocabana.
A título de exemplo, os loteamentos implantados ao longo da
Avenida Afonso José Aiello, consoante demonstra o mapa incluso, transformaram
essa avenida num verdadeiro gargalo, pela falta de vias de acesso, de modo que,
em dias de maior movimento, forma-se um longo congestionamento, que vai da
Avenida Getúlio Vargas até o Residencial Villagio I, inviabilizando, inclusive,
caso se faça necessário, o trânsito de viaturas pelo local (ambulância, corpo
de bombeiros, polícia, etc.). Além disso, jovens imprudentes transformaram essa
avenida numa verdadeira pista de corrida, gerando o risco de sérios acidentes.
A propósito dessa situação, confira-se o depoimento anexo do 2º Tenente Roger de
Souza, Comandante da Base Comunitária de Trânsito de Bauru.
Essa caótica situação deve-se à falta de planejamento urbano
por parte do Município-réu, que aprovou esses empreendimentos imobiliários (e o
fechamento das vias e áreas públicas) sem qualquer critério técnico, deixando
de elaborar, previamente, os necessários estudos de impacto de vizinhança e do
sistema viário do entorno desses loteamentos (com exceção do Residencial
Martha, que possui estudo de impacto do sistema viário realizado pelos órgãos técnicos
do Ministério Público de São Paulo).
Se não bastasse, existem ainda vários condomínios de casas
térreas na cidade, disciplinados pela Lei nº 4.591/64, os quais, a despeito de
ocuparem uma grande extensão de área murada, não tiveram seus projetos submetidos
ao necessário estudo prévio de impacto de vizinhança ou laudo pericial
semelhante.
A observância ou a ofensa aos padrões urbanísticos, como se
sabe, necessariamente projeta seus efeitos em todas as direções, alcançando
indistintamente toda a coletividade, incluindo munícipes e demais pessoas que
eventualmente transitem pela cidade.
As normas municipais que autorizam o fechamento desses
bairros residenciais permitem que o Município, por si, ou por delegação a
terceiros, interfira diretamente nesses padrões urbanísticos, alterando o
traçado viário de loteamentos e, com isso, descaracterizando todo o
planejamento autorizado pela legislação federal de uso e ocupação do solo.
As normas constitucionais e infra-constitucionais que
estabelecem limitações de ordem pública relativas a uso e ocupação do
solo, como o arruamento, a salubridade, a segurança, a funcionalidade e
estética da cidade destinam-se a propiciar melhor qualidade de vida à
população. Esses preceitos atendem à coletividade como um todo, pois preservam
os recursos naturais e disciplinam a utilização dos espaços urbanos destinados
à habitação e ao lazer, propiciando melhor qualidade de vida à população,
estabelecendo, ainda, para o bem-estar geral, os critérios de desenvolvimento
do Município.
III. O DIREITO
Como é cediço, após a aprovação pelos órgãos próprios e
registro do loteamento no ofício predial, todas as vias e áreas destinadas ao
lazer e à implantação de equipamentos públicos são transferidas ao domínio
público municipal, consoante determina o art. 22 da Lei nº 6.766/79, in
verbis:
“Desde a
data do registro do loteamento, passam a integrar o domínio do Município as
vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e
outros equipamentos urbanos constantes do projeto e do memorial
descritivo.”
A propósito do assunto, assim já decidiu o Excelso Pretório:
"Loteamento.
Aprovado o arruamento, para urbanização de terrenos particulares, as áreas
destinadas às vias e logradouros públicos passam automaticamente para o domínio
público do município, independentemente de título aquisitivo e transcrição,
visto que o efeito jurídico do arruamento é, exatamente, o de transformar o
domínio particular em domínio público, para uso comum do povo". (STF,
2ª T ac. un. de 28.09.76 RE 84.327-SP, Rel. Min. Cordeiro
Guerra).
Desse modo, a permissão ou concessão de direito real de uso
não pode conferir, ao particular, o direito de murar área de uso comum
do povo, já que não existe previsão legal nesse sentido, e nem poderia haver,
sob pena de lesão à ordem jurídica e aos interesses gerais da coletividade.
São dois os principais fundamentos que embasam essa posição.
Primeiro, o Código Civil destina os bens públicos dessa natureza ao uso
comum do povo[4],
o que pressupõe sua disponibilidade livre e desimpedida a toda população,
indistintamente, além de prever sua inalienabilidade.
Além disso, a Constituição Federal (art. 5o, inc.
XV) garante o direito de locomoção e o direito de circulação,
que lhe é inerente, de sorte que a ninguém é lícito obstar o direito das
pessoas de circularem livremente por ruas, praças e áreas públicas de modo
geral.
1. Da Inconstitucionalidade da Lei Municipal Nº 4.053/96
A Constituição Federal de 1988 proclamou a cidadania e
a dignidade da pessoa humana como fundamentos da República Federativa do
Brasil (art. 1º, incisos II e III), destacando ainda, em seu artigo 3º, que os
objetivos fundamentais da República são:
I -
construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - ...;
III -
erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais;
IV -
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
Além disso, a Carta Magna dispôs, em seu artigo 5º, que:
II -
"ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei";
XV - é
"livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com
seus bens".
Por seu turno, estabelece o Código Civil, em seu artigo 99,
inciso I, que são bens públicos, de uso comum do povo, as ruas,
praças, estradas, rios e mares.
Desse modo, ao se promover o loteamento de terrenos, passam à
categoria de bens públicos as vias de circulação e os espaços livres constantes
do respectivo memorial e planta (art. 3º, do Decreto-lei nº 58/37 e art. 22 da
Lei 6.766/79).
Na lição de Hely Lopes Meirelles, “...o município interfere
como poder administrador, disciplinando e policiando a conduta do público ou
dos usuários especiais, a fim de assegurar a conservação dos bens e
possibilitar a sua normal utilização, tanto pela coletividade quanto pelos
indivíduos”. Sobre o conceito e o alcance de uso comum do povo,
esclarece que “é todo aquele que se reconhece à coletividade em geral sobres
os bens públicos, sem discriminação de usuários ou ordem especial para sua
fruição. É o uso que o povo faz das ruas e logradouros públicos, dos rios
navegáveis, do mar e das praias naturais. Esse uso comum não exige
qualquer qualificação ou consentimento especial, nem se pode cobrar ingresso ou
limitar a freqüência, pois isto importaria um atentado ao direito subjetivo
público do indivíduo de fruir os bens de uso comum do povo sem qualquer
limitação individual. Para esse uso só se admitem regulamentações gerais, de
ordem pública, preservadoras da segurança, da higiene, da saúde, da moral e dos
bons costumes, sem particularizações de pessoas ou categorias sociais"[5] (grifamos).
"No uso comum do povo os usuários são anônimos,
indeterminados, e os bens utilizados o são por todos os membros da coletividade
- uti universi - razão pela qual ninguém tem direito ao uso
exclusivo ou a privilégios na utilização do bem: o direito de cada indivíduo
limita-se à igualdade com os demais na fruição do bem ou no suportar os ônus
dele resultantes. Pode-se dizer que todos são iguais perante os bens de uso
comum do povo"[6].
Por outro lado, asevera que “Não é admissível o arruamento
privado ou mesmo a rua particular em zona urbana, porque todo sistema viário de
uma cidade é de uso comum do povo, o que afasta a possibilidade jurídica de
vias urbanas particulares.” (grifo nosso)[7].
Consoante anota Maria Sylvia Zanello de Pietro "Uso
comum é o que se exerce, em igualdade de condições, por todos os membros da
coletividade”. Trata-se, segundo Miguel S. Marienhoff (1955:62), "de
um poder que pode ser exercido por todos os homens, por sua só condição de homens
- quivis de populo - sem distinção entre nacionais e
estrangeiros, e em cujo exercício o usuário permanece sempre anônimo,
indeterminado e não individualizado"[8] (o grifo não
consta do original).
Não obstante, contrariando o conceito e a destinação dos bens
públicos de uso comum do povo, a Lei Municipal nº 4.053/96, em seu art. 3º,
dispõe o seguinte:
“O acesso
de pessoas e veículos poderá ser controlado pela portaria do loteamento e será
vedado na forma estabelecida pelo loteador ou pela associação de bairro,
ressalvada a livre movimentação de servidores públicos no exercício de sua
função”.
Trata-se de dispositivo eivado de inconstitucionalidade e
ilegalidade, material e formal, pois afronta tanto a Constituição da República
(arts. 1º, II e III, 3º, I, III e IV, 5º, II e XV, 21, XX, XXI; 22, XI, 23, II;
24, I, e §§ 2º e 3º; 182, caput; 227, § 2º) como a Constituição Estadual
(arts. 152, III; 181, caput e §§ 2º e 3º, e 280), além das Leis Federais
nº 6.766/79 (arts. 4º, I e 28) e nº 7.853/89 (art. 2º, parágrafo único, V,
"a").
Em primeiro lugar, vale lembrar que inexiste a figura
jurídica do “loteamento fechado” no Direito brasileiro. Além disso, a
famigerada Lei Municipal faz letra morta do princípio federativo,
consagrado pela Constituição da República, pois no âmbito das liberdades
públicas, a Carta Magna confere a liberdade de circulação, de sorte que, "cabe
à União estabelecer os princípios e diretrizes do sistema nacional de viação
(arts. 21, XXI) e legislar privativamente sobre trânsito e transportes (art.
22, XI), restando aos municípios disciplinar o tráfego nas respectivas vias
públicas)"[9]; compete ainda, à União e
aos Estados, legislarem concorrentemente sobre direito urbanístico (art.24, I e
§§ 2º e 3º), cabendo ao Estado (lato sensu) assegurar, ademais, o bem
estar de seus habitantes (arts. 182, caput e 227, § 2º).
Sustenta Diógenes Gasparini que “os Municípios não podem
autorizar essa forma de ‘loteamento condominial’. Lei municipal que preveja ou
regule sua implantação contamina o ato de flagrante ilegalidade, porque o
município não tem competência legislativa em matéria de condomínio”[10],
sendo certo, ademais, que a questão da destinação das áreas verdes e
institucionais decorre desse entendimento.
A Lei Municipal de Bauru nº 4.053/96 afronta ainda a Constituição
Estadual, pois não observa as normas urbanísticas que tratam do pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade (art. 180, I e V); e o dever de
promover a utilização racional do território, dos recursos naturais e de
proteção ao meio ambiente (art. 152, III).
A propósito, nos autos do Recurso Especial 95.300-SP, com
voto do ilustre Ministro Humberto Gomes de Barros, que abaixo segue transcrito,
decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça o seguinte:
"O
recurso merece conhecimento, somente pela suposta ofensa aos dispositivos do DL
58/37 e da Lei 6.766/79. A teor do art. 22 da Lei 6.766/79 as áreas do terreno
loteado reservadas à implantação de logradouros e serviços públicos integram -
por efeito automático do registro - o patrimônio do Município. Discute-se aqui
a possibilidade de o município dispor destes logradouros, mediante simples desafetação
legal. Tenho para mim que a desafetação, na hipótese, sofre restrições. É que a
desafetação implica em alterar-se o loteamento. Ora, o art. 28 da Lei 6.766/79
condiciona qualquer alteração ou cancelamento parcial do loteamento à
concordância dos adquirentes dos lotes atingidos pela modificação. Sem tal
concordância, é defeso ao Município consumar alteração - a não ser que
desaproprie e indenize os adquirentes prejudicados". in Revista de
Direito Imobiliário 41/105-106.
Se não bastasse, ao estabelecer restrições ao acesso de
pessoas nesses loteamentos fechados, loteadores e associações de bairro arrogam
para si uma parcela do poder de polícia que é exclusivo do Estado, e isto com o
aval do próprio Poder Executivo Municipal, o que é inconcebível no âmbito do
sistema federativo e do estado social e democrático de direitos. Exatamente por
isso, em decisão irreparável, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou
inconstitucional lei municipal que outorgou a particular o direito de controlar
o acesso de pessoas a loteamento:
Nesse sentido:
"Por fim, é de cuidar-se da outorga às concessionárias de uso das áreas em
questão da obrigação de praticamente as isolar, controlando o ingresso de
estranhos em suas dependências, assim substituindo, como dito na inicial,
"a vigilância pública pela privada, matéria essa relacionada ao campo da
segurança pública, que é da competência exclusiva do Estado, nos termos do
disposto no artigo 139 da Constituição Estadual" (f.10), podendo-se
indicar como vulnerado também o art. 1º da mesma Carta.
"Bem
acentuado na manifestação final do Ministério Público que o controle de acesso
às áreas de uso comum, "que pressupõe abordagem e exibição de documentos
pessoais", é tarefa típica de policiamento preventivo, sequer atribuída ao
Município, mas sim ao Estado, que também por isso não poderia delegar direitos
que não tem (f.168)..." (Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº
056.132.0/7 - Órgão Especial do TJSP, j. 10/11/99, v.u., relator Des. Luis de
Macedo).
Nesse contexto, conclui-se que a instalação e manutenção de
barreiras (tais como cancelas, correntes, avisos de parada e identificação,
etc.) em plena via pública, com fiscalização por funcionários caracterizados
ostensivamente como seguranças, guardas ou vigias, não constitui mera ameaça,
configurando, isto sim, um meio hábil a reduzir a capacidade de resistência de
qualquer cidadão, obrigando-o interromper seu caminho, pois não terá como
acessar tais vias públicas sem colocar em risco sua integridade física e moral,
além de seus bens.
Trata-se, portanto, de flagrante constrangimento ilegal
(tipificado como crime no artigo 146 do Código Penal), e que vem sendo
praticado com escora numa lei municipal eivada de inconstitucionalidade, tanto
formal quanto material, mesmo porque, conforme se verá, “...podem todos
locomover-se livremente nas ruas, nas praças, nos lugares públicos, sem temor
de serem privados de sua liberdade de locomoção”[11].
2. Da afronta ao direito de ir e vir
A construção de qualquer tipo de barreira arquitetônica ao
redor de um loteamento torna impossível o acesso da população às vias públicas
e áreas verdes e institucionais localizadas em seu interior, cuja utilização
passa a ser privilégio exclusivo dos moradores do bairro, situação essa
incompatível com o princípio da igualdade e com o direito constitucional de ir
e vir, dois dos pilares do estado democrático de direitos.
Em seu art. 5º, inc. XV, a Constituição Federal, como visto,
prevê o direito de locomoção como garantia fundamental, de tal
sorte que, pelo direito de circulação, que lhe é inerente, ninguém pode
licitamente obstar o direito das pessoas de livremente circularem por ruas,
praças e áreas públicas em geral. Para José Afonso da Silva, "o direito
de circular (ou liberdade de circulação) consiste na faculdade de
deslocar-se de um ponto a outro através de uma via pública ou afetada ao uso
público. Em tal caso, a utilização da via não constituirá uma mera
possibilidade, mas um poder exercitável erga omnes. Em conseqüência, a
Administração não poderá impedir, nem geral nem singularmente, o trânsito de
pessoas de maneira estável, a menos que desafete a via, já que, de outro modo,
se produziria uma transformação da afetação por meio de uma simples atividade
de polícia"[12].
Ainda na lição de José Afonso da Silva:
"As vias
urbanas são bens de uso comum do povo, nos termos do art. 66, I, do Código
Civil. São espaços preordenados ao cumprimento da função urbana de circular que
é manifestação do direito fundamental de locomoção, consoante já examinamos
antes. É certo que a realidade de nossos dias vai gerando vias de uso especial
do povo, como as vias expressas, sujeitas a um regime jurídico especial, mas
que não desnatura a sua função básica que é servir de canal de circulação, de
comunicação e de infra-estrutura urbana, pelo que também aí, observado o regime
especial, ocorre aquele direito.
"Esse
direito se estende de modo geral a todos os logradouros públicos, que são bens
de uso comum do povo. Certo é que uns são mais adequados à circulação, como as
ruas, avenidas, estradas, caminhos; outros destinados à permanência, ao
descanso, ao lazer, como as praças, os jardins e as áreas verdes públicas.
"Ressalvadas,
pois, as restrições de trânsito e as demais limitações de interesse comum,
ninguém poderá ser impedido do direito de transitar e permanecer neles. Nesse
‘permanecer’ se insere o direito de reunião sem armas, previsto no art. 5º.,
XVI, da Constituição Federal, bem como o de estacionar veículos, desde que não
haja proibição expressa nos termos da legislação de trânsito. Ocorre, claro
está, o poder da Administração de estabelecer a regulamentação do uso dos
logradouros públicos, inclusive, certamente, das vias urbanas, pela qual pode
determinar o tipo de circulação de cada via, a imposição de limitações e
proibições à circulação de veículos, o controle prévio de determinados tipos de
circulação, a imposição de requisitos para circular a determinadas categorias
de veículos, a proibição de circulação de determinados animais, a imposição de
sanções aos contraventores das normas estabelecidas, a vigilância permanente
por seus próprios agentes. Essas imposições e restrições são de competência das
autoridades municipais e das autoridades de trânsito, que podem ser estaduais.
"Há,
porém, limites a esse poder regulamentar da Administração, que precisamente se
situa no respeito ao direito de todos ao uso do bem, segundo sua destinação
específica. Como anota Pedro Escribano Collado, de cujo ensinamento nos temos
servido aqui amplamente, a doutrina francesa reconhece um tríplice limite aos
poderes da administração, formulados desde Rousseau, consistente no respeito às
liberdades individuais, e claramente a mais elementar de todas, a liberdade de
ir e vir que se confunde precisamente com o fato de circular através das vias
públicas, ao princípio de igualdade de todos os administrados e, por último, ao
princípio da liberdade de comércio e da indústria e do direito de
propriedade"[13] (grifamos).
Nesse passo, considerando que as estradas, ruas, praças – e
áreas destinadas à implantação de equipamentos públicos e comunitários -,
constituem bens de uso comum do povo, cuja utilização está intimamente ligada à
liberdade de circulação, não podem ter desvirtuadas as suas finalidades, sob
pena de flagrante inconstitucionalidade.
No esteio desse entendimento, conclui-se que o
fechamento das áreas públicas, por concessão ou permissão pela municipalidade,
revela-se ilegal e inconstitucional, pelos seguintes motivos: a) impede o uso
dessas áreas pelo público em geral; b) importa em alienação de fato desses
bens; c) inviabiliza o direito constitucional de circulação; d) não está
amparado em lei federal que define as regras de parcelamento do solo urbano; d)
configura constrangimento ilegal, pela falta de poder de policiamento exercido
sobre os transeuntes.
3. Bens de Uso Comum do Povo
As vias de circulação e as áreas verdes e institucionais, que
normalmente configuram o objeto da concessão de uso pelo Município-réu, como
visto acima, são bens de uso comum do povo, conforme classificação de
bens públicos adotada pelo Código Civil (art. 99, inc. I).
Assim, dispõe
o Código Civil:
"Art.
99. São bens públicos: I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares,
estradas, ruas e praças;
Fica até difícil, sem incorrer em tautologia, definir o que
vem a ser bem de uso comum do povo, pois a designação desta categoria de bens é
auto-explicativa. Consoante José Cretella Júnior, essa categoria de bens
compreende "coisas materiais que pertencem ao Estado, mas sobre as quais quisque
de populo, anônima e coletivamente, pode exercer direitos de uso e gozo,
como, p. ex., os logradouros públicos, praças, jardins, ruas, avenidas. Os bens
de uso comum são insuscetíveis de direito de propriedade"[14].
E não é outra a motivação que inspira a própria noção de República,
que pressupõe sempre a isonomia entre a totalidade dos indivíduos. Nesse
aspecto, José Afonso da Silva ensina que "público, do latim publicum, quer
dizer do povo (populum deu populicum, e daí público).
Lembra Jhering que res publica, como personalidade, na concepção do
Estado da época posterior à sociedade gentílica, implica, originariamente, o
que é comum a todos: res publicae são as diversas coisas da sociedade
pública, às quais todos têm igual direito"[15].
Logo, os bens de uso comum do povo devem ter sua utilização
franqueada a toda população, isonomicamente, sem restrições, pois "nos
bens de uso comum do povo, o uso por toda a gente não só se concilia com o
domínio público da coisa, como constitui mesmo o fator de sua
caracterização"[16].
Desse modo, a regra a ser observada é a que assegura, para
toda população, o livre e franco acesso a todos esses bens, sem restrições,
devendo seu uso exclusivo por particulares constituir a exceção, como, por
exemplo, nos casos de segurança nacional ou áreas protegidas por legislação
específica[17].
Nesse contexto, sobre o conceito de excepcionalidade, destaca
Carlos Maximiliano que devem ser consideradas excepcionais as
disposições que asseguram privilégio, palavra esta de significados
vários no campo jurídico, abrangendo, dentre outras situações, “o gozo e a
exploração de propriedades e riquezas do Estado”[18].
A Lei Orgânica do Município de Bauru determina que A
concessão administrativa de bens públicos de uso comum somente poderá ser
outorgada para finalidades escolares, de assistência social ou turística,
mediante autorização legislativa (art. 68, § 3º), não se concebendo,
portanto, o uso privativo desses bens por uma parcela privilegiada da
população.
No escólio de Maria Sylvia Zanello Di Pietro, "os bens
de uso comum do povo, tais como as ruas e praças, destinam-se ao uso coletivo.
O uso privativo de uma parcela de rua ou praça para realização de comércio de
qualquer tipo (venda de frutas, roupas, jornais, etc.) depende de consentimento
do poder público, manifestado por meio de autorização, permissão, ou concessão
de uso. Em regra, em se tratando de bem de uso comum do povo, a autorização e a
permissão são as medidas mais adequadas devido ao seu caráter precário. Com
efeito, o uso privativo não corresponde à destinação desses bens; eles
existem para servir ao uso igual por parte de toda a coletividade. Por isso
mesmo, somente devem ser expedidas quando não prejudiquem a destinação
principal, que é a livre circulação. E devem ser expedidas em caráter
precário, exatamente pela necessidade de sua revogação, a qualquer tempo em que
o uso privativo prejudicar a destinação do bem"[19]
(grifamos).
Outrossim, do ponto de vista da qualidade de vida da
população, não se pode olvidar da função urbanística desempenhada
por vias, praças e outras áreas públicas. Como bem destaca José Afonso da
Silva, "todo aglomerado urbano possui dois elementos essenciais": as unidades
edilícias e os equipamentos públicos. Equipamentos públicos, segundo
o mesmo jurista, "são os espaços urbanos abertos", ou seja,
"toda área geográfica, de terra ou de água, situada dentro de uma
concentração urbana ou a uma distância razoável, ou seja, dentro do perímetro
urbano, não coberto por qualquer estrutura permanente. Esses espaços
desempenham inumeráveis funções urbanísticas, de sorte que sua adequada
ordenação, tendo em vista a natureza de cada qual deles, constitui meio de
propiciar uma qualidade ambiental conveniente à qualidade de vida da população"[20].
Ao permitir que sejam construídos muros ao redor dos
loteamentos, o Município-réu causa prejuízos a interesses difusos de caráter
urbanísticos, privando a população de milhares de metros quadrados de áreas
verdes, além das áreas institucionais, destinadas à implantação equipamentos
públicos e comunitários, sem se falar nas centenas de quilômetros de ruas e
avenidas.
Vale destacar, nesse aspecto, precedente do Supremo Tribunal
Federal pela legalidade de ato do prefeito municipal de Ubatuba que determinou
a remoção de obstáculos que impediam o acesso a bens de uso coletivo, fundada
no direito de ir e vir e de utilizar esses bens públicos de uso comum do povo.
Nesse sentido:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. N º 94.253 JULGAMENTO: 12/11/1982 E M E N T A:
LOTEAMENTO. FECHAMENTO DE ACESSO A RUAS QUE INTERLIGAM LOTES E CONDUZEM A ORLA
MARITIMA. LEGALIDADE DE ATO DA PREFEITURA MUNICIPAL, REMOVENDO OBSTÁCULOS QUE
IMPEDIAM AQUELE LIVRE ACESSO. INCONSTITUCIONALIDADE INOCORRENTE DA LEI
MUNICIPAL N. 557/79, DE UBATUBA: ASSEGURA DIREITO A UTILIZACAO DE BEM PUBLICO
DE USO COMUM DO POVO.
RECURSO
EXTRAORDINARIO NÃO CONHECIDO.
VOTACÃO
UNÂNIME. RESULTADO NÃO CONHECIDO. VEJA RE-84327. ANO: 82 AUD: 17-12-82 ORIGEM:
SP - SAO PAULO PUBLICAÇÃO: DJ DATA-17-12-82 PG-13209 EMENT VOL-01312-02
PG-00412 RELATOR: OSCAR CORREA SESSÃO: 01 - PRIMEIRA TURMA.”
4. Inalienabilidade dos Bens Públicos
Origina-se do direito romano o princípio da inalienabilidade
dos bens de uso comum. Assim, referindo-se aos bens públicos, preceitua o art.
100 do Código Civil Brasileiro:
"Art.
100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são
inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.
Segundo lição de Caio Mário da Silva Pereira, a
inalienabilidade refere-se a "bens que são legalmente indisponíveis, e são
aqueles que, apropriáveis por natureza, não podem ser objeto de comércio em
razão da pendência de uma prescrição de lei, que proíbe sua alienação. Podem
ser apontados nesta categoria os bens públicos de uso comum e de uso
especial"[21].
Em termos jurisprudenciais, acerca da destinação e disposição
das áreas de uso comum decorrentes de parcelamento (arts. 17 e 22 da Lei
Federal nº 6.766/79), contundentes se mostram os fundamentos elencados em
precedente do Superior Tribunal de Justiça:
"...O
art. 17 não pode ser compreendido isoladamente. Ao contrário, impõe-se uma
interpretação sistemática com os arts. 4º, 22 e 28 do mesmo diploma. O
legislador determinou no art. 22 da Lei nº 6.766/79 que:
"Art. 22. Desde a data do registro do loteamento, passam a integrar o
domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas destinadas
a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do
memorial descritivo."
Essa
estatuição pretendeu, sem dúvida, vedar o poder de disponibilidade do
incorporador sobre essas áreas. Coloca-as, portanto, sobre a tutela da
Administração municipal de forma a garantir que não terão destinação diversa.
Este parece ser o espírito da lei. De outra forma, estaria a norma legalizando
uma desapropriação indireta ou, pior, permitindo o confisco por parte do poder
público. Por outro lado, visa, também, a aumentar o patrimônio comunitário,
pois esta é a utilidade e função social dos bens públicos de uso comum do povo,
a de servirem os interesses da comunidade.
Essa tese é
reforçada por análise teleológica do art. 17 com o art, 4º do mesmo diploma
legal...."
"..Esse
dispositivo destaca os pressupostos mínimos do loteamento relativamente às
áreas de uso comum, cuja fiscalização depende da municipalidade. Exige,
portanto, que o loteador destaque áreas mínimas, tendo em vista a comodidade da
população, a saúde e a segurança da comunidade. Portanto, embora a norma se
dirija ao loteador, parece-me, mais uma vez, que a idéia que lhe é subjacente é
a de proteger o interesse dos administrados, outorgando ao poder público essa tutela.
Existe, em
relação a esses bens, uma espécie de separação jurídica entre o sujeito de
direito da propriedade, o Município, e o seu objeto, a comunidade. Assim,
embora a norma jurídica em apreço se dirija ao loteador, retirando-lhe de forma
expressa o poder de disponibilidade sobre as praças, ruas e áreas de uso comum,
a razão de ser da norma, isto é, o seu espírito, cria limitações à atuação do
Município, pois, a Administração que fiscaliza não pode violar a
norma...."
"...No
caso concreto, as áreas foram postas sob a tutela da administração municipal,
não com o propósito de confisco, mas como forma de salvaguardar o interesse dos
administrados, em face de possíveis interesses especulativos dos
incorporadores. Ademais, a importância do patrimônio público deve ser aferida
em razão da importância da sua destinação. Assim, os bens de uso comum do povo
possuem função ut universi. Constituem um patrimônio social
comunitário, um acervo colocado à disposição de todos. Nesse sentido, a
desafetação desse patrimônio prejudicaria toda uma comunidade de pessoas,
indeterminadas e indefinidas, diminuindo a qualidade de vida do grupo.
Dessarte,
existe uma espécie de hierarquia de bens públicos, consolidada não em face do
seu valor monetário, mas segundo a relação destes bens com a comunidade. Por
isso, não me parece razoável que a própria Administração diminua sensivelmente
o patrimônio social da comunidade. Prática, aliás, vedada por lei, pois o art.
4º impõe áreas mínimas para os espaços de uso comum. Incorre em falácia pensar
que a Administração onipotentemente possa fazer, sob a capa da
discricionariedade, atos vedados ao particular, se a própria lei impõe a tutela
desses interesses...." (Recurso Especial nº 28.058 (92-025543-4) - São
Paulo - Relator: Ministro Adhemar Maciel - Data do julgamento: 13/10/1998 - 2ª
Turma do Superior Tribunal de Justiça - (grifamos).
Nesse prisma, a concessão de direito real de uso não pode
resultar na alienação do bem público, sendo essa a exegese que dá conteúdo à
proibição resultante da inalienabilidade, conferindo-lhe a efetividade
necessária, mesmo porque, seria letra morta a proteção legal contra a alienação
de um bem, se não houvesse restrição à sua concessão a particulares, para uso
exclusivo por período indeterminado. Consoante observa Paulo Affonso Leme
Machado, "na realidade não só a venda como concessões privatizam os
bens, colocando-os exclusivamente a serviço de uns poucos"[22]
(grifamos). Portanto, se é defeso ao Poder Público alienar determinado bem, por
idêntica razão, não poderá conceder direito real de uso gratuito que resulte na
sua privatização. Afinal, conforme lembra Carlos Maximiliano, Ubi eadem
legis ratio, ibi eadem legis dispositio: "onde se depare razão igual à
da lei, ali prevalece a disposição correspondente, da norma referida"[23].
IV. DA NECESSIDADE DE UM PLANEJAMENTO URBANO E DAS
CONSEQÜÊNCIAS DE SUA INOBSERVÂNCIA.
Hodiernamente, assim como ocorre com as questões ligadas ao
meio ambiente natural, com o intuito de assegurar uma melhor qualidade de vida
para as presentes e futuras gerações, o meio ambiente urbano, que envolve o
planejamento das cidades e o papel do Estado, é tema que vem despertando grande
interesse tanto de operadores do Direito quanto de outras ciências que se
interligam nessa busca, como a Engenharia, a Arquitetura, a Sociologia, a
Medicina, dentre outras.
As cidades são verdadeiras células vivas, em constante
mutação, que exigem do homem uma busca contínua na solução dos problemas
decorrentes dos contingentes humanos que nelas vão se estabelecendo, sem a
necessária infra-estrutura para assegurar a todos uma sadia qualidade de vida,
de forma igualitária e não discriminatória. Assim, o fenômeno
"cidades" vem sendo debatido e discutido em todo o planeta, por todos
os seguimentos envolvidos nesse processo.
O Estado, por sua vez, como ente político que avocou para si
a tarefa de regular a vida em sociedade, tem um papel de fundamental
importância nesse planejamento, pois cabe a ele assegurar sua realização e
estabelecer como serão executadas as normas indispensáveis à planificação dos
centros urbanos.
Para a concretização desse processo de planificação e
ordenamento urbano, é fundamental que cada Município elabore o seu próprio
Plano Diretor, consoante determina a Lei nº 10.267/2001.
Em publicação da Fundação Prefeito Faria Lima, o CEPAM -
Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal -, assim se expressa: "No
jogo do planejamento, o Poder Público desempenha um duplo papel, ao mesmo tempo
que participa do jogo ele deve ser o seu árbitro. Cabe-lhe desenvolver os
esforços necessários para que todos os interessados nesse jogo possam dele
participar em condições mais equilibradas no tocante às chances de sucesso.
Quanto maior for a transparência do jogo - isto é, quanto maior for o
conhecimento daqueles que dele participam, da importância das questões que
estão sendo jogadas, do prêmio a ser recebido e das perdas associadas aos
reveses - menores serão as possibilidades de manipulação dos resultados" (cf.
Subsídios para a Elaboração do Plano Diretor - CEPAM - Coordenação Técnica de
Yara Darcy Police Monteiro, Consultores, Affonso Accorsi e Fernando Rezende da
Silva - São Paulo - 1990).
Os dados estatísticos do "Relatório Brasileiro sobre
Assentamentos Humanos", apresentado pelo Comitê Nacional na Conferência
Habitat II da Organização das Nações Unidas, realizada em Istambul em 1996,
aponta que o nível de urbanização no Brasil atinge patamares muito elevados
conforme o conceito político-administrativo adotado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística - IBGE -, sendo que 76,5% da população brasileira
vivia em áreas urbanas, o que revela que devemos dar papel de destaque à vida
comunitária, pois com o crescimento das cidades e o surgimento das metrópoles,
os problemas decorrentes dessa crescente urbanização se agigantam em
complexidade, o que demonstra a necessidade crescente de um planejamento urbano
mais eficaz.
Segundo José Afonso da Silva, "o planejamento, em geral,
é um processo técnico instrumentado para transformar a realidade existente no
sentido de objetivos previamente estabelecidos”, sendo que, de início, tal
processo dependia simplesmente da vontade do administrador, que poderia
utilizá-lo ou não, pois não se caracterizava como um processo juridicamente
imposto, mas simples técnica de que o administrador poderia se utilizar. “Se o
usasse, deveria fazê-lo mediante atos jurídicos, que se traduziriam num plano,
que é o meio pelo qual se instrumentaliza o processo de planejamento". E
prossegue o mestre:
“A institucionalização do processo de
planejamento importou em convertê-lo num tema do Direito, e de entidade
basicamente técnica passou a ser uma instituição jurídica, sem perder suas
características técnicas. Mesmo seus aspectos técnicos acabaram, em grande
medida, juridicizando-se, deixando de ser regras puramente técnicas para se
tornarem normas técnico-jurídicas. O processo de planejamento encontra
fundamentos sólidos na Constituição Federal de 1988, quer quando, no art. 21,
IX, reconhece a competência da União para elaborar planos nacionais e regionais
de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social, quer quando,
no art. 174, inclui o planejamento entre os instrumentos de atuação do Estado
no domínio econômico, estatuindo que a lei estabelecerá as diretrizes e bases
do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e
compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento, ou, ainda,
quando, mais especificamente, atribui aos Municípios a competência para
estabelecer o planejamento e os planos urbanísticos para ordenamento do seu
território (arts. 30, VIII, e 182).
A complementar o trecho supra citado,
cumpre remarcar o teor do artigo 182 da Carta Magna que dispõe que "a
política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal,
conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento
das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes".
De mesmo teor é o disposto no artigo 30, VIII, da Constituição da República,
cabendo ao Município, promover no que couber, adequado ordenamento territorial,
mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo
urbano"[24].
A Constituição Estadual, por sua vez, corroborando com o
ordenamento proposto pela Lei Maior disciplina em seu artigo 181
"caput" que, "lei municipal estabelecerá, em conformidade com
as diretrizes do plano diretor, normas sobre zoneamento, loteamento,
parcelamento, uso e ocupação do solo, índices urbanísticos, proteção ambiental
e demais limitações administrativas pertinentes".
Descendo a um detalhamento maior, a Lei Orgânica do
Município de Bauru dispõe em seu art. 159 que “o uso e o parcelamento do solo serão feitos de
forma a ordenar pleno desenvolvimento das funções sociais e econômicas da
cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.
Segundo magistério de Joaquim Castro Aguiar, "planejar
significa estabelecer objetivos, indicar diretrizes, estudar programas,
escolher os meios mais adequados a uma realização e traçar a atuação do
governo, consideradas as alternativas possíveis". E prossegue o autor,
embasado nas lições de José Afonso da Silva:
"O
processo de planejamento urbanístico adquire sentido jurídico, quando se traduz
em planos urbanísticos. Estes são pois, os instrumentos formais que
consubstanciam e materializam as determinações e os objetivos previstos
naquele. Enquanto não traduzido por planos aprovados por lei (entre nós), o
processo de planejamento não passa de propostas técnicas e, às vezes,
simplesmente administrativas, mas não tem ainda dimensão jurídica. Por isso,
enquanto simples processo, o planejamento não opera transformação da realidade
existente, não surte efeitos inovadores da realidade urbana. Estes só se
manifestam quando o processo de planejamento elabora o plano ou planos
correspondentes, com o que, então ingressa no ordenamento jurídico por seu
caráter conformador ou inovativo..."[25].
Nesse contexto, infere-se que os planos urbanísticos,
instrumentos formais por excelência, somente apresentam validade se estiverem
em conformidade com o a lei, e, partir daí, ingressam no ordenamento jurídico,
nos termos do que preceitua a Constituição da República, a Constituição
Estadual e a Lei Orgânica do Município. Vale dizer, assim, que o planejamento
urbano de uma cidade somente será constitucional se tiver por objetivos a
preservação do meio ambiente e o pleno desenvolvimento econômico e social do
município, assegurando, portanto, o bem-estar geral da coletividade.
V. DO ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA – EIV
O estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) é um
instrumento de política urbana que vem previsto nos artigos 4º, VI, e 36 a 38
do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/01), tendo como objetivo avaliar os efeitos
- positivos ou negativos - do empreendimento ou atividade a ser implementado em
áreas urbanas.
Assim, nos termos do artigo 36 do Estatuto da Cidade:
Art. 36.
“Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em
área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de
vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção,
ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.”
Por sua vez, estabelece o art. 37 do mesmo diploma que:
Art. 37. “O
EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do
empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente
na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes
questões”:
I-
adensamento populacional;
II-
equipamentos urbanos e comunitários;
III- uso e
ocupação do solo;
IV-
valorização imobiliária;
V- geração
de tráfego e demanda por transporte público;
VI-
ventilação e iluminação
VII-
paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.
Parágrafo
único – Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que ficarão
disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal, para
qualquer interessado.”
Tratando-se de um instrumento de política urbana essencial ao
desenvolvimento das cidades, sua principal meta é avaliar os empreendimentos e
atividades a serem implantados em áreas urbanas, concluindo acerca de sua
conveniência, ou não, assegurando-se à população a plena possibilidade de
acesso aos documentos integrantes do EIV, para a averiguação de sua
conformidade e adequação.
Assim, cabe à Lei Municipal estabelecer quais os
empreendimentos e atividades públicas ou privadas em área urbana, que, para
obter licenças ou autorizações de construção, implantação, ampliação ou
funcionamento a cargo do Poder Público Municipal, devem elaborar Estudo Prévio
de Impacto de Vizinhança (EIV).
Na maioria dos casos, as atividades públicas e privadas
realizam-se de forma simples e sem maiores transtornos para população e para o
Poder Público. Entretanto, havendo solicitação de licença para implantação de
empreendimento que possa adensar extraordinariamente a população local ou
acarretar algum inconveniente do ponto de vista urbanístico, ambiental ou de
equipamentos públicos, será imprescindível um estudo de impacto de vizinhança
(EIV), de forma a determinar quais os efeitos positivos e negativos de tal
empreendimento - inclusive no que tange à implantação de áreas verdes e de
equipamentos públicos e comunitários, bem como no que se refere ao impacto do
sistema viário.
Infere-se da lição de Regis Fernandes de Oliveira que esse
estudo se mostra necessário em face das transformações que a atividade ou
empreendimento acarretará ao local, haja vista que o aumento no tráfego de
pessoas incorre na necessidade de mais creches, escolas, postos de saúde, sendo
que essas novas demandas da população só poderão ser aferidas por meio de um
estudo de impacto de vizinhança, devendo os documentos e dados que serviram de
base para o resultado do estudo ficar à disposição do órgão municipal
competente, para que possam ser consultados por qualquer interessado[26].
Por conseqüência, as conclusões desse estudo poderão levar à
aprovação do empreendimento ou atividade, estabelecendo, em contrapartida, as
condições necessárias para sua implantação ou funcionamento, tais como:
a) exigência de creches, áreas verdes, parques e escolas para
a questão do adensamento populacional;
b) nos casos de impacto sobre o sistema de tráfego e a
infraestrutura do entorno viário, poderão ser exigidos investimentos em
sinalização, transportes coletivos, estação de embarque e desembarque,
implantação de áreas de escape, de aceleração e desaceleração.
Ademais, essa avaliação poderá ainda indicar a necessidade de
modificação do projeto do empreendimento, como por exemplo a diminuição da área
construída, aumento de vagas para estacionamento, isolamento acústico,
alterações na fachada, dentre outros. Desse modo, o grande desafio dos
Municípios no Estudo do Impacto de Vizinhança é estabelecer o equilíbrio entre
o ônus e os benefícios de cada empreendimento, tendo como foco, além da
vizinhança, o conjunto da cidade, mesmo porque, consoante redação do artigo 38,
“a elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação do estudo
prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação
ambiental.”[27]
Não obstante essa imposição legal, o Município de Bauru ainda
não tem legislação própria disciplinando esse imprescindível instrumento de
política urbana, de modo que toda a população está à mercê da aprovação de
empreendimentos imobiliários que possam acarretar sérios impactos tanto na
esfera ambiental quanto urbanística do município.
O Projeto de Lei que institui o Plano Diretor Participativo
do Município de Bauru, a despeito de prever o estudo de impacto de vizinhança
como um de seus instrumentos de política urbana (arts. 7º, V e § 1º e 25/27),
ainda está longe de ser aprovado, pois sequer foi apreciado pela Câmara
Municipal de Bauru. Além disso, o EIV reger-se-á por legislação própria, que
seguramente tardará a entrar em vigor.
E para agravar ainda mais essa situação, além do município
não contar com legislação própria que lhe assegure a elaboração do estudo
prévio de impacto de vizinhança, o Projeto do Plano Direitor de Bauru, em total
afronta aos dispositivos legais e constitucionais mencionados nos tópicos
anteriores, prevê expressamente, em seu artigo 202, a figura do
famigerado “loteamento fechado”, estabelecendo, sem qualquer critério,
que o empreendimento deverá respeitar os seguintes requisitos:
I-
perímetro máximo de 2000 metros lineares;
II-
Distância mínima entre loteamentos fechados de 300 m;
III-...
IV- 50% da
área destinada a sistema de lazer e a totalidade da área institucional e áreas
dominiais com acesso público.
Como se pode constatar, essa situação de flagrante
inconstitucionalidade vem sendo fomentada pelo Município, tanto que no próprio
Projeto do Plano Diretor prevê a figura do “loteamento fechado”, chegando ao
absurdo de estabelecer, sem qualquer critério técnico, um perímetro de até 2000
metros lineares, além de uma irrisória distância mínima de 300 metros entre um
e outro. E o que não é menos grave quanto, permite que metade do percentual da
área verde fique localizada no interior do loteamento, atendendo com
exclusividade uma classe privilegiada de pessoas, o que se revela inconcebível,
à luz dos argumentos fáticos e jurídicos acima relacionados.
VI. DA CONCLUSÃO
Como visto, a cidade de Bauru possui dezenas de loteamentos
fechados, a maioria lozalizada na zona sul da cidade, região visada pelos
empreendedores para implantação de novos loteamentos fechados, conforme
demonstra o mapa em anexo. Logo, necessário se faz que seja freado
imediatamente esse processo de esbulho de áreas de uso comum do povo, pois a
população de Bauru não suporta mais essa situação de insegurança jurídica, se
vendo obrigada a conviver, diuturnamente, numa cidade cada vez mais emparedada
por esses loteamentos fechados, que configuram verdadeiros feudos, à disposição
de uma minoria de privilegiados, em detrimento do restante da comunidade.
Outrossim, independentemente da existência de lei municipal,
necessário se faz que os novos empreendimentos imobiliários (loteamentos
regidos pela Lei 6.766/79 e condomínios regidos pela Lei 4.591/64) sejam
submetidos ao necessário estudo prévio de impacto de vizinhança, notadamente
para se avaliar o grau de impacto do sistema de trânsito e da demanda dos
serviços públicos, bem como os transtornos decorrentes da poluição sonora e do
ar atmosférico, além dos inconveninetes relativos à ordem estética e
urbanística.
Portanto, em face dos argumentos expostos, conclui-se que a
população de Bauru não está livre da implantação de outros loteamentos
fechados, que seguramente irão privá-la da utilização das vias de trânsito e
das áreas verdes e institucionais, sendo necessário, por conseqüência, um
pronunciamento jurisdicional visando coibir que esses abusos se perpetuem,
reconhecendo-se, inclusive, a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº
4.053/96 .
Além disso, necessário se faz que os novos empreendimentos
imobiliários - por serem pólos geradores de tráfego de outras atividades, que
podem causar sérios transtornos à população - sejam submetidos ao competente
estudo prévio de impacto de vizinhança.
VII. DOS PEDIDOS
O Ministério Público, com base nos fatos e fundamentos
jurídicos acima expostos, formula os seguintes pedidos:
1. Da Liminar
Considerando que a aprovação e implantação desses loteamentos
fechados violam os direitos constitucionais do cidadão e atentam contra a ordem
urbanística estabelecida na legislação própria, incluindo a Constituição
Federal, pois impedem que a coletividade tenha acesso às vias públicas e às
áreas verdes e institucionais, bens de uso comum do povo, privilegiando uma
minoria de proprietários, e tendo em vista que o Poder Público Municipal vem
autorizando esse tipo de empreendimento imobiliário de forma indiscriminada, o
que pode acarretar sérios e irreparáveis prejuízos à população, requer-se, liminarmente,
a título de antecipação de tutela, sem justificação prévia ou oitiva
da parte contrária, seja determinado ao Município-réu que:
a) abstenha-se de autorizar, doravante, por meio de permissão,
concessão de direito real de uso ou qualquer outro tipo de contrato ou
convênio, o fechamento das vias e áreas públicas de loteamentos ou
desmembramentos urbanos (regidos pela Lei nº 6.766/79), mediante a construção
de muros e instalação de portaria com cancela, para acesso privativo dos
moradores do bairro, privando a população em geral de acesso a essas áreas de uso
comum do povo;
b) passe a exigir, de imediato, como condição para aprovação de
novos empreendimentos imobiliários (regidos pelas Leis nº 6.766/79 e nº
4.591/64), a realização do necessário estudo prévio de impacto de vizinhança,
bem como o cumprimento das exigências nele estabelecidas, conforme determina o
Estatuto da Cidade (Lei nº 10.267/2001, arts. 36/38), devendo o EIV ser
elaborado por órgãos oficiais ou da Universidade Estadual Paulista de Bauru,
com base em critérios técnicos definidos em lei, ou, na sua falta, por esses
mesmos órgãos;
c) requer ainda o estabelecimento de multa no valor de R$
500.000,00 (quinhentos mil reais), sujeita à correção monetária, devida por
qualquer ato praticado em descordo à ordem judicial, sem prejuízo das penas do
crime de desobediência (Código Penal, art. 330).
2. Dos Efeitos da Liminar
Por uma questão de segurança jurídica, para não prejudicar os
interesses de adquirentes de boa-fé e não inviabilizar os empreendimentos que
já tiveram seus projetos aprovados pelo Poder Público do município, a liminar
não deverá alcançar os parcelamentos de solo (já implantados, em fase de
implantação ou por implantar) cujo projeto - com previsão para fechamento das
áreas e vias públicas e desacompanhado do EIV -, tenha sido aprovado pelo
Município antes da concessão da medida antecipatória, devendo prevalecer,
portanto, para os demais empreendimentos.
Com relação aos empreendimentos cujos projetos já foram
aprovados (já implantados, em fase de implantação e por implantar), eventuais
problemas decorrentes do fechamento das áreas de uso comum do povo serão
analisados no momento oportuno, em procedimento próprio, quando necessário,
notadamente para avaliação do grau de colisão entre os princípios da segurança
pública e da liberdade de locomoção.
3. Dos Pedidos Finais
Requer, finalmente:
a) a citação do Município-réu na pessoa de seu Prefeito Municipal,
para responder aos termos desta ação no prazo legal, sob pena de revelia;
b) a procedência total da ação, convertendo-se em definitiva a
medida antecipatória e condenando-se o Município-réu nos seguintes termos:
b.1) a abster-se de autorizar, por meio de permissão, concessão
de direito real de uso ou qualquer outro tipo de contrato ou convênio, o
fechamento das vias e áreas públicas de loteamentos e desmembramentos urbanos,
assegurando assim, a toda população, o acesso amplo e irrestrito a essas áreas
de uso comum do povo, observando-se, entretanto, a ressalva constante do item
VII.2.;
b.2) para que passe a exigir, como condição para aprovação de
novos empreendimentos imobiliários (loteamentos e desmembramentos regidos pela
Lei nº 6.766/79, e condomínios disciplinados pela Lei nº 4.591/64), a
realização do competente estudo prévio de impacto de vizinhança, bem como o
cumprimento das medidas mitigadoras e compensatórias nele estabelecidas, além
da implantação dos equipamentos públicos necessários, consoante estabelece o
Estatuto da Cidade (Lei nº 10.267/2001), devendo o EIV ser elaborado por órgão
oficiais ou da Universidade Estadual Paulista de Bauru, com base em critérios
técnicos definidos em lei, ou, na sua falta, por esses mesmos órgãos;
b.3) ao pagamento das custas e demais despesas processuais;
b.4) ao pagamento de multa no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos
mil reais), sem prejuízo das penas do crime de desobediência (CP, art. 330),
devida pela prática de qualquer ato que importe na implantação de
empreendimento imobiliário contrariando determinação judicial.
c) Requer, por fim, a produção de todo tipo de prova admissível
no ordenamento jurídico (testemunhal, documental, pericial, vistoria, inspeção,
etc.), bem como a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros
encargos (Lei nº 7.347/85, art. 18, e Código de Defesa do Consumidor, art. 87),
e ainda, que as intimações ao Autor, de todos os atos e termos processuais, na
forma da lei, se façam no seguinte endereço: Promotoria de Justiça Cível e de
Habitação e Urbanismo de Bauru, Rua Silva Jardim, nº 2-77, 3º andar, Bela
Vista, Bauru-SP.
Dá-se à causa o valor
de R$ 10.000,00 (dez mil reais), para efeitos fiscais.
Bauru, 05 de outubro de
2006.
JOSÉ
CARLOS CARNEIRO DE OLIVEIRA
3º Promotor de Justiça Cível e de
Habitação e Urbanismo de Bauru
[1]
Direito Urbanístico Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 2ª ed., 1995, p. 30.
[2] O EIV,
na falta de lei regulamentadora, deverá ser elaborado por órgãos oficiais ou da
Universidade Estadual Paulista de Bauru, com base em critérios técnicos
definidos em lei ou por esses órgãos.
[3] Lei
Municipal Nº 4.503/96, art. 3º: “O acesso de pessoas e veículos poderá ser controlado
pela portaria do loteamento e será vedado na forma estabelecida pelo loteador
ou pela associação de bairro, ressalvada a livre movimentação de servidores
públicos no exercício de sua função”.
[4] Quanto
ao conceito de “bens de uso comum do povo”, será objeto de análise mais
específica no item III. 3.
[5] Direito
Municipal Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 6ª ed., p. 232.
[6] Ob. Cit., p. 233.
[7] Ob. Cit., p. 401.
[8] Direito
Administrativo, São Paulo, Editora Atlas, 3ª ed., p. 384.
[9] José
Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo,
RT, 5ª ed., p. 213.
[10] Loteamento
em Condomínio, RDP, vol. 68, p. 319. No mesmo sentido: José Carlos de
Freitas, Da Legalidade dos Loteamentos Fechados, RT 750/148 e segs.;
José Afonso da Silva, direito Urbanístico Brasileiro, Malheiros, 2ª ed.,
p. 316).
[11] Curso
de Direito Constitucional Positivo, José Afonso da Silva, São Paulo, RT, 5ª
ed., p. 211.
[12] Curso
de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, RT, 5ª ed., 1989, P. 212.
[13] Direito
Urbanístico Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 2ª ed., p. 194.
[14] Enciclopédia
Saraiva de Direito, Saraiva, São Paulo, 1978, vol. 11, p. 204.
[15] Curso
de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, RT, 5ª ed., 1989, p. 90.
[16] Caio
Mário da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil, Rio de Janeiro,
Forense, 19ª ed., 1999, vol. I, p. 280.
[17] Lei nº 7.661/88, art. 10: "As praias são bens de
uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao
mar, em qualquer direção e sentido , ressalvados os trechos de interesse de
segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação
específica".
[18] Hermenêutica
e Aplicação do Direito, Rio de Janeiro, Forense, 11ª ed., 1991, p. 232.
[19] Poder
de Polícia em matéria urbanística, in Temas de Direito Urbanístico,
Ministério Público/Imprensa Oficial, 1999, p. 34.
[20] Direito
Ambiental Constitucional, São Paulo, Malheiros, 3ª ed., 2.000, p. 203.
[21] Instituições
de Direito Civil, Rio de Janeiro, 19ª ed., vol. I, p. 285.
[22] Direito
Ambiental Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 8ª ed., 2.000, p. 402.
[23] Hermenêutica
e Aplicação do Direito, Rio de Janeiro, Forense, 11ª ed., p.209.
[24] Direito
Urbanístico Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 2ª ed., p.p. 77 e ss.
[25] Direito
da Cidade, São Paulo, Renovar, p. 36.
[26] Comentários
ao Estatuto da Cidade, São Paulo, RT, 2002, p.p. 98/101.
[27] Comentários
ao Estatuto da Cidade, Patrícia Teixeira Rezende Flores e Bernadete
Schelder dos Santos, Rio de Janeiro, AIDE Editora, 2002, p.p. 109/111.
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