segunda-feira, 12 de junho de 2017

MP AL INSTAURA AÇÃO CIVIL PUBLICA CONTRA FALSOS CONDOMINIOS

Parabenizamos o Dr. Antonio Jorge Sodré Valentim de Souza , Promotor de Justiça Titular da 66ª Promotoria de Justiça de Alagoas,   pelo excelente trabalho em defesa do Regime Democrático, do Patrimonio Publico e dos direitos inalienáveis do povo brasileiro ! 

"A Administração Pública que consegue diminuir a desigualdade social, obtém significativa redução da criminalidade. Pensemos nisso" Dr. Antonio Jorge Sodré Valentim de Souza

TRECHOS DA AÇÃO CIVIL PUBLICA 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL DA COMARCA DE MACEIÓ/AL



O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE ALAGOAS, por seu Promotor de Justiça titular da 66ª Promotoria de Justiça da Capital, que este subscreve, no uso de suas atribuições legais, em especial por conta da Resolução do Colégio de Procuradores de Justiça nº 38/2012, que conferiu atribuições judiciais e extrajudiciais à citada Promotoria de Justiça em sede de urbanismo, defesa dos patrimônios artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico do município de Maceió, podendo atuar perante qualquer juízo da Capital, (...) com fundamento no artigo 129, incisos II e III, da Constituição Federal, na Lei Federal nº 7.347/85, no Código de Urbanismo e Edificações da Cidade de Maceió, dentre outros diplomas legais, vem, perante Vossa Excelência, ajuizar:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA 
EM DESFAVOR


Do MUNICÍPIO DE MACEIÓ, pessoa jurídica de direito público interno, REPRESENTADO PELO SENHOR PREFEITO (art. 55, I, da Lei Orgânica do Município de Maceió), EXCELENTÍSSIMO SENHOR PREFEITO (...) , REPRESENTANDO JUDICALMENTE PELO PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE MACEIÓ, EXCELENTÍSSIMO SENHOR (...) conforme art. 61 da Lei Orgânica do Município de Maceió, PELOS FATOS E FUNDAMENTOS A SEGUIR: 

I – DOS FATOS 

1. A 66ª Promotoria de Justiça da Capital, com base nos diversos processos em tramitação nesta unidade ministerial, que apuram as ocupações irregulares por meio de fechamento de ruas e de fechamento de loteamentos na Cidade de Maceió, resolveu organizar a prova, para fins de ajuizamento da presente ação, colacionado em um único processo, o de nº MP 09.2016.00000250-5, antigo PGJ nº 3878/2013, que tem como interessados o Procurador-Geral da República, Doutor Rodrigo Janot Monteiro de Barros e o ex-Senador Eduardo Matarazzo Suplicy, as peças contidas noutros que versam sobre o tema em questão. 

2. Com efeito, conforme deflui dos autos do Processo MP nº 09.2016.00000250-5, munícipes da cidade de Maceió, em face da conduta “comissiva por omissão” do Poder Público Municipal, arvoraram-se: 

a) Da utilização exclusiva de bens públicos necessariamente destinados ao uso comum, quando do registro dos loteamentos, que passaram a integrar, ato contínuo, o domínio do Município, e

b) De diversas ruas, praças públicas, equipamentos públicos comunitários (a exemplo: de esportes, de lazer e de convívio social), áreas livres e de lazer, equipamentos urbanos, todos de uso comum do povo ou de Domínio Público. 

3. De fato, tamanho é o número de loteamentos fechados e de ruas ocupadas irregularmente na Cidade de Maceió que a 66ª Promotoria de Justiça da Capital os apresenta tão somente a título de amostragem, já que muitos outros se encontram em idêntica situação.

(....) 

4. Deveras, ao ocuparem os citados espaços públicos urbanos, passaram a administrá-los como se deles fossem, instalando cancelas, portões, guaritas, portarias na entrada dos loteamentos ou nos acessos ao bairro ou às ruas, somente permitindo a passagem de pessoas por eles credenciadas, de modo que o ingresso de cidadãos não credenciados só é permitido após prévia, ilegal e constrangedora identificação. 

Verdadeiramente, depois dos fechamentos dessas áreas urbanas e fixação dos respectivos controles de entrada, esses munícipes, por meio de associações, passaram a agir como administradores de condomínio, transformando ao talante desses e, máxime, ao arrepio da lei, o loteamento ou rua, agora fechados, em falsos condomínios residências horizontais, passando a exigir dos moradores o pagamento de contribuições condominiais compulsórias, inclusive patrocinando execução judicial contra alguns deles.

(...) 

8. Deveras, pelo que se observa do ordenamento jurídico ora vigente, inexiste a figura dos loteamentos fechados, que se caracterizam em empreendimentos geralmente concebidos e aprovados perante o município e registrados como loteamento, sendo posteriormente murados, fechados com portões e guaritas e comercializados como condomínios, por iniciativa do loteador ou de munícipes (proprietários dos lotes), em geral por meio de associações de moradores, que ocupam irregularmente as áreas de domínio público que foram automaticamente transferidas para o município, conforme artigo 22 da Lei Federal nº 6.766/79. 

Juridicamente, a 66ª Promotoria de Justiça da Capital entende que não há legislação que ampare essa feição urbanística, ao revés, o que existe, ao fecharem os loteamentos, é a tentativa de locupletação de bens públicos de uso coletivo. 

III – DAS RUAS 

9. Na mesma senda, como já dito acima, há também ocupação irregular de bens públicos de uso coletivo pelos munícipes, com a aquiescência ilícita do Poder Público Municipal, quando do fechamento ininterrupto de ruas da cidade de Maceió, com colocação de grades, portões e instalação de portarias nas calçadas ou sobre estas. 

10. Com efeito, estabelecem o art. 99 do Código Civil, o artigo 6, incisos I e IX, X, XI e 8º, 103, incisos I e II e §§ 1º 2 º, todos da Lei Orgânica do Município de Maceió e o artigo 218 do Código Municipal de Posturas da Cidade de Maceió, verbis: 

“Art. 99. São bens públicos: 
I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; (Omissis);” (Negrito nosso). 

“Art. 6º. Compete ao Município de Maceió:
 I - promover, com a permanente e efetiva participação da comunidade e a colaboração da União Federal e do Estado de Alagoas, a sedimentação e o desenvolvimento de uma sociedade livre, justa e solidária, fundada na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho, na livre iniciativa e no pluralismo partidário; (Omissis); 
IX - assegurar adequado ordenamento territorial, mediante o planejamento e o controle do uso, do fracionamento, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; 
X - expedir plano diretor destinado a garantir a execução de política racional de desenvolvimento e da expansão urbana, calcada inclusive no ordenamento das fundações sociais das áreas habitadas e em vias de implantação de arruamentos; 
XI - garantir o cumprimento da função social dos espaços urbanos, promovendo meios visando a reduzir e a finalidade extinguir as áreas em condições de não utilização, subutilização ou utilização inadequada, inclusive mediante a instituição de impostos progressivos e programas de parcelamento ou edificações compulsórios; 

(.....) 

“Art. 103. O Município exercerá a polícia administrativa sobre os bens e as atividades das pessoas visando a disciplinar as condutas e a conter comportamentos prejudiciais ao interesse coletivo, cumprindo-lhe exercer o controle, especialmente: I - das edificações, dos parcelamentos urbanos, do uso e da ocupação do solo; (Omissis); 
§ 1º - São atributos do poder de polícia e coercibidade, a discricionariedade e auto executoriedade.
§ 2º - A lei disporá sobre as sanções aplicáveis em razão do exercício do poder de polícia, sempre que ocorrente inobservância das posturas municipais.” 

(....) 

13. Já os bens de uso comum do povo ou de Domínio Público é tão evidente a sua destinação que ao explicá-lo se faz mister incidir em tautologia, já que a designação desta categoria de bens é autoexplicativa. Segundo lição doutrinária, essa categoria de bens compreende "coisas materiais que pertencem ao Estado, mas sobre as quais quisque de populo, anônima e coletivamente, pode exercer direitos de uso e gozo, como, p. ex., os logradouros públicos, praças, jardins, ruas, avenidas. Os bens de uso comum são insuscetíveis de direito de propriedade". [1]. (Negrito nosso). 

14. Temos, assim, que bens públicos de uso comum do povo ou de Domínio Público são os que se destinam à utilização geral pela coletividade, podendo essa, de forma anônima, exercer direitos de uso e gozo, a exemplo, frise-se, das ruas, praças, equipamentos públicos comunitários, parques públicos, estradas, dentre outros, como os rios, os mares, de acordo com o disposto no artigo 99, I, do Código Civil. 

15. Nesta senda, também são bens públicos de uso comum do povo, que passam a integrar o patrimônio do município, desde a data de registro, as vias e as praças, os espaços livres e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto memorial descritivo do loteamento, ex vi artigo 22 da Lei 6.766/1976, c/c o artigo 165, da Lei Municipal nº 5.593/2007, já destacados acima. 

16. Sente-se aqui, ante as linhas acima traçadas, em última razão, o espírito de República, no tocante ao sentimento popular dos bens públicos de uso comum, que pressupõe sempre a isonomia entre a totalidade dos indivíduos. José Afonso da Silva ensina que “público, do latim publicum, quer dizer do povo (populum deu populicum, e daí público)”.

 Lembra Jhering que res publica, como personalidade, na concepção do Estado da época posterior à sociedade gentílica, implica, originariamente, o que é comum a todos: res publicae são as diversas coisas da sociedade pública, às quais todos têm igual direito"[2]

(...) 

17. Assim, os bens de uso comum do povo, como parece óbvio, devem ter sua utilização franqueada a toda população, isonomicamente, sem restrições, pois “nos bens de uso comum do povo, o uso por toda a gente não só se concilia com o domínio público da coisa, como constitui mesmo o fator de sua caracterização”. (Negrito nosso).[3] [4]. 

18. A regra, portanto, é de serem assegurados, para toda população, sempre, livre e franco acesso, além de plena disposição sobre esses bens, sem restrições, sendo o seu uso exclusivo e perene por particulares uma anomalia, que não corresponde à ideia de República. 

19. De caráter absolutamente excepcional, por conseguinte, sua destinação a particulares, que deve obedecer ao regramento da curta duração. Carlos Maximiliano afirma que "consideram-se excepcionais as disposições que asseguram privilégio, palavra esta de significados vários no terreno jurídico. Abrange: a) ... ; b) o gozo e a exploração de propriedades e riquezas do Estado"[5]. 

20. Nas abalizadas palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

 "Os bens de uso comum do povo, tais como as ruas e praças, destinam-se ao uso coletivo. O uso privativo de uma parcela de rua ou praça para realização de comércio de qualquer tipo (venda de frutas, roupas, jornais, etc.) depende de consentimento do poder público, manifestado por meio de autorização, permissão, ou concessão de uso. 

Em regra, em se tratando de bem de uso comum do povo, a autorização e a permissão são as medidas mais adequadas devido ao seu caráter precário. Com efeito, o uso privativo não corresponde à destinação desses bens; eles existem para servir ao uso igual por parte de toda a coletividade. Por isso mesmo, somente devem ser expedidas quando não prejudiquem a destinação principal, que é a livre circulação (negrito nosso). 

E devem ser expedidas em caráter precário, exatamente pela necessidade de sua revogação, a qualquer tempo em que o uso privativo prejudicar a destinação do bem."[6]. 

(....) 

23. Com efeito, conforme é notório na Cidade de Maceió, vários bens públicos de uso comum do povo, frise-se, que se destinam à utilização geral pela coletividade, como, por exemplo, ruas, praças, equipamentos públicos comunitários, inclusive córregos, passaram a ser ocupados irregularmente, ao longo de vários anos, por alguns munícipes, em geral por meio de associações, ao arrepio da lei, ao talante dos ocupantes e algumas vezes com a aquiescência de administradores públicos municipais.

VI – DA OMISSÃO DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL 

24. Assevera-se o consentimento de órgãos da administração municipal, ao longo de várias gestões municipais, pelos seguintes motivos: 

a) Omissão na fiscalização de instalação de “loteamento fechado”;  

b) Autorização para fechamento de área urbana, que contém bens públicos, por quem não detinha competência para prática desse ato; 

c) Omissão na fiscalização de fechamento de ruas sem qualquer autorização legal; 

d) Omissão na fiscalização da cessação dos efeitos, quando autorizado o fechamento de rua em caráter temporária ou precário, pelo advento do termo final, e 

e) Omissão na fiscalização de instalações de guaritas e até portarias, resultando, em ato contínuo, no fechamento de rua e de loteamento nos quais estes estão edificados. 

25. Em alto grau, munícipes, em face das razões listadas nas alíneas acima, ao ocuparem irregularmente bens públicos de uso comum do povo, que, aliás, não podem sofrer administração privada por meio de fechamento de loteamentos e logradouros, impedindo e dificultando a entrada de pessoas, impondo uma utilização exclusivamente privada de ruas e praças pelos moradores beneficiados, subtraem diversas áreas públicas de uso comum do povo, colocando-as como áreas de uso privativo de alguns poucos moradores privilegiados, causando prejuízos a interesses difusos urbanísticos, privando a cidade de vias de circulação, áreas verdes e equipamentos públicos, resultando numa diminuição significativa da qualidade ambiental conveniente à qualidade de vida da maioria da população maceioense. 

VII – DA INALIENABILIDADE DOS BENS PÚBLICOS

 26. Do direito romano vem o princípio da inalienabilidade dos bens de uso comum. O Código Civil prevê no art. 100, referindo-se aos bens públicos: " 

Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.” 

(...)

28. De fato, não é possível sequer a permissão de direito real de uso de bem público de uso comum do povo, que poderia resultar na sua disfarçada alienação, burlando a lei. Essa exegese se dá por força da inalienabilidade dessa espécie de bem público. 

De nada adiantaria a proteção legal contra a alienação de um bem se nenhuma restrição incidir sobre sua concessão a particulares para uso exclusivo por período indeterminado. 

É que "na realidade não só a venda como concessões privatizam os bens, colocando-os exclusivamente a serviço de uns poucos".[10]. 

Quem não pode alienar um bem não pode conceder direito real de uso gratuito que resulte na privatização. (Negritos nossos). Ubi eadem legis ratio, ibi eadem legis dispositio: "onde se depare razão igual à da lei, ali prevalece a disposição correspondente, da norma referida", diz Carlos Maximiliano.[11].

(...) 

VIII – DA ESTIMATIVA DE VALOR PECUNIÁRIO DECORRENTES DAS OCUPAÇÕES IRREGULARES DE BENS PÚBLICOS DE USO COLETIVO 

29. Ad argumentandum tantum, mesmo estando os bens públicos de uso coletivo fora do comércio, já que sua alienabilidade não é possível, merece destaque o estudo realizado pela arquiteta Maria da Glória Santos Modesto [12], que versa também sobre a dinâmica de privatização dos tecidos urbanos nos loteamentos fechados. 

Observou a referida arquiteta, a partir da análise de 47 (quarenta e sete) empreendimentos na cidade de Maceió, a existência de um total de 733.284.36 m² de áreas pertencentes ao domínio público que foram privatizadas de forma irregular, isso no ano de 2010, conforme pode ser extraído da seguinte tabela por ela identificada: (...) 

Disponívelem: http://www.repositorio.ufal.br/bitstream/riufal/717/1/Dissertacao_MariadaGloriaSantosM odesto_2010.pdf, p. 135

(...) 

Em harmonia ao exposto, é certeiro o que assevera o jurista José Afonso da Silva, ao lecionar que: As prefeituras deverão negar autorização para esse tipo de aproveitamento do espaço urbano, exigindo que se processe na forma de plano de arruamentos e loteamento ou desmembramento, que não se admite sejam substituídos por forma condominial, como se vem fazendo. 

Vale dizer, os tais “loteamentos fechados” juridicamente não existem; não há legislação que os ampare, constituem distorções e uma deformação.[13]. 

(....) 

37. Ao permitir o controle de ingresso de pessoas em área pública, os munícipes que geram obstáculos, em face da omissão do requerido, investiram-se, ilegalmente, do poder de polícia exclusivo do Estado. 

De fato, em situação como esta, em decisão irreparável, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou inconstitucional lei municipal que outorgou a particular o direito de controlar o acesso de pessoas a loteamento, verbis: 

Nesse sentido: "Por fim, é de cuidar-se da outorga às concessionárias de uso das áreas em questão da obrigação de praticamente as isolar, controlando o ingresso de estranhos em suas dependências, assim substituindo, como dito na inicial, "a vigilância pública pela privada, matéria essa relacionada ao campo da segurança pública, que é da competência exclusiva do Estado, nos termos do disposto no artigo 139 da Constituição Estadual" (f.10), podendo-se indicar como vulnerado também o art. 1º da mesma Carta. "Bem acentuado na manifestação final do Ministério Público que o controle de acesso às áreas de uso comum, "que pressupõe abordagem e exibição de documentos pessoais", é tarefa típica de policiamento preventivo, sequer atribuída ao Município, mas sim ao Estado, que também por isso não poderia delegar direitos que não tem (f.168)..." (Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº 056.132.0/7 - Órgão Especial do TJSP, j. 10/11/99, v.u., relator Des. Luis de Macedo).

(....) 

38. Em outras palavras, os munícipes que impedem a circulação dos transeuntes em espaços considerados como bens públicos de uso comum, ao se arvorarem ilegalmente desses, investem-se também do Poder de Polícia decorrente da Segurança Pública pertencente ao Estado de Alagoas, criando uma série de entraves ao direito de ir e vir de todo cidadão às áreas públicas de uso comum da cidade de Maceió, listadas, a título de amostragem, em artículo mais acima.

(...) 

X – DA AFRONTA AO DISPOSTO NO ARTIGO 5º, INCISO XVII, DA C.F.

 40. Embora não seja o objeto da presente ação, impende não olvidar que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XVII [15], assegura, como direito fundamental, o direito pleno de liberdade de associação e o inciso XX do mesmo dispositivo impõe a proibição do dever de associar [16].

 41. Para Uadi Lammêgo Bulos, o referido inciso XX é uma cláusula de “(...) liberdade negativa de associação. Contém a ideia de que o direito de associação assegura à pessoa a liberdade de não ingressar em nenhuma associação contra a sua vontade, nem tampouco manter vínculo de permanência.”[17]. 

42. Já para o festejado constitucionalista português Jorge Miranda, o direito de associação possui múltiplas dimensões, podendo ser positivo ou negativo. 

É negativo enquanto: “O direito de não ser coagido a inscrever ou permanecer em qualquer associação, ou pagar quotizações para associação em que não esteja inscrito..”[18].

43. De fato, muitos dos fechados loteamentos e arruamentos da cidade de Maceió, por meio de associações, têm imposto aos proprietários e aos moradores o dever de se associar, sob pena, de não o fazendo, sofrerem tratamento discriminatório, já que alegam que em nome da manutenção dos ilegais serviços de vigilância e restrição de ingresso de pessoas nas áreas públicas fechadas têm despesas pecuniárias. 

Isto é claramente um abuso e uma arbitrariedade que certamente deixará de existir quando a legalidade voltar a imperar, vale dizer, quando da ordem Judicial de abertura de todos fechados loteamentos e de ruas fechadas da cidade de Maceió. 

53. De fato, não é possível o fechamento de um loteamento. Fechado pode ser o condomínio, que como já visto possui feição urbanística distinta. Assim, editados os artigos 211 usque 225 e, por conseguinte, toda a Subseção VIII, da Seção IV, do Capítulo IV, do Código de Urbanismo e Edificações de Maceió, Lei Municipal nº 5593/2007, com o fim de regularizar o fechamento de tal espécie de parcelamento do solo para fins urbanos, a citada Subseção VIII do diploma legal em análise, ressente-se, inexoravelmente, de inconstitucionalidade e de afronto ao ordenamento jurídico federal citado acima. 

54. Portanto, a 66ª Promotoria de Justiça da Capital assevera que lícita não é a legislação que venha, em sentido diametralmente oposto ao regramento da Lei Orgânica do Município de Maceió e aos diplomas legais invocados, permitir que se altere a destinação de áreas institucionais e demais aparelhamentos urbanos, integradas ao domínio público do município, que devem estar ao dispor da coletividade, para, com o fechamento do loteamento, beneficiar pequena parcela da sociedade em detrimento de toda comunidade, que ficará subtraída do uso de tais bens de uso comum, além de ter cerceado o seu direito de livre trânsito. 

55. Verdadeiramente, tais disposições, artigos 211 a 225 do Código de Urbanismo e Edificações da Cidade de Maceió, em seu conjunto, formam uma burla, uma tentativa de desafetação de bens públicos juridicamente inalienáveis (Código Civil de 1916, art. 67; Código Civil de 2002, art.100). 

56. De fato, a conduta do Município, ao consentir no fechamento de loteamento nos termos das disposições em exame, desafia o comando do artigo 17 da Lei 6766/79. Referido dispositivo legal proíbe qualquer tipo de alteração de destinação de áreas institucionais e verdes após a aprovação do loteamento, ao dispor:

“Art. 17. Os espaços livres de uso comum, as vias e praças, as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo, não poderão ter sua destinação alterada pelo loteador, desde a aprovação do loteamento, salvo as hipóteses de caducidade da licença ou desistência do loteador, sendo, neste caso, observadas as exigências do art. 23 desta lei.” 

57. Assim, ao permitir o uso de áreas públicas por associação de moradores, o Município contraria a proibição emanada da lei federal e por esta razão padece do vício insanável da ilegalidade.

(....) 

64. Diante da indisponibilidade do direito em debate, a 66ª Promotoria de Justiça da Capital requer ainda a dispensa da designação de audiência de conciliação, nos termos do artigo 319, VII do Código de Processo Civil. 

65. Dá-se o valor estimado à causa de R$ 366.642.180,00 (trezentos e sessenta e seis milhões, seiscentos e quarenta e dois mil e cento e oitenta reais), para efeitos legais. 

Nestes termos, Pede deferimento. 

Maceió, 11 de abril de 2017. 

Antonio Jorge Sodré Valentim de Souza 

Promotor de Justiça da 66ª Promotoria de Justiça